Relatos de Pesquisa

Mecanismos de empoderamento de mulheres negras: um estudo qualitativo

Cláudia de Oliveira Alves Alves
Universidade de Brasília, Brasil
Stéfane Macedo de Jesus Jesus
Universidade de Brasília, Brasil
Sheila Giardini Murta Murta
Universidade de Brasília, Brasil

Mecanismos de empoderamento de mulheres negras: um estudo qualitativo

Revista de Psicologia, vol. 13, núm. 2, pp. 168-183, 2022

Universidade Federal do Ceará

Recepción: 27 Febrero 2022

Aprobación: 26 Mayo 2022

Resumo: Propostas de promoção de empoderamento, que visam maximizar as possibilidades de ação no ambiente de vida, podem contribuir para a mudança dessa realidade ao aumentar as chances de alcançar acesso mais igualitário a recursos que favorecem condições dignas de vida, garantias de direitos, bem-estar e saúde. Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi investigar, a partir da visão das participantes, elementos que podem funcionar como mecanismos favorecedores de empoderamento para as mulheres negras. Participaram do estudo 23 mulheres de três estados brasileiros. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas e a análise do material se deu por meio de Análise Temática, baseada em uma compreensão multidimensional de empoderamento. Os resultados apontam os mecanismos de empoderamento de mulheres negras localizados em três níveis de análise micro/pessoal, meso/comunitário e macro/social. Isso vai ao encontro de abordagens que compreendem o conceito a partir de uma perspectiva multidimensional e ressalta a importância de não se adotar apenas um foco individual. Os achados do estudo apontam ainda elementos que remetem a vivências interseccionadas por raça, gênero e classe.

Palavras-chave: Mulheres negras, empoderamento, mecanismos, raça, interseccionalidade.

Abstract: Proposals to foster empowerment, aiming to increase people’s possibilities of taking action in their living environment, may contribute to change this reality by increasing the chances for more equalitarian access to resources favoring more dignifying living conditions, the guarantee of rights, health and welfare. Thus, the goal of this study was to investigate, beginning from the participants’ point of view, elements that could work as black women empowerment mechanisms. 23 women from three Brazilian states took part in the study. Data was collected through interviews with an open question and a sociodemographic questionnaire. The material analysis was performed using Thematic Analysis based on a multidimensional understanding of empowerment. The results point to black women empowerment mechanisms in three levels of analysis: micro/personal, meso/community, and macro/social levels. This is in accordance with approaches which understand the aforementioned concept by means of a multidimensional perspective, also emphasizing the importance of not using an individual focus, solely. The study findings also indicate elements which refer to intersectional experiences of race, gender and class.

Keywords: Black women, empowerment, mechanisms, race, intersectionality.

Introduçao

As mulheres negras brasileiras, aqui compreendidas as pretas e pardas, ocupam condições desfavorecidas na sociedade em relação a condições de pobreza e vulnerabilidade; posições no campo do trabalho e salários; acesso a bens e à internet; níveis de escolaridade - ficando à frente somente dos homens negros; e expectativa de vida quando comparadas com as mulheres brancas (Alves, Murta, & Moreira, 2021; Marcondes, Pinheiro, Queiroz, Querino, & Valverde, 2013). Esse cenário, construído por processos históricos e sociais (constantemente atualizados) articulados a marcadores interseccionais tais como raça, gênero, classe, orientação sexual, dentre outros (Hooks, 2015; Collins, 2019; González, 1988), atua com efeito desempoderador para as mulheres negras ao afetá-las na subjetividade, relações, condições de viver, estudar, trabalhar, morar, ir e vir, dentre outras dimensões da vida.

As relações raciais, de gênero e de classe (dente outras) no Brasil estão estabelecidas de forma que essa teia interseccional (Crenshaw, 2002) de experiências, ao mesmo tempo em que fomenta resistência, muitas vezes é marcada por vivências de discriminações, violências e acesso dificultado a recursos e direitos gerando barreiras internas e externas que contribuem para o não empoderamento. As barreiras externas consistem, por exemplo, em acesso dificultado ou nulo a recursos e direitos. Já as barreiras internas se referem a processos subjetivos que impactam negativamente, por exemplo, o autoconceito, a autoestima e a autoeficácia. Esse contexto contribui para colocar e manter as mulheres negras em condições de desvantagem social ao colaborar para a manutenção de desigualdades que cooperam para a desigualdade em saúde (Williams & Priest, 2015). Em face desse cenário, empoderamento tem sido adotado como princípio e proposta nas ações de algumas políticas públicas, como é o caso da Política Nacional de Assistência Social (Brasil, 2004) e da Política Nacional de Promoção de Saúde (Brasil, 2018). Dessa forma, o presente estudo se propôs a investigar os mecanismos que podem favorecer o empoderamento e impactar essa realidade, promovendo melhores condições de vida e saúde de mulheres negras brasileiras.

