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A “PEC das domésticas” e os enquadramentos midiáticos sobre o trabalho de mulheres1
Clarisse Goulart Paradis; Rayza Sarmento
Clarisse Goulart Paradis; Rayza Sarmento
A “PEC das domésticas” e os enquadramentos midiáticos sobre o trabalho de mulheres1
The constitutional amendment bill on domestic workers in Brazil and the media frameworks on women’s work
La “PEC de las empleadas domésticas” y los encuadramientos mediáticos sobre el trabajo de las mujeres
Sociedade e Cultura, vol. 19, núm. 2, pp. 83-94, 2016
Universidade Federal de Goiás
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Resumo: Este trabalho analisou os enquadramentos disponíveis na mídia brasileira sobre a PEC das Domésticas durante a semana de sua promulgação. O referencial teórico utilizado para a análise de quinze textos publicados nos periódicos Folha de S. Paulo e Veja foi oriundo da Sociologia do Gênero, em especial, dos estudos voltados para o trabalho doméstico majoritariamente realizado por mulheres. O artigo aborda as múltiplas desigualdades enfrentadas por essas mulheres em seu ambiente de trabalho, bem como as discussões sobre os laços afetivos que atravessam essas relações e o uso diferenciado do tempo para mulheres e homens. A partir de uma análise qualitativa, identificamos os três enquadramentos principais a guiar a construção das notícias utilizadas no estudo: o dos direitos, o das relações pessoais e o do mercado. Observamos ainda nas notícias a ausência do debate sobre o papel do Estado no oferecimento de condições para que haja melhor conciliação entre esfera pública e privada.

Palavras-chave:mídiamídia,gênerogênero,trabalho domésticotrabalho doméstico,mulheresmulheres.

Abstract: This paper analyzed the available frameworks in the Brazilian media on the Constitutional Amendment Bill on domestic workers, during the week of enactment. The theoretical framework for the analysis of fifteen articles published in Folha de S. Paulo newspaper and Veja magazine came from sociology of work and gender studies, especially the discussion about the mostly female domestic work and its inequalities, the emotional ties that cross these relationships, as well the time use patterns between women and men. From qualitative analysis, we identified the three main frameworks that guided the structure of news: the rights, personal relations and the market. We also observed in the news the absence of debate about the state’s role in providing conditions to better balance conciliation between public and private sphere.

Keywords: media, gender, domestic labor, women.

Resumen: En este trabajo se analizan los marcos disponibles en los medios de comunicación brasileños sobre el proyecto de ley de enmienda constitucional sobre las trabajadoras domésticas, durante la semana de su promulgación. El marco teórico para el análisis de quince artículos publicados en el diario Folha de S. Paulo y en la revista Veja viene de la sociología del trabajo y de los estudios de género, especialmente la discusión sobre el trabajo doméstico en su mayoría hecho por mujeres y sus desigualdades, los lazos emocionales que atraviesan estas relaciones, así como los modelos de uso del tiempo entre hombres y mujeres. A partir del análisis cualitativo, se identificaron tres marcos principales que guiaron la estructura de las noticias: los derechos, las relaciones personales y el mercado. También hemos observado, en las noticias, la ausencia de debate sobre el papel del Estado en la oferta de condiciones para una mejor conciliación entre la esfera pública y la privada.

Palabras clave: medios de comunicación, género, trabajo doméstico, mujeres.

Carátula del artículo

Artigos Livres

A “PEC das domésticas” e os enquadramentos midiáticos sobre o trabalho de mulheres1

The constitutional amendment bill on domestic workers in Brazil and the media frameworks on women’s work

La “PEC de las empleadas domésticas” y los encuadramientos mediáticos sobre el trabajo de las mujeres

Clarisse Goulart Paradis
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Rayza Sarmento
Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Sociedade e Cultura, vol. 19, núm. 2, pp. 83-94, 2016
Universidade Federal de Goiás

Recepção: 11 Abril 2016

Aprovação: 24 Outubro 2017

Introdução

“A Marly nunca vai embora. Quando eu tiver minha própria casa, ela vai comigo.” A frase, publicada no jornal Folha de S. Paulo, é de Rocco, uma criança de oito anos, e Marly é a empregada doméstica de sua casa. Desde o dia 1º de abril de 2013, ao menos em tese, ela teve garantidos novos direitos para o exercício de sua profissão. Nessa data, foi publicada a emenda constitucional número 72, conhecida como “PEC das Domésticas”, que dispôs sobre o pagamento de horas extras, FGTS, adicional noturno e multa por demissão dentro da categoria. Este trabalho propõe-se a analisar os enquadramentos disponíveis na mídia brasileira sobre a referida emenda, as fontes mobilizadas para falar do assunto e a forma como o tema do trabalho doméstico ganhou visibilidade a partir da aprovação da PEC. Para avaliar essas discussões, mobilizaremos o referencial teórico oriundo da Sociologia do Gênero, especialmente os estudos sobre o trabalho de mulheres e sobre as desigualdades de diferentes níveis que as afetam nos postos trabalhistas.

Ao trabalho doméstico são dedicados estudos relativos à dificuldade de remunerar uma profissão cujas relações são atravessadas por laços afetivos e por opressões, entre outras questões. De acordo com Bruschini (2007), mais de seis milhões de mulheres no Brasil são empregadas domésticas, e tal atividade, exercida em condições trabalhistas precárias, envolve jornadas de trabalho exaustivas, rendimentos baixos e pouca formalização do trabalho com a assinatura de carteira, índice que não chega a 25%.

Neste texto analisaremos as notícias referentes à PEC disponíveis no jornal e na revista de maior circulação nacional (Folha de S. Paulo e Veja) durante a semana de promulgação do documento (dos dias 1º a 7 de abril de 2013). Aplicaremos a metodologia de análise de enquadramento, inspirada nos estudos de Goffman (1974), a fim de entender quais feixes de interpretação ganharam maior relevância na cobertura jornalística supracitada.

