Relatos de Pesquisa

EXPECTATIVAS FUTURAS PARA A CONJUGALIDADE DE MULHERES CASADAS NA ÓTICA DO RELACIONAMENTO INTERPESSOAL

FUTURE MARITAL EXPECTATIONS OF MARRIED WOMEN FROM THE PERSPECTIVE OF INTERPERSONAL RELATIONSHIPS

Jussara Abilio Galvão Galvão
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
Agnaldo Garcia Garcia
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil

EXPECTATIVAS FUTURAS PARA A CONJUGALIDADE DE MULHERES CASADAS NA ÓTICA DO RELACIONAMENTO INTERPESSOAL

Revista de Psicologia, vol. 13, núm. 2, pp. 139-152, 2022

Universidade Federal do Ceará

Recepción: 17 Febrero 2022

Aprobación: 25 Mayo 2022

Resumo: Este estudo teve por objetivo pesquisar as diferenças e as semelhanças entre as expectativas futuras para a conjugalidade de mulheres casadas, de três faixas etárias, na óptica do relacionamento interpessoal (Hinde, 1997). Entrevistaram-se 35 mulheres casadas, sendo 11 de 20 a 30 anos (grupo A), 12 de 35 a 54 anos (grupo B), e 12 de 60 a 78 anos (grupo C) com filhos, na classe média. Perguntou-se a elas quais seriam as suas expectativas futuras para a vida conjugal. Realizou-se a análise temática dos dados. Constataram-se mais diferenças que semelhanças entre as respostas das mulheres. As expectativas das entrevistadas incluíram o desejo de conviver e envelhecer junto, o trabalho, o lazer (grupos A, B e C), a compreensão mútua, a vontade de ter mais filhos e de vê-los crescer (grupos A e B), a saúde do casal, Deus e a religião, o companheirismo, o respeito mútuo (grupos B e C), a união e a sexualidade (grupo B). Este trabalho contribuiu para que as participantes pudessem refletir acerca de suas expectativas a respeito da conjugalidade, coopera para os estudos no campo dos relacionamentos interpessoais e para profissionais que trabalham com o referido tema.

Palavras-chave: Relações interpessoais, casamento, mulheres.

Abstract: This study aimed to investigate the differences and similarities between the future expectations for conjugality of married women of three age groups, from the perspective of interpersonal relationships (Hinde, 1997). Thirty-five married middle-income class women with children were interviewed: 11 aged between 20 and 30 years old (group A), 12 aged between 35 and 54 years old (group B), and 12 aged between 60 and 78 years old (group C). They were asked what their future expectations for married life would be. Thematic analysis of the data was carried out. There were more differences than similarities between the women's responses. The expectations of the respondents included the desire to live and grow old together, work, leisure (groups A, B and C), mutual understanding, the desire to have more children and to see them grow (groups A and B), the couple's health, God and religion, companionship, mutual respect (groups B and C), union and sexuality (group B). This study contributed so that the participants could reflect on their expectations regarding conjugality. It cooperates for studies in the field of interpersonal relationships and for professionals who work with the aforementioned theme.

Keywords: Interpersonal relationships, marriage, women.

Introdução

Hinde (1997) explicou que nos estudos sobre os relacionamentos interpessoais devem-se considerar as relações contínuas e dialéticas entre os sucessíveis níveis de complexidade social, isto é, o indivíduo, os relacionamentos, os grupos, as instituições, o ambiente físico, o contexto cultural e econômico. Desse modo, nesta pesquisa, entende-se que a conjugalidade está em permanente relação dialética com esses níveis, influenciando-os e sendo influenciada por eles, e que tais níveis podem passar por diversas transformações ao longo do tempo.

No que se referem às mudanças nos relacionamentos amorosos, em meados do século passado, os papéis entre homens e mulheres na relação amorosa eram definidos pelo modelo tradicional, que atribuía a mulher à função de dona de casa, submissa ao marido, responsável pela educação e pelo cuidado dos filhos. Por sua vez, ao homem conferia-se o papel de chefe de família, provedor financeiro do lar, e detentor da autoridade sobre a esposa e os filhos. O casamento era indissolúvel e a satisfação do marido era o indicativo da felicidade conjugal, que envolvia as qualidades domésticas e a boa reputação da esposa. Todavia, o desempenho e a satisfação sexual da mulher não eram considerados nesse modelo de felicidade nupcial. Além disso, a vida sexual feminina ficava restrita ao casamento, enquanto o homem desfrutava livremente da sexualidade (Del Priore, 2014).

Por volta dos anos de 1970, iniciou-se a discussão acerca do direito ao prazer sexual para ambos os sexos, bem como o avanço dos métodos contraceptivos e a maior inclusão da mulher no mercado de trabalho contribuíram para que as mulheres pudessem ressignificar o casamento, afastando-se do ideal de casar, viver em prol da família e de ter muitos filhos (Del Priore, 2014). Ademais, entrevistaram-se 30 jovens casadas, 15 em 1993, e 15 em 2013, a respeito das mudanças ocorridas nos relacionamentos amorosos, nas últimas décadas. De modo geral, as participantes citaram a inserção feminina no mercado de trabalho, a divisão das tarefas domésticas e a valorização dos sentimentos na vida a dois. De sua parte, as mulheres entrevistadas em 2013 mencionaram a independência financeira da mulher e a fragilidade dos vínculos, ou seja, o descompromisso, a despreocupação e a impaciência com o outro na relação amorosa, e a banalização do casamento (Galvão, Alencar & Alves, 2019).

