Resumo: Este artigo analisa julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre crimes contra a dignidade sexual, a fim de responder à seguinte pergunta: além da palavra da vítima, quais as “demais provas” valoradas nessa espécie de delito para se considerar provado um enunciado fático? Para tanto, faz-se uma análise qualitativa de casos julgados pelo STJ no ano de 2022 envolvendo o tema da prova nos crimes sexuais, sistematizando-os. Ao final, em conformidade com os resultados apresentados, constata-se a existência de três categorias: provas relacionadas à própria palavra da vítima; provas consistentes na palavra de terceiros; laudos (físicos e psicológicos).
Keywords: Case law of the Superior Court of Justice, Evidence of crimes against sexual dignity, Word of the victim, Third-party testimony, Reports as evidence.
Abstract: This article analyzes judgments from the Superior Court of Justice (STJ) on crimes against sexual dignity, in order to answer the following question: in addition to the victim’s word, what “other evidence” is valued in this type of crime in order to consider a factual statement proven? Therefore, a qualitative analysis of cases judged by the STJ in the year 2022 is carried out, systematizing them. At the end, in accordance with the results presented, the existence of three categories was verified: evidence related to the victim’s own words; consistent evidence in the word of others; reports (physical and psychological).
Palavras-chave: Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, Prova de crimes contra a dignidade sexual, Palavra da vítima, Testemunho de terceiros, Laudos como prova.
Teoria da Prova Penal
O que existe além da palavra da vítima? A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a prova em crimes sexuais
What exists beyond the word of the victim? The case law of the Superior Court of Justice on evidence in sexual crimes
Received: 22 April 2023
Revised document received: 10 June August September September September September September 2023
Accepted: 02 October 2023
A prova em casos de crimes sexuais (= dignidade sexual) é um assunto tormentoso, não só por sua difícil produção, mas, também, por vulnerabilizar a vítima e causar comoção social3. Por essa combinação de fatores, buscaram-se formas de, a um só tempo, contornar as referidas dificuldades probatórias e dar uma resposta satisfatória à vítima e à população4.
Uma tentativa de equacionar os diversos interesses em jogo pode ser encontrada na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (adiante: STJ) que confere especial valor probatório da palavra da vítima nos crimes sexuais. Entretanto, os julgados5 que fazem referência a esse entendimento, muitas vezes, acrescentam mais um elemento: a palavra da vítima tem especial valor probatório quando está em consonância com as demais provas dos autos. A questão que fica é: além da palavra da vítima, quais são essas “demais provas” levadas em conta para considerar provado um enunciado fático?
Buscando responder a essa pergunta, analisou-se a jurisprudência do STJ, no ano de 2022, com relação às provas que se somam à palavra da vítima em casos de crimes contra a dignidade sexual. Para isso, o presente estudo foi dividido em quatro partes: na primeira, há uma breve exposição sobre a problemática probatória dos crimes contra a dignidade sexual; na segunda, é justificado o recorte da presente pesquisa; na terceira, há uma explicação sobre a metodologia aplicada; e, por fim, na quarta parte, os resultados alcançados são apresentados. Ao final, foram resumidas as conclusões da pesquisa.
Os crimes contra a dignidade sexual6 causam consequências dramáticas tanto para a vítima, manifestadas nos efeitos do fato sobre sua vida, quanto para a pessoa acusada, pois as penas previstas para alguns dos crimes contidos nessa categoria são altas7, bem como por encontrar condições piores em estabelecimentos penitenciários em comparação a outros condenados e por ficar estigmatizado no círculo social8.
Não obstante, é exatamente esse tipo de delito que apresenta, muitas vezes, as maiores dificuldades probatórias, podendo-se citar, sem pretensão de completude, os seguintes fatores: normalmente são cometidos em lugares reservados e longe dos olhares de terceiros9, estando presentes apenas a vítima e o agente; por isso, na instrução processual, é comum a falta de testemunhas diretas do fato. Soma-se a isso o fato de não deixarem, em muitos casos, marcas físicas10, de modo a não ser possível detectá-las por meio de exame de corpo de delito; caso o fato deixe sinais físicos, é possível que tenham desaparecido devido ao tempo decorrido entre o crime e o exame, uma vez que nem sempre a vítima denuncia logo após o fato; ou seja, ao fim e ao cabo, há ausência de vestígios11. Há, ainda, um incremento na dificuldade probatória nos casos em que a vítima é menor de idade, pois há o tensionamento entre a proteção da criança e do adolescente e os direitos da pessoa acusada, mormente o contraditório e a ampla defesa12, além de existirem dificuldades de comunicação, principalmente em casos que envolvem crianças de idade tenra13.