O que se disse sobre os novos direitos de trabalhadoras como Marly? Quem foi ouvida/o, como fonte legítima, para tratar das implicações da PEC e do trabalho doméstico? Como entender a fala do menino Rocco, que diz querer, tal qual se faz com um objeto, levar Marly, quando adulto, para sua casa? Essas são algumas questões que tentaremos responder a seguir. Antes, apresentaremos o referencial teórico que circunscreve nossa discussão.

1. O emprego doméstico remunerado no contexto da divisão sexual do trabalho no Brasil

O campo de estudos que buscou investigar as conexões entre as relações sociais de sexo e o trabalho, no interior da Sociologia, partiu de críticas contra a cegueira dos estudos precedentes às especificidades das mulheres. O conceito de divisão sexual do trabalho passou a ser noção fundamental para resolver essa inconsistência. Segundo Helena Hirata e Danièle Kergoat (2007), essa expressão tem duas acepções. Ela diz respeito à desigual distribuição de homens e mulheres no mercado de trabalho, nas formas de ofícios e nas profissões estabelecidas e ainda à divisão desigual do trabalho doméstico entre ambos os sexos. A partir do conceito referido, é possível compreender a desvalorização e a precarização envolvidas no trabalho doméstico, sobretudo o remunerado.

As autoras propõem pensar dois princípios da divisão sexual do trabalho: o princípio da separação, ou seja, é socialmente entendido que alguns trabalhos são femininos, enquanto outros são masculinos; e o princípio da hierarquia, em que o trabalho exercido pelos homens tem maior valor do que aquele exercido pelas mulheres (Hirata; Kergoat, 2007). Com as novas possibilidades analíticas e metodológicas proporcionadas pela problematização da divisão sexual do trabalho, foi possível repensar a esfera da família como espaço de exercício do trabalho reprodutivo e também a imagem do trabalhador assalariado como homem – branco e qualificado (Hirata; Kergoat, 2007).

O fenômeno social em pauta também pode ser entendido com base nas teorias e práticas do care. Poderíamos simplesmente utilizar na tradução do termo a palavra cuidado, mas, como afirma Hirata (2010), o conceito de care é polissêmico e não facilmente traduzido como tal. Pode ser entendido de diversas formas, significando “cuidado, solicitude, preocupação com o outro, estar atento a suas necessidades” (Hirata, 2010, p. 43).

De acordo com Joan Tronto (1997, p. 196), no roteiro tradicional dos estudos sobre cuidados2 exigidos dos homens e mulheres, as mulheres fazem essa tarefa, enquanto os homens se ocupam de coisas “mais importantes”, como o sustento familiar, o dinheiro, o progresso etc. Cuidar seria, portanto, uma atividade marcada pelo gênero feminino, tanto no âmbito familiar quanto no mercado – as mulheres são as que exercem a maior parte das atividades de cuidados (Tronto, 1997). Segundo a autora, cuidar também é relacional, implica responsabilidades mútuas, envolve necessidades físicas e psíquicas e diz respeito à dependência que todos os seres humanos experimentam, em algumas ou em todas as fases da vida.

Todas essas interpretações estão contidas no processo de profissionalização do care. Segundo Hirata (2010), esse processo está em expansão graças a dois fatores: os fenômenos da globalização e da migração, em que mulheres do Sul migram para países do Norte a fim de exercer atividades remuneradas na área do care; o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para os cuidados das pessoas.

No que se refere ao trabalho das empregadas domésticas, é possível pensá-lo no âmbito dos trabalhos do care. Deixar uma casa limpa, cozinhar os alimentos, lavar e passar roupas são tarefas que, de alguma forma, objetivam a saúde, o bem-estar e o cuidado dos moradores daquele lar. São trabalhos que atendem às necessidades físicas e psíquicas das famílias. Além disso, segundo Hirata (2002), muitas empregadas domésticas acabam por se ocupar diretamente do cuidado de crianças e idosos, sem, no entanto, serem reconhecidas como cuidadoras. A autora chama a atenção também para os problemas de saúde da pessoa que realiza trabalhos do care – isolamento, esgotamento físico e psíquico, dores musculares, exposição a acidentes e agressões físicas e verbais.

Dentro do cenário mundial da divisão sexual do trabalho, o trabalho doméstico remunerado está inserido no seguinte contexto: fluxos migratórios;3 implementação das políticas neoliberais, em que os empregos formais diminuem, e as funções de bem- -estar atribuíveis ao Estado passam a ser resolvidas de maneira privada; bipolarização das ocupações femininas, isto é, enquanto parcela das mulheres se insere no mercado de trabalho, com rendimentos relativamente superiores e com níveis altos de escolaridade, permanece um contingente de trabalhadoras informais, ganhando baixos salários e em setores precários; falta de opções públicas para conciliação entre trabalho e família (Georges, 2011; Hirata; Kergoat, 2007; Bruschini; Lombardi, 2003; Sorj et al., 2007; Nogueira; Jacino, 2013).

O número de mulheres ocupando postos de trabalho altamente qualificado e com jornadas extensas é expressivo, e o resultado disso é a externalização do trabalho doméstico por meio da contratação de outras mulheres para exercê-lo (Hirata; Kergoat, 2007). Existem algumas consequências dessa nova configuração da divisão sexual do trabalho: a intensificação das diferenças de classe nas relações entre as mulheres; o aparecimento de uma “nova classe servil”; a harmonização das tensões entre os casais das classes abastadas; a maior flexibilidade das mulheres profissionais em relação ao seu emprego; as novas percepções sobre as relações familiares burguesas em virtude da visão de equidade entre componentes da família (Hirata; Kergoat, 2007, p. 602).