O Complexo Conceito de Empoderamento

Empoderamento, constantemente, é adotado com focos diferentes, ora com um mais individual, ora um mais comunitário e ora a partir de uma perspectiva multidimensional. O foco na dimensão individual (psicológica) é o mais abraçado e avaliado na literatura científica (Cyril, Smith, & Renzaho, 2016; Baquero, 2012), principalmente na literatura norte-americana. Essa dimensão está baseada no empoderamento psicológico proposto por Zimmerman (1995), que envolve componentes intrapsíquicos, interacionais e comportamentais que interatuam com o ambiente para aumentar ou inibir o domínio e controle sobre os fatores que afetam a vida. Alguns dos elementos abarcados no empoderamento psicológico são: habilidade, conhecimento, consciência, motivação, lócus de controle, autoeficácia, controle de forças pessoais, autoestima, autoafirmação, autoconfiança, aumento da capacidade das pessoas se sentirem influentes nos processos que determinam suas vidas (Baquero, 2012; Wallerstein, 2006; Zimmerman,1995). Apesar de as influências ecológicas e culturais serem consideradas nesse nível, o alvo de análise e intervenção ainda é centrado nos processos individuais. Ao longo do tempo, intervenções que se limitam a, ou focalizam demasiadamente essa dimensão, têm sido alvo de críticas que argumentam que centrar apenas no indivíduo é insuficiente (Hamlin & Peters, 2018).

O empoderamento comunitário, outra linha muito desenvolvida, envolve um processo de ação social no qual indivíduos e grupos agem coletivamente para promover mudanças em seu ambiente social e político (Douglas, Grills, Villanueva, & Subica, 2016) visando a conquista plena de direitos e o acesso e controle sobre recursos materiais e simbólicos (Baquero, 2012; Wallerstein, 2006). Nascido em contextos como a psicologia comunitária, educação, desenvolvimento comunitário e serviço social, o empoderamento comunitário destaca a dimensão coletiva de transformação da realidade (Wallerstein, 2006). Essa perspectiva salienta a importância do empoderamento individual, mas por meio de um processo social (pensamento crítico, conscientização, construção de capacidade pessoal e social, transformações de relações sociais), com ênfase no diálogo e em processos educativos (Baquero, 2012). Partindo desse entendimento, considera-se que a dimensão psicológica está ligada à participação comunitária, que por sua vez está relacionada a estruturas sociais mais amplas (Aguilar-Pinto, Tuñón-Pablos, Zapata-Martelo, & Evangelista-Garcia, 2017; Carvalho, 2004). A contribuição de Paulo Freire (2011), a partir da proposta de educação libertária e do processo de conscientização crítica para a transformação das condições de vida das pessoas, é frequentemente mencionada na literatura sobre empoderamento comunitário (Cornwall, 2016; Freire, 2011).

Alguns autores propõem ainda o entendimento de empoderamento como um conceito multidimensional, o que envolve considerar as várias dimensões nas quais ele ocorre e produz resultados (Cyril et al., 2016). Huis, Hansen, Otten e Lensink (2017), fundamentados na Teoria dos Sistemas Ecológicos, sugerem um modelo multidimensional de empoderamento das mulheres que envolve o nível pessoal, de relações próximas e coletivo. Trata-se, assim, de um processo multifacetado, que envolve a consciência, as crenças e os comportamentos individuais e coletivos, incorporados na estrutura social de contextos culturais específicos, destacando a perspectiva coletiva em detrimento da individual. Salienta-se que empoderamento também pode ser considerado sistêmico, uma vez que se desenvolve por meio do intercâmbio entre indivíduo e o contexto social (Cattaneo & Chapman, 2010; Cyril et al., 2016; Huis et al., 2017), e envolve uma interação dinâmica entre mudanças psicológicas internas e superação de barreiras estruturais externas para acessar recursos (Wallerstein, 2006). Nesse processo interativo de mudança, instituições e comunidades se transformam à medida que as pessoas envolvidas na mudança também são transformadas. Dessa forma, empoderamento pode ser entendido como um conceito orientado para ação que tem foco na remoção de barreiras formais e informais. Tais barreiras, muitas vezes camufladas, podem ser psicossociais, como percepção prejudicada do próprio valor, e/ou culturais e estruturais tais como dinâmica de poder desigual, racismo, alta estratificação social. Elas são, ainda, multidimensionais, por envolver o nível individual, comunitário, institucional e cultural.

A noção de superação de barreiras (formais e informais) apontada por Wallerstein (2006) ajuda a romper com uma ideia de empoderamento focado no nível individual e/ou que, muitas vezes, tem o efeito de responsabilizar, quase que exclusivamente, as próprias pessoas por mudança em suas condições de vida. Isso é particularmente relevante quando se trata de grupos que historicamente lidam com estruturas sociais que os colocam em posições de desprestígio e limitado acesso a recursos materiais e simbólicos, como é o caso das mulheres negras na sociedade brasileira.