Diante dos problemas expostos, o STJ firmou jurisprudência no sentido de que, em delitos de natureza sexual, a palavra da vítima recebe especial relevância quando em harmonia com as demais provas colacionadas ao processo14. Por meio desse entendimento, o Tribunal teria tentado remediar a impunidade e o sentimento de falta de proteção de mulheres e pessoas LGBTQIAPN+ vítimas dessa espécie de crime15. Tal tema recebeu atenção doutrinária e vem sendo por ela desenvolvido16, sem que, entretanto, se tenha clareza sobre quais seriam as “demais provas” que a jurisprudência menciona, de modo que nos parece de valor investigar o que o Tribunal responsável por essa jurisprudência entende ser o seu conteúdo.
É necessário justificar o porquê da análise da jurisprudência do STJ. Em primeiro lugar, trata-se do órgão responsável por uniformizar os entendimentos quanto à legislação infraconstitucional e, por isso, interessa tanto à teoria quanto à prática ter clareza sobre o conteúdo de sua jurisprudência. Além disso, a forma como o STJ apresenta seus acórdãos, com transcrições das decisões dos Tribunais de Justiça, torna acessível o conteúdo dessas decisões que, de outra forma, teriam a sua leitura impedida por força do segredo de justiça decretado correlato à matéria17.
Todavia, há um aspecto a ser considerado. A súmula 7 do STJ prevê: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”, de modo que a simples matéria fática está excluída da análise em sede de recurso especial18, o que poderia impossibilitar a aferição de quais provas o STJ considerou aplicáveis ao caso.
Contudo, isso não se mostrou um problema. As decisões que aplicaram a referida súmula, por mais que não examinassem novamente o acervo de provas do processo, descrevem com detalhes quais foram as provas produzidas nos casos por meio da transcrição da decisão recorrida, o que viabilizou o acesso ao que foi utilizado como prova no caso. Ademais, foi possível identificar quais provas o STJ considerou importantes para o caso, pois, quando discordou da valoração ou entendeu que houve desrespeito à sua jurisprudência, o Tribunal não se omitiu de alterar o resultado do julgamento mediante nova valoração do conjunto probatório19.
Dessa forma, há vários julgados cujo conteúdo consiste, essencialmente, em transcrição da valoração da prova realizada pelo Tribunal Estadual na decisão objeto de recurso, com um comentário do Ministro Relator sobre a correção da valoração adotada pela instância inferior. A partir disso, foi possível traçar o entendimento do STJ sobre o conteúdo do termo “demais provas” em crimes contra a dignidade sexual.
As pesquisas de julgados foram feitas no site do STJ com a inserção, em todas, de limitação temporal na busca de acórdãos a publicações entre 01 de janeiro de 2022 e 31 de dezembro de 2022. Na primeira pesquisa, foram usados os termos “palavra”, “vítima” e “crime sexual”, do que resultaram 33 (trinta e três) julgados. Na sequência, fez-se nova pesquisa com os termos “palavra”, “vítima” e “crimes sexuais”, que localizou 14 (catorze) acórdãos. Após análise dos julgados, verificou-se que esses 14 (catorze) acórdãos já estavam contidos no resultado da primeira pesquisa. Ou seja, a alteração do comando de pesquisa consistente em usar “crimes sexuais” no plural ao invés do singular não fez surgir novos julgados.
Em seguida, outra pesquisa foi feita usando os termos “palavra”, “vítima” e “delito sexual”, tendo sido encontrados 30 (trinta) julgados, dos quais 25 (vinte e cinco) estavam também contidos na primeira pesquisa e os outros 5 (cinco), não. Por fim, na última busca foram usadas as palavras “declaração vítima” e “crime sexual”, o que resultou em um total de 16 (dezesseis) acórdãos, estando 6 (seis) deles contidos na primeira pesquisa, havendo, portanto, 10 (dez) julgados novos.
