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A FUNÇÃO DO IMAGINÁRIO NO SIONISMO CRISTÃO BRASILEIRO

La función del imaginario en el sionismo cristiano brasileño

The role of the imaginary in Brazilian Christian Zionism

André Daniel Reinke *
Faculdades EST, Brasil

A FUNÇÃO DO IMAGINÁRIO NO SIONISMO CRISTÃO BRASILEIRO

Ciencias Sociales y Religión / Ciências Sociais e Religião, vol. 25, e023024, 2023

Universidade Estadual de Campinas

Recepção: 08 Abril 2023

Aprovação: 20 Outubro 2023

Resumo: O presente texto apresenta uma reflexão hermenêutica a respeito do protestantismo brasileiro, procurando compreender como opera o imaginário a respeito do Reino de Deus como motivação fundamental para o engajamento no sionismo cristão. Para tanto, foram operacionalizados os conceitos de identidade narrativa em Paul Ricoeur e revisadas algumas reflexões da teologia bíblica sobre a simbólica do Reino de Deus na interpretação cristã. A reflexão possui três partes: a primeira trata do universo simbólico que atua nos textos bíblicos sobre a vinda do Reino de Deus tanto na Bíblia hebraica como no Novo Testamento; a segunda demonstra como os sionismos cristãos no Brasil diferem entre si a partir da ênfase na espera ou realização do Reino de Deus; e a terceira trata como os sionismos cristãos entrecruzam narrativas do Estado de Israel com as de sua própria esperança escatológica, produzindo um imaginário por vezes desvinculado da realidade.

Palavras-chave: Israel, Igreja, Imaginário, Reino de Deus, Sionismo Cristão.

Resumen: El presente texto plantea una reflexión hermenéutica con respecto al protestantismo brasileño, buscando entender cómo el imaginario opera con respecto al Reino de Dios como motivación fundamental para su participación en el sionismo cristiano. Para lograrlo, se operacionalizaron los conceptos de identidad narrativa de Paul Ricoeur y revisaron algunas reflexiones de la teología bíblica sobre la simbólica del Reino de Dios en la interpretación cristiana. La reflexión tiene tres partes: la primera presenta el universo simbólico que actúa en los textos bíblicos sobre la venida del Reino de Dios tanto en la Biblia hebraica como en el Nuevo Testamento; la segunda muestra cómo los sionismos cristianos en Brasil se distinguen entre sí a partir del énfasis en la espera o en la realización del Reino de Dios; y la tercera aborda cómo los sionismos cristianos entrecruzan narrativas del Estado de Israel con las de su propia esperanza escatológica, produciendo un imaginario muchas veces desvinculado de la realidad.

Palabras clave: Israel, Iglesia, Imaginario, Reino de Dios, Sionismo Cristiano.

Abstract: This text presents a hermeneutic reflection regarding Brazilian Protestantism, seeking to understand how the imaginary about the Kingdom of God operates as a fundamental motivation for engaging in Christian Zionism. For this purpose, the concepts of narrative identity by Paul Ricoeur were operationalized and some reflections of biblical theology on the symbolism of the Kingdom of God in the Christian interpretation were reviewed. The reflection has three parts: the first deals with the symbolic universe that operates in the biblical texts about the coming of the Kingdom of God both in the Hebrew Bible and in the New Testament; the second demonstrates how Christian Zionisms in Brazil differ from each other based on their emphasis on waiting for or fulfillment of the Kingdom of God; and the third deals with how Christian Zionisms intertwine narratives of the State of Israel with those of their own eschatological hope, producing an imaginary that is sometimes disconnected from reality.

Keywords: Israel, Church, Imaginary, Kingdom of God, Christian Zionism.

Introdução

Existe uma manifesta paixão por Israel no meio protestante brasileiro, 1 que pode ser denominada judeofilia ou filossemitismo – o amor dos protestantes pelas coisas dos judeus. Esse fenômeno foi pesquisado em mestrado e doutorado publicados recentemente ( Reinke, 2018, 2022). Tal paixão por Israel pode ser verificada em múltiplas manifestações: pela vasta produção literária escatológica, na qual Israel desempenha papel central; nas publicações de apreço pelos judeus e seu país em ambiente virtual brasileiro; pelos discursos na câmara de deputados federais exaltando Israel; pelo crescente uso do simbolismo judaico em ministérios protestantes; na presença de artigos judaicos em comércio vinculado aos protestantes; na construção de um vasto aparato bíblico e judaico pela Igreja Universal do Reino de Deus; e pelo turismo religioso de brasileiros em Israel. Além dessas ocorrências, podem ser verificadas situações pitorescas como a curiosidade pela culinária judaica, a celebração de festas judaicas ou até mesmo admiração pela arte marcial judaica, o krav magá ( Reinke, 2022: 28-54). Enfim, as igrejas protestantes brasileiras têm demonstrado, de incontáveis maneiras, seu apreço pelos judeus e pelo moderno Estado de Israel.

Entre as diferentes manifestações dessa paixão encontramos o sionismo cristão, ou seja, o apoio dos cristãos (especificamente protestantes) ao sionismo, que é o movimento pelo retorno dos judeus a Sião e a manutenção de um Estado nacional judaico na Palestina. Tratase de um tema relevante, evidenciado, por exemplo, quando ocorrem crises internacionais envolvendo o Estado de Israel. Nessas ocasiões, jornalistas acabam percebendo que a posição da maioria dos protestantes está ao lado das pautas judaicas – como pode ser observado no conflito Israel-Hamas de outubro de 2023. 2 Dada a relevância do tema, o presente texto pretende apresentar algumas ideias que resumem pontos explorados na tese supracitada e que podem contribuir para a compreensão do fenômeno sionista cristão entre os protestantes brasileiros.

Antes disso, entretanto, é preciso ressaltar um detalhe delimitador de nossa análise. Embora o sionismo cristão esteja profundamente ligado à judeofilia de comunidades protestantes, deve-se considerar que seu diferencial está na “explícita defesa do Estado de Israel contemporâneo”. O posicionamento pró-Israel não fica evidente em qualquer comunidade cristã que demonstre mimetismo com o judaísmo ( Machado, Mariz & Carranza, 2022: 244) e, além disso, há grupos abandonando as tradições e doutrinas cristãs em processos intensos de judaização. 3 Portanto, a análise das próximas páginas contemplará apenas os movimentos que continuam compreendendo serem pertencentes ao universo protestante e que estão efetivamente engajados no ativismo pró-Israel. Também acreditamos que a ênfase “cristão”, acrescentada ao “sionismo”, implica que os argumentos e motivações para tal apoio devam ter relação com tradições e crenças religiosas – ou seja, emergem da teologia pregada ou vivenciada pelos grupos de sionistas cristãos.