Muitos estudos descritos na literatura adotam definições de empoderamento que o compreendem como um processo de dar poder a alguém ou grupo que antes não o tinha, ou que uma pessoa sem poder o adquire por conta própria (Cattaneo & Chapman, 2010). Para explorar esse aspecto, nos baseamos principalmente nas análises de Foucault (1995) para o qual poder designa relações que se enraízam no nexo social. O que define uma relação de poder, para o autor, é o modo de ação que age sobre a ação dos outros (as eventuais, futuras ou presentes). O poder “é um conjunto de ações sobre ações possíveis” (p. 243) que incita, desvia, induz, facilita ou torna mais difícil, amplia ou limita. Um ponto nevrálgico da análise do autor é que para ele, a relação de poder só existe onde há a liberdade como possibilidade. Isso implica dizer que onde há relação de poder há resistência. Dessa forma, pode-se entender que empoderamento refere-se muito mais à resistência de relações de poder assimétricas, sugerindo um maior equilíbrio nessa relação, do que uma invertida de posição na manutenção de relações já existentes. Pode-se também depreender que empoderamento refere-se à mudança de possibilidades de ação que estejam sendo dificultadas ou limitadas. Empoderamento seria, então, exercício de resistência que promove mudança por meio da transposição e redução de barreiras e leva a um maior controle sobre recursos de vida (materiais e simbólicos), garantia de direitos, bem-estar e melhores desfechos em saúde. Mas como dito antes, uma vez que as barreiras são forjadas e reeditadas no seio da estrutura social, o ônus da mudança precisa recair prioritariamente sobre os mecanismos fomentadores das barreiras. A falha em considerar as estruturas sociopolíticas e culturais pode reforçar relações assimétricas de poder já existentes (Huis et al., 2017) e que estão entrelaçadas com processos subjetivos, comportamentais e relacionais. Diante do exposto, no presente estudo, empoderamento é entendido como conceito multidimensional e sistêmico que se refere à maximização das possibilidades de ação sobre a própria vida e a da comunidade, por meio da superação (ou minimização) de barreiras formais e informais, internas e externas.

Proposta do Estudo

O presente estudo buscou investigar a percepção de mulheres sobre mecanismos que podem promover o empoderamento de mulheres negras. Mecanismo é um dos processos que faz algo ser o que é. Bunge (2004) o entende como uma sequência de eventos em determinado nível de um sistema que produz o resultado de alterar ou manter seu estado. O autor defende que identificar e entender os mecanismos, ao mesmo tempo em que ajuda a explicar como algo funciona, permite promover investimentos para modificar esses processos. Nesse sentido, o presente estudo aborda mecanismo como aquilo que pode promover ou favorecer o empoderamento, ou seja, como uma mudança intermediária que leva ao empoderamento. Só é possível compreender um mecanismo atrelado ao sistema no qual ele opera, assinalou Bunge (2004). Por isso, é relevante compreender quais são os mecanismos que podem funcionar nos sistemas nos quais mulheres negras estão inseridas, ou seja, analisá-los e compreendê-los localizados no contexto social, histórico, econômico, político e simbólico que compõe a realidade desse grupo. Em sistemas complexos, como os sociais, existem mecanismos concorrentes e em diversos níveis. Essa compreensão vai ao encontro do entendimento adotado do empoderamento operando em vários níveis, uma vez que melhoria da saúde, realocação de recursos e mudança política podem ser resultado do aumento no empoderamento nos três níveis de interação: o micro, meso e macrossistema.

O objetivo deste estudo foi investigar, a partir da visão de mulheres, em sua maioria, negras, quais mecanismos podem favorecer o empoderamento de mulheres negras. Nos baseamos nos estudos de Whitehead et al. (2016) a respeito do controle sobre o ambiente de vida para compreender o empoderamento em três dimensões que interagem e se retroalimentam: microssocial/pessoal, mesossocial/comunitário e macrossocial. O controle sobre o ambiente de vida se refere às possibilidades de ação de um indivíduo, grupo ou população sobre as decisões que afetam suas vidas diariamente no ambiente físico e social, incluindo condições socioeconômicas e psicossociais em que as pessoas vivem (Whitehead et al., 2016). Relacionando esse conceito com desfechos em saúde, as autoras apontam que no nível microssocial, a condição social das pessoas, na sociedade, influencia o acesso a recursos necessários para a saúde, bem-estar e controle sobre o destino, repercutindo nas decisões críticas que afetam as suas vidas. O nível mesossocial se refere ao local em que as pessoas vivem e as interações estabelecidas (inclui também estrutura socioambiental, acessos a serviços básicos, dentre outros), e a interação de pessoas e grupos nesse contexto. O nível macrossocial se refere a processos culturais, sociais ou políticos que geram vários graus de exclusão e discriminação de alguns grupos na sociedade, o que resulta em baixo status e, consequentemente, em baixo controle sobre o acesso para satisfazer necessidades em saúde (Whitehead et al., 2016). Os mecanismos para esse processo partem do contexto social como um todo, interagindo com outros níveis. Racismo, sexismo, classismo, capacitismo, por exemplo, operam no nível das estruturas sociais e produzem experiências diferentes para grupos populacionais, influenciando o grau de controle que esses grupos sentem que têm, e realmente têm, sobre suas vidas. Dessa forma, a questão que guiou esse estudo foi: Quais são os mecanismos promotores de empoderamento das mulheres negras nos níveis micro, meso e macrossocial?