Ante isso, em outro estudo, as jovens casadas foram inquiridas sobre as suas expectativas futuras para as relações amorosas. Elas disseram que, no futuro, os relacionamentos amorosos serão caracterizados pela fragilidade dos vínculos, isto é, vão ser escorregadios, frívolos, artificiais, banalizados e piores, em virtude da falta de amor. Por outro lado, as mulheres mencionaram a continuidade da busca por viver o amor, sendo que as entrevistadas em 2013 ainda expuseram que haverá a perseverança no casamento (Galvão, Alencar & Alves, 2017).

As expectativas vindouras para as relações amorosas também foram investigadas em um estudo realizado com duas mulheres casadas, de 48 e 52 anos. Como uma provável característica dos relacionamentos amorosos, no futuro, as participantes citaram a fragilidade dos vínculos. Assim, elas explicaram que as relações amorosas serão baseadas no individualismo, na procura por prazer e sexo, e em interesses materiais (Galvão, Alencar & Rossetti, 2016).

Além do exposto, Padilha, Zaparoli, Damo e Pereira (2018) pesquisaram as expectativas para o casamento de 10 pessoas (três solteiras, quatro casadas e três divorciadas), de ambos os sexos, de 20 a 40 anos. Os participantes elencaram a constituição de uma conjugalidade que dure para sempre, a aquisição de bens materiais (residência e automóvel), a divisão das responsabilidades e a felicidade conjugal. Estudou-se a concepção de nove pessoas, que estavam em casamentos longevos, de ambos os sexos, sobre as relações amorosas. Os depoentes alegaram que ser feliz é a principal expectativa para a vida a dois (Costa & Mosmann, 2015). Entrevistaram-se quatro casais com, no mínimo, 15 anos de casamento, com filhos, sobre o convívio conjugal e familiar. Em seus projetos conjugais, eles mencionaram o ideal de casamento até a morte e esclareceram que essa concepção favorece a conservação da união marital (Porreca, 2019).

Para mais, perquiriram-se os projetos de vida de 10 casais evangélicos. Os participantes disseram aspirar pela conservação do elo entre a família, Deus e o grupo religioso, que pertencem, assim como pela qualidade de vida familiar, que pode ser alcançada por meio da aquisição de bens materiais e da inserção no ensino formal de membros da família (Ciscon-Evangelista & Menandro, 2011). Os projetos de vida ainda foram pesquisados com adolescentes. Dessa forma, Riter (2015) desenvolveu uma pesquisa com seis adolescentes, de ambos os sexos. Em seus planos para a vida, eles enunciaram o constituir família com filhos, os estudos e o trabalho formal.

Além do que, motivos para a decisão pelo casamento e aspectos importantes para os relacionamentos amorosos foram identificados na literatura. Destarte, entrevistaram-se cinco pessoas casadas, com mais de cinco anos de união conjugal, de ambos os sexos. Os participantes aludiram à busca por uma relação amorosa estável, como uma das principais razões para o casamento (Emídio & Souza, 2019). As depoentes dos estudos de Galvão, Alencar e Alves (2017, 2019) também foram inquiridas por Moraes, Ortega, Alencar e Galvão (2019) a respeito das motivações para a vida conjugal. Como justificativas para a conjugalidade, as mulheres em geral expuseram os sentimentos recíprocos, como o amor e a paixão. De sua parte, as entrevistadas, em 2013, referiram-se ao conhecimento.

Em uma pesquisa realizada com 120 jovens universitários, de ambos os sexos, os discentes explicaram que o amor e a paixão são fundamentais para o início e a conservação dos relacionamentos amorosos (Schlösser & Camargo, 2019). Nos Estados Unidos, indagaram-se 53 casais acerca da conjugalidade deles. Os participantes mencionaram a paixão, e o compartilhar significados e concepções, como aspectos da vida conjugal (Gildersleeve, Singer, Skerrett & Wein, 2017). Estudou-se a vivência do amor nos relacionamentos amorosos na óptica de nove adolescentes, nove adultos e oito idosos, de ambos os sexos, que estavam em uma relação amorosa. Como maneiras de viver o amor, os adolescentes citaram o conhecimento mútuo, os adultos o conhecimento do parceiro e o compartilhar projetos e sonhos, e os idosos dividir sentimentos e emoções (Hoffmeister, Carvalho & Marin, 2019).

Além disso, investigaram-se as estratégias de resolução dos conflitos de 750 casais, de várias idades. Como fatores que cooperam para a solução das adversidades conjugais, os respondentes enunciaram o conhecimento recíproco e a religiosidade (Delatorre & Wagner, 2018). Na pesquisa efetuada por Costa e Mosmann (2015), os entrevistados aclararam que, com o passar dos anos, o casamento torna-se mais harmonioso, pois, devido à convivência e ao conhecimento mútuo, os casais desenvolvem formas mais construtivas de solucionar os conflitos conjugais. Eles ainda explicaram que o cuidado e o companheirismo são constituídos ao longo da conjugalidade.

Na Argentina, entrevistaram-se 113 idosos sobre as relações amorosas deles. Como qualidades de seus relacionamentos, os idosos mencionaram o cuidado mútuo e a harmonia em dar e receber na relação, bem como disseram que o companheirismo está entre as principais funções dos relacionamentos amorosos na terceira idade (Arias & Polizzi, 2013). De sua parte, Limeira & Féres-Carneiro (2019) estudaram os fatores que auxiliam o processo de reconciliação conjugal com 12 pessoas casadas com o ex-cônjuge, de ambos os sexos, com filhos em comum. Os participantes esclareceram que os sentimentos de harmonia e o compartilhamento de vidas favorecem a reconciliação do casal.