Neste sentido, nossa intuição é que o apoio dos protestantes ao Estado de Israel e à causa sionista está diretamente ligado à sua paixão pela Bíblia. Trata-se fundamentalmente de uma questão hermenêutica: o objetivo aqui é compreender como os protestantes interpretam os judeus e o Estado de Israel – ou seja, como eles o imaginam. Por isso, o presente texto irá explorar a função das narrativas e sua influência no imaginário do sionismo cristão brasileiro.

Paul Ricoeur, em sua obra “Tempo e narrativa”, apresenta uma reflexão bastante contundente a respeito de como a narrativa torna a experiência do tempo acessível ao ser humano. É apenas narrando que organizamos o caos dos acontecimentos de nossas vidas; apenas contando histórias, conseguimos tirar deles o sentido para a nossa existência. Segundo o flósofo, nossas identidades nada mais são do que identidades narrativas ( Ricoeur, 2010: 418). É significativo que Ricoeur apresente Israel como o exemplo mais notável de como um povo constitui uma identidade a partir dos próprios textos que produz:

(…) pode-se dizer que foi contando narrativas consideradas testemunhos dos acontecimentos fundadores de sua própria história que o Israel bíblico se tornou a comunidade histórica que leva esse nome. É uma relação circular: a comunidade histórica que se chama povo judeu tirou sua identidade da própria recepção dos textos que ela produziu. ( Ricoeur, 2010: 421, ênfases do autor)

Isso significa que Israel construiu sua identidade narrativa a partir do texto bíblico. Entretanto, isso não ocorre apenas com Israel: também há comunidades das mais variadas denominações cristãs vinculando aos mesmos textos suas próprias identidades. Exatamente nesse ponto ocorrem os entrecruzamentos narrativos que alimentam o sionismo cristão. Ou seja, este movimento está ancorado tanto nas histórias que o Estado de Israel conta sobre si mesmo, como na forma como os cristãos se apropriam dessas narrativas em face de sua interpretação das profecias bíblicas. Acontecimentos do tempo presente e textos do passado estão entrelaçados naquilo que os sionistas cristãos esperam do futuro.

Adentramos, portanto, no universo dos símbolos e das metáforas bíblicas, e de como eles se desdobram na construção da realidade imaginada pelos sionistas cristãos. A seguir serão apresentadas algumas ideias sobre o funcionamento de tal processo, em três momentos. O primeiro diz respeito ao universo simbólico que opera nos textos bíblicos no que se refere às promessas divinas sobre a vinda do Reino de Deus, tanto para Israel no contexto da Bíblia hebraica, como à igreja cristã no Novo Testamento. O segundo esclarece as diferenças entre os sionismos cristãos no Brasil em função de hermenêuticas distintas na recepção do paradoxo do Reino de Deus realizado e ainda por ser concluído. O terceiro demonstrará como o sionismo cristão opera a partir do entrecruzamento de narrativas de sua própria esperança escatológica frente às narrativas do Estado de Israel.

Israel, Igreja e a simbólica do Reino de Deus

O Reino de Deus é um tema importante na tradição bíblica hebraica. As escrituras do antigo Israel enfatizam um Reino divino que chega com poder para governar em oposição a uma espécie de “antirreino”, como enfatiza Goldingay (2020: 234). Tal estrutura é manifesta em diversos textos bíblicos, inclusive narrativos, como o de Josué, cujo autor enfatiza o quanto as promessas de Iahweh a Abraão foram cumpridas naquele momento. Segundo a narrativa bíblica, Israel já possuía a Terra Prometida; entretanto, o mesmo texto também demonstra como as tribos não haviam conquistado a totalidade do território, deixando claro que o povo continuaria a experimentar um longo processo no qual Deus cumpriria seu propósito (Josué 21:45; 23:1-16). Ou seja, os israelitas percebiam um cumprimento parcial das promessas divinas, vivendo, entretanto, na esperança de algo maior a ser concluído em um futuro ainda incerto. Neste sentido, a Bíblia hebraica apresenta o reinado de Deus em termos de presente e futuro, como algo que virá um dia, mas cujos aspectos podem e são antecipados – mesmo que aguardando a completude no longo prazo ( Goldingay, 2020: 237).

A tradição bíblica hebraica entende ainda que o Reino de Deus será expandido para o mundo inteiro. Apesar de Israel ser o povo eleito de Deus, foi escolhido com um propósito universal, a saber, manifestar Deus no mundo. Disso derivam afirmações de que “Iahweh reinará para todo o sempre” (Êxodo 15:18), bem como a assimilação de símbolos da realeza das culturas vizinhas. Tal inferência aconteceu inclusive com potências invasoras como o Império Assírio, cujo monarca arrogava ser o “grande rei de toda a terra” – expressão utilizada em tom desafiador pelo salmista para descrever o Deus de Israel reinando sobre as nações (Salmos 47). Israel declara que, na verdade, é seu Deus quem governa sobre todas as nações, não os conquistadores assírios ( Goldingay, 2020: 240-243).

Além de Iahweh ser frequentemente referido como o verdadeiro rei de Israel e do mundo (Números 23:21; Salmos 29:10), seus atributos de governo são explorados pelos autores bíblicos em metáforas de realeza: o trono eterno (Lamentações 5:19), os querubins (Salmos 99:1), o cetro (Salmos 45:6), a fortaleza (Salmos 68:34), os exércitos (Malaquias 3:10), a espada (Salmos 17:13), o leão (Amós 3:8). Desta última figura deriva, por exemplo, a imagem do Messias, o Leão da Tribo de Judá (Gênesis 49:8-10). Deus reina, e a arte da narrativa bíblica o expressa com esmero.

Mas a história não foi gentil com o pequeno Israel. Os eventos traumáticos da queda de Samaria ante os assírios (722 a.C.) e da destruição de Jerusalém pelos babilônios (586 a.C.) determinaram uma crise que levaria a questionar a soberania de Deus. A solução teológica foi a compreensão de que o reinado divino no mundo, por meio de Israel, poderia trazer implicações negativas aos próprios israelitas e judaítas, pois Iahweh anuncia que abandonou seu povo, embora não definitivamente (Isaías 54:7-8 e Salmos 137). O retorno do exílio, promovido pelos persas, retoma a dualidade, pois Deus cumpriu suas promessas, mas a pobreza daquelas circunstâncias demonstrava que muito havia ainda a acontecer. A expectativa de textos proféticos como Daniel 7 a 12, escritos por um visionário no período de 160 a.C., partem do entendimento de que, de fato, as promessas dadas por meio de Jeremias não haviam ainda sido cumpridas, uma vez que a punição e a tribulação ainda persistiam, mas que um dia seriam, finalmente, ratificadas (Daniel 9). O mesmo se deu com o problema enfrentado pelos autores pós-exílicos dos livros de Esdras e Neemias, para quem a restauração estava incompleta ( Goldingay, 2020: 247-250).