É necessário compreender também o perfil do emprego doméstico no Brasil e como as conexões entre classe, raça e gênero marcam o lugar das empregadas domésticas no contexto social brasileiro. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, 7,2 milhões de brasileiros e brasileiras estavam empregados naquele ano como trabalhadores domésticos, sendo que 93% desses eram mulheres (6,7 milhões), 62% eram negros (4,4 milhões) e 91% se encontravam em áreas urbanas (um terço nas regiões metropolitanas) (Ipea, 2012). Como afirma Isabel Georges (2011), o emprego doméstico faz parte de, ao menos, algum momento da vida das mulheres dos meios populares. De acordo com uma nota técnica do Ipea (2012), essa é ainda a maior categoria ocupacional entre as mulheres trabalhadoras no Brasil. No entanto, algumas mudanças no perfil de idade e nos formatos de empregabilidade foram acontecendo a partir dos anos 2000.

Há um aumento na idade média dessas mulheres, que passam de 30 anos em 1995 para quase 38 anos em 2009 (Ipea, 2012), o que revela que as mulheres mais jovens, com novas oportunidades de escolarização, buscam uma inserção alternativa no mercado de trabalho, fugindo da precarização e do estigma associado ao emprego doméstico (Ipea, 2012; Bila Sorj, 2008). Além disso, há um crescimento significativo do número de trabalhadoras diaristas. Estas trabalhadoras costumam ter acesso a maior rendimento, ter jornada de trabalho menor e mais flexível e relações de trabalho mais profissionais (Ipea, 2012). No entanto, são vítimas de maior desproteção social e precarização no que diz respeito às relações trabalhistas.

Apesar do cenário descrito, o modelo que prevalece é o das empregadas domésticas mensalistas em regime informal e cuja única ocupação é o emprego doméstico. A questão da formalização é ainda um grande desafio. Apenas cerca de um quarto das empregadas domésticas possuem carteira assinada (Ipea, 2012), o que demonstra que as ocupadas nesse segmento são bastante desprotegidas. Apesar de sua baixa incidência, a formalização aumentou. Em 1995, 18 em cada 100 empregadas domésticas tinham carteira assinada; em 2009, essa proporção passou a 26 para cada 100.

As longas jornadas de trabalho também fazem parte das características precárias do emprego doméstico. Em média, as trabalhadoras domésticas com carteira assinada trabalham 43 horas por semana, sendo que 40% delas possuem jornadas superiores a 44 horas semanais (Ipea, 2012), ultrapassando a jornada estabelecida pela Constituição. A jornada é maior entre as que possuem carteira assinada em comparação com as diaristas ou com as mensalistas não formalizadas. Quanto ao rendimento, em 2009, as trabalhadoras domésticas ganhavam, em média, um salário 17% menor do que o salário mínimo.4 O rendimento era maior entre diaristas e entre as formalizadas.

Além de ser uma atividade feminina, o trabalho doméstico remunerado é também uma atividade fortemente marcada pelo componente étnico-racial. Ao longo das décadas, desde o fim da escravidão, essa ocupação tem sido a principal entre as mulheres negras. Portanto o emprego doméstico é, em grande parte, responsável pela circulação de recursos entre as comunidades negras e pela manutenção das desigualdades raciais no Brasil, guardando relação com o passado escravocrata brasileiro (Xavier; Werneck, 2013; Nogueira; Jacino, 2013; Georges, 2011).

Essa realidade é exemplificada pela fala de uma militante do movimento negro, Laudelina de Campos Mello, que fundou a primeira Associação das Empregadas Domésticas do Brasil, em 1936, na cidade de Santos: “a situação da empregada doméstica era muito ruim, a maioria daquelas, antigas, trabalhavam 23 anos e morriam na rua pedindo esmolas. Lá em Santos a gente andou cuidando, tratou delas até a morte. Era um resíduo de escravidão, porque era tudo descendente de escravos” (Mello apud Nogueira; Jacino 2013, p. 288).

Bruschini e Lombardi (2003), ao analisar as diferenças de gênero e raça no mercado de trabalho do Brasil na década de 1990, constataram que as condições de trabalho das empregadas domésticas negras eram piores do que aquelas experimentadas pelas trabalhadoras domésticas brancas – as mulheres negras entravam mais jovens na ocupação, eram maioria entre as que residiam no domicílio de trabalho, experimentavam jornadas de trabalho maiores e tinham menos acesso à carteira assinada. Os dados anteriores mostram algumas melhoras nas condições de trabalho em geral, mas a situação das mulheres negras não se alterou significativamente após os anos 2000.

Além disso, dados apresentados por Xavier e Werneck (2013) mostram que as mulheres negras ocupadas gastam mais horas de trabalho doméstico não remunerado (22 horas por semana) do que as mulheres brancas ocupadas (20,3 horas por semana). Para as autoras, diante da situação de exploração no mercado de trabalho e de acentuada pobreza nos domicílios das mulheres negras, o trabalho doméstico não remunerado é exercido ali em condições de “espoliação, insalubridade e estresse” (p. 273). Como foi possível perceber na seção anterior, o emprego doméstico tal como ele é exercido no Brasil faz com que o fosso entre as mulheres se torne maior, pois opera uma separação de condições entre brancas e negras, entre pobres e não pobres.

De acordo com Isabel Georges (2011), além de carregar o estigma oriundo da escravidão, o emprego doméstico é marcado por relações “pater(mater) nalistas” no trabalho. O fato de o local de trabalho ser a casa do empregador significa, para a autora, que a personalização adquire uma função fundamental nesse tipo de trabalho, gerando ambiguidades importantes. Por exemplo, o que é profissional e o que é extraprofissional aparecem justapostos (Georges, 2011). Esse perfil está presente nas profissões do care, que acabam por se configurar em relações de trabalho que misturam afeto e dominação, solidariedade e hierarquia, relações pessoais e trabalhistas. Como esses profissionais lidam com o cuidado, estão lidando com relações de dependência e desigualdade.

As empregadas domésticas estão, portanto, na interseção entre o âmbito público e o âmbito privado (Georges, 2011). O primeiro seria caracterizado pelas relações trabalhistas, pelos marcos legais e formais de ação, e o último, por um local de trabalho marcado pelas relações pessoais: a casa do empregador. Nesse contexto, o emprego doméstico estaria impregnado de relações “patern(mater)nalistas”. Esse aspecto será recorrente nos artigos jornalísticos a serem analisados na terceira seção deste artigo.