Pesquisaram-se os elementos estruturais de casamentos longevos com três pessoas casadas, de ambos os sexos. Os entrevistados disseram que o cuidado e o respeito à individualidade do outro estão na base de seus relacionamentos (Albertoni & Lages, 2018). Quatro casais homossexuais foram inquiridos acerca das características de seus relacionamentos. Em suas relações, os depoentes estimaram o respeito à individualidade do(a) parceiro(a) (Oliveira & Sei, 2018). Por fim, em uma revisão de literatura sobre os casamentos de longa duração, constatou-se a importância do respeito na vida conjugal (Manente, 2019).

Assim sendo, devido às possíveis transformações nos níveis de complexidade social ao longo do tempo, às mudanças que vêm acontecendo nas relações amorosas, às diferentes expectativas e aos aspectos valorizados nos relacionamentos amorosos, este estudo teve por objetivo pesquisar as diferenças e as semelhanças entre as expectativas futuras para a conjugalidade de mulheres casadas, de três faixas etárias, na óptica do relacionamento interpessoal de Robert Hinde (1997). Pois, com base no referido autor, supõe-se que as modificações que ocorrem nos níveis de complexidade social provavelmente vão influenciar nas expectativas das mulheres acerca da vida conjugal. Além do mais, esta pesquisa buscou responder a seguinte pergunta: Se a fragilidade das relações amorosas (Galvão et al., 2016, 2017, 2019) vai ser constatada nos relatos das entrevistadas? Dito isso, apresenta-se o método empregado, com vistas a alcançar o objeto proposto.

MÉTODO

Participantes

Entrevistaram-se 35 mulheres, sendo 11 de 20 a 30 anos (grupo A), 12 de 35 a 54 anos (grupo B), e 12 de 60 a 78 anos (grupo C), que estavam na primeira união conjugal, havia pelo menos um ano, com filhos, na classe média, residentes na Grande Vitória, ES. O número de participantes em cada faixa etária baseou-se no critério de saturação de dados (Ando, Cousins & Young, 2014). Optou-se por entrevistar mulheres em três faixas etárias, em virtude das modificações que podem ocorrer nos níveis de complexidade social ao longo do tempo (Hinde, 1997) e das mudanças nos relacionamentos amorosos, nas últimas décadas (Del Priore, 2014; Galvão et al., 2019), capazes de influenciar as expectativas futuras das entrevistadas para a vida a dois.

A escolha por participantes com filhos pautou-se na provável interferência da prole na vida do casal. Selecionaram-se mulheres que estavam na primeira conjugalidade, com vistas a evitar a possível influência de uma experiência conjugal prévia nos resultados. A opção pela classe média fundamentou-se na possibilidade de se encontrar certa coesão de condutas, valores e crenças em mulheres pertencentes a esse segmento social, moradoras da Grande Vitória, ES (Galvão, 2017). Explica-se que o critério utilizado para definir a classe média consistiu na avaliação pessoal das entrevistadas (Batistone & Neri, 2007).

Instrumento e Procedimentos de Coleta dos Dados

As entrevistas foram realizadas nos semestre de 2019/02 e 2020/01. A seleção das participantes foi por meio de indicação. Trinta e duas entrevistas ocorreram presencialmente em dia, horário e local estipulados pelas mulheres. Em virtude da pandemia do coronavírus, as outras três entrevistas foram efetuadas por meio de ligação telefônica, no modo viva voz, em dia, horário e lugar definidos pelas participantes. Todas as entrevistas foram gravadas em áudio e transcritas na íntegra. As entrevistadas responderam a seguinte pergunta: “Quais são as suas expectativas futuras para a vida conjugal?”.

As mulheres entrevistadas presencialmente assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Já as entrevistadas, por meio de chamada telefônica, deram o seu consentimento verbal, após a pesquisadora descrever para elas o referido documento. Este estudo seguiu as normas da Resolução n.º 510/16 (2016) do Conselho Nacional de Saúde (CNS) sobre as diretrizes de Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais e obteve o Parecer favorável com o n.º 3.703.729 do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo (CEP/UFES).

Tratamento e Análise dos Dados

Tendo em vista a um melhor detalhamento dos resultados, realizou-se a análise temática dos dados. De tal modo, efetuou-se a leitura e a releitura dos protocolos de entrevistas, buscando a familiarização dos dados e a identificação das primeiras impressões gerais. Com base nos dados, elaboraram-se os códigos, ou seja, palavras e frases representativas das respostas das mulheres. Posteriormente, seguindo o critério de semelhança e de não sobreposição, pautado nos núcleos dos códigos, organizaram-se os subtemas e os temas (Braun & Clarke, 2014). Ademais, na definição dos subtemas e dos temas consideraram-se os tipos de relacionamento interpessoal, ou seja, os relacionamentos interpessoais conjugais e familiares, bem como as relações com a sociedade e o ambiente externo, a fim de identificar as influências desses níveis de complexidade social nas expectativas das participantes (Hinde, 1997).

DESCRIÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Utilizaram-se nomes fictícios iniciados com a letra A para mencionar as mulheres do grupo A, com a letra B para as do grupo B, e com a letra C para as do grupo C. Com base na diversidade de subtemas, constataram-se mais diferenças que semelhanças entre as expectativas futuras para a conjugalidade das mulheres dos três grupos. Esses subtemas foram organizados em três temas: (a) relações interpessoais conjugais; (b) relações interpessoais familiares; e (c) a sociedade e o ambiente externo. As relações interpessoais conjugais aliaram o anseio de conviver e envelhecer junto, a tranquilidade, os sentimentos (grupos A, B e C), a compreensão mútua (grupos A e B), o respeito recíproco, a saúde do casal, o companheirismo (grupos B e C), a sexualidade, a união (grupo B) e o cuidado mútuo (grupo C).

Desse modo, as entrevistadas dos três grupos citaram a expectativa de conviver e envelhecer junto, incluindo a pretensão de conviver melhor com o cônjuge e permanecer casada, podendo ser para sempre. Destarte, Alessandra (21 anos) acredita que o convívio conjugal vai melhorar. Catarina (66 anos) procurará viver melhor com o consorte. Aline crê que o casamento prosseguirá dando certo, se conservar as qualidades atuais. Amanda (29 anos) anseia que o casal permaneça junto, mesmo se existirem adversidades. Por sua vez, Bruna (43 anos) e Clara (63 anos) aspiram que os cônjuges envelheçam juntos.

Aline (26 anos), Antônia (26 anos), Brígida (49 anos), Carol (66 anos), Cecília (66 anos) e Cláudia (70 anos) desejam continuar casadas, sendo que Bárbara (49 anos), Camila (78 anos), Celeste (60 anos) e Célia (61 anos) anelam pelo casamento até o fim da vida. Nesse caso, Camila acrescentou que o casamento, até a morte, deve ser na saúde e na doença, na alegria e na tristeza. Nas palavras de Camila: “É porque a gente faz o juramento na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, então, eu espero que vai ser assim até o final, não é?”

Esse resultado diverge da fragilidade dos vínculos constatada por Galvão et al. (2016, 2017, 2019). De outro modo, indo ao encontro dos relatos das entrevistadas, em suas expectativas para o casamento, jovens citaram a formação de uma conjugalidade que se conserve a vida inteira (Padilha, Zaparoli, Damo & Pereira, 2018). Jovens casadas enunciaram a perseverança no casamento, como aspiração futura acerca das relações amorosas (Galvão et al., 2017). Pessoas casadas mencionaram a procura por um relacionamento estável, como uma das principais razões para o casamento (Emídio & Souza, 2019). Destaca-se também que o ideal de união conjugal até a morte foi evidenciado nos projetos de vida de casais e notado como um aspecto que favorece a permanência do vínculo conjugal (Porreca, 2019).

A tranquilidade representou a harmonia e o prazer, sendo aludida por participantes dos três grupos. Assim, Carolina (71 anos) espera ter uma senilidade tranquila. Bethânia (41 anos) destacou que o casal apetece por uma vida mais tranquila e prazerosa. Clara (63 anos) anseia que os cônjuges convivam tranquilamente. Já Alice (28 anos) deseja que os consortes vivam em harmonia. Sobre a harmonia citada por Alice, o referido aspecto foi considerado uma qualidade de casamentos longevos, visto que, com o passar dos anos, os cônjuges aprendem maneiras mais positivas de resolver os desentendimentos conjugais (Costa & Mosmann, 2015). Idosos argentinos mencionaram a harmonia na reciprocidade, como qualidade de suas relações amorosas (Arias & Polizzi, 2013). De sua parte, pessoas casadas esclareceram que os sentimentos de harmonia contribuíram para a reconciliação do casal (Limeira & Féres-Carneiro, 2019).

As mulheres dos três grupos mencionaram os sentimentos, isto é, o gostar de ficar junto, a alegria, a felicidade, o amor e a paixão. Bianca (50 anos) espera que o casal prossiga gostando de estar junto. Alice (28 anos) anela por uma vida conjugal feliz e alegre. Beibiane (35 anos) almeja a durabilidade da paixão entre ela e o marido. Conceição (66 anos) acredita que o amor entre os consortes vai continuar. E Adriana (23 anos) deseja que o amor nupcial nunca termine. Note-se o relato de Adriana: “Que o amor nunca acabe entre a gente”.

Aproximando-se dessas declarações, jovens (Padilha et al., 2018) e pessoas em casamentos longevos (Costa & Mosmann, 2015) enunciaram a felicidade conjugal, como expectativa para o casamento. Jovens casadas aludiram à valorização dos sentimentos na vida a dois (Galvão et al., 2019) e que, futuramente, a vivência do amor entre os casais continuará sendo aspirada (Galvão et al, 2017). Elas também elencaram o amor e a paixão mútua, como motivos para o casamento (Moraes, Ortega, Alencar & Galvão, 2019). Universitários citaram que o amor e a paixão são essenciais para o início e a manutenção dos relacionamentos amorosos (Schlösser & Camargo, 2019). Por sua vez, casais estadunidenses expuseram a paixão como qualidade da relação conjugal deles (Gildersleeve et al., 2017).

Nos grupos A e B, as mulheres referiram-se à compreensão mútua, que inseriu o conhecimento recíproco. Amanda (30 anos) espera que os cônjuges compreendam os problemas de maneira positiva. Bárbara (49 anos) anela que o esposo seja mais compreensivo com ela. E Alice (28 anos) aspira pelo acréscimo do conhecimento e da compreensão mútuos. Nas palavras de Alice: “Eu espero que a gente consiga entender melhor as nuanças um do outro ... é essa a expectativa de a gente se conhecer mais e a gente está conseguindo”.