A sensação de incompletude, na qual o reinado de Deus era acreditado teologicamente e esperado para o futuro, mas não visto em sentido dinâmico na vida de seu povo, permaneceu até a ocupação romana. Os autores do Novo Testamento apresentam Jesus de Nazaré anunciando um Reino de Deus em andamento, presente e dádiva concedida ao povo de Israel ( Goldingay, 2020: 251). Os ensinos dos Evangelhos são de que o Reino de Deus já estava presente com Jesus – pensamento inovador em relação ao judaísmo do período. Segundo as narrativas evangélicas, o ministério de Jesus foi o cumprimento das promessas dadas a Israel na Bíblia hebraica, o que teria sido evidente por meio do exorcismo – uma manifestação do poder de Deus libertando o povo do domínio de Satanás e do poder do mal, como analisa Ladd (1997: 62-63). Ou seja, os seguidores de Jesus de Nazaré interpretaram as experiências com ele vividas como o “ponto culminante da história de Israel”, como afirma Wright (2019: 83).

A proclamação do Cristo vencedor, de um Messias governante, foi manifesta por meio de rica simbólica nos textos do Novo Testamento, assim como aconteceu em relação a Iahweh na Bíblia hebraica. Cristo foi feito Senhor (Atos 2:36) e deve ser confessado como tal (Filipenses 2:11), está assentado no trono à direita de Deus (1Pedro 3:22), sustenta um cetro de equidade (Hebreus 1:8), é o Leão da Tribo de Judá e Raiz de Davi (Apocalipse 5:5), monta o cavalo branco e tem em sua coxa inscrito o nome “Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Apocalipse 19:16).

Na narrativa neotestamentária, Cristo exerceu seu ministério, morreu crucificado e ressuscitou, e desde então governa no trono do universo. Mas o mundo seguiu seu curso normal. O Reino de Deus anunciado não apareceu visível e inquestionavelmente. Os romanos continuaram crucificando opositores do império, a opressão permaneceu e a Judeia caminhou para a destruição nas guerras vencidas por Roma em 70 e 135 d.C. Naturalmente, tal situação provocou uma tensão na fé cristã da mesma maneira como havia operado na judaica. Trata-se de um Reino inaugurado, mas não concluído. Como afirma George Ladd:

A mensagem de Jesus é que, na sua própria pessoa e missão, Deus invadiu a história humana e triunfou sobre o mal, muito embora a libertação final venha a ocorrer somente na consumação dos tempos. ( Ladd, 1997: 65)

Com a compreensão de que o Messias de Israel já havia vindo ao mundo, e consequentemente o Reino de Deus já fora inaugurado, ocorreu uma mudança na linha do tempo cristã em relação à judaica. Como analisa Oscar Cullmann ( 2020a, 2020b), na tradição bíblica anterior havia o entendimento do tempo linear dividido em três partes: o éon anterior à criação; depois o tempo entre a criação e a Parusia (a vinda do Messias); e finalmente o tempo futuro posterior à Parusia. Ou seja, na estrutura de pensamento judaico de então, o ponto alto e culminante da história da salvação estava posta no futuro como uma expectativa pelo fim da história e início do Reino divino. Já no caso cristão, a presença de Cristo alterou esse ponto culminante para o meio – o tempo de sua vida e dos apóstolos. O passado agora é portador da manifestação mais importante e ato decisivo do Reino de Deus: a cruz e a ressurreição. Assim, tanto no judaísmo como no cristianismo há uma expectativa e esperança da futura instauração do Reino de Deus; entretanto, no cristianismo o elemento primordial foi transposto para o passado, reservando ao futuro uma consolidação de algo já vencido ( Cullmann, 2020a: 121-126).

Assim, a tradição cristã foi desenvolvida no entorno de uma tensão: Cristo veio, o Reino de Deus está em andamento, mas ainda falta algo. O retardo da Parusia produziu a estrutura de pensamento que considera o Reino de Deus já instaurado, mas ainda não consumado. Por isso, os livros do Novo Testamento afirmam tanto o “já” como o “ainda não” do Reino, pois a fé sabe que tudo se cumpriu e a esperança aguarda que tudo seja concluído ( Cullmann, 2020b: 299-300).

Como o sionismo cristão se relaciona com a esperança de concretização do Reino de Deus? O que o atual Estado de Israel tem a ver com as esperanças cristãs? Trata-se de uma questão hermenêutica, de uma escatologia que interpretou literalmente uma série de profecias relativas ao Israel bíblico, mas que ainda demandariam cumprimento. Para tal interpretação, o povo israelita deve ocupar a Terra Prometida do Egito até a fronteira do Iraque (Gênesis 15:18), o templo deve ser reconstruído em Jerusalém para que Deus governe (Ezequiel 43:5-9) e toda a terra deve reconhecer Israel como o povo favorecido de Deus – mas apenas depois de passar pela grande tribulação e tiver se convertido a Jesus de Nazaré, aceitando-o como o Messias prometido (Romanos 11:25-29). Depois disso, Cristo voltará e dará início ao reino milenar (Apocalipse 20:1-6), governando o mundo assentado no trono em Jerusalém, capital do Reino de Deus na era do milênio. Tais expectativas fazem parte da hermenêutica escatológica do dispensacionalismo, conforme apontou Clarence Bass (1960: 132-139) desde as décadas iniciais de ascensão da doutrina no contexto norte-americano. Disso decorre a referência constante de sionistas cristãos a versículos que demandam tal apoio: “Consolem, consolem meu povo, diz o seu Deus” (Isaías 40:1) e “Orem pela paz de Jerusalém; sejam prósperos todos que amam essa cidade” (Salmos 122:6).

Portanto, a expectativa em torno do Estado de Israel faz parte do amplo universo da simbólica e da escatologia protestante. É preciso lembrar que os discursos cristãos estão organizados sobre o paradoxo da certeza de sua existência presente assim como na expectativa de algo que venha a se concretizar no futuro. Tanto o imediatismo do “já” como a espera do “ainda não” fazem parte do ethos escatológico cristão, especialmente do protestante. A mesma tensão se estabelece na relação da igreja com os judeus e seu Estado, produzindo diferentes imaginários e manifestações de sionismo cristão.

Três tipos de sionismo cristão no Brasil

O fenômeno do sionismo cristão é complexo. A justificativa dos protestantes para apoiarem Israel é diversa, podendo ter formas plurais de acordo com discursos distintos ao longo das décadas. Por isso, Paul Freston (2020) propõe cinco tipos ideais de sionismo cristão: o “profético”, que enfatiza as profecias do Antigo Testamento e a centralidade dos judeus para a emergência do reino de Deus; o “humanista”, relacionado ao histórico sofrimento judaico e à solução palestina para seu nacionalismo; o “civilizacional”, pela identificação cultural com Israel; o “analógico”, pela empatia nacionalista norte-americana com a história israelita bíblica; e o “islamofóbico”, que provocaria um alinhamento a Israel, alvo de países islâmicos ( Freston, 2020apudMachado, Mariz & Carranza, 2022: 226-227).