Ao final, todas as pesquisas totalizaram, juntas, 48 (quarenta e oito) acórdãos. Após análise qualitativa, foram descartados 13 (treze) julgados por não abordarem o tema da palavra da vítima e, por isso, dissociarem-se do fim desta pesquisa. Portanto, com a dedução destes, sobraram 35 (trinta e cinco) acórdãos. Ocorre que um caso20 apareceu em duplicidade, já que um julgado consistia na decisão dos embargos de declaração opostos. Como se referem ao mesmo caso e não houve alteração da decisão embargada, seria incorreto considerá-las como decisões diferentes para a o fim da análise a que se propõe o presente estudo. Em razão disso, levaremos em conta 34 (trinta e quatro) acórdãos que restaram após realizar essa “triagem”.21
O primeiro critério de sistematização aplicado aos 34 (trinta e quatro) acórdãos foi o crime imputado. A justificativa para tanto é que, conforme explicado no tópico 2, o valor da palavra da vítima em crimes sexuais apresenta ainda maiores dificuldades nos casos em que a vítima é criança. Desse critério resultaram: (a) 20 (vinte) julgados com a imputação era de estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A do Código Penal; (b) 7 (sete) julgados imputaram o crime de estupro de vulnerável (artigo 217-A, CP) cumulado com a causa de aumento de pena por relação familiar (artigo 226, II, CP); (c) 2 (dois) julgados com imputação de estupro, previsto no artigo 213, CP; (d) 2 (dois) julgados com imputação de violência sexual mediante fraude (artigo 215, CP); (e) 1 (um) caso cuja imputação era o crime previsto no artigo 213, § 1º (estupro vítima entre 14-18 anos) e 217-A (estupro vítima de vulnerável) cumulada com a causa de aumento de pena por relação familiar (artigo 226, II, CP); (e) 1 (um) julgado de estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A, § 1º do CP; e (f) 1 (um) julgado cuja imputação era de estupro de vulnerável (artigo 217-A, §1º, CP) cumulada com causa de aumento de pena por concurso de agentes (artigo 226, I, CP). Essas informações podem ser apresentadas por meio do seguinte gráfico:
A quantidade de julgados que tematizaram o art. 217-A, CP, chama a atenção, especialmente considerando que a maior parte das discussões sobre a palavra da vítima arrancam da ideia de que ela seria uma pessoa adulta22, capaz de armazenar informações e se expressar de forma clara. Caso se tenha em mente que boa parte dos casos que chegam ao judiciário envolvem menores de idade, pode-se concluir que outras discussões precisam ser aprofundadas e difundidas23.
O segundo critério de sistematização aplicado consiste na classificação dos julgados em dois grupos: os que aplicaram a súmula 7/STJ e os que não a aplicaram. Dos 34 (trinta e quatro) casos analisados, 28 (vinte e oito) aplicaram a súmula 7:
Dessa aplicação generalizada da súmula 7 decorre que em várias decisões do STJ não há uma revaloração das provas apresentadas, mas simplesmente a repetição do que foi valorado pelo juízo de primeira instância ou Tribunal de Justiça. Entretanto, conforme mencionado acima24, a súmula não impediu o STJ de revalorar a produção probatória quando não concordou com o resultado alcançado pela instância inferior25, nem obstou a alteração de julgamento quando identificada a incorreta aplicação da jurisprudência do STJ sobre a palavra da vítima26. Dessa forma, é possível concluir que quando o STJ apenas cita a valoração realizada pela instância inferior, sem alterá-la, a considera, ao menos prima facie, como correta.
Ainda, antes de adentrar na análise do conteúdo dos julgados, são necessárias três ressalvas: (i) dos 34 (trinta e quatro) julgados, em um27 o STJ não faz a descrição da valoração de provas feita por outras instâncias, o que impediu a análise qualitativa aqui visada; (ii) em um grupo de julgados, composto por três casos28, o especial valor probatório da palavra da vítima era analisado no contexto de alegação de falta de justa causa da ação penal, ou seja, em momento anterior à eventual condenação e avaliação de toda a produção probatória desenvolvida no processo, de modo que não foram, aqui, levados em consideração; (iii) por fim, em um caso29, houve o reconhecimento da falta de prova para condenação, pois a vítima, criança de dois anos de idade, não sabia se expressar adequadamente, de modo que a única “prova” era a palavra da mãe, que, contudo, não havia presenciado o suposto crime; logo, é um caso em que não houve a palavra da vítima e, por isso, também será desconsiderado.
Assentado isso, parte-se à análise do que efetivamente se entende por “demais provas” nos crimes sexuais. Mediante uma sistematização prévia do material probatório citado, conseguiu-se dividi-lo em três grandes grupos: provas referentes à própria palavra da vítima (palavra da vítima e seus reforços, tópico 4.1, infra); o depoimento de terceiros (palavra de terceiros, tópico 4.2, infra); laudos (laudos físicos e psicológicos, tópico 4.3, infra).
Neste tópico, focar-se-á nas provas que se relacionam de forma direta com a própria palavra da vítima. Em 33 (trinta e três) casos, é referido que a palavra da vítima tem especial valor probatório nos crimes sexuais e deve ser corroborada por outros elementos de prova, conforme a jurisprudência dominante do STJ.