Perante o exposto, ressalta-se que adolescentes citaram o conhecimento mútuo, e adultos o conhecimento do parceiro, como formas de viver o amor em um relacionamento amoroso (Hoffmeister et al., 2019). Jovens casadas elencaram o conhecimento entre o casal, como um motivo para o casamento (Moraes et al., 2019). Sublinha-se também que o conhecimento recíproco (Costa & Mosmann, 2015; Delatorre & Wagner, 2018) foi notado como um fator que beneficia a solução dos problemas conjugais.

Outras expectativas futuras para a vida conjugal foram elencadas por mulheres dos grupos A e B. Tais anseios contemplaram a confiança, a fidelidade, o diálogo, a maturidade e a proximidade. Destarte, as entrevistadas aspiram pela conservação do diálogo, da proximidade (Beibiane, 35 anos), da fidelidade (Bernadete, 54 anos) e da confiança (Adriana, 23 anos) entre o casal. Para mais, Ana (20 anos) almeja continuar amadurecendo e adquirir mais experiência, com o objetivo de ser uma boa esposa.

As participantes dos grupos B e C citaram a saúde do casal, referindo-se à expectativa por ter saúde física e mental para aproveitar a vida, não depender dos outros e cuidar do marido. Desse modo, as mulheres anseiam pela saúde do casal, com vistas a usufruir da vida (Brenda, 51 anos; Cíntia, 68 anos) e permanecer da maneira como está (Conceição, 66 anos). Bernadete (54 anos) espera que os consortes envelheçam com saúde. Camila (78 anos) apetece pela saúde do marido e a dela, pois ela precisa cuidar dele. Cecília (66 anos) deseja que os cônjuges vivam até quando possuírem saúde, dado que ela não quer dar trabalho aos filhos. E Carolina (71 anos) anela que o casal disponha de saúde física e mental, para não necessitarem de terceiros.

Cabe pontuar que foram as entrevistadas dos grupos B e C que elencaram a saúde do casal como expectativa futura atinente à vida a dois. Em conformidade com isso, constatou-se que com o aumento da idade crescem as preocupações e os cuidados com a saúde, devido ao aparecimento e/ou ao agravamento das doenças (Ferrari et al., 2017). Além do que, idosos argentinos proferiram o cuidado com a saúde em seus projetos de vida (Krzemien, Richard's & Biscarra, 2018). E anciões portugueses alegaram que a saúde favorece a autonomia e a qualidade de vida deles (Fernandes & Duque, 2017).

Nos grupos B e C, as mulheres também enunciaram o companheirismo, que incluiu o compartilhar e a parceria entre o casal. Bernadete (54 anos) anela que os cônjuges prossigam compartilhando todas as coisas. Betina (36 anos) espera pela conservação da parceria entre o casal. Por sua vez, Conceição (66 anos) crê que o compartilhamento das tarefas e o companheirismo vão continuar na vida a dois. Segundo Conceição: “Que está junto ainda o companheirismo ... o compartilhamento de afazeres, não é? Dividir as coisas, não é?”.

Ante o exposto, reitera-se que jovens citaram a divisão das responsabilidades, como expectativa para o casamento (Padilha et al., 2018). Jovens casadas mencionaram o compartilhamento das tarefas domésticas, como uma das mudanças nas relações amorosas, nas últimas décadas (Galvão et al., 2019). Como formas de viver o amor no relacionamento, adultos enunciaram o compartilhar planos e sonhos, e idosos sentimentos e emoções (Hoffmeister et al., 2019). Pessoas casadas disseram que o compartilhamento de vidas coopera para a reconciliação conjugal (Limeira & Féres-Carneiro, 2019). Casais estadunidenses elencaram o compartilhar significados e pontos de vista, como características da conjugalidade deles (Gildersleeve et al., 2017).

De sua parte, idosos argentinos explicaram que o companheirismo, além de estar presente nas relações deles, representa uma das basilares funções do relacionamento amoroso na terceira idade (Arias & Polizzi, 2013). E pessoas em casamentos longevos esclareceram que o companheirismo se desenvolve ao longo da vida conjugal (Costa & Mosmann, 2015).

As participantes dos grupos B e C ressaltaram o respeito mútuo, inserindo o respeito à singularidade do cônjuge. Sendo assim, Conceição (66 anos) crê na conservação do respeito entre os consortes. Já Bernadete (54 anos) apetece pela continuidade do respeito mútuo à individualidade do outro. Perante essas expectativas, cabe sublinhar que casais homossexuais (Oliveira & Sei, 2018) e pessoas em casamentos longevos (Albertoni & Lages, 2018) citaram o respeito à individualidade do parceiro, como um fator positivo de seus relacionamentos. Além do mais, destaca-se que o respeito foi valorizado em uniões conjugais de longa duração (Manente, 2019).

Houve três subtemas que foram pronunciados somente por um grupo de entrevistadas. No grupo B, as mulheres elencaram a união, que versou sobre o desejo pela conservação (Bernadete, 54 anos) e o acréscimo (Bianca, 50 anos) da união entre o casal. As participantes do grupo B ainda expuseram a sexualidade, que contemplou o romantismo. Logo, Bianca anela pela continuidade da satisfação sexual entre os cônjuges, e Beibiane (35 anos) pela conservação o romantismo entre os parceiros. Observe-se o relato de Bianca: “Que a gente esteja ainda mais unido ... eu acho importantíssimo isso, não só a presença física, mas sexualmente”. Essa declaração pode indicar uma mudança na vida conjugal, visto que, em meados do século passado, a satisfação sexual feminina não era um requisito para a felicidade conjugal (Del Priore, 2014).