Método

Este estudo qualitativo apoia-se na concepção reivindicatória/participatória (Creswell, 2010), que está baseada na noção de que a pesquisa precisa estar interligada à agenda política para contribuir com mudanças nas condições de vida de grupos historicamente marginalizados. Participaram do estudo 23 mulheres de três diferentes unidades da federação (Goiás - 3; Distrito Federal - 15; e Pernambuco -5) e de diferentes contextos: oito especialistas/estudiosas em/sobre relações raciais (três psicólogas, duas historiadoras, duas assistentes sociais, uma pedagoga), seis profissionais de Centros Referência e Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS) (duas assistentes sociais, três psicólogas, uma pedagoga), sete usuárias de CRAS, e duas gestoras da Proteção Social Básica no nível nacional da Política Nacional de Assistência Social (PNAS). A seleção das participantes seguiu critérios de amostra intencional. Atentando-se para o cuidado de que as mulheres negras pudessem falar por si mesmas sobre aspectos que influenciam suas vidas, optou-se por priorizar a participação de mulheres negras. Três participantes eram conhecidas da pesquisadora principal, outras três foram indicadas pela Secretaria de Assistência Social do Distrito Federal e as demais foram acessadas por meio da técnica “bola de neve”. Os critérios para inclusão compreenderam ter idade acima de 18 anos e se encaixar em algum dos grupos de participação – especialistas, profissionais do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), usuárias do SUAS ou Gestoras/es nacionais. A faixa de idade das participantes foi de 32 a 58 anos. Quanto ao quesito cor, as participantes se autoidentificaram como pretas (7), negras (8), pardas (4), brancas (3) e morenas (1).

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas individuais (uma entrevista foi realizada em dupla) com a pergunta aberta e disparadora: o que você acha que pode favorecer o empoderamento de mulheres negras? Durante a coleta de dados, foi utilizado o termo fortalecimento como sinônimo de empoderamento para facilitar a compreensão da pergunta. Um Questionário Sociodemográfico com cinco perguntas sobre idade, cor, sexo, formação, trabalho/profissão também foi utilizado. O convite às participantes foi feito via e-mail ou telefone. Optou-se por incluir participantes da região centro-oeste e da região nordeste (PE), que apresenta uma realidade socioterritorial diferente. Inserir perspectivas de regiões diferentes, somando com os pontos de vista diversos das participantes, contribuiu para a triangulação de dados de fonte e espaço como estratégia para validação dos dados. As entrevistas foram realizadas em locais de preferência das participantes (residências, local de trabalho, espaços públicos), e foram realizadas pela primeira autora com a colaboração de pesquisadoras auxiliares treinadas. A quantidade de entrevistas foi delimitada com base no princípio de saturação (Creswell, 2010).

Após a transcrição, que totalizou 19.420 palavras, os textos das entrevistas foram submetidos à Análise Temática (Braun & Clarke, 2006), utilizando processo dedutivo. O material foi codificado com base nos níveis micro, meso e macro de controle sobre o ambiente de vida proposto por Whitehead et al. (2016). Para cada nível foram identificados subtemas com base nas teorias sobre empoderamento. Os dados foram organizados e analisados com o auxílio do software NVivo, versão 12 Pro. As dúvidas que surgiram durante a análise foram discutidas e resolvidas com uma segunda pesquisadora. Como estratégia de validação dos resultados foi realizada a verificação pelos membros (Birt, Scott, Covers, Campbell, & Walter, 2016; Creswell, 2010). No processo de verificação, uma síntese da análise dos resultados (Tabela 1) foi apresentada para doze participantes da pesquisa via WhatsApp (11) ou por e-mail (1), solicitando às entrevistadas a indicação da presença ou ausência de representatividade nos resultados sobre o que considerassem como favorecedores de empoderamento de mulheres negras. Uma participante não retornou. As demais indicaram que os resultados contemplavam o que quiseram dizer na entrevista e uma participante fez comentários, que foram integrados aos resultados. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais da Universidade de Brasília – CAAE 01208518.4.0000.5540, Parecer Nº 3.070.871 e foram adotados todos os cuidados éticos necessários.