Em 29 casos, é possível extrair que fatores foram levados em conta como prova. O primeiro, verificado em 1030 (dez) casos, refere-se à coerência da palavra da vítima durante o processo, que reforçaria sua qualidade e lhe conferiria maior credibilidade. Em sentido, contrário em 131 (um) caso, apesar do relato da vítima menor de idade apresentar incongruências em relação ao local em que teria ocorrido o crime, estas não foram suficientes para ilidir o valor probatório de sua palavra, pois foi considerado que as incongruências eram acessórias e insignificantes diante do que a vítima narrou com detalhes. Assim, pode-se extrair a primeira conclusão: a ideia de coerência não estaria já contida na “palavra da vítima”, representando um plus à sua credibilidade: além da palavra da vítima, que já tem especial valor, ela ainda é coerente32.
Outro critério desenvolvido pela jurisprudência, presente em 9 (nove) casos, consiste no fato de a vítima e/ou testemunhas/informantes não terem motivos para prejudicar o réu, incriminando-o. Novamente, aplica-se a lógica já exposta de que essa característica seria um plus: além da palavra da vítima, especialmente valorosa nessa espécie de crime, ela não tem motivo para querer incriminar o réu; logo, deve ser ainda mais crível33.
Cruzando os dados, a coerência da palavra da vítima e a ausência de motivos para incriminar o acusado estão presentes simultaneamente em 5 (cinco) casos34.
Em suma, conclui-se, a partir dos casos analisados, que a coerência da palavra da vítima e a ausência de motivos para incriminar/prejudicar o réu funcionam como reforços à palavra da vítima. A coerência é algo que está no próprio círculo da credibilidade da palavra da vítima, ou seja, relacionado diretamente ao seu conteúdo. Diferentemente, a ausência de motivos para incriminar/prejudicar o réu é aferida do contexto fático apresentado nos autos e depende de alguns fatores, como relatos de testemunhas e informantes, a versão da vítima e sua condição (como, por exemplo, o fator menoridade), sendo um fator externo a em favor da credibilidade ao relato.
Em 2335 (vinte e três) julgados são encontradas referências a testemunhas e/ou informantes, não havendo, entretanto, em nenhum desses casos, uma que tivesse presenciado o crime imputado, o que, mais uma vez, evidencia a dificuldade probatória dos crimes contra a dignidade sexual.
A prova testemunhal pode ser subdividida em três categorias: a) referente às declarações da vítima (testemunha de ouvir dizer)36; b) referente à mudança de comportamento da vítima37; c) referente ao comportamento da pessoa acusada38.
Nos 18 (dezoito) casos de testemunhas de ouvir dizer, as testemunhas e/ou informantes são familiares, vizinhos ou professores que não presenciaram os fatos e narram em juízo o que ouviram da própria vítima ou de terceiros. Ou seja, são testemunhas que contam em juízo a versão que ouviram da vítima, o que é possível descrever a partir da seguinte estrutura: a) a vítima diz que algo (um abuso) ocorreu; b) essa declaração ocorre antes do procedimento judicial; c) as palavras da vítima são repetidas perante o julgador com a intenção de provar que aquilo que a vítima disse efetivamente ocorreu39.
A segunda categoria, por sua vez, aparece em 4 (quatro) casos e busca demonstrar os efeitos que o abuso teria causado sobre a vítima, geralmente destacando mudanças comportamentais percebidas desde a data do fato40. Com isso, busca-se, indiretamente, reforçar a veracidade da palavra da vítima, pois demonstra que o ocorrido teve efeitos concretos sobre a sua forma de ser e de se portar. É comum também que haja sobreposição entre essa categoria e a de testemunhas de ouvir dizer41.
Por fim, há 4 (quatro) casos42 em que a testemunha destaca o comportamento suspeito do réu. A lógica é o alegado pela vítima estaria em harmonia com a forma de ser da pessoa acusada, de maneira a ser compatível o que a vítima diz e a visão que se tem sobre a pessoa acusada, reforçando o depoimento.
A jurisprudência ressalva, contudo, que o depoimento de testemunha/informante serve como uma prova que corrobora a declaração da vítima, militando a seu favor, sem, contudo, ser aceita como única prova no caso43. Tem-se, portanto, novamente uma relação de plus.
Por fim, nos casos analisados, a dificuldade probatória relativa à prova pericial ficou evidente. Isso porque, como o estupro não envolve apenas a conjunção carnal, mas também a prática de atos libidinosos que não deixam qualquer vestígio, há casos em que a perícia nada apontará44. Ademais, mesmo nos casos em que há conjunção carnal, a prova pericial também nada indicará se decorrido certo tempo entre o fato e a realização da perícia45.