Aqui, a teologia pode dar sua contribuição para o debate, aprofundando os sentidos interpretativo, narrativo e imaginário que justificam as atitudes protestantes em relação a Israel. Nesse sentido, o paradoxo cristão do Reino de Deus “já – ainda não” implementado permite uma ampla gama de possibilidades de interpretação e apropriação das narrativas bíblicas, assim como de formas de sionismo cristão. Os diferentes movimentos pró-Israel no Brasil aparentemente estão ancorados em uma e outra ponta desse paradoxo. Nossa proposta é que os diferentes sionismos cristãos podem ser classificados em pelo menos três tipos no Brasil: o clássico, o novo sionismo cristão e o simbólico-afetivo.

Sionismo cristão clássico

O primeiro tipo de sionismo cristão será denominado de “clássico”. Está articulado no Brasil desde as primeiras décadas do século XX e possui matriz dispensacionalista, 4 que é o modelo hermenêutico escatológico fundamental de grande parte do protestantismo brasileiro, especialmente nas pentecostais e neopentecostais, mas também nas igrejas históricas. Nesse tipo de sionismo, o foco maior da reflexão teológica são os textos bíblicos apocalípticos e o paradoxo escatológico pendendo para o “ainda não”. Os olhos estão postos no futuro, naquilo que falta ser realizado para a completude do Reino.

Os apocalipses em geral possuem como característica comum o interesse no destino histórico e na batalha cósmica, ainda a ser vencida, entre o bem e o mal. Entretanto, uma vez que estabelecer a conexão entre os aspectos cósmicos e a realidade concreta é uma tarefa especulativa, sempre está aberta a possibilidade de que qualquer acontecimento seja considerado parte do drama final. Logo, o desvelar da profecia seria percebido apenas pela “pessoa sábia”, capaz de “ler os sinais dos tempos” ( Bray, 2017: 461). Essa é uma característica permanente do sionismo cristão clássico: a abertura a especulações sobre os fatos do presente na perspectiva da realização profética no futuro próximo. Seus adeptos entendem estar vivendo o teatro da batalha cósmica final. Nessa batalha, o pequeno Estado de Israel desempenha papel central, uma vez que o literalismo bíblico do movimento aponta Jerusalém como a capital do Reino no milênio e os judeus (uma vez convertidos a Jesus Cristo) como o povo de Deus, governando o mundo renovado junto ao Messias.

Tais crenças levam aos sionistas cristãos clássicos a apoiarem Israel politicamente e espiritualmente. Grande parte desse apoio se manifesta de maneira incondicional (todas as ações do governo israelense serão aprovadas independentemente de sua justiça), e os palestinos são entendidos basicamente como um estorvo para os planos divinos de consumação do Reino. Mas não se tome o movimento por monolítico: há dispensacionalistas defendendo que tal apoio não pode acontecer de maneira acrítica, uma vez que o atual Estado de Israel seria apenas uma etapa anterior ao milênio e, portanto, sujeito a erros humanos e ação do pecado.

O termo “expectador” serve como metáfora para o envolvimento do sionismo cristão clássico no Brasil, uma vez que sua atitude para com os judeus e o Estado de Israel é de observação. Diferente do dispensacionalismo nos Estados Unidos, cuja doutrina está na base teológica de instituições engajadas política e financeiramente (inclusive promovendo lobby junto ao governo federal por políticas diplomáticas favoráveis a Israel), não foi encontrado no Brasil caso semelhante. Não foi possível perceber nenhuma organização pró-Israel, de base teológica dispensacionalista ou não, captando recursos financeiros significativos para seus projetos entre brasileiros. O que há, concretamente, são ações de políticos da Bancada Evangélica fazendo uso de sua influência no Congresso Nacional para buscar apoio diplomático a Israel, mas tais ações não são vinculadas a instituições sionistas cristãs ( Wachholz & Reinke, 2020). Em outras palavras: o protestante brasileiro ama Israel e ora por ele; o país dos judeus faz parte do seu vocabulário apocalíptico; quando eleito procura usar seu cargo em favor da causa sionista, está engajado midiaticamente; consome produtos literários do sionismo cristão e viaja à Terra Santa – mas não investe dinheiro como oferta para instituições sionistas ou sionistas cristãs. Neste movimento, Israel é estimado, mas basicamente observado. Portanto, as manifestações do sionismo cristão clássico são de cunho teológico, com especulações bastante intensas no que se refere à política internacional e posição basicamente incondicional ao lado do Estado judaico. Israel, neste caso, é o “outro” da igreja a ser cuidado e convertido a Cristo.

O exemplo mais evidente do sionismo cristão clássico é a organização missionária Chamada da Meia Noite, um ministério interdenominacional com objetivo de “levar pessoas a Cristo e alertar sobre o seu retorno”. 5 Estando a sede brasileira em Porto Alegre (RS), a Chamada produz literatura dispensacionalista (livros, revistas e folhetos), organiza conferências sobre palavra profética, realiza viagens a Israel e oferece cursos bíblicos em aulas gravadas e ao vivo, cuja tônica demanda um posicionamento cristão ao lado dos judeus e do Estado de Israel.

Novo Sionismo Cristão

O segundo tipo de sionismo cristão identificado é o autodeclarado “novo sionismo cristão”. Esse movimento deriva do primeiro, uma vez que se trata também de uma associação de cristãos protestantes empenhados na causa do sionismo judaico e igualmente baseado em sistemas escatológicos milenaristas. Entretanto, seus defensores têm procurado se afastar do sistema dispensacionalista, vinculando-se geralmente aos modelos amilenistas, pré-milenistas históricos e pós-milenistas (mais ligados às igrejas reformadas, portanto). O ativismo pró-Israel não é enfraquecido, mas permite um olhar mais brando em relação às demandas humanitárias e políticas das causas palestinas. Na linha do novo sionismo cristão, o Estado de Israel não é tanto um “relógio de Deus” (como ocorre no dispensacionalismo e em outras vertentes ainda mais radicais da escatologia protestante), mas uma solução histórica necessária como resposta ao incorrigível antissemitismo no mundo. Diferente do sionismo cristão clássico, que acredita em uma conquista judaica de toda a Terra Prometida nos limites bíblicos da promessa, o novo sionismo cristão acredita em uma solução de dois Estados para o conflito israelense-palestino, considerando tanto o reconhecimento da eleição divina dos judeus como a dignidade humana dos palestinos ( Sabino, 2020: 120-122).