2. Trabalho doméstico de mulheres e visibilidade midiática

A promulgação da PEC das Domésticas tornou- -se um gancho importante para a cobertura midiática sobre o trabalho doméstico. Invisível de tão naturalizado, o trabalho exercido por mulheres, na maioria das vezes, em lares de outras mulheres, tornou- -se pauta, assunto a ser discutido, espraiando-se para além dos núcleos de estudo ou de ativismo onde era debatido. Olhar para a visibilidade midiática de um instrumento legal como esse é fundamental, dado que os meios de comunicação operam jogando luz sobre um determinado assunto e tornando potencialmente infinita a audiência sobre ele. E mais: são parte fundamental na construção de representações sociais e potencializadores de discursos presentes no tecido social (Gomes, 2004; Thompson, 1998).

Há diversas formas para entender e explicar a visibilidade de um assunto como a PEC das Domésticas, de caráter eminentemente político, nos media. Algumas pesquisas buscam olhar os meios midiáticos como responsáveis por aquilo que o público pensa, agendando a leitura e interpretação (agenda setting) desse público sobre os fatos narrados e atribuindo à mídia a apatia e desengajamento dos cidadãos (media malaise) (Putnam, 1995; Sartori, 2000). Existem também estudos que compreendem os meios de comunicação como parte da vida social e não como algo descolado dela (Maia, 2006). Não concordamos com uma leitura unidirecional dos meios de comunicação na qual os indivíduos fiquem reduzidos a agentes sem capacidade crítica de relacionar as informações veiculadas com sua própria experiência. Há uma relação muito mais complexa entre os indivíduos e os meios de comunicação, com processos de enfrentamento e resistência (Braga, 2006). Assim, nossa análise da cobertura jornalística sobre a PEC das Domésticas não se inscreve em uma tentativa de responsabilizar ou culpabilizar os meios de comunicação, mas de perceber como os sentidos mostrados nos jornais se relacionam com os demais âmbitos sociais onde se processa a discussão do documento.

Desde os anos 1970, uma série de estudos inscritos no campo feminista tenta pensar a relação entre gênero e mídia (Dow; Condit, 2005; Gill, 2007; Goffman, 1974; Mendes; Carter, 2003; Miguel; Biroli, 2011; Ross; Byerly, 2006; Van Zoonen, 1994). Esses estudos admitem que há uma desigualdade de gênero atravessando as representações midiáticas sobre mulheres, nas quais elas são desfavorecidas. Assim, eles buscam diagnosticar essa desigualdade, oferecer possibilidades de resistência e produzir conteúdos novos para contestar tais representações. Uma das conclusões mais proeminentes dessas pesquisas diz respeito ao lugar ocupado por mulheres nas notícias, especialmente como fontes prestadoras de informações, ou seja, como entrevistadas. De acordo com Ross e Carter (2011), apesar de não criarem desigualdades específicas, os media as reforçam, contribuindo para sua cristalização. As autoras sustentam que há uma sub-representação de mulheres na posição de fontes consultadas por pesquisadores e que estes ainda resguardam para elas assuntos específicos, focando mais suas “experiências pessoais” do que lhes concedendo o lugar de especialistas.

Este trabalho também dialoga com esses estudos, mapeados brevemente em Sarmento (2013). Destacamos a visibilidade conferida à PEC, dando foco especial a duas questões: o fato de o trabalho doméstico majoritariamente realizado por mulheres ter sido dotado de sentido nesse documento; o modo como são tratadas as questões sobre desigualdade de gênero pelos sujeitos que tematizam essa categoria profissional. Buscamos desvelar, sob uma perspectiva feminista e orientada pelas discussões sociológicas sobre as desigualdades no trabalho doméstico, os quadros de sentido construídos a partir de um documento tão importante para a vida das trabalhadoras brasileiras.

2.1 Metodologia

O corpus de análise foi construído por notícias relativas à promulgação da emenda, em 1º de abril de 2013. Coletamos todas as notícias disponíveis na Folha de S. Paulo e Veja durante a semana de 1º a 7 de abril. Para isso, utilizamos o mecanismo de busca online desses veículos, elegendo como chaves de busca as expressões “domésticas”, “PEC Domésticas” e “trabalho doméstico”.

Conforme já adiantamos, os veículos foram escolhidos por apresentarem, à época, os maiores números de circulação no país, ou seja, por fazerem parte da grande mídia brasileira, cujo contexto não podemos deixar de situar. No Brasil, é recorrente o discurso, dos próprios massmedia, de que a imprensa atua vigiando e fiscalizando o poder político formal. Albuquerque (2009) tem empreendido esforços para mostrar as peculiaridades das empresas de comunicação brasileiras no exercício dessa prática, conhecida como “quarto poder”. Segundo o autor, a função fiscalizadora da imprensa brasileira é bem menos acentuada do que na tradição americana. No Brasil a imprensa funciona mais como um árbitro dos demais poderes. “O que torna o caso brasileiro excepcional é o fato de que, nele, o jornalismo concilia um papel político ativo com a reivindicação do exercício de um lugar transcendental em relação às forças políticas particulares” (Albuquerque, 2009, p. 10). Embora poucos veículos declarem uma posição política explícita, estudos sobre vieses de cobertura têm mostrado como candidatos e políticas de esquerda ganham cobertura diferenciada dos demais, especialmente dos de centro-direita e conservadores (Aldé et al., 2007). É preciso reconhecer esse pano de fundo na análise dos textos, dado que a posição dos dois periódicos no assunto analisado se revela, por exemplo, no tipo de fonte ouvida com maior frequência nesse corpus, como veremos a seguir.

