Resumo: A partir da teoria familiar sistêmica, o objetivo deste estudo foi compreender como ocorreu a transmissão de padrões e perspectivas sobre a família, o casamento e o feminino em três gerações de mulheres, incluindo o gênero como um marcador interseccional relevante. O estudo de caso foi composto por duas famílias, ambas representadas pelas gerações de avós, mães e filhas. Participaram seis mulheres, com idades variando de 28 a 90 anos. A média de idade da primeira geração foi 82 anos, da segunda foi 57,5 anos, enquanto a terceira foi de 32 anos. O tempo de casamento variou de cinco a 64 anos, sendo que a média de duração da primeira geração foi 60,5 anos, seguida de 33,5 anos para a segunda e 11,5 para a terceira. Todas as participantes foram entrevistadas individualmente. A análise temático-reflexiva evidenciou a transmissão de valores sobre família e casamento, havendo a emergência de relações mais flexíveis de gênero apenas na terceira geração, o que pode ser observado na dimensão da parentalidade e da carreira. No entanto, destacaram-se questões transgeracionais e de gênero para manter o legado familiar e a indissolubilidade do casamento, o que não pode ser compreendido apartado de marcadores sociais e culturais.
Palavras-chave: Família, casamento, gênero, dinâmica familiar, geração.
Abstract: From the systemic family theory, the aim of this study was to understand how the transmission of patterns and perspectives on the family, marriage and the feminine occurred in three generations of women, including gender as a relevant intersectional marker. The case study was composed of two families, both represented by generations of grandmothers, mothers and daughters. Six women participated, with ages ranging from 28 to 90 years. The average age of the first generation was 82 years, the second was 57.5 years, while the third was 32 years. The length of marriage ranged from five to 64 years, with the average duration of the first generation being 60.5 years, followed by 33.5 years for the second and 11.5 years for the third. All participants were interviewed individually. The thematic-reflective analysis showed the transmission of values about family and marriage, with the emergence of more flexible gender relationships only in the third generation, which can be observed in the parenting and career dimensions. However, transgenerational and gender issues were highlighted to maintain the family legacy and the indissolubility of marriage, which cannot be understood apart from social and cultural markers.
Keywords: Family, marriage, gender, family dynamics, generation.
Relatos de Pesquisa
A transgeracionalidade do feminino na família: estudo de caso com três gerações de mulheres casadas
The transgenerationality of the feminine in the family: a case study with three generations of married women
Recepción: 31 Enero 2022
Aprobación: 06 Abril 2022
A Teoria Sistêmica compreende o indivíduo como um ser inter-relacionado e parte de uma rede que se modifica continuamente. A família, sendo um sistema aberto e dinâmico em constantes interações com o meio, transforma-se para garantir o crescimento psicossocial de seus membros e para se adaptar às circunstâncias e aos estágios de transição presentes em seu desenvolvimento (Bowen, 1989; McGoldrick, 2011).
O conceito de diferenciação de self é importante e equivale ao grau de maturidade emocional do indivíduo. O nível de diferenciação de um sujeito é influenciado pelo nível de diferenciação de seus pais e pelo tipo de relacionamento que tem com eles. O processo de transmissão multigeracional desenvolvido por Bowen (1989) indica o modo como o nível de indiferenciação dos pais é passada às gerações seguintes, sendo que esse processo multigeracional pode fornecer uma base sobre a qual é possível entender a geração atual da família e oferecer uma perspectiva do que se esperar das gerações seguintes.
A transmissão transgeracional de lealdades, valores, crenças, mitos, segredos, ritos ou rituais e legados permite que a história familiar se mantenha ao longo do tempo, perpassando gerações e fornecendo padrões de comportamentos, sejam esses modelos para serem seguidos ou evitados pelas gerações seguintes. A perspectiva sistêmica consegue fundamentar essas discussões transgeracionais, considerando sua visão dinâmica e de circularidade sobre os processos de constantes interações entre as pessoas e o meio, o que favorece o entendimento das construções familiares e sociais, que também são dinâmicas. Nesse processo de transmissão ganham particular importância os fenômenos do casamento e da parentalidade, permitindo a reflexão sobre a família, suas permanências e rupturas ao longo das diferentes gerações (Alves-Silva & Scorsolini-Comin, 2021).
Muitos estudos na área da transgeracionalidade buscam compreender os aspectos que se repetem nas gerações e sua repercussão na construção da identidade do indivíduo (Ballard, Fazio-Griffith, & Marino, 2016) e na maneira como a família influencia as práticas conjugais das próximas gerações (Quissini & Coelho, 2014; Scorsolini-Comin, Fontaine, Barroso, & Santos, 2015). No entanto, a maioria dos estudos acessa apenas uma ou duas gerações, nem sempre privilegiando pessoas de uma mesma família.