Por sua vez, as idosas enunciaram o cuidado recíproco. Nesse caso, Clara (63 anos) e Cecília (66 anos) expuseram almejar pela permanência do cuidado entre o casal. Dessa maneira, ressalta-se que pessoas em casamentos longevos aclararam que cuidado é formado no decorrer da vida conjugal (Costa & Mosmann, 2015), bem como está na base do relacionamento (Albertoni & Lages, 2018). E idosos argentinos citaram o cuidado mútuo como uma qualidade de suas relações amorosas (Arias & Polizzi, 2013).

Destarte, termina-se a exposição das expectativas futuras para a vida a dois atinentes às relações conjugais. A seguir apresenta-se o tema relações interpessoais familiares, que incluiu os filhos e a família em geral. O subtema filhos tratou da educação formal e familiar da progênie (grupos A, B e C), do anseio por ter mais filhos e acompanhar o desenvolvimento deles (grupos A e B), e a preocupação com o bem-estar da prole (grupos B e C). A educação escolar e familiar envolveu a autonomia da filha e o auxílio na criação dos netos. Bethânia (41 anos) afirmou que a menina vai estudar e ser independente. Antônia (26 anos) pretende priorizar a educação da filha e dar a ela liberdade de escolha. Já Carol (66 anos) espera que os cônjuges ajudem os filhos a criar os netos.

Indo ao encontro do anseio de Carol (66 anos), em seus projetos de vida, idosos argentinos expuseram a pretensão de cooperar com os cuidados dos netos (Krzemien et al., 2018). Além disso, aproximando-se das expectativas de Antônia (26 anos) e Bethânia (41 anos), jovens explicaram que a família é fonte de boa educação e incentivo, especialmente no que se referem aos estudos, o que é essencial para se alcançar os objetivos na vida (Pereira, Zuffo & Moura, 2019).

Nos três grupos, as entrevistadas ainda citaram outras expectativas futuras para a vida conjugal, pertinentes aos filhos e netos. Tais anseios representaram a presença das filhas, a maturidade materna, o companheirismo e a paciência com os netos. Ana (20 anos) deseja amadurecer mais, visando ter uma boa relação com o filho. Bruna (43 anos) alegou que os cônjuges estarão na companhia das filhas e, caso elas casarem e tiverem filhos, dos netos e dos genros. E Carol (66 anos) apetece que o casal seja companheiro dos netos, e que o esposo se torne mais tranquilo com as crianças. Ante as expectativas de Carol, vale salientar que idosos argentinos mencionaram em seus projetos de vida a vontade de desfrutar da relação com os filhos e os netos (Krzemien et al., 2018). Ademais, anciões portugueses expuseram que a oportunidade de acompanhar o futuro dos filhos e dos netos favorece o estabelecimento de maiores objetivos na vida (Fernandes & Duque, 2017).

De sua parte, as mulheres dos grupos A e B enunciaram a pretensão de acompanhar o crescimento dos filhos, que se estendeu à aspiração por desfrutar desse período. Assim, Berenice (40 anos) espera ver os dois filhos mais novos crescerem. E Andressa (30 anos) almeja ver a filha crescer e deleitar-se com o desenvolvimento da menina.

Nos grupos A e B, as participantes também expressaram a expectativa por gerar mais filhos, que aliou o desejo por ter mais netos. Destarte, Berenice (40 anos) quer ter mais netos. Andressa (30 anos), Ariel (22 anos), Amanda (29 anos) e Aline (22 anos) disseram que pretendem conceber mais um filho. Beibiane (35 anos) relatou que os cônjuges estarão com dois filhos (ela estava gestante no período da entrevista). Por sua vez, Antônia (26 anos) afirmou que o casal estará com a família constituída, em questão de filhos, pois almeja ter mais crianças. Conforme Antônia: “A gente pensa em ter filhos daqui uns três anos. ... então, daqui a dez anos, já seria, assim, uma família formada em questão de filhos”. Indo ao encontro da aspiração por dar à luz a mais um filho ou filhos, citada pelas entrevistadas, adolescentes elencaram o formar família com filhos, em seus projetos de vida (Riter, 2015).

A preocupação com o bem-estar dos filhos foi enunciada por mulheres dos grupos B e C. Esse subtema tratou das inquietações sobre a vida amorosa e financeira das filhas e a possibilidade de investir na prole. Brígida (49 anos) apetece que as filhas estejam bem e obtenham um parceiro amoroso, mas sem muito apego, com vistas a evitar o sofrimento. Célia (61 anos) anela pela autonomia financeira das filhas. Já Bernadete (54 anos) espera que os cônjuges possam prosseguir investindo nos filhos, que são a maior preocupação dela.

As entrevistadas dos grupos A e B expuseram a família em geral, que agrupou o cuidado e a proximidade, porém sem especificar quem seria esse membro da família. Assim, Aline (26 anos) almeja que os consortes permaneçam cuidando da família. E Bárbara (49 anos) apetece que o esposo se torne mais presente na vida familiar. Ante isso, finaliza-se a descrição e a discussão das expectativas futuras para o casal pertinentes às relações familiares. Em seguida, serão apresentadas as aspirações que incluíram a sociedade e o ambiente externo.