Na escolha do corpus, encontramos doze notícias no jornal e três na referida revista, eliminando os artigos de opinião de articulistas, pequenas notas e textos enviados por leitores, a fim de focarmos no gênero informativo. Trabalhamos com um universo de quinze textos, sem o estabelecimento de comparações entre os veículos analisados. Embora o elemento visual desses textos tenha muito a nos informar sobre os sentidos da PEC das Domésticas, a análise textual das notícias será nosso foco, excluindo-se a análise imagética.

Os textos estudados foram submetidos a uma análise qualitativa de enquadramento, inspirada na matriz goffmaniana da frame analysis. A expressão análise de enquadramento tem sido mobilizada em distintas operacionalizações (Mendonça e Simões, 2012; Reese, 2007) nas Ciências Sociais e na Comunicação. Diante da fama do termo e da frouxidão com que vem sendo empregado, Mendonça e Simões (2012) sistematizaram seus diferentes usos, advogando por uma compreensão mais próxima à encetada pelo texto de Goffman (1986), citado pelos autores. Segundo eles, em Goffman, frame (quadro) é “um conjunto de princípios de organização que governa acontecimentos sociais e nosso envolvimento subjetivo neles” (Goffman, apud Mendonça e Simões, 2012, p. 4). Um quadro é entendido “como uma espécie de ângulo que permite compreender uma interpretação proposta em detrimento de outras” (Mendonça; Simões, 2012, p. 12).

Ainda que a maioria dos estudos que utilizam a análise do enquadramento faça menção à inspiração goffmaniana, são marcantes as diferenças entre eles e Goffman. O uso mais comum dessa análise na Ciência Política é focado no efeito (framing effects) de um enquadramento para o público, o que seria contrário à própria noção goffmaniana de enquadramento (Mendonça; Simões, 2012; Reese, 2007). Afinal, “quadros” não podem ser entendidos como propriedade privada de um sujeito atuando sobre a consciência de outros.

Outra forma de operacionalizar a análise de enquadramento é aquela focada no conteúdo discursivo da mídia a fim de perceber como certos quadros de sentido emolduram a visibilidade de temas no cenário midiático (Gamson, 2011; Gamson; Modigliani, 1989, Ferre et al., 2002; Van Gorp, 2007). Compartilhando desse modelo, assumiremos aqui um processo metodológico que compreende quadros como “estruturas que desenham limites, estabelecem categorias, definem idéias” (Reese, 2007, p. 150, tradução nossa), guiando a interpretação, sem engessá-la. Entman (1993) afirma que as notícias são permeadas pela competição de enquadramentos, de relevância e silêncio, por isso é necessário levar em consideração o contexto sociocultural, político e histórico em que são produzidas.

Nosso esforço metodológico consistiu em criar uma ficha de catalogação com as matérias sobre a PEC, as fontes ouvidas e os argumentos dispostos nos textos selecionados. A releitura minuciosa dos argumentos, a partir do referencial teórico mobilizado, ajudou-nos a nomear os enquadramentos que guiam a compreensão da cobertura midiática no período estudado. Três grandes quadros de sentido nos ajudam a entender como a PEC das Domésticas tornou-se visível nos textos em análise. São eles: o enquadramento dos direitos, o enquadramento das relações pessoais e o enquadramento do mercado. Eles funcionam aqui como molduras de interpretação sobre a PEC nos media.

3 A PEC das Domésticas na mídia brasileira

Antes de demonstrar como esses quadros de sentido aparecem nas notícias utilizadas aqui, cabe discutir as fontes que foram mobilizadas nesses textos. Identificamos as falas diretas (entre aspas) e indiretas de uma fonte por matéria. Isto é, se em uma mesma matéria uma fonte foi ouvida duas vezes, só a contamos uma vez, a fim de avaliar a pluralidade, e não apenas a frequência de uma determinada fonte. Foram ouvidas 30 pessoas diferentes, agrupadas em 12 categorias,5 com um total de 41 inserções, o que significa que várias pessoas foram ouvidas em mais de uma matéria.

O gráfico abaixo mostra que as fontes mais ouvidas foram as do setor empresarial e especialistas, com 10 inserções cada, mais de 48% do total. Os empresários foram mobilizados, especialmente, para falar do possível aumento da terceirização de certas atividades, e os especialistas, para explicar e/ou comentar as implicações da PEC na economia, nos direitos e nas relações trabalhistas.


Gráfico 1
Números absolutos de fontes presentes nas notícias por categoría
Fonte: Construção nossa

O gráfico mostra uma baixa presença de vozes de empregadas domésticas e uma presença menor ainda de empregadoras/res ou patroas/ões. Há apenas uma fala (expressa por uma assessora jurídica) de representantes de movimentos sociais ou de classe ligados ao trabalho doméstico. Apesar de um dos textos mencionar a presença da representante do Sindicato Nacional de Trabalhadoras Domésticas na solenidade de promulgação da PEC, tal pessoa não é ouvida. É interessante também perceber que, se, por um lado, aparecem mulheres nos lugares de patroas e empregadas, esposas e mães, ainda que em menor escala, por outro, os homens só estão inscritos nos lugares de empresários ou especialistas. Não são chamados ao debate do uso do tempo implicado no trabalho doméstico. Essa distribuição das fontes nos textos ajuda-nos a compreender a estruturação dos enquadramentos a seguir.

3.1 Enquadramento dos direitos

Nomeado de enquadramento dos direitos, esse eixo de interpretação trata a PEC das Domésticas como conquista das garantias trabalhistas, dos principais direitos adquiridos com a emenda, tais como o horário de descanso e o pagamento de horas extras. O excerto abaixo mostra o foco das notícias nesse enquadramento.

Alguns direitos, como jornada máxima de 44 horas semanais ou 8 horas diárias de trabalho e o pagamento de hora extra, passam a valer imediatamente [...]. Renan [Calheiros, presidente do Congresso à época] classificou a promulgação da PEC de “dia histórico” para o Legislativo, semelhante à abolição da escravatura na história do país. (Congresso..., 2013).