Como a escatologia é um campo polêmico e aberto a especulações por vezes sensacionalistas, os defensores do novo sionismo cristão tiram o foco do aspecto escatológico de Israel enquanto cumprimento de profecias relativas ao tempo do fim e o colocam no passado, no caráter imutável das promessas de Deus aos judeus desde os patriarcas, especialmente no que se refere à posse da Terra Prometida. Sustentam a solução dos dois Estados, defendendo a existência de um Estado de Israel ao lado de um Estado Palestino, por considerarem a proposta coerente com a hospitalidade e recepção ao estrangeiro ordenada na tradição bíblica deuteronomista. Enfim, são bem mais abertos ao diálogo pela paz entre israelenses e palestinos do que o sionismo cristão clássico. Entretanto, aparentemente o método do novo sionismo cristão tem sido de avançar para além dos argumentos teológicos, que permanecem sendo usados “internamente” ao tratar com comunidades cristãs, mas buscando outros referenciais de caráter histórico, social e político, trazidos à luz para defender Israel no debate com outras religiões e no campo laico da política internacional.

Assim, no novo sionismo cristão, Israel também é o “outro” da igreja a ser apoiado e cuidado. Nesse sentido, não difere muito do modelo clássico dos dispensacionalistas. Mas o faz dentro de uma postura de escuta e intermediação com as demandas palestinas, atitude considerada necessária por motivações humanitárias, mas principalmente para construir a paz local e a própria manutenção e prosperidade do Estado de Israel.

O segundo tipo é ainda minoritário no Brasil. O principal representante do novo sionismo cristão é o Philos Brasil, 6 o ramo brasileiro da comunidade estadunidense Philos Project. Um de seus principais objetivos, conforme declarado em seu perfil no Instagram, é “promover o engajamento cristão positivo no Oriente Médio”, o que significaria a defesa da convivência pacífica entre nações, tribos e comunidades religiosas. Por isso, há no novo sionismo cristão um apoio a Israel, mas buscando sua realização no diálogo com as demandas cristãs, palestinas e árabes do seu entorno.

Sionismo Cristão Simbólico-Afetivo

O terceiro tipo de sionismo cristão é o “simbólico-afetivo”. Observese que a sua base teológica é absolutamente dispensacionalista, como o sionismo cristão clássico: comunga da mesma crença escatológica, Israel permanece sendo o “relógio de Deus” para o cumprimento profético do tempo do fim, exige igualmente um apoio incondicional – enfim, a estrutura teológica é a mesma. Entretanto, essa não é a tônica central do discurso desse movimento, pois suas manifestações não são de cunho racional, mas emocional. Trata-se de um sionismo cristão envolvido simbólica e afetivamente. O paradoxo escatológico, neste caso, está mais deslocado para o “já” do Reino de Deus. Sua matriz está no movimento pentecostal e no neopentecostal. A escatologia é central no sionismo cristão simbólico-afetivo, mas em sentido distinto: trata-se da crença pentecostal de estar vivendo o derramamento do Espírito Santo como sinal dos últimos dias, uma “chuva serôdia”, não como válvula de escape do mundo, mas desejo de ser exemplo do Reino vindouro para transformar o mundo no presente – como ressalta Smith (2020: 87), ao tratar das características do pentecostalismo. Os olhos desse movimento estão postos no presente, na ação do Reino de Deus na realidade atual do mundo, postura que serve também de base para doutrinas como a da prosperidade (crentes serão abençoados por Deus por serem “filhos do rei”) e a teologia do domínio (como corpo de Cristo, a igreja deve governar o mundo).

Nesse tipo de sionismo cristão, o Estado de Israel também é compreendido na perspectiva de futuro, como “relógio de Deus” do tempo do fim, mas ganha maior relevância por ser um cumprimento profético no presente, sendo considerado a restauração dos judeus na Terra Prometida. Ou seja, representa uma manifestação visível do Reino de Deus em andamento, uma “prova” de que Deus está agindo e a Parusia está às portas. O derramamento do Espírito Santo anunciado por tais comunidades é sinal do final dos tempos, e mesmo na expectativa do “ainda não”, o “já” está ao alcance das mãos. A crença no sobrenatural divino presente na natureza, a cura deste corpo e a busca da prosperidade neste mundo são elementos manifestos na fé pentecostal não tanto de maneira propositiva, mas estética, pela via do culto – este baseado na narrativa e na metáfora ( Smith, 2020: 133). No seu testemunho e liturgia, os pentecostais e neopentecostais se veem repetindo as experiências dos personagens bíblicos e construindo uma identidade marcada pela narrativa bíblica. O resultado é uma aproximação pentecostal dos elementos do judaísmo, como as viagens a Israel, o toque do shofar nos cultos, a celebração de feriados judaicos e inclusive o uso de símbolos judaicos tardios, como a estrela de Davi, e de símbolos contemporâneos, como a bandeira de Israel. Tal fenômeno estético foi constatado por Joseph Williams (2015: 183), ao considerar que o sionismo sofreu uma “pentecostalização” desde meados dos anos 1950.

Em resumo, no sionismo cristão simbólico-afetivo o Estado de Israel é celebrado como cumprimento visível do Reino de Deus; os símbolos judaicos são parte de uma liturgia que remonta aos tempos bíblicos e são incluídos no culto justamente por estarem firmados nessa “autoridade antiga”. Retomando o paradoxo do “já” e do “ainda não”, aqui a linha do “já” do Reino ganha preeminência pela compreensão de que Israel é uma prova do Reino de Deus em andamento, assim como o derramamento do Espírito Santo. Israel, assim, é o “si mesmo” da igreja, o semelhante a ser imitado, com quem se comungam narrativas e símbolos. Sendo o Estado de Israel considerado o início da concretização do Reino de Deus, ele deve ser celebrado em festas e apoiado em suas demandas políticas internacionais.

O principal exemplo de sionismo cristão simbólico-afetivo está na Embaixada Cristã Internacional de Jerusalém, 7 uma instituição internacional cuja filial brasileira é liderada pelo pastor Renê Terra Nova. A ICEJ celebra anualmente a Festa dos Tabernáculos em Jerusalém, juntando-se a milhares de peregrinos para declarar sua devoção ao Messias e seu apoio a Israel. Além de participar da Marcha das Nações (evento organizado pela matriz em Jerusalém), a filial brasileira celebra o CITY, a Convenção Internacional de Tabernáculos em Jerusalém, uma versão da festa organizada exclusivamente pelos brasileiros. Terra Nova tem sido apontado como o maior mobilizador de protestantes brasileiros para Israel, cujas caravanas são em torno de 25 vezes maiores do que as lideradas por outros pastores ( Paganelli, 2020: 130).

Sionismos cristãos em disputa

Três tipos de sionismo cristão foram mencionados acima: o sionismo cristão clássico, o novo sionismo cristão e o sionismo cristão simbólico-afetivo. Os argumentos de cada tipo são próximos uns dos outros, pois partem de posições conservadoras da teologia, especialmente no que se refere à escatologia. Todos eles dependem de sistemas já consolidados entre denominações protestantes históricas, pentecostais e neopentecostais. Pode-se afirmar que o clássico é baseado no dispensacionalismo, de longe o sistema predominante no Brasil; o “novo” é a versão reformada do sionismo cristão; e o simbólico-afetivo também é dispensacionalista, mas coloca sua ênfase na celebração e uso dos símbolos judaicos. Isso significa que determinados argumentos podem ser compartilhados e usados seletivamente de acordo com o interlocutor a ser apoiado ou combatido na argumentação.