Resultados

Os resultados sobre a percepção de mulheres acerca do empoderamento de mulheres negras identificaram mecanismos que operam nos três níveis (micro, meso e macrossocial), sumarizados na Tabela 1. A maior quantidade e variedade de mecanismos nos três níveis foram informadas pelas participantes especialistas sobre relações raciais. Para as usuárias de CRAS e CREAS, os mecanismos se concentram mais no nível meso, com destaque para oportunidade de trabalho para obter renda. Para as profissionais da assistência social, os mecanismos de empoderamento se concentram nos níveis micro e meso. Passa-se à descrição de cada nível e seus mecanismos, apresentados em ordem decrescente de frequência.

Empoderamento no Nível Micro

O reconhecimento de si como mulher envolve conhecer sua história sem estereótipos geralmente implicados e se ver enquanto parte da população negra. Isso permite o reconhecimento positivo do seu lugar, sua história, sua ancestralidade para que seja possível se empoderar e reivindicar melhorias nas condições de vida. A consciência crítica da realidade sócio-histórica na qual o racismo se expressa se refere a ter pensamento crítico e reconhecer as expressões do racismo nas violências, discriminações, maus tratos, abusos sofridos ao longo da vida, postos de trabalho precarizados, falta de acesso a serviços públicos, dentre outras formas. É preciso se reconhecer como parte de um grupo excluído da sociedade ao qual as oportunidades são embarreiradas, reconhecendo, assim, o racismo como um processo estrutural. Se ver de uma forma positiva, se aceitarem como são, acreditar que são capazes se referem à autoestima, um dos mecanismos que mais apareceu. Ter amor próprio, acreditar no seu valor e se respeitar contribuem para o empoderamento. O reconhecimento de si como sujeito de direitos favorece o empoderamento quando a mulher negra sabe quais são os seus direitos tanto para reivindicá-los quanto para reconhecer quando estão sendo violados. É necessário se reconhecer como cidadã e exercer a cidadania. O reconhecimento de si como sujeito ativo/agência se refere a se reconhecerem como parte importante da estrutura sociedade, a partir de uma perspectiva histórica, e que pode transformá-la. É fundamental ver possibilidades, se ver como uma pessoa que pode fazer o que deseja, assim como perceber seu lugar de poder e reconhecer que precisa de mais autonomia. O fortalecimento da autoeficácia possibilita acreditar em si mesma e na sua capacidade, se ver como capaz de promover mudanças. O fortalecimento da identidade política por meio da representatividade das mulheres negras nos três poderes do Estado, para que suas vozes sejam ouvidas, e ter referências positivas de mulheres negras, de ícones que foram invisibilizadas ao longo do tempo também apareceram. A seguir, tem-se um trecho de uma entrevista que exemplifica um dos mecanismos mais frequentes.

[...] Então eu acho que é isso e principalmente se identificar porque muitas nem se identificam né, elas não se reconhecem porque é taxada de coisa ruim. Então elas não querem ser taxadas de coisas ruins, então ela fala “Não, não sou!” né... Então para você ter ideia para depois, eu faço cadastro de um tanto também né no que origina o Bolsa Família. E aí lá também tem essa pergunta. E aí as vezes eu faço essa pergunta. A mulher do Maranhão que é negra, ela não se considera. Aí ela perguntou para mim [...] “E você acha que eu sou de que cor?”. Eu falo: “Eu acho que você é negra, né! Eu não tenho essa autonomia para falar, mas já que você perguntou. Já que foi uma pergunta sua. Eu acho que você é negra!”. Aí ela perguntou que cor que eu era né, aí eu falei que eu era negra, aí ela falou assim “Não, mulher, você tá doida! Você não é negra não!”, não fala uma coisa dessa. [...] Então é mais ou menos isso, a falta de reconhecimento mesmo que é inicial, é o início tá faltando... (Participante 7 – Mecanismo: Reconhecimento de si como mulher negra).