A simplificação de certos tributos para o pagamento das contribuições pelas trabalhadoras também está inscrita nesse quadro, e tem em vista a necessidade real, dizem as fontes, de implementar a norma. Afinal “os lares brasileiros não têm contador nem recursos humanos, por isso temos que criar um dispositivo para não deixar dúvidas sobre os direitos das domésticas” (Senado..., 2013).

Mas, se houve um reconhecimento público desses direitos, os jornais deram vazão também à preocupação dos patrões com as novas obrigações dispostas na PEC, que, em sua opinião, podem onerar ou complicar as famílias. Ou seja, há também uma discussão sobre a necessidade de os direitos dos patrões/ as ou empregadores/as se adequarem às novas regras, argumento travestido em temor de insurgência das domésticas contra eles.

Segundo Dias [Manoel Dias, então ministro do Trabalho], é importante adotar sistemas de controle para os horários de entrada e saída de funcionários, uma espécie de folha de ponto. “Nada muito complexo, basta um papel indicando entrada e saída. É um controle, uma prova. É bom ter como precaução”. (Tributo..., 2013).

Mas, antes de pôr ordem na situação, a nova PEC deverá complicá-la um pouco. Por exemplo: fazer um chá para o patrão ou brincar com as crianças da casa será trabalho ou não? Por lei, o que for ordenado é trabalho, mas o que for voluntário não [...]. É o tipo de situação que poderá abrir as comportas para uma avalanche de processos judiciais, não necessariamente fundamentados, contra patrões. (Nada..., 2013).

Em um momento anterior à conquista de direitos trabalhistas por meio da PEC, as discussões teóricas de Georges (2011) já haviam mostrado como o cruzamento entre público e privado envolvido nos trabalhos do care, tal qual o doméstico, é atravessado por negociações e conflitos. A autora pontua que a garantia de direitos cria diferenças, por vezes insustentáveis, entre patrões e empregadas. A dificuldade em reconhecer essas garantias à empregada doméstica se deve ao fato de a atividade do care ser entendida como “uma extensão de sua função ‘natural’ de esposa e mãe”; sem falar da extrema desigualdade presente nas relações entre empregadores/as e empregadas e da “ampliação da margem de manobra” contra elas “em face de sua dependência social e econômica” (Georges, 2011, p. 112).

Esses argumentos tornam ainda mais clara a naturalização do trabalho doméstico tal qual foi historicamente tratado na sociedade brasileira. Se, de um lado, entende-se a força da conquista referida, de outro, há também uma ponderação de fundo moral e político muito grande no discurso de certa camada da sociedade, temerosa de sair de uma zona de conforto possibilitada pela não regulamentação dos direitos, agora previstos na PEC.

No enquadramento dos direitos, encontram-se também discursos que estabelecem a comparação internacional da emenda com a situação de outros países. A maioria desses discursos traz o cenário diferenciado dos Estados Unidos e países da Europa, por exemplo, nos quais a mão de obra doméstica não é tão frequente quanto no contexto brasileiro.

Na Califórnia, onde a maioria das domésticas é latino-americana, uma lei foi aprovada pela Assembleia Legislativa, mas acabou vetada pelo governador, o democrata Jerry Brown [...]. Em Illinois, onde as empregadas são, na maioria, imigrantes polonesas, também se discute lei específica. [...]. Por enquanto, nada se falou das domésticas nos Estados Unidos, para as quais a nova lei brasileira – quem diria – não passa de um sonho. (Saindo..., 2013).

Esse argumento comparativo sobre os (não) direitos das domésticas nos Estados Unidos e Europa é uma preocupação da literatura do care. Hoschschild (2012) discute o aumento do fluxo migratório de mulheres para esse tipo de trabalho em tais países nos últimos quarenta anos. Conforme o autor, não se trata de mera escolha individual, mas de um processo inscrito em uma dinâmica global. E uma das consequências desse cenário para as migrantes é “enfrentar as dilacerantes rupturas na sua relação com a própria família” (p. 186). Tal dimensão afetiva envolvida nesse processo migratório não é tematizada, entretanto, na comparação realizada no cenário midiático. Já nas matérias focadas no contexto brasileiro, o imbricamento entre trabalho e afeto está presente, como mostra o próximo enquadramento.

3.2 Enquadramento das relações pessoais

No enquadramento das relações pessoais, estão os argumentos que tematizam outras relações, além das trabalhistas, entre domésticas e empregadores/as. Laços de afeto, de vivência e história atravessam a presença da doméstica na casa dos patrões. No caderno infantil da Folha, Maria Diomar dos Santos, empregada doméstica da casa de uma menina chamada Helena, sintetiza essa relação: “É minha família também. Helena é como se fosse milha filha” (Ordem..., 2013). Essa interseção entre trabalho e afeto é percebida na literatura sobre o tema. Sorj et al. (2007) afirmam que, especialmente nas classes em que há mais mulheres em postos de trabalho com melhor remuneração, “a contratação de empregadas domésticas preenche a lacuna das mães no domicílio durante o período em que as crianças voltam para a casa”.

Essa atividade trabalhista permeada por questões pessoais também abre espaço para opressões veladas. Um argumento presente nos jornais é que, com a PEC, essa confusão entre trabalho e família vai ser alterada. Ouvida pela revista Veja, a historiadora Mary Del Priore pontua essa ambiguidade no emprego doméstico, que mistura “exploração e solidariedade”.

A situação acabava gerando intimidade, mas não anulava o caráter de exploração da relação [...]. Assim, dizer que Maria é “como se fosse da família” pode ser uma verdade em termos sentimentais, mas pode também ser uma crença que resulta no escamoteamento de obrigações empregatícias – se Maria é praticamente da família, a ponto de passar com ela as festas de fim de ano, por exemplo, por que se preocupar em pagar os dias que Maria trabalhou nesses feriados? (Nada..., 2013).