Apesar da relativa semelhança no engajamento pró-Israel, não foi encontrada articulação entre esses diferentes sionismos cristãos. Não há qualquer tentativa de unidade ou soma de esforços. Pelo contrário: embora as posições teológicas sejam próximas e eventualmente possuam os mesmos argumentos ou referenciais bíblicos, cada movimento procura se distanciar dos outros com severas críticas a ideias ou práticas. Também há de se considerar que eventualmente os movimentos são promotores de caravanas a Israel e, portanto, concorrentes comerciais.

Tome-se o exemplo do sionismo cristão clássico. Os adeptos desse tipo não aceitam os argumentos do novo sionismo cristão em prol da criação e manutenção de um Estado Palestino porque tal situação simplesmente não cabe no seu esquema escatológico, marcado por um literalismo extremo no qual Israel deve controlar toda a Terra Prometida, desde o Sinai até o rio Eufrates. No modelo clássico, os palestinos devem ser assimilados ou deixarem o território. Os sionistas cristãos clássicos também são críticos ao uso de símbolos e celebração de festas judaicas do sionismo cristão simbólico-afetivo. Nesse sentido, por exemplo, consideram estranha (pra não dizer herética) a construção de um “Templo de Salomão”, em São Paulo, pela Igreja Universal do Reino de Deus.

Já o novo sionismo cristão procura explicitar a distância do dispensacionalismo, criticando sua tendência às especulações em torno de notícias internacionais e ao sensacionalismo, especialmente quando suas interpretações ganham conotações de “teoria conspiratória”. É o movimento que busca a maior racionalidade, universalidade argumentativa e diálogo com opositores, razão pela qual também procura se afastar do terceiro tipo pela sua tônica festiva e postura extravagante.

Finalmente, o sionismo cristão simbólico-afetivo talvez seja o mais fundamentalista de todos. Este movimento sequer consideraria os argumentos do novo sionismo cristão, uma vez que está teologicamente situado no esquema dispensacionalista e sua posição junto a Israel é incondicional. Em relação ao sionismo cristão clássico, teria afinidade pela base escatológica em relação ao “ainda não”, mas se coloca muito distante em relação ao “já”, uma vez que os dispensacionalistas são, em grande medida, contrários às teologias da prosperidade, às manifestações carismáticas e aos usos da simbólica judaica comuns entre pentecostais e neopentecostais.

É claro que os três tipos são ideais e não podem corresponder a toda e qualquer manifestação particular de sionismo cristão. Entretanto, eles guardam traços gerais que auxiliam a perceber o quanto os diferentes movimentos não possuem articulação que possa unir esforços. Pelo contrário: são esparsos e fragmentados. Pode-se afirmar que não existe um único sionismo cristão no Brasil, mas “sionismos cristãos” com ênfases, argumentos e manifestações distintas.

Sionismo Cristão e o imaginário do Reino de Deus

A seção anterior explorou como o sionismo cristão no Brasil possui diferentes motivações e ênfases dentro de uma mesma estrutura escatológica paradoxal. A intuição dessa pesquisa, considerando a nossa experiência e convivência no meio protestante brasileiro, é que atualmente a maior parte de manifestações de sionismo cristão partem do terceiro tipo: do sionismo cristão simbólico-afetivo. Ele carrega consigo a hermenêutica dispensacionalista com as expectativas do futuro escatológico, mas tem sua ênfase na vivência presente desse Reino, o “já” do paradoxo, a presença ativa das promessas divinas no cotidiano dos cristãos e na sociedade em que estão inseridos.

A característica de crer em um reino de Deus instaurado e ativo neste mundo, por meio da igreja, demanda envolvimento político. Tal envolvimento tem ganho proporções muito mais significativas na segunda década do século XXI, especificamente por meio de parlamentares ligados ao universo carismático e pentecostal. Como apontam Maria das Dores Campos Machado, Cecília Mariz e Brenda Carranza (2021: 24), a teologia do domínio, operada pelos apóstolos locais ligados à Nova Reforma Apostólica, foi decisiva para o incremento do ativismo sionista cristão entre parlamentares evangélicos.

Isso significa que não foram as peripécias racionalistas do dispensacionalismo que atraíram o brasileiro ao sionismo cristão, mas a participação concreta e corpórea em uma teologia que tem por manifestação litúrgica e simbólica uma aproximação com Israel, o povo abençoado por Deus cujo nome está intimamente ligado às narrativas bíblicas tão apreciadas pelas comunidades protestantes. Tal fenômeno está relacionado ao poder do símbolo para constituir identidades ligadas à Bíblia e de pertencer às origens judaicas da fé cristã.

A constituição simbólica de Israel e dos sionistas cristãos

O símbolo em operação entre os protestantes das mais diversas vertentes, na sua relação com Israel e os judeus, é o do Reino de Deus e imagens derivadas. Como mencionado no início deste artigo, o conceito de Reino de Deus é manifesto por uma série de metáforas bíblicas que produzem uma simbólica rica e polifônica, de cunho político (como as figuras do trono e do cetro). Os principais elementos políticos são o reino bíblico de Israel (a instituição política da Antiguidade) e Jerusalém (sua capital), ambas fundamentais na narrativa bíblica. Lembre-se o óbvio: o território atualmente chamado de Palestina e o povo judeu estão intimamente ligados à tradição bíblica.

O Israel bíblico é alvo das profecias sobre a vinda do Reino de Deus. E o povo judeu, a despeito de eventuais discussões a respeito da continuidade étnica ou cultural desde a Antiguidade, é o herdeiro das tradições bíblicas. O movimento sionista dos séculos XIX e XX entendeu a importância dessa relação na construção do nacionalismo judaico, que daria origem ao atual Estado de Israel. Assim, as narrativas bíblicas foram utilizadas como “mito fundador” do país dos judeus – afinal, todo país necessita de mitos para constituir sua ideia de nação. Com os judeus não foi diferente, e sua fonte era clara: a Bíblia.

Os nacionalistas israelenses constituíram sua identidade nacional em base bíblica, mas modernizada e laicizada. A Bíblia hebraica deixou de ser pensada como documento religioso e passou a ser prova da conexão do povo com a terra, fornecendo narrativas para legitimar a conquista do território. Durante a Aliá (retorno judaico à Palestina) e desde a Independência de Israel (em 1948) foram usadas exaustivamente metáforas bíblicas da reunião de exilados, da geração do deserto e da conquista de Josué, ou a luta de Davi e Golias, entre outras. Segundo a historiadora israelense Anita Shapira (2018: 312-313), a Bíblia foi usada como motor poderoso da cultura israelense nas primeiras décadas de seu Estado, e a arqueologia era instrumentalizada para trazer o passado para o presente, validando a continuidade dos judeus no Eretz Ysrael.

