Em 2018, fui eleito presidente da então chamada Associação dos Cientistas Sociais da Religião do Mercosul. Entre as expectativas para o exercício daquele mandato, estava a de organizar a XX Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina no ano de 2020. Com o evento já organizado, papers aprovados para apresentação em 32 grupos de trabalho, mesas redondas constituídas e conferencistas com passagens compradas, fomos surpreendidos, assim como todo restante do mundo, pelo avanço da pandemia do coronavirus. A Associação precisou reinventar as suas formas de promoção de fóruns de debates acadêmicos. Assim como outras associações científicas, investimos no ambiente virtual como maneira para manter ativa a interlocução entre nós e o espírito de comunidade que sempre deu a marca dos pesquisadores da religião na América Latina. No entanto, isso não nos fez desistir da aposta nos encontros presenciais como grande potencializador dos diálogos no nosso campo. Adiamos em dois anos a realização da XX Jornadas, que finalmente ocorreu em agosto de 2022, sediada no Instituto de Filosofa e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No Brasil, até onde tivemos registro, a realização deste evento foi o ato inaugural do retorno aos congressos inteiramente presenciais das ciências humanas.

Foi no marco dessa atividade que o debate, agora publicado em Ciencias Sociales y Religión / Ciências Sociais e Religião, ocorreu. Na comissão organizadora do evento, optamos por substituir o tradicional formato das conferências por um modelo que estivesse mais adequado àquilo que tanto desejamos proporcionar durante os dois anos de isolamento social: dialogar presencialmente. Para isso, convidamos dois pesquisadores dedicados ao tema da religião e empenhados na produção de imagens para compor um dueto: Mattijs van de Port, antropólogo holandês, e Hugo José Suárez, sociólogo mexicano. Nenhum dos dois se conheciam, tampouco a produção um do outro, de modo que o evento foi literalmente um encontro inédito para todos. De minha parte, quando os contatei, meu ímpeto era o de convidá-los a conversarem sobre as suas produções acadêmicas em um ambiente público. Coube à Renata Menezes, antropóloga brasileira, o papel de dar o pontapé inicial para que a conversa continuasse entre o dueto de conferencistas e a plateia.

Certamente o convite estava, no fundo, orientado por uma percepção mais geral da progressiva relevância que a produção de imagens tem ocupado no campo das ciências sociais da religião. Teoricamente também interessava ouvi-los reagir a perspectivas teórico metodológicas “em alta”, como a chamada virada material e a noção de religião vivida. Propositadamente, no entanto, o convite enviado evitou oferecer enquadramentos teóricos limitantes, que de saída fornecessem os marcos do diálogo, o restringindo a universos conceituais que poderiam limitar as formas do debate. Por isso, o que ofereci a ambos foi uma espécie de pergunta disparadora: Como as imagens fazem vocês pensarem sobre religião?

Ao elaborá-la, minha única preocupação foi a de não submeter as imagens à religião. Embora isso fosse uma possibilidade, inclusive explorada por Renata Menezes em seus comentários na ocasião, optei por uma forma de pergunta que desse indícios do lugar privilegiado que as imagens podem ocupar nas reflexões sobre religião, não como um anexo, um acessório imagético, mas sim como um ponto de partida potencialmente disruptivo, transformador para o modo como lidamos com a religião.

Nas páginas que seguem, os leitores de Ciencias Sociales y Religión / Ciências Sociais e Religião terão acesso a este profícuo diálogo e eventualmente também se sentirão motivados a pensar, a partir de suas próprias perspectivas, em outras respostas para esta pergunta capciosa.

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