Na mesma reportagem da revista, contudo, um contraponto é feito por uma patroa, Sônia, “que diz não ver sentido em uma jornada de trabalho mais rígida”. Ela é a única empregadora ouvida no conjunto de textos analisados neste estudo. “Sônia argumenta que sua empregada serve o café às 8 da manhã e o jantar às 8 da noite, mas descansa parte do dia. ‘Não tem cabimento burocratizar a relação que tenho com alguém que vê TV comigo’ ” (Nada..., 2013).

Outro argumento presente no quadro de sentidos sobre as relações pessoais no emprego doméstico é o que traz à tona a relação desigual entre os sexos como um facilitador da existência desse tipo de atividade. Na literatura sobre divisão sexual do trabalho, Sorj et al. (2007, p. 574) sustentam que a entrada das mulheres no mercado de trabalho não caminhou junto com uma “transferência correspondente do tempo investido pelos homens no mercado de trabalho para a ‘esfera privada’ ”. As matérias trazem novamente uma comparação com o cenário internacional.

Na Europa, os empregados domésticos representam 0,3 da força de trabalho. No Brasil, chegam a 6,5. Evidentemente, a europeia só consegue viver sem empregada porque sua realidade é diferente, a começar pelo fato de que seu marido lava pratos e suas crianças fazem a própria cama – o que, longe de ser um ato de boa vontade, é obrigação de cada um. (Nada..., 2013).

Buscando atenuar as implicações da sobrecarga doméstica para as mulheres, os estudos de gênero apontam a necessidade de políticas que conciliem trabalho e família e não coloquem toda a responsabilidade familiar sobre as mulheres. No corpus de notícias analisado, o Estado não foi cobrado de nenhuma forma a não ser para regulamentar a PEC. Ao contrário, há uma visibilidade da força do mercado diante do novo cenário instituído com a promulgação da PEC das Domésticas.

3.3 Enquadramento do mercado

Um trabalho assentado na informalidade, na solidariedade e amizade entre patrões e empregados de repente faz com que as papelarias esvaziem seus estoques de “livros de controle de ponto” devido à grande procura por esse material, diz uma das matérias (Livros..., 2013). Mas a venda de utensílios para o controle das horas dos funcionários está longe de ser o impacto mais sentido pelo mercado em decorrência da PEC das Domésticas. As notícias preveem que a emenda poderá provocar o aumento da terceirização dos serviços, além da menor contratação e maior demissão das atuais trabalhadoras domésticas. A redução da jornada de trabalho para diminuição dos encargos trabalhistas é outra possibilidade. Conforme mencionamos anteriormente, o empresariado foi a categoria ouvida no maior número de notícias do período de implantação da PEC, denotando como ela motivou uma discussão não só dos direitos e das relações pessoais, mas também fortemente centrada nos serviços oferecidos.

A aposta desses negócios é que, com o aumento de custos para a contratação desses profissionais e o controle mais rígido sobre horas trabalhadas, haja um aumento na demanda por serviços terceirizados de alimentação, lavanderia e limpeza [...]. A companhia cobra a partir de R$ 92 para limpar uma casa de até 150 metros quadrados. A diretora de expansão da Companhia, Lilian Esteves, afirma que todas as lojas tiveram aumento na procura durante a última semana, por causa da nova legislação. (Pequeno..., 2013).

Outro argumento presente no enquadramento que foca o mercado vai em direção à responsabilidade das empresas de tentar conciliar o trabalho fora de casa e o cuidado doméstico exercido por seus funcionários. Novamente, em uma matéria que compara o Brasil com o contexto europeu, pondera-se que a maioria das famílias europeias não conta com empregadas, e o trabalho flexível favorece essa cultura.

Conheço muitas famílias, no entanto, que não têm faxineira. Têm dinheiro para isso, mas nem chegam a considerar a possibilidade. [...] O trato com o trabalho, no entanto, é mais fundamental e menos sujeito a contestações. Aceitei uma promoção recente com uma condição: que pudesse trabalhar das 7h às 15h e tivesse tempo de buscar meus filhos na escola. (Jornada..., 2013).

As implicações da relação entre o trabalho doméstico e o tempo parcial a ser cumprido nas empresas têm sido motivo de preocupação de autoras como Fagan et al. (2003) e Walby (2003). O emprego flexível, dizem essas autoras, tem duas faces muito distintas. Por um lado, ele tende a valorizar certos postos de trabalho em detrimento de outros já marginalizados, ocupados na maioria das vezes por mulheres, fazendo então com que haja um aumento na desigualdade de gênero. Por outro, ele pode favorecer a distribuição das tarefas domésticas. Embora a pouca presença do emprego parcial no Brasil possa ajudar a dar respostas sobre a maior quantidade de domésticas no país, em nenhum momento essa discussão foi levantada pelas notícias com o enfoque do contexto brasileiro. A maior preocupação no Brasil é criar novas funções que terceirizem o trabalho já exercido pelas domésticas, e não adequar o mercado para oferecer novas condições de trabalho em que homens e mulheres possam articular atividades fora de casa e cuidados domésticos.

4 Considerações finais

Este trabalho buscou avaliar os enquadramentos sobre a PEC das Domésticas na mídia brasileira na semana de sua promulgação, a partir da análise qualitativa de matérias publicadas em dois periódicos de grande circulação. É evidente o viés de seleção das fontes pelos veículos, reconhecidamente alinhados a uma posição política mais conservadora, como demonstram os próprios enquadramentos encontrados. Mas, apesar disso, dada a penetração desses meios na sociedade, entendemos que a seleção referida continua sendo relevante, muito pela capacidade que eles têm de agendar e pautar outros veículos nas esferas nacional e regional.

Percebemos que algumas questões tematizadas na literatura aparecem explicitamente nas matérias e outras ainda não são fonte de debate. Encontramos três principais enquadramentos nos textos analisados – o dos direitos, o das relações pessoais e o do mercado. No quadro dos direitos, destacamos que há uma compreensão pública, a partir da PEC, de que as empregadas domésticas são profissionais com direitos e deveres. No entanto, as notícias também mostram uma forte proteção aos/às empregadores/as, tornando os direitos garantidos na emenda um provável risco para as relações até então estabelecidas, com prejuízos aos patrões.