Empoderamento no Nível Meso

Oportunidades de trabalho para obter renda aparece como um mecanismo que pode favorecer o empoderamento, uma vez que o racismo e o sexismo muitas vezes criam obstáculos para as mulheres negras acessarem empregos e postos de trabalho. O emprego permite ter renda própria e consequentemente melhorar as condições de vida, as faz se sentirem mais protegidas e a ter independência financeira, principalmente nas relações amorosas. Ter creches para deixar os filhos é fundamental para que as mulheres tenham condições de acessar e permanecer no emprego. O acesso e permanência na educação formal também aparece como um mecanismo principalmente por permitir maior acesso a trabalho e renda e melhores condições de vida, abrindo mais possibilidades para as mulheres negras. Cursos de capacitação/profissionalizantes gratuitos que permitam geração de renda também foram mencionados. A união com outras mulheres negras permite que se possa interagir com outras pessoas que passam pelas mesmas experiências, situações, dificuldades, alegrias e possibilidades. Isso favorece que as mulheres percebam que não estão sozinhas ao compartilhar dores, lutas, sofrimentos e alegrias e se reconhecer na experiência umas das outras. Nesse processo, a ideia de coletividade pode ser desenvolvida e a mulher negra se fortalece para ajudar as outras. Essa vivência, enquanto grupo, precisa ser possibilitada e estimulada também no âmbito das políticas públicas. Ter rede de apoio foi apontado como importante para o empoderamento de mulheres negras, que envolve vínculos familiares e comunitários fortalecidos. Já a participação na vida pública envolve protagonismo e participação social por meio de reivindicações de novas formas (mais valorizadas) das mulheres serem entendidas e tratadas na sociedade. Envolve também a participação social enquanto usuárias de políticas públicas. O pertencimento comunitário é um mecanismo de empoderamento ao permitir que as mulheres negras se sintam acolhidas em oposição ao ambiente de rejeição no qual geralmente são socializadas. Relações mais igualitárias com os companheiros(as) amorosos(as) favorece o empoderamento das mulheres negras e significa elas não serem submissas e dependentes do companheiro, para que possam tomar decisões que afetam sua vida sem barreiras provenientes dessa relação. Melhoria no acesso à saúde possibilita melhorar as condições de saúde das mulheres negras. A saída do empobrecimento reduz as chances de as mulheres negras estarem em situação de vulnerabilidade, ou seja, quando as necessidades básicas estão satisfeitas, isso permite que elas possam ser mais autônomas e possam investir em outras dimensões da vida. Um relato ilustrativo de um dos mecanismos mais frequentes está disponível a seguir:

[...] É porque tem o desemprego, né. Porque antes eu trabalhava fichada, hoje eu trabalho com diária. É o que tá dando para viver hoje. Mas assim, a complicação é essa: o desemprego [...] Rapaz até eu me pergunto isso. Com esse valor a gente está levando, correndo atrás de emprego, né. Então, por eu ser negra passo muito por preconceito. Às vezes eu vou chegando na entrevista e as pessoas olha assim e falam assim: uma negra? (risos) Nem dá a oportunidade, já olha para pessoa e não dá oportunidade (Participante 18 - Mecanismo: Oportunidade de trabalho para obter renda).

Empoderamento no Nível Macro

O empoderamento de mulheres negras passa pela existência de políticas públicas em várias áreas, tais como: acesso à moradia, alimentação e mobilidade; combate à violência contra as mulheres; reparação da exploração histórica da população negra; favorecimento do acesso das mulheres negras à educação; melhoria das condições de vida das mulheres negras; redução da desigualdade social; combate ao racismo; e políticas públicas que considerem as especificidades de gênero e que tenham a mulher como referência. Segundo as entrevistadas, o empoderamento das mulheres negras também pode ser favorecido pela representatividade positiva nas mídias como na televisão, nas propagandas, nas revistas, nos veículos de comunicação e nos espaços públicos, em que as mulheres negras não sejam representadas como objeto, mas sim como donas de seu próprio querer. A política é outra área que precisa ser contemplada. O resgate da história da população negra com uma visão mais positiva, justa e crítica é um mecanismo que pode favorecer o empoderamento de mulheres negras. Esse resgate precisa fazer oposição à imagem triste e depreciativa que geralmente acompanha a história das raízes negras. Nesse nível também apareceu como promotor de empoderamento o reconhecimento da educação não formal na sociedade, ou seja, de saberes da população que vão desde cuidados com a saúde até formas de viver e nutrir e que são passados de geração em geração e da transmissão oral afrocentrada, especialmente aquela a partir do convívio cotidiano entre mulheres. O empoderamento pode ser favorecido com a mudança da cultura atual para uma cultura de maior equidade assim como com o interesse e ação de políticos para proteger as mulheres negras e o combate ao racismo com leis mais severas de combate e redução do preconceito contra esse grupo. As ações de empoderamento deve ter foco nas mulheres pobres, pois são essas mulheres que são mais afetadas. Combate ao sexismo que, junto com o racismo, limita as possibilidades de condições dignas de trabalho e ocupação de alguns espaços na sociedade. Por fim, o empoderamento de mulheres negras pode ser favorecido pela discussão sobre racismo institucional no mercado de trabalho. O relato da Participante 11 ilustra um dos mecanismos mais frequentes.

[...] E aí a gente fala de políticas específicas para a educação, a gente já tem as cotas raciais; que foi um grande avanço para o acesso das mulheres no ensino superior, das mulheres negras, da juventude negra no ensino superior. [...] Mas também que a gente possa ter políticas públicas que sejam voltadas para a melhoria das condições de vida dessa população, né (Participante 11 - Mecanismo: Políticas públicas).