Além disso, nem sempre as questões de gênero são suficientemente exploradas, sendo naturalizadas a partir de papéis socialmente atribuídos a homens e mulheres na composição do par heterossexual (Jablonski, 2010). O gênero deve ser cotejado como um marcador interseccional capaz de permitir determinadas expressões e rituais, bem como a manutenção de comportamentos que atravessam a conjugalidade e a parentalidade (Figueiredo & Diniz, 2018; Oliveira, Leonidas, & Scorsolini-Comin, 2020). Em diferentes gerações, o modo como gênero irá atuar deve ser discutido, o que também não pode se dar de modo apartado de elementos como origem, cor/etnia e aspectos socioeconômicos, ultrapassando o sistema familiar. A fim de possibilitar uma investigação aprofundada dentro de uma mesma família e ampliando o alcance da transmissão para três gerações, o objetivo deste estudo foi compreender como ocorreu a transmissão de padrões e perspectivas sobre a família, o casamento e o feminino em três gerações de mulheres, incluindo o gênero como um marcador interseccional relevante.
Trata-se de um estudo de caso construído na abordagem qualitativa de pesquisa (Yin, 2015), pois visa a investigar um fenômeno contemporâneo em seu contexto real, assumindo que esse entendimento pode englobar condições contextuais pertinentes ao caso que devem ser assumidas em sua complexidade e a partir de um aprofundamento nos dados. Para garantir a validade do estudo qualitativo foram observados os itens de verificação do protocolo COREQ – Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (Tong, Sainsbury, & Craig, 2007).
Participaram do estudo mulheres de três gerações de uma mesma família, correspondendo aos seguintes papéis: avó, mãe e filha. Essas três mulheres deveriam estar em relacionamento conjugal (casamento civil ou união estável) pelo tempo mínimo de dois anos. Não houve restrições quanto ao grau de escolaridade ou aspectos socioeconômicos. O corpus foi composto por duas famílias de mulheres, totalizando seis participantes que serão apresentadas na seção de Resultados e Discussão.
Foi empregada uma entrevista semiestruturada com roteiro elaborado a partir dos objetivos deste estudo. Em linhas gerais, foram coletados dados referentes à idade dos cônjuges, escolaridade, emprego/ocupação, religião, etapa do ciclo vital, tempo e história do relacionamento conjugal, história da família de origem, influência familiar na constituição e manutenção do vínculo conjugal, além de suas dificuldades e possibilidades.
As participantes foram recrutadas a partir de contatos realizados pelos pesquisadores na região do Triângulo Mineiro, estado de Minas Gerais. Também foi empregada a técnica da bola de neve, em que uma família pode indicar outra para participar. A principal dificuldade da coleta de dados foi encontrar o cruzamento dos critérios (a) ter três gerações e (b) casadas com o fato de (c) serem do mesmo sexo. Foi possível encontrar três gerações que já tivessem vivenciado a experiência do casamento em algum período da vida, porém a primeira e/ou a segunda geração era divorciada ou viúva no momento da coleta de dados. Outro critério que excluiu algumas famílias foi o fato de a terceira geração ainda não ter se casado. O processo de recrutamento e coleta de dados durou um ano e meio.
As entrevistas foram realizadas presencialmente nos domicílios das participantes após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As entrevistas foram conduzidas por uma pesquisadora mulher, psicóloga clínica na abordagem sistêmica e com experiência em pesquisas com famílias e com a técnica de entrevista em profundidade. As entrevistas individuais foram audiogravadas mediante o consentimento das participantes e posteriormente transcritas na íntegra para análise, constituindo o corpus do estudo.
Para a organização do corpus analítico foram utilizados os procedimentos de análise temático-reflexiva (Braun & Clarke, 2019), descritos nas seguintes etapas: (a) familiarizar-se com os dados em busca de significados e padrões a partir da transcrição, leitura e anotação de ideias iniciais; (b) gerar códigos iniciais das características relevantes dos dados coletados de forma sistemática e organizar os dados codificados em grupos significativos, sendo estes diferentes dos temas (mais amplos); (c) buscar temas: início da análise interpretativa dos códigos, que podem se combinar para formar um tema abrangente; (d) rever os temas e refinar os códigos extraídos para cada um; (e) definir, nomear temas e aperfeiçoar os temas apresentados; (f) produzir o relatório final. Após esses procedimentos foram compostos temas interpretados a partir da perspectiva familiar sistêmica e da literatura científica sobre família e conjugalidade.
Este estudo foi amparado na Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição de origem da primeira autora (CAAE 70796917.9.0000.5154).