O reconhecimento do trabalho doméstico como feminino faz com que seu arranjo se dê, quase sempre, entre as mulheres – patroas e empregadas domésticas. O enquadramento dos direitos reforça o argumento já mencionado de Hirata e Kergoat (2007) de que esse arranjo cria uma bipolaridade nas ocupações femininas, revelando uma configuração da divisão sexual do trabalho que produz uma mediação de classe nas relações entre mulheres. Ou seja, tal divisão contribui para a desigualdade e hierarquia entre elas, especialmente entre as mulheres brancas e negras.

No enquadramento das relações pessoais, deu- -se publicidade à confusão gerada pelos laços afetivos presentes no local de trabalho das empregadas, mostrando o que Georges (2011) trata como a interseção entre as esferas profissional e extraprofissional, nem sempre perceptível no trabalho doméstico. Todavia, novamente, os patrões, especialmente as patroas (e também as próprias trabalhadoras), reforçaram essa relação, por vezes servil (Georges, 2011), ao falarem da dificuldade em separar o que é trabalho do que é afeto.

No quadro do mercado, ficou evidente a apresentação de soluções privadas para a inevitável queda de contratação do serviço das trabalhadoras domésticas, uma vez que ele se tornaria mais oneroso às famílias. As soluções variam de instrumentos para facilitar a marcação do ponto das domésticas a serviços de alimentação e limpeza profissionalizados. Alguns desses quadros são, no mínimo, curiosos – buscam discursivamente transpor a figura da trabalhadora para a dos eletrodomésticos, quase nos fazendo esquecer de que as trabalhadoras são pessoas, mulheres reais. Além disso, há um completo silêncio a respeito das soluções públicas para os dilemas do trabalho doméstico. As creches, por exemplo, não são citadas em nenhuma notícia.

Três outros silêncios foram percebidos na análise. O primeiro refere-se à pouca escuta das trabalhadoras domésticas, que apareceram apenas duas vezes no conjunto de textos. Isso denota que não foram tidas como fontes importantes para participar do debate, ainda que a PEC tematize exatamente questões que as afetam. O segundo silêncio é acerca da invisibilidade da discussão racial, não disposta nas notícias. Apesar de a PEC ter sido caracterizada como uma nova abolição da escravidão, não foi citado que a maior parte dessas trabalhadoras são negras e quais as implicações disso; tampouco os movimentos negros figuram entre as fontes. Finalmente o terceiro silêncio diz sobre a não mobilização dos homens, como interlocutores, acerca do trabalho doméstico. De empregadoras a empregadas, esse tipo de trabalho parece ser uma responsabilidade exclusivamente de mulheres.

Foi possível perceber então como esses enquadramentos têm estreita correspondência com os dilemas da conciliação entre trabalho e família no Brasil, com a experiência do trabalho doméstico remunerado na justaposição dos âmbitos público e privado e nas ambiguidades e desafios envolvidos no trabalho invisível e desvalorizado do care.

Por fim, é perceptível, na narrativa midiática, a ambivalência entre a ideia de um direito tardiamente reconhecido para fins de mitigar uma opressão e a busca por soluções que beneficiem o mercado. Em nenhum momento a mídia trouxe à tona a divisão sexual do trabalho (ouvindo os homens) como um fato importante para o novo contexto instituído pela PEC das Domésticas.

Mais do que apontar a responsabilização de ambos os periódicos com base em tais achados analíticos, defendemos que esses discursos não estão inscritos nas relações ordinárias de forma mecânica ou meramente espelhada. Ao contrário, a realidade social é a fonte por excelência de que se vale o jornalismo na construção das suas narrativas” (Carvalho, 2012, p. 172), e, portanto, não podemos “tomar enquadramentos jornalísticos como imobilizados em torno de quadros de referência imutáveis” (p. 172).

Refletir sobre as ambivalências e silêncios que permeiam o trabalho doméstico remunerado na mídia e na sociedade permite compreender a conexão entre os seguintes aspectos: a atividade de cuidar exercida majoritariamente pelas mulheres; a permanência de relações sociais marcadas pelas hierarquias raciais; e a configuração de uma classe servil, simbolizando umas das mais importantes formas de desigualdade interseccional na sociedade brasileira contemporânea. É na expectativa de que novas compreensões sobre o trabalho doméstico remunerado serão disseminadas tanto nas narrativas cotidianas dos sujeitos como nas jornalísticas que reflexões preocupadas com essas desigualdades têm se desenvolvido.

Material suplementar
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Notas
Notas
1 As autoras agradecem a interlocução com a professora Dra. Yumi Santos, do Departamento de Sociologia da UFMG, para a construção do trabalho, e os pareceres anônimos que ajudaram a refinar o texto. Também informam que a ordem de autoria é estritamente alfabética
2 Na versão traduzida do texto de Tronto, o conceito de care foi traduzido como cuidados.
3 No caso do Brasil, esses fluxos são mais internos do que internacionais (Hirata, 2010).
4 Em 2009, o salário mínimo era de R$465,00.
5 Categorias: a - empregadas domésticas; b - empregadoras/es e patroas/patrões; c - empresários/as (de diversos serviços, como terceirização do trabalho doméstico a lojas de eletrodomésticos); d - especialistas (pesquisadores/as ligados/as à economia, história e gênero); e - representantes do Executivo (ministros e secretários); f - filhos e familiares de empregadores/as; g - representantes do Judiciário (juízes do trabalho); h - representantes do Legislativo (deputados e senadores atuantes na PEC); i - representantes do Legislativo Internacional (com comparações); j - Ministério Público do Trabalho; k - Organização Internacional Sobre Trabalho Doméstico; l - uma representante de movimento de trabalhadoras domésticas.

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