Discussão

Os mecanismos de empoderamento de mulheres negras apontados nos resultados do estudo estão localizados nos três níveis de análise micro/pessoal, meso/comunitário e macro/social. Isso corrobora abordagens que compreendem o conceito a partir de uma perspectiva multidimensional (Cyril et al., 2016; Huis et al., 2017) e ressalta a importância de não se adotar apenas um foco individual. A percepção das participantes sobre empoderamento incluiu, além de mudanças individuais e interacionais, aspectos de mudanças concretas na sociedade para as quais elas podem contribuir, mas que dependem de esforços coletivos também em nível societal como criação e fortalecimento de políticas públicas e mudança da cultura atual para uma cultura de maior equidade. Ao longo das últimas décadas, propostas de empoderamento com focos individuais foram sendo associadas a ideias de realização, sucesso e autonomia pessoal, consoantes com a lógica capitalista neoliberal (Hamlin & Peters, 2018). Práticas derivadas dessa associação, por adotarem um viés individualista e meritocrático, pouco contribuem para empoderar mulheres. Sentir-se fortalecido, empoderado, sem o ser, ou seja, sem conseguir de fato transpor barreiras externas, contribui para legitimidade de dimensões liberais, aponta Miraftab (2004). Segundo o autor, o empoderamento com foco individual, apesar de poder de fato melhorar a situação econômica individual e a possibilidade de tomada de decisão nos níveis pessoal e interpessoal, não impacta a base sistêmica da pobreza e opressão, e perpetua hierarquias sociais de raça, gênero e classe. Na contramão dessa lógica, Hamlin e Peters (2018) assinalam que o empoderamento de mulheres negras depende de ações políticas que levem em consideração as associações íntimas entre racismo, classismo e sexismo – o que aponta, mais uma vez, para a dimensão estrutural do problema e suas soluções coletivas.

Os mecanismos apontados pelas participantes estão em consonância com estudos de autoras do movimento feminismo negro (Carneiro, 2009; Collins, 2019; Davis, 2017; Hooks, 2015; Kilomba, 2019), para o qual empoderamento de mulheres negras é uma das temáticas centrais e só é possível a partir da existência de vários elementos que se correlacionam e interagem, criando contextos que o influenciam e são influenciados por ele. Consistentemente com os resultados obtidos neste estudo, alguns dos mecanismos já apontados são: reconhecimento de si mesma como uma mulher negra; consciência crítica sobre a realidade e expressões de racismo (Collins, 2019; Kilomba, 2019); identificar-se como cidadã e sujeito de direitos, podendo se ver representada nas propostas da sociedade; acesso à educação libertária e de qualidade (Hooks, 2015); acesso à saúde integral; oportunidade de ter emprego como meio de emancipação e independência financeira (Davis, 2017; Collins, 2019); consolidação de uma rede de apoio; união com outras mulheres negras (Collins, 2019; Kilomba, 2019); políticas públicas que buscam caminhos de reconstrução das bases sociopolíticas para além das vertentes estruturais de opressão, tratando mutuamente questões de opressões de gênero, raça e classe (Collins, 2019); representatividade nas mídias que possuam uma narrativa de reparação, fortalecimento e transformação econômica, social, histórica, cultural, psicológica e identitária para mulheres negras (Carneiro, 2009); dentre outros.

Os mecanismos do nível micro/pessoal apontados pelas participantes também já foram abordados por diversos autores e autoras ao discutirem os efeitos psicossociais do racismo e do sexismo que afetam a dinâmica psicológica e as relações (afetivas, familiares, profissionais e sociais) (Kilomba, 2019; Sousa, 1983). Ao aprender que seu grupo de gênero e raça são desvalorizados dentro da cultura dominante, essa percepção molda a visão que mulheres negras tem sobre si mesmas e sua interação com os outros. Para Frantz Fanon (2008, p. 65), o racismo produz uma “valia psicológica”, ou seja, um sentimento de diminuição que vai sendo construído ao longo da vida em pessoas negras. O contexto racista, segundo o autor, cria o sentimento de inferiorização, uma vez que ela já está objetivada, que molda o autoconceito e afeta negativamente a autoestima e autoeficácia. Racismo e sexismo estruturais sustentam (e são sustentados por) expressões também no nível interpessoal, que se expressam por meio de estigmas, estereótipos, preconceitos e discriminações. O processo de conscientização sobre as dinâmicas relacionais nas quais está inscrito contribuiria para o agir em busca de mudanças estruturais. Sousa (1983, p. 12) também explorou o repúdio à cor negra e ao corpo como um dos efeitos do racismo. Nesse processo também está envolvido o não reconhecimento de si como pessoa negra, dada a dificuldade de se reconhecer naquilo que é odiado. Vale lembrar que, como apontou Crenshaw (2002), no caso das mulheres negras, além do racismo, sexismo, classismo, capacitismo, homofobia, dentre outros sistemas de opressão, configuram as experiências desse grupo.

No nível meso, grande parte do grupo de usuárias de CRAS apontou oportunidade de emprego para obter renda como um dos mecanismos de empoderamento. Há estudos consistentes na literatura sobre microfinanças e empoderamento de mulheres (Whitehead et al., 2016). Estudos sobre intervenções que visam impactar a renda das mulheres para promover empoderamento, como estratégias de microfinanciamento, apontam efeitos como aumento da confiança em si mesma, capacidade de expressar suas ideias, participação na tomada de decisão, independência, autonomia, melhoria na autoestima e confiança no futuro (Aguilar-Pinto et al., 2017). Embora a renda tenha sido apontada como um elemento importante para o processo de empoderamento, os resultados do estudo sugerem que ela deve estar atrelada aos outros mecanismos.