Duas famílias (A e B) participaram deste estudo, sendo que cada geração foi identificada com um número (1 para a geração das avós; 2 para a geração das mães; 3 para a geração das filhas). Observa-se que as idades das participantes variaram de 28 a 90 anos, sendo que a média de idade da 1ª geração foi 82 anos, da 2ª foi 57,5 anos, enquanto a 3ª geração foi 32 anos. Já o tempo de casamento variou de cinco a 64 anos de duração, sendo que a média de duração da 1ª geração foi 60,5 anos, da 2ª foi 33,5 anos, enquanto da 3ª geração foi 11,5 anos. Cinco das seis mulheres realizaram casamentos civis e religiosos, enquanto apenas uma delas vive em união estável. Apenas a participante A3 não tem filhos.
O catolicismo foi afirmado como a crença da maioria das participantes. Quanto à escolaridade e profissão, observa-se que as respostas foram bastante variadas. Todas as participantes vivem em suas próprias casas, de modo que nenhuma geração deste estudo coabita com as demais. Quanto às etapas do ciclo vital familiar, ressalta-se que A1, B1 e B2 vivenciam o estágio tardio da vida, A2 vivencia o lançamento dos filhos e seguindo em frente, B3 vivencia a etapa com filhos pequenos e adolescentes, enquanto A3 vivencia a formação do novo casal a partir do casamento, conforme proposta de ciclo vital de McGoldrick (2011).
Composta pelas participantes A1 (74 anos de idade, 57 anos de casamento, mãe de cinco filhos, avó de 12 netos e bisavó de oito bisnetos), A2 (filha de A1, 52 anos de idade, 30 anos de casamento, mãe de três filhos) e A3 (filha de A2 e neta de A1, 28 anos de idade, cinco anos de casamento). As participantes apresentaram ideias bastante próximas sobre o que entendem por família ao indicarem o respeito, a união e a construção conjunta como valores compartilhados pelo grupo. Além disso, as três ressaltaram a necessidade de esforço para preservar essa instituição, tendo em vista que no cotidiano familiar pode ocorrer eventos estressantes.
A construção da conjugalidade das participantes A1, A2 e A3 percorreu caminhos diferentes, considerando o atravessamento de aspectos como cultura vigente na época em que se casaram, expectativas para os papéis sociais e influência religiosa. A1 narrou a vivência de um casamento permeado por silenciamentos e renúncias, tendo em vista a necessidade de criar muitos filhos e a dependência financeira do marido. A cristalização dos papéis sociais ficou muito evidente na entrevista de A1, que trouxe diversas menções à tarefa masculina de sustento do lar e à tarefa feminina de cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos, tanto na sua própria vivência conjugal quanto nas experiências que teve com sua família de origem, especialmente o casamento dos pais.
Além disso, também ficou evidente a construção familiar como a única alternativa possível na vida das mulheres da geração de A1 por não haver “outras perspectivas que não fosse criar os filhos” A1, 74 anos. Dessa forma, a manutenção do casamento para toda a vida, apesar dos conflitos que frustravam as expectativas individuais, foi uma temática que perpassou amplamente a entrevista desta participante e que possivelmente foi transmitido pelas gerações anteriores à participante.
Meu pai achava que os filhos tinham que casar, né? É... Tem que casar! (...) Gente, 17 anos, era virgem, ia casar e morava com a sogra, mas usava muito isso, né? Morar com os pais. Isso era quase uma cultura na época. A1, 74 anos.
De acordo com a fala de A1, há possíveis influências culturais no modo como os casamentos da sua época eram organizados, como o fato de ela ter morado com os sogros durante os primeiros meses de casamento. A1 também mencionou ter passado por muitas dificuldades financeiras nos primeiros anos do casamento, o que, somado aos filhos que nasceram subsequentemente, trouxe desequilíbrios para a relação conjugal. O estágio de lançamento do adulto jovem solteiro para a fase de união das famílias com o casamento apareceu bastante marcada na fala de A1, que indicou essa fase como uma espécie de corte, um distanciamento da família de origem, a partir do qual o papel de filha ficava secundário frente às responsabilidades do novo papel de esposa e mãe, como uma ideia naturalizada na progressão da vida e na qual os pais procuravam não interferir: “Era ‘casou, vai ter que cuidar da sua vida!’, você entendeu? Os problemas que a gente tinha, que a gente passava sozinha, eles não interferiam, nem pra ajudar e nem pra atrapalhar.” (A1, 74 anos).
Compreender o contexto familiar exige um olhar estendido às gerações e à família extensa, considerando que, segundo a teoria de Bowen (1989), as pessoas carregam as bagagens de suas famílias de origem, de modo que os conflitos não resolvidos podem se repetir em outras relações interpessoais. As expectativas dos cônjuges anteriores ao casamento e a bagagem que eles carregam das experiências nas famílias de origem (como conflitos mal resolvidos e padrões de comunicação) podem ser desafios para a constituição do vínculo conjugal (Quissini & Coelho, 2014).