Não se pretende fazer aqui o levantamento de todas as ações israelenses para a construção de seu nacionalismo. Basta compreender que a nação atual de Israel baseou seu mito fundador no antigo Israel bíblico, estabelecendo uma conexão direta com a Bíblia, tirando-a da prateleira dos livros teológicos e colocando-a na dos livros históricos para dar a um povo plural uma origem comum – como esclarece o historiador Shlomo Sand (2011: 228).

Volte-se às considerações do início desta seção relacionadas ao símbolo do Reino de Deus no paradoxo do “já” e do “ainda não”. Enquanto os israelenses constituíam sua nação encharcada de símbolos e metáforas bíblicas, os sionistas cristãos observavam com entusiasmo o cumprimento de sua interpretação das Escrituras. Desde então, os sionistas cristãos clássicos observam o desenrolar dos acontecimentos em Israel na ardente expectativa da volta de Cristo e instauração definitiva do milênio e do Reino de Deus, enquanto os sionistas cristãos simbólico-afetivos celebram a chegada desse Reino na expressão concreta do mesmo Estado de Israel.

A tese de Reinhart Koselleck (2006: 308-313) auxilia aqui. Segundo esse historiador dos conceitos, nossas ações sociais e políticas são orientadas pelo entrelaçamento de duas categorias meta-históricas: o espaço de experiência (o passado incorporado em nossa lembrança, que funde tanto a racionalidade como o comportamento inconsciente) e o horizonte de expectativa (aquilo que no presente se espera como realização no futuro, que ainda não foi visto, mas pode ser previsto ou imaginado). Cada geração vive sob essa dupla condição: impregnada de experiências sobrepostas, mas também influenciada pela esperança ou decepção que repercute nas primeiras. Por isso, Paul Ricoeur (2010: 363) afirma que cada pessoa é afetada tanto pela história vivida como pela história que faz a partir das próprias narrativas.

Então, o que aconteceu a partir da metade do século XX? O espaço de experiência passou a comportar um país situado na Terra Santa com o nome bíblico de Israel, fazendo com que o horizonte de expectativa dos sionistas cristãos se intensificasse exponencialmente pela chegada de um evento que era considerado ainda para o futuro. Se antes a esperança profética era o retorno dos judeus à Terra Prometida, a partir de então tal expectativa passou a ser uma realidade. O resultado político foi evidente no contexto norte-americano, como aponta Yaakov Ariel (2017: 16): a Guerra dos Seis Dias, de 1967, incrementou o envolvimento de cristãos conservadores na causa sionista, uma vez que os eventos validavam suas interpretações das escrituras e da história. É claro que a restauração de Israel não aconteceu conforme se esperava, pois foi produzida por nacionalistas judeus descrentes de Jesus Cristo (e até mesmo agnósticos, ateus e, pior, “comunistas”). Mas o símbolo “Israel”, como país autodeterminado, estava plantado, pronto a produzir identidades narrativas.

Desde então, relacionar acontecimentos da política internacional com ideias preconcebidas tem sido a tônica do sionismo cristão. Por um lado, o Estado de Israel produziu inúmeros entrecruzamentos narrativos com a Bíblia na construção de seu nacionalismo; por outro, os sionistas cristãos passaram a interpretar as profecias tendo o jornal diário nas mãos, traduzindo as metáforas bíblicas conforme os acontecimentos do presente e produzindo um novo imaginário para compreender Israel e o povo judeu. Esse método tem sido sistematicamente utilizado pelo dispensacionalismo, mas ampliado pela vertente simbólico-afetiva ao assimilar símbolos e liturgias judaicas em sua estética religiosa. Pentecostais e neopentecostais passaram a celebrar as festas prescritas na Torá e símbolos bíblicos como o menorá e o shofar, mas incluíram em suas liturgias elementos desenvolvidos na milenar cultura judaica, como o talit, o quipá, o chanukiá e até mesmo a bandeira do Estado de Israel. Todos esses elementos são percebidos como pertencentes ao povo de Israel em todo o tempo, e por isso mesmo constitutivos de uma ideia de Reino de Deus. Neste sentido, o universo simbólico dos judeus passa a representar uma essência, uma ideia que transcende o tempo e o espaço. 8 Tais símbolos passaram a ser imaginados como representativos, ao mesmo tempo, do Israel bíblico, do Israel moderno e da Igreja, entrelaçados como manifestações visíveis do Reino de Deus agindo neste mundo. Por isso, é natural ver um protestante usando um pingente com a Estrela de Davi; não se trata de referência ao judaísmo, mas a Davi, de quem Jesus é filho. É um símbolo do Messias de Israel, Jesus de Nazaré – e relacionado, pelo protestante que o usa, ao Reino de Deus.

A Bandeira de Israel, criada por David Wolffsohn para os congressos sionistas realizados na Basileia pela Organização Sionista Mundial, na virada do século XIX ao XX, é um caso emblemático. Conceitualmente, é a estilização gráfica do talit, o manto de oração judaico, mantendo o fundo branco e as tarjas azuis e incluindo em seu centro a Estrela de Davi, símbolo inserido no século XVII e popularizado no judaísmo desde o século XIX. Ou seja, os símbolos religiosos do judaísmo foram transformados no maior símbolo nacionalista israelense, laicizando seus sentidos. 9 Pois os sionistas cristãos simbólico-afetivos do Brasil fizeram o caminho inverso: tomaram a bandeira nacional e laica do Estado de Israel e a devolveram para seu lugar religioso, tornando-a símbolo não de um país, mas de uma ideia de Reino de Deus. Por isso a bandeira de Israel frequenta o palco de igrejas pentecostais e neopentecostais e aparece sendo tremulada em eventos como a Marcha para Jesus ou mesmo em manifestações políticas de direita e extrema-direita, onde slogans, como “Deus, pátria e família”, são entoados. O que está sendo tremulada não é a bandeira que representa o Estado de Israel enquanto entidade política estabelecida no Oriente Médio, mas o Reino de Deus em andamento neste mundo.

Os problemas do imaginário sionista cristão do Brasil

O uso da bandeira de Israel de maneira indiscriminada causa constrangimento e reprovação de entidades judaicas brasileiras. 10 Evidentemente, há um ruído de entendimento entre israelenses e sionistas cristãos no uso do símbolo. Para aqueles, a bandeira representa seu Estado nacional; para estes, o Reino de Deus. Não possuem o mesmo significado, embora o objeto seja o mesmo.