Os resultados também dialogam com os estudos de Whitehead et al. (2016) sobre o controle do ambiente de vida, tanto por apontarem mecanismos nos três níveis explicativos possíveis para o empoderamento, quanto aos elementos evidenciados em cada dimensão. Os mecanismos no nível individual, como autoestima e autoeficácia, podem influenciar as crenças sobre o controle do ambiente de vida. Da mesma forma, os mecanismos identificados no nível meso se referem a interações estabelecidas com indivíduos e com o contexto de vida, como união com outras mulheres negras, rede de apoio e participação na vida pública. Os resultados no nível macro apontam para processos culturais e políticos, tais como o combate ao racismo e sexismo, representatividade e criação e aprimoramento de políticas públicas que também é ponto de partida de um caminho explicativo que influencia o controle sobre o ambiente de vida.

Implicações Práticas

Os resultados deste estudo podem fornecer direções importantes para a promoção de saúde de mulheres negras. Considerar as especificidades dos mecanismos de empoderamento para mulheres negras é relevante, uma vez que estudos apontam relações entre racismo sofrido (e percebido) por pessoas negras e desfechos em saúde. Diversas pesquisas têm demonstrado que a discriminação racial gera desfechos negativos na saúde física e mental (Werneck, 2016; Williams & Priest, 2015). A revisão de literatura conduzida por Krieger (2014) sobre os impactos da discriminação na saúde apontou forte relação com desfechos piores em saúde mental (depressão ou sofrimento psíquico, por exemplo). Lewis, Williams, Peppers, & Gadson (2017) também apontam que microagressões raciais de gênero, que são expressões verbais, comportamentais e ambientais sutis de frequência cotidianas de opressão com base na interseção de sua raça e gênero, geram impactos negativos na saúde física e mental. Portanto, é fundamental que a compreensão desses processos esteja presente no percurso de formação profissionais da saúde.

A literatura internacional apresenta algumas experiências de intervenções para o empoderamento de mulheres negras como programas de atenção primária em saúde para famílias afrocolombianas (Barreto-Zorza & Velásquez-Gutiérrez, 2016). Essas e outras intervenções adotam maior foco na dimensão individual. Concorda-se com Huis et al., (2017) que salientam que a direcionalidade da mudança que o empoderamento propõe não pode ser fixa. Esse é um ponto relevante a ser considerado, pois significa que o processo não necessariamente precisa partir do indivíduo (micro) em direção a mudanças externas (meso e macro), como é assumindo por muitos estudos que focam o empoderamento individual. Mudanças ambientais, como as propostas por políticas afirmativas, promovem mudanças externas que também podem impactar o nível individual (intrapsíquico e comportamental). Vale ressaltar que existem processos históricos e sociais que estão profundamente enraizados na dinâmica social, como o racismo, o sexismo e o classismo, que fortalecem as barreiras externas e tornam insuficiente o alcance da remoção de barreiras internas (fortalecimento da autoestima e autoeficácia, por exemplo) para transformar essa estrutura, pois as relações de poder que a sustentam resistem em ser alteradas. Dessa forma, ainda que intervenções foquem um ou dois níveis, não se pode perder o todo de vista, pois corre-se o risco de continuar responsabilizando unicamente as mulheres negras por mudanças estruturais, ocorrendo, assim, como afirma Miraftab (2004), uma individualização despolitizada da noção de empoderamento.

Considerações Finais

O presente estudo identificou mecanismos que podem funcionar como pistas a serem seguidas em estudos futuros, desenvolvimento de intervenções e elaborações de políticas públicas que tenham como alvo as mulheres negras brasileiras. Ainda que iluminadores, estes achados não podem ser tomados como o que pensam as mulheres negras brasileiras em geral, sendo esta a maior limitação desse estudo. Os resultados deste estudo permitem tecer algumas recomendações que podem guiar estudos futuros: (a) é crucial a adoção de uma perspectiva multidimensional do empoderamento de mulheres negras; (b) os estudos na área podem ser enriquecidos se fizerem uso de uma perspectiva de interseccionalidade, uma vez que as experiências são atravessadas por eixos estruturantes como raça, gênero, classe, sexualidade, dentre outros; (c) abertura para a contribuição de outras áreas do saber faz-se necessária, uma vez que empoderamento é um fenômeno complexo que perpassa as várias dimensões da vida; (d) intervenções que objetivem promover o empoderamento de mulheres negras precisam considerar os níveis nos quais os mecanismos operam; (e) é necessário que haja maior investimento em avaliação do empoderamento de mulheres negras, tanto como processo quanto resultado.

Referências

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