Tendo sido criada em um ambiente cujos papéis eram mais rígidos, A2 buscou afastar-se dessa pressão e citou acreditar que o casamento poderia libertá-la. “(...) eu tive um pouquinho de pressa de casar por conta de ter liberdade, né? Olha que ilusão (risos).” A2, 52 anos. Percebe-se, pela fala, que não foi bem assim. A2 também trouxe relatos de um casamento marcado por expectativas quanto aos papéis de gênero e a visão do casamento como a alternativa de construção para a vida, em detrimento de planejamentos individuais.
Como diferença em relação à A1, A2 indicou mais flexibilidade para pensar em investimentos pessoais, desde que as funções dentro de casa fossem priorizadas (como o cuidado dos filhos), o que acarretou uma dupla função e uma sobrecarga, conforme também pode ser visto em outros estudos que retrataram a temática (Alves-Silva, Scorsolini-Comin, & Santos, 2017; Jablonski, 2010). Como na fala de A2, “Mas alguém tinha que ficar sacrificado, né? No caso, fui eu (risos)”, essa naturalização da ideia de que a mulher era quem deveria se sacrificar em nome do grupo familiar apareceu também na história de A1, enquanto para A3 a desconstrução desse padrão se mostrou mais evidente.
A fala de A2 pode indicar o atravessamento do processo de transmissão multigeracional proposto por Bowen (1989), a partir do qual a ansiedade é transmitida entre as gerações da família, de modo que as pessoas escolhem cônjuges cujos níveis de diferenciação de self sejam próximos ao seu próprio. A2 relata durante a entrevista que sentia “ânsia de liberdade” e se sentiu reprimida durante boa parte da vida. Esse padrão emocional parece ter sido carregado para seu relacionamento conjugal, já que ela indicou o controle excessivo como uma característica negativa do marido.
Essa busca pela liberdade aparece associada a uma possibilidade de investimento em sua individualidade, uma maneira de tomar as rédeas da própria vida, o que parece ter influenciado tanto A2 quanto sua filha, A3. As duas participantes utilizaram a mesma frase “minha casa, minhas regras” para descrever um dos aspectos que consideravam positivos de sua experiência conjugal, indicando que o casamento pode ser uma forma concreta de afirmar e vivenciar a criação de um espaço comum compartilhado pelo casal (no caso, a conjugalidade), mas que, ao mesmo tempo, permite o investimento na própria individualidade.
A necessidade de investimento na individualidade e o benefício que isso pode trazer para a conjugalidade apareceram na entrevista de A3. “Relacionamento leve. Não tem cobrança (...) Eu sou eu com ele.” A3, 28 anos. A participante utilizou diversas vezes a palavra “leve” para se referir ao seu relacionamento. Comparando com o relato de sua mãe A2 e considerando o contexto de criação de A3, é possível ressaltar a transformação da bagagem transgeracional sobre os padrões relacionais com o companheiro, considerando ter sido um aspecto citado como negativo pela A2 e que foi evitado e transformado pela A3 em seu próprio relacionamento conjugal.
É provável que A3 tenha incorporado algo do padrão de relacionamento mais rígido vivenciado pelos pais e avós e buscado evitar a vivência de um mesmo padrão de conjugalidade, o que foi ilustrado na fala “ É manifestar suas vontades, né? Não é só ceder”. O estudo desenvolvido por Wang, Xing e Zhao (2014) indicou que é possível que um relacionamento conjugal seguro funcione como uma experiência emocional corretiva na idade adulta, de modo a aumentar as capacidades de autorregulação emocional das pessoas. Ou seja, por mais que a bagagem transgeracional comunique relações disfuncionais, uma experiência mais adaptativa ao longo da vida pode influenciar positivamente na desconstrução dessas heranças, o que parece ter acontecido entre A1-A2-A3.
Composta pelas participantes B1 (90 anos de idade, 64 anos de casamento, mãe de oito filhos, avó de 18 netos e bisavó de 21 bisnetos), B2 (filha de B1, 63 anos de idade, 37 anos de casamento, mãe de três filhas e avó de cinco netos) e B3 (filha de B2, neta de B1, 36 anos de idade, 18 anos de casamento, mãe de duas filhas). As três participantes trouxeram a ideia da família como base da vida e das relações, como espaço de união, de convívio necessário e valorizado.