O aludido tema reuniu os subtemas trabalho, lazer, mudança de país/cidade (grupos A, B e C), e Deus e a religião (grupo C). O trabalho envolveu os estudos, a estabilidade econômica e profissional, a obtenção e a reforma de imóvel, a compra de automóvel, a participação no trabalho do marido, o serviço autônomo e a reforma da previdência/aposentadoria.

Destarte, a expectativa por ter uma vida financeira e profissional sólida foi citada. Alessandra (21 anos), Aline (26 anos), Ana (20 anos), Andressa (30 anos), Beatriz (54 anos), Bella (44 anos), Berenice (40 anos) e Bernadete (54 anos) anelam pela estabilidade econômica, sendo que Aline e Bella ainda aspiram pelo sucesso profissional. Bernadete deseja que os cônjuges continuem tendo possibilidades financeiras para ajudar o próximo. Todavia, ela explicou que os recentes acontecimentos na política e na economia brasileira podem impedir isso. Andressa alegou que será aprovada em um concurso público e seguirá a carreira acadêmica. De sua parte, Antônia (26 anos) disse que o consorte trabalhará na profissão dele.

Em se tratando do serviço autônomo, da inserção no trabalho do marido e da reforma da previdência/aposentadoria, Berenice (40 anos) almeja abrir um restaurante. Andressa (30 anos) anela que o cônjuge instale uma clínica, depois que ele finalizar a residência em psiquiatria, e aspira por participar disso. Analú (29 anos) relatou que permanecerá trabalhando com costura criativa e espera que o consorte entenda que a oportunidade de o casal possuir um trabalho autônomo está nisso, porém ela acredita que, se ele deixar o emprego atual, não focará nesse projeto. Por sua vez, Bethânia (41 anos) aclarou que, em virtude da reforma da previdência, os parceiros necessitarão desenvolver uma forma de renumeração e trabalhar, mas com um ritmo de serviço menor, o que consistirá na aposentadoria deles.

Acerca dos bens materiais, dos estudos e ainda sobre a aposentadoria, Brenda (51 anos) quer terminar a reforma do sítio, e Berenice (40 anos) a da casa. Alessandra (21 anos) e Ariel (22 anos) desejam adquirir um automóvel e uma residência própria. Célia (61 anos) e o esposo pretendem comprar um apartamento menor, após a aposentadoria dele. Bethânia (41 anos) explicou que os cônjuges comprarão um motorhome para viajar e um terreno na Bahia, para construir lá. Antônia (26 anos) espera erguer uma casa no interior e disse que estará com o mestrado e, quiçá, com o doutorado finalizado. Analú (29 anos) alegou que terá concluído o curso técnico em radiologia. E Aline (26 anos) aspira que o marido consiga realizar o sonho de fazer o mestrado.

Em conformidade com essas declarações, como expectativas para o casamento, jovens mencionaram a aquisição de automóvel e da casa própria (Padilha et al., 2018). Além disso, a obtenção de bens materiais, a melhoria econômica (Krzemien et al., 2018), a estabilidade financeira e profissional (Stengel & Tozo, 2010), a satisfação com o trabalho (Silva, 2018), o trabalho formal (Riter, 2015) e os estudos (Riter, 2015; Silva, 2018; Stengel & Tozo, 2010) foram citados como projetos de vida. Casais evangélicos explicaram que os estudos e a aquisição de bens materiais cooperam para a qualidade de vida familiar (Ciscon-Evangelista & Menandro, 2011). E jovens casadas expuseram a inserção feminina no mundo do trabalho e a independência financeira da mulher, como mudanças nos relacionamentos amorosos, nas últimas décadas (Galvão et al., 2019).

Importa salientar que a aspiração pelos estudos foi citada por adolescentes (Riter, 2015; Stengel & Tozo, 2010) e jovens (Silva, 2018). Tal fato se assemelha ainda mais a esse subtema, já que foram as participantes com 30 anos ou menos que enunciaram as expectativas futuras para a conjugalidade acerca dos estudos. Também convém enfatizar que não se constatou na literatura pesquisas que tratassem das prováveis interferências da reforma previdenciária e dos recentes acontecimentos no Brasil na vida a dois, segundo mencionaram Bethânia (41 anos) e Bernadete (54 anos). Nesse caso, ressalta-se a relevância do desenvolvimento de estudos sobre a aludida situação.

Para mais, as entrevistadas dos três grupos expuseram a mudança de cidade e/ou país, que envolveu o desejo por morar em uma praia, na Bahia, no interior do estado ou na Europa. Célia (61 anos) alegou que os cônjuges irão apreciar a vida e morar em uma praia, pois o marido ama pescar. Bethânia (41 anos) declarou que o casal vai residir próximo à praia, na Bahia. Bella (44 anos) almeja morar na Europa, para que ela e o esposo possam acessar outro idioma. Já Antônia (26 anos) deseja viver em uma cidade do interior, devido à tranquilidade.