Dentre os julgados analisados, não há menção sobre a produção de prova pericial em 22 (vinte e dois) casos46.
Nos outros 12 (doze) julgados47, há referência à produção de prova pericial e/ou relatório médico. Em 8 (oito) casos48 a perícia resultou negativa, sendo que: em 3 (três)49, o tempo decorrido entre o exame e o fato foi determinante para não se encontrarem vestígios; em outros 3 (três)50, a perícia nada constatou porque a prática imputada por si só não deixava marcas, como, por exemplo, um toque nas partes íntimas. Além disso, em 2 (dois) casos não há descrição do porquê a perícia foi negativa, de maneira que não há como enquadrá-los nos grupos anteriores. Há, ainda, 3 (três) casos nos quais a perícia resultou positiva: em um caso a ruptura antiga do hímen corroborava com a narrativa do fato criminoso51; nos outros dois52 foi constatada a conjunção carnal. Por fim, há ainda um caso53 sem a descrição do conteúdo do laudo pericial, de modo que não há como saber se foi conclusivo ou não.
Quanto aos relatórios psicológicos, em 20 (vinte) casos não há menção sobre a sua produção, ao passo que em 13 (treze) casos houve a elaboração de relatório. Para além destes treze, há um caso54 peculiar em que a discussão recursal consistia no pedido da defesa de anulação do processo para que fosse determinada a juntada de laudo psicológico conclusivo acerca do estudo técnico em produção pelo CRAS (Centro de Referência de Assistência Social). No entanto, o STJ entendeu que a defesa não demonstrou a imprescindibilidade do laudo para alterar a condenação e que as demais provas no processo – palavra da vítima e provas orais – foram consideradas suficientes para a condenação pelas instâncias inferiores, em harmonia com a sua jurisprudência.
Dentre os 13 (treze) casos com relatório, foram constatadas mudanças comportamentais das vítimas e até o desenvolvimento de certas consequências após o crime – como, por exemplo, pânico – em 4 (quatro) casos55, sendo que em outro56 foi constado abalo psicológico da vítima. Há ainda 4 (quatro) casos que orbitam em torno da palavra da vítima: um57 atesta a veracidade da declaração; outro58, a vítima detalha a violência sofrida; em um terceiro,59 psicólogos prestam depoimento e afirmam que a revelação do fato pela vítima foi de forma deliberada; no quarto60, foi produzido parecer técnico sobre eventual comprometimento do relato pela deficiência mental da vítima, concluindo-se que não. Ademais, há um caso em que 61 o relatório psicossocial da menor não constatou os sintomas e comportamentos típicos da pessoa vitimada, e outro62 em que foram encontrados indicativos de que a violência ocorrera. Por fim, em 2 (dois) casos não há descrição sobre o conteúdo do que foi constado pelos laudos63.
Para que se visualize de forma mais didática o que constitui as “demais provas”, o gráfico abaixo reúne as análises anteriores nos respectivos tópicos temáticos. No entanto, a fim de evitar confusões quanto ao número de julgados, algumas explicações são necessárias para a compreensão do gráfico final.
A primeira é que com exceção dos casos que se excluem mutuamente – como, por exemplo, laudos negativos e positivos -, um caso pode aparecer mais de uma vez em uma mesma categoria, por exemplo: na palavra de terceiros, a testemunha/informante pode ser do grupo de ouvir dizer e, ao mesmo tempo, ser alguém que estranhou o comportamento do réu.
A segunda refere-se à categoria palavra de terceiros. Em um caso64, apesar de constar na descrição das provas que há testemunhas, não há referência ao conteúdo do que foi dito, de modo que não foi possível contabilizá-lo em nenhum dos três grupos (testemunhas de ouvir dizer; testemunhas que apontaram mudança de comportamento da vítima; e testemunhas que estranharam o comportamento do réu).
Por fim, a terceira explicação: os laudos ou estudos psicossociais foram categorizados pelo conteúdo, tendo sido adotada como nomenclatura geral a palavra “laudo”.
Graficamente:
Os resultados da pesquisa podem ser assim sintetizados:
Os autores agradecem a leitura crítica e as sugestões de complementação que este trabalho recebeu de Vítor Gabriel Carvalho e dos editores e avaliadores da Revista Brasileira de Direito Processual Penal.
Editor-in-chief: 1 (VGV)
Associated-editor: 1 (MAV)
Reviewers: 2
hellenluanas78@gmail.comjoaobayrosa@gmail.com