Todas as participantes da família B indicaram seguir a religião católica. Sendo assim, é possível indicar a influência de crenças compartilhadas pelo catolicismo (especialmente na vivência de B1 e B2), como a indissolubilidade do casamento como um fator que apoia os casais a entenderem a relação conjugal como um dever assumido para toda a vida, o que pode ser observado nas entrevistas em aspectos como a vivência da sexualidade associada à procriação e ao casamento e o enrijecimento da submissão do papel feminino frente ao marido a fim de evitar conflitos. Ressalta-se que a desvalorização social, religiosa e cultural da separação dos casais influenciou especialmente os comportamentos de B1 e B2 no exercício da conjugalidade e da maternidade, o que parece ter enfraquecido com o passar das gerações. O casamento acaba sendo compreendido como uma instituição que possibilita uma vida sexual e afetiva, associada ao compromisso com a reprodução e o exercício da parentalidade. Mais do que isso, o matrimônio é visto como um evento que responde a expectativas sociais e que se constitui como um locus de evitação de aspectos socialmente indesejados, sem consideração das vontades individuais, especialmente das mulheres (Oliveira et al., 2020). Embora a família se apresente como o principal contexto para a socialização religiosa e espiritual das pessoas (Gutierrez, Goodwin, Kirkinis, & Mattis, 2014), aspectos positivos relacionados a essa dimensão não foram mencionados. Aparece, desse modo, uma naturalização da religiosidade costurando a manutenção do casamento e da família.
Em relação ao estabelecimento de relacionamentos amorosos, a questão do gênero aparece fortemente marcada nas falas das três participantes:
Então, a (neta) fala assim ‘A minha avó fica deixando os meninos namorarem, e quando eu falo de namorado ela diz pra eu ir estudar’ (...) A gente preocupa mais com menina. (...) Então eu acho que eu preocupo mais com a (neta) por isso, por ser mulher. B2, 63 anos.
Eu acho que eu sou até um pouco chata com ela (filha), mais do que comigo, porque ela tem 19 anos e não tem nem namorado. (...) do jeito que tá o mundo hoje, eu acho que seguro mais ela. Eu ando com a rédea mais curta do que minha mãe. B3, 36 anos.
A responsabilização da mulher sobre os filhos aparece em diversos momentos das entrevistas, sendo possível perceber a transmissão transgeracional da maior preocupação com a vivência amorosa das mulheres do que dos homens, conforme ilustrado na fala das participantes das três gerações. As falas de B1 e B2 sobre a vivência relacional feminina apareceram atravessadas pela cristalização de papéis de gênero. B2 relatou que suas três filhas engravidaram na adolescência e que apenas o marido de B3 “assumiu” a responsabilidade, pois foi o único que se casou com a sua filha, mesmo que em união estável, que, para ela, é uma configuração conjugal que não recebe a bênção de Deus. Esse fato deixa evidente que, para B2, a assunção da responsabilidade de pai estava associada à conjugalidade, já que B3 foi a única que se casou com o pai da filha.
Quanto às outras duas filhas, B2 relatou ter se sentido decepcionada, pois planejou para elas uma vivência associada entre conjugalidade e parentalidade, o que não aconteceu. A própria experiência da gravidez antes do casamento parece ter afetado a maneira como B3 realiza a educação de suas filhas, já que ela mesma indicou rigidez e controle para com a filha, apesar de a menina não apresentar comportamentos que lhe exijam isso.
A construção dos papéis de mãe, filha, esposa e profissional apareceu atravessada por essas questões de gênero e de geração ao longo de todas as entrevistas. As participantes ressaltaram as importantes transformações que aconteceram em suas vidas quando ampliaram seus papéis de filhas para esposas e mães. A bagagem transgeracional foi observada no exercício da maternidade, o que ressaltou a ideia de que a família de origem influencia consideravelmente a maneira como os pais vão realizar a educação intrafamiliar, e que esse processo pode incluir a repetição ou o distanciamento dos modelos parentais aprendidos (Fleck, Falcke, & Hackner, 2014).
Então eu acho que os meus pais foram (...) modelos como educadores. (...) a gente procura reciclar umas coisas que a gente acha que não tá muito certo, né? Às vezes tem algumas coisas que você fala que não precisa ser tão radical. B2, 63 anos.
Depois, mais velha (...) Você começa a entender! Coisas que você não entendia, (...) aí a gente vira mãe, né? Você começa entender aquele sentimento, né? Aí você começa a dar razão, e a falar ‘Coitada, fez isso por causa disso’. A1, 74 anos.
Observa-se nas falas das participantes a coexistência tanto de uma identificação parental sobre os modelos educativos quanto uma contestação dos padrões de criação em busca de transformar aspectos da educação dos pais que foi considerada negativa. Vivenciar um novo papel, seja ele conjugal ou parental, amplia os subsistemas de interação das pessoas, o que foi visto neste estudo para ambas as experiências, de modo a ressaltar que por mais que possamos lutar contra nossa herança familiar, em geral ela nos alcança (Nichols & Schwartz, 2007).