O lazer também foi declarado por mulheres das três faixas etárias e correspondeu aos passeios e às viagens pelo país e/ou para o exterior. Brenda (51 anos) aspira por passear pelo Brasil. Cíntia (68 anos) disse que os consortes vão viajar, passear e curtir a vida. Beatriz (54 anos) anseia por viajar pelo país e/ou para o exterior. Andressa (30 anos) anela dispor de maior tempo para viajar com a família. Alana (30 anos) apetece que o casal possa sair junto, sem se preocupar com filhos, e ter mais tempo para viajar. De sua parte, Bella (44 anos) espera que os parceiros viajem e saiam junto mais vezes, dado que os filhos estarão adolescentes. Ante essas pretensões, vale destacar que idosos argentinos enunciaram o turismo e as viagens, isto é, passear, conhecer lugares, culturas e pessoas diferentes, em seus projetos de vida (Krzemien et al., 2018).

Por sua vez, o subtema Deus e a religião foi elencado por mulheres dos grupos B e C e tratou da importância divina na vida a dois e do anseio de que o marido busque a religião/espiritualidade. Creuza (72 anos) espera que o esposo se aproxime da religiosidade/espiritualidade, pois ficar em bares é uma vida vazia. Cláudia (70 anos) deseja que Deus dê direção e forças aos cônjuges. E Brenda (51 anos) apetece ter Deus em primeiro plano na conjugalidade. Nas palavras de Brenda: “Colocar Deus em primeiro lugar”. Aproximando-se desses relatos, casais evangélicos citaram o empenho em conservar o elo entre a família, Deus e a comunidade religiosa, que participam, em seus projetos de vida (Ciscon-Evangelista & Menandro, 2011). Além do mais, casais expuseram que a religiosidade favorece a solução dos desentendimentos conjugais (Delatorre & Wagner, 2018).

Encerrando, no grupo A, Antônia (26 anos) expressou o desejo de casar no civil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve por objetivo pesquisar as diferenças e as semelhanças entre as expectativas futuras para a conjugalidade de mulheres casadas, de três faixas etárias, na perspectiva do relacionamento interpessoal (Hinde, 1997). Buscou também responder se a fragilidade das relações amorosas (Galvão et al., 2016, 2017, 2019) seria identificada nas respostas das entrevistadas. De tal modo, constataram-se mais diferenças que similaridades entre as expectativas das participantes. As mulheres dos três grupos mencionaram o desejo de conviver e envelhecer junto, divergindo-se da fragilidade dos relacionamentos amorosos (Galvão et al., 2016, 2017, 2019); a tranquilidade; e os sentimentos, sendo que a valorização dos sentimentos na vida a dois (Galvão et al., 2019) e a expectativa futura de que haverá pessoas que continuarão a buscar viver o amor na relação amorosa (Galvão et al., 2017) foram observadas na literatura.

As entrevistadas os três grupos ainda citaram a educação formal e familiar dos descendentes, a mudança de cidade e/ou país, o lazer e o trabalho. Destaca-se que o trabalho envolveu a aquisição de automóvel e da casa própria, que foram enunciados como expectativas para o casamento no estudo de Padilha et al. (2018). Referiu também à possibilidade de os últimos acontecimentos políticos e econômicos no Brasil, incluindo a reforma da previdência, afetar a dinâmica conjugal. Nesse caso, sugere-se a importância de se realizar pesquisas que investiguem essa provável interferência na conjugalidade.

Nos grupos A e B, as mulheres elencaram a compreensão mútua, a família em geral, e o desejo de ter mais filhos e de acompanhar o crescimento deles. Assim, vale lembrar que adolescentes declararam em seus projetos de vida a vontade de estabelecer família com filhos (Riter, 2015). As participantes dos grupos B e C mencionaram Deus e a religião, a preocupação com o bem-estar dos filhos, o companheirismo, o respeito mútuo e a saúde do casal. Sobre a saúde do casal, sublinha-se que Ferrari et al. (2017) expuseram que as pessoas mais velhas tendem a se preocupar mais com a saúde, em virtude do surgimento e/ou do agravo de doenças.

Houve subtemas que foram citados somente por um grupo de mulheres. Destarte, foram pronunciados o casamento no civil (grupo A), a união, a sexualidade (grupo B) e o cuidado mútuo (grupo C). O fato de a sexualidade ter sido mencionada como expectativa futura para o casamento diverge do ideal de felicidade conjugal, difundido em meados do século passado, que não considerava a satisfação e o desempenho sexual da esposa (Del Priore, 2014). Por fim, destaca-se que não se constatou nas expectativas das mulheres a fragilidade dos relacionamentos amorosos (Galvão et al., 2016, 2017, 2019), pois, além de elas terem declarado a pretensão de conviver e envelhecer junto, não se observou nenhuma alusão à possibilidade de divórcio ou de separação conjugal em seus relatos.

Este estudo contribuiu para que as participantes pudessem refletir acerca de suas aspirações sobre a vida conjugal, coopera para os estudos no campo dos relacionamentos interpessoais e para profissionais que trabalham como o referido tema. Além disso, a abordagem teórica proposta por Hinde (1997) permitiu observar que as expectativas das mulheres incluíram aspectos mais restritos ao casal, como o companheirismo e a compreensão, mas também foram influenciadas pelos relacionamentos do casal ou de um dos cônjuges com os filhos, os netos, a família em geral, o mundo do trabalho, a religião, o lazer e a possibilidade de acesso a outras culturas.

Como limitações deste trabalho, citam-se o fato de esta pesquisa ter sido realizada com mulheres, que estavam no primeiro casamento, com filhos, na classe média. Dessa maneira, propõem-se a realização de estudos que investiguem as expectativas futuras para a vida a dois com homens casados, pessoas solteiras, na segunda ou mais união conjugal e/ou outras classes sociais.

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