Discutindo possíveis mecanismos que participam da construção de padrões familiares, Fasang e Raab (2014) concluíram que os padrões intergeracionais de formação familiar são constituídos na interseção da mudança macroestrutural e do funcionamento psicológico interno da família. Esse dado pode ser percebido nas transformações transgeracionais evidenciadas nas falas das participantes, especialmente sobre o exercício dos papéis sociais esperados para mulheres como mães e esposas. As entrevistadas ressaltaram a importância dos padrões familiares na construção de suas identidades e no exercício de seus papéis, mas também indicaram como as dinâmicas sociais influenciaram para que modificassem determinados aspectos das heranças familiares, especialmente a segunda e a terceira geração das famílias A e B. Vale ressaltar que a 1ª geração se casou nas décadas de 1950 e 1960, a 2ª geração se casou na década de 1980, enquanto a 3ª geração se casou após os anos 2000.
Nós fomos preparadas pra ser donas de casa. (...) Era muita roupa pra lavar (risos). (...) Na mão! Eu, minhas irmãs. (...) éramos jogadas no serviço mesmo! A1, 74 anos.
Eu lavava roupa na fazenda uma época, eu lavava com um menino no braço e dois atrás (risos). B1, 90 anos.
Esses trechos ilustram a proximidade das experiências narradas pelas participantes A1 e B1 quanto à socialização, ao papel de gênero atribuído ao feminino e ao que aprenderam como sendo dever da mulher. Ambas relataram que precisaram trabalhar muito dentro de casa, seja nas tarefas domésticas ou em atividades manuais que rendiam certo dinheiro, mas com a clara distinção de quem era a responsabilidade pelas tarefas e, mais tarde, pelos filhos.
E eu fiquei dentro de casa, porque eu tive um filho atrás do outro também, né? E ele foi muito de pescaria, e eu não podia falar nada, não reagia. Porque eu achava que ele trabalhava muito, (...) mas ele era muito livre, era egoísta. A1, 74 anos.
Percebe-se como a fala de A1 identifica e diferencia quais eram os comportamentos esperados para homens e mulheres na época em que os filhos nasceram. O trabalho no espaço público cabia ao homem, a quem era dada certa liberdade devido ao cumprimento de sua “parcela de responsabilidade” na família, no caso, o sustento financeiro da casa. Em contrapartida, cuidar dos filhos e das tarefas domésticas era um compromisso da mulher. As entrevistas destacaram que os papéis sociais para homens e mulheres apareceram mais definidos e cristalizados nas primeiras gerações, de modo que a renúncia foi atribuída ao feminino, tal como se pertencesse às mulheres a função de abdicar de possíveis projetos pessoais em razão de organizar e manter a homeostase familiar, operando, desse modo, uma distinção fortemente associada ao gênero.
As próprias participantes reconheceram a complexa tarefa dos homens de sustentarem uma casa composta por vários filhos, porém, ao olharem para a própria realidade do papel feminino, elas tiveram dificuldade em valorizar com igual importância a tarefa de cuidar de uma família e transformá-la em um lar, e acabaram ajudando a manter a desvalorização dos movimentos operados dentro do ambiente doméstico, já que, sistemicamente, um relacionamento é definido pela participação das duas partes envolvidas (Fleck et al., 2014), no caso, esposo e esposa em seus processos relacionais.
Ao se situar nesse lugar de desvalorização, a mulher não emerge como uma parceira, como alguém com quem se divide responsabilidades, mas sim como alguém que, no máximo, “ajuda” o homem, que mantém financeiramente a casa. Essa percepção apareceu nos relatos das participantes A1 e B1 sobre suas próprias experiências e sobre as vivências de suas mães. Elas realizaram serviços manuais como arremate e costura, lavagem de roupa e plantio de café a fim de contribuir com a renda familiar, porém esses trabalhos precisavam ser associados ao cuidado da casa e dos filhos e eram apenas complementares. Sendo assim, a dependência do marido para sustentar os filhos acabou atrelando a vivência da parentalidade como justificativa para a manutenção do casamento de algumas participantes, assim como identificado no estudo de Grizólio, Scorsolini-Comin e Santos (2015).
O exercício da parentalidade foi indicado como uma fonte de conflitos entre o casal, especialmente na educação durante as fases da infância e adolescência, ressaltando a relevância da interface entre os subsistemas conjugal e parental ao longo de várias etapas do ciclo vital das famílias A e B. A maioria das entrevistadas se casou em uma época em que as separações eram menos comuns, fato que, aliado aos valores do catolicismo e ao contexto interiorano da coleta dos dados, naturalizou a manutenção do casamento ao longo dos anos, apesar das dificuldades vividas. A naturalização de expectativas para o gênero feminino atravessou as gerações e influenciou a maneira como as mães educaram seus filhos e filhas sobre questões relacionais, profissionais e também sexuais.
Agora, os meus meninos também foram criados um pouquinho parecidos com a minha criação (...) os meninos não tinham tanta liberdade também. (...) E a adolescência das meninas, eu sofri muito, porque eu vivi, eu revivi a minha. Então eu sofri com elas. E eu, muitas vezes, eu intrometia. (...) Falei ‘eu não quero que elas vivam do jeito que eu vivi’. A2, 52 anos.
A fala de A2 ressalta a repetição de determinadas vivências familiares entre sua geração e a de seus filhos, especialmente as filhas. Essa diferenciação de cuidados e preocupações quanto aos filhos homens e mulheres apareceu em diversos momentos das entrevistas, de modo a evidenciar a transmissão transgeracional do compartilhamento de experiências cotidianas sobre o que é reforçado para os papéis masculino e feminino, além da comunicação verbal ou informal de valores e a reprodução de padrões relacionais entre as gerações familiares. É possível dizer que a vivência como mãe, filha e esposa para as mulheres deste estudo pode ter sofrido influência da educação recebida sobre o exercício dos papéis sociais e de gênero e que foram transmitidos pelas famílias de origem, considerando a força da cultura da época de nascimento e casamento de cada participante (Coutinho & Menandro, 2010; Fleck et al., 2014).
Eu sempre conversava com os meninos (...) sobre drogas, que eu tinha muito medo, mas eu não interferia no namoro deles não (...) então eu não tinha que preocupar, só com as meninas. (...) Os pais antigamente tinham muito medo de as filhas aparecerem grávidas, nossa, como eles tinham medo! Isso era uma vergonha, né?. A1, 74 anos.
A partir do relato das participantes, a sexualidade é apresentada como uma experiência que deveria ser partilhada somente por pessoas casadas (Bozon, 2003), ressaltando a gravidez fora do casamento como uma ocorrência desaprovada socialmente. O fato de todas as participantes terem se casado com o primeiro namorado ressalta a sexualidade como uma vivência fortemente influenciada por expectativas de gênero e também por aspectos religiosos compartilhados pelo grupo familiar, que acabam validando somente a experiência sexual que acontece dentro dos casamentos. A vivência da sexualidade entre os cônjuges apareceu como um aspecto conjugal que ficou prejudicado com a chegada dos filhos, conforme foi ilustrado em algumas das entrevistas, devido à necessidade de reorganização dos subsistemas conjugal e parental e à influência da cristalização dos papéis sociais.
Minha vida sexual foi depois de os filhos maiores que eu vivi plenamente a minha vida! Aí eu liguei, não tinha mais medo de ficar grávida! (...) Essa parte de sexo! Então era sinônimo de gravidez (...) Então aquilo me atrapalhava! A1, 74 anos.
Eu acho que a maioria das mães dedica muito mais aos filhos do que ao marido, né? Eu duvido que uma mãe coloca o marido em primeiro lugar! (...) Com o passar do tempo a gente vai vendo que poderia ter dividido melhor... (...) E aí o relacionamento já vai ficando mais complicado, mais distanciado. B2, 63 anos.
A vivência sexual para as primeiras gerações apareceu associada à procriação e, como mais um filho estaria ligado a mais despesas, a ideia do sexo acabava sendo desconfortável para as mulheres. Diferentemente das gerações mais tradicionais, a sexualidade desempenha um papel importante na conjugalidade contemporânea, sendo indispensável para a qualidade do relacionamento (Bozon, 2003). Se antes era uma vivência socialmente aceita somente com o casamento, hoje o exercício da sexualidade pode se constituir como um projeto individual, não necessariamente ligado à conjugalidade (Borges, Magalhães, & Féres-Carneiro, 2014).
Além da transformação da vivência sexual, com o passar das gerações evidenciou-se também uma transformação do papel da mulher, que abriu espaço para o investimento em seu lado profissional (Coutinho & Menandro, 2010; Heckler & Mosmann, 2014), fato que apareceu neste estudo, especialmente entre as participantes mais novas. A terceira geração indicou ter sido incentivada a se desenvolver profissionalmente, além de ter buscado vivenciar relacionamentos conjugais mais simétricos.
A gente não pensa um atrás do outro, é sempre ao lado. Então a gente quer crescer junto. A3, 28 anos.
(...) pra ver quem faz o almoço hoje, até isso divide. (...) Quem chega primeiro já começa, né, tudo distribuído. A3, 28 anos
A3 e B3 indicaram responsabilidades mais divididas entre homens e mulheres, especialmente sobre tarefas domésticas e financeiras, apesar de esses papéis mais cristalizados ainda refletirem na organização conjugal e familiar das participantes (Jablonski, 2010). As diferenças geracionais e de gênero apareceram também sobre as expectativas que os pais tinham para seus filhos, fossem elas verbalizadas ou não. Os papéis e funções esperados para homens e mulheres são construídos antes mesmo do nascimento da criança, quando a família já manifesta suas expectativas para ela, de modo a refletir valores que são incorporados por esse filho que, por lealdade à família e para pertencer ao grupo assume determinadas características como próprias (Fleck et al., 2014).
Entre essas expectativas apareceu o casamento dos filhos, especialmente nos relatos das duas primeiras gerações, apesar da mudança/ampliação das expectativas para os papéis sociais com o passar do tempo. O incentivo à independência e ao exercício do papel profissional só ficou evidente para a terceira geração e seus filhos, já que para a primeira geração as possibilidades para as mulheres se limitavam ao casamento e à maternidade, o que acabou sendo transmitido à segunda geração, mesmo que transformado.
Morava na fazenda, o pai falava que não precisava de aprender a ler, que aprendia a ler pra escrever pra rapaz (...) O papai não deixou nós aprender (a ler e a escrever), mas pros menino... O quarto ano, que nós morava na roça, eles tiraram. B1, 90 anos.
Ele queria que eu casasse direitinho e tudo mais, né? (...) Mas em relação à profissão, essas coisas, eles não atinavam muito não. (...) eu falo pras minhas meninas, cuida da profissão antes de ter filho porque sacrifica muito. A2, 52 anos.
Eu acho que a expectativa de virar uma pessoa de bem, né, não mexer com droga. Encontrar um companheiro (...), um emprego, se estabilizar. A3, 28 anos.
Quando eu tive a (filha) eu tinha 17 anos. (...) Aí depois de dez anos que eu voltei a estudar. Por incentivo dos meus pais. B3, 36 anos.
Esses diversos recortes evidenciam a transformação progressiva da bagagem familiar a partir de influências socioculturais de cada época, além de articular os pensamentos das diversas gerações. A fase do ciclo de vida que vivencia e o ponto em que a pessoa está localizada em sua estrutura familiar podem influenciar seu funcionamento próprio, seus padrões de relação e a família que poderá constituir na geração seguinte (McGoldrick, 2011).
Como foi possível discutir, as transformações contemporâneas no domínio da conjugalidade abriram espaço para novas possibilidades de ser família e para questionamentos de características tradicionais da conjugalidade, como sua indissolubilidade, idade ao se casar, necessidade ou não de filhos e ainda de coabitação. As participantes ressaltaram que, mesmo que as pessoas consigam se diferenciar de suas famílias de origem em alguns aspectos da vida e questionar as heranças transgeracionais recebidas, não é possível fazer escolhas que descartem por completo essas bagagens. Desse modo, pode-se entender a necessidade de equilíbrio entre pertencimento ao grupo familiar e diferenciação para as pessoas, o que ficou evidente nos relatos das seis participantes deste estudo a partir da discussão da construção do papel feminino e das expectativas relacionadas ao ser mulher.
Ao final desse percurso é importante ressaltar a influência considerável de fatores históricos e sociais que participam da construção dos papéis de gênero e da coexistência de valores tradicionais e modernos na contemporaneidade sobre os modos de ser família e de vivenciar a conjugalidade. A manutenção desses papéis sociais e de gênero é transmitida entre as gerações da família e participa da sua constituição como grupo, reforçando o papel do casamento como um atualizador das heranças familiares.
As transformações observadas em ambos os casos não chegaram a mudar radicalmente as histórias de vida das gerações mais recentes, mas possibilitaram a assunção de posições menos submissas às mulheres, o maior acesso à escolarização e a profissionalização, com constantes reflexões em termos dos lugares sociais que as mulheres podem ocupar na contemporaneidade. Essas mudanças, como pode ser observado nas falas das participantes, não são creditadas somente às famílias, mas também a movimentos macrossociais nos quais esses grupos estão incluídos e que promovem o exercício de novos comportamentos.
Como limitação deste estudo, observa-se que foram privilegiadas as visões de mulheres casadas sobre o casamento e a parentalidade. No entanto, é importante considerar também as experiências de mulheres viúvas, divorciadas, recasadas e solteiras a respeito dos mesmos tópicos, haja vista que carregam significações que se referem à mesma herança, inclusive em mulheres que não buscam a conjugalidade ou a parentalidade em seus projetos de vida. Compreender em que medida uma mesma herança familiar possibilita diferentes itinerários em relação à conjugalidade e à parentalidade ao longo das diferentes gerações pode ser uma recomendação para estudos vindouros.
Sugere-se a continuidade de desenvolvimento de estudos que busquem compreender esse processo de transmissão transgeracional de padrões familiares no contexto contemporâneo, especialmente aqueles ligados a eventos que possibilitam a constituição de novos grupos, como pode ser entendido o casamento, já que as transformações são constantes em decorrência das reorganizações e ressignificações pelas quais as famílias passam. Este estudo privilegiou a discussão acerca do gênero. A inclusão de outros marcadores sociais, como os socioeconômicos, de origem e relacionados à cor/raça, por exemplo, podem ampliar o debate interseccional no campo da transgeracionalidade.