Entretanto, confusões interpretativas à parte, o entusiasmo simbólico por Israel esconde outro problema mais grave: o Israel da simbólica do sionismo cristão não é o Israel real, com toda a sua pluralidade e contradição. É um Israel bíblico e mítico, produzido pelo imaginário cristão ao longo de séculos e reposicionado recentemente pelo dispensacionalismo. O Estado de Israel moderno é imaginado como tendo a Torá por base de sua legislação, o judeu como alguém devoto ao mesmo

Deus dos cristãos e um país conservador e baluarte contra os inimigos da fé judaico-cristã ocidental – o país portador de um judaísmo “que rime com o cristianismo conservador, que contenha fortes referências messiânicas e que tenha definições livres de propostas de esquerda ou liberais”, como aponta Michel Gherman e Misha Klein (2019: 105). Enfim, trata-se de um Israel imaginado à imagem e semelhança das ideias protestantes a respeito de política e sociedade. O israelense, cidadão desse país, é compreendido como um cristão no comportamento ético, faltando-lhe apenas aceitar Jesus Cristo como o Messias de Israel.

Como foi possível construir essa imagem? Como os sionistas cristãos imaginam um Israel tão distinto da realidade? Porque simplesmente não há contato entre judeus e protestantes no Brasil, nem a nível coletivo, tampouco individual. Essa foi a percepção de entrevistas realizadas com autoridades judaicas e protestantes ligadas ao diálogo religioso brasileiro ( Reinke, 2022: 240-249). Os neopentecostais que fazem uso dos símbolos e imitam os rituais judaicos o fazem por meio de conhecimento adquirido em livros e na Internet, mas sempre por meio de obras de cunho religioso, desconhecendo os aspectos seculares dos israelenses. Eles não frequentam sinagogas nem se relacionam com qualquer judeu – salvo raras exceções. O cientista político Igor Sabino (2020: 23), defensor do novo sionismo cristão, também tem o mesmo entendimento: o evangélico que sinceramente expressa seu amor a Israel jamais conversou com um judeu .

A antropóloga Sônia Ramagem (2001) concluiu basicamente o mesmo quando trabalhava na Seção Cultural da Embaixada Israelense no Brasil. A pesquisadora descobriu que os pentecostais percebem os judeus como entidades míticas, parte de um Israel idealizado e parecido com o descrito na Bíblia. Então os visitantes pentecostais da embaixada ficavam surpresos pelo fato dela estar vestida de maneira moderna e não com as longas túnicas, mantos e véus das figuras bíblicas. Também manifestavam estranhamento pelo comportamento moderno dos judeus em geral e acabavam deixando de frequentar os espaços judaicos. Segundo Ramagem (2001: 242-247), para os pentecostais, o Estado de Israel não poderia ser o verdadeiro Israel, pois deveria ser um país santo e diferente dos demais países.

Ou seja, ocorre uma crise identitária quando o sionista cristão encontra o judeu ou o Israel verdadeiros e suas demandas bem pouco ortodoxas. Ele não entende quando descobre que as questões sobre casamento homoafetivo ou acesso público ao aborto não são tratados na legislação israelense, como ele imagina que deveria ser por um povo “baseado na Bíblia”. Tampouco quando é informado que muitos judeus contemporâneos sequer confessam religião. Então esse sionista cristão se decepciona, pois o Israel que ele imagina deveria ser a manifestação do Reino de Deus neste mundo e jamais poderia estar coadunado com “ideais progressistas”.

A consequência é que esse mesmo sionismo cristão, tão entusiasmado na defesa de Israel, pode ganhar notas contraditórias. Se o judeu e o Estado de Israel reais não podem ser como de fato são, então sua forma de ser passa a ser considerada ilegítima de acordo com o imaginário sionista cristão. E isso é, basicamente, antissemitismo.

Conclusão

O fenômeno do sionismo cristão no protestantismo brasileiro é complexo. Suas manifestações, embora semelhantes no resultado, ocorrem com motivações distintas e por comunidades por vezes antagônicas. Para além das questões políticas ou sociais, há de se observar a raiz hermenêutica dessa paixão, tão vinculada à Bíblia e às leituras que o protestantismo brasileiro faz dela. Disso deriva o interesse dessa pesquisa pelo universo simbólico no sionismo cristão.

Paul Ricoeur (2019: 366) afirma que o “símbolo dá o que pensar”, provocando reflexões que procedem justamente da abertura do símbolo a múltiplos modos de pensar. Entretanto, se o símbolo dá o que pensar e convida à reflexão, também carrega uma fraqueza, que é o potencial para produzir confusões, derivações fantasiosas e imaginários desvinculados do real – como adverte o teólogo Dietrich Ritschl (2012: 25). Então, o sionismo cristão pode estar sofrendo, em alguma medida, desse tipo de distorção hermenêutica. E isso se dá especialmente porque os judeus são, para os sionistas cristãos do Brasil, ilustres desconhecidos.

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Notas

1 Está-se usando o termo “protestante” de maneira bastante livre para todas as denominações derivadas da Reforma, tanto históricas como o pentecostalismo e neopentecostalismo. “Evangélico” é outro termo que poderia ser usado no mesmo sentido, dado o uso popular no Brasil.
2 Como pode ser verificado na busca de jornalistas por explicações para tal apoio. Veja-se o artigo “Por que tantos evangélicos defendem Israel?”, da jornalista Letícia Mori, na qual maiores esclarecimentos foram tomados junto a teólogos protestantes. Disponível em: < https://www.bbc.com/portuguese/ articles/clkjxpvjxjgo > (Acessado em: 16/10/2023).
3 A pluralidade de aproximações simbólicas de igrejas neopentecostais com o judaísmo foi bem examinada por Manoela Carpenedo (2021), concluindo que os “evangélicos judaizantes” complicam as atuais elaborações sobre o fenômeno ( Carpenedo, 2021: 214). Há que se considerar, entretanto, se tal grupo – que está gradativamente se desconectando do cristianismo e sublinhando as origens marranas em seu processo de judaização ( Carpenedo, 2019: 170, 181) – poderia ser enquadrado como “sionista cristão”. Essa comunidade não parece demonstrar engajamento no aspecto “sionista” e está se distanciando cada vez mais do elemento “cristão” tanto na teologia quanto na simbólica e liturgia.
4 O dispensacionalismo é um método hermenêutico milenarista que compreende a história da salvação em uma série de dispensações (ou economias) por meio das quais Deus revela uma ordenança para a humanidade, o que ela não consegue cumprir, fazendo surgir uma nova dispensação. Esquemas como os de John Darby (1800-1882) e Cyrus Scofeld (1843-1921) estabeleceram um total de sete dispensações, sendo que estaríamos atualmente na sexta (a da Igreja), que também terminará em apostasia como as anteriores. Na perspectiva dos dispensacionalistas clássicos, o Reino será a sétima e última dispensação, tempo da volta de Cristo para reinar em Jerusalém e, igualmente, quando Israel será restaurado em suas fronteiras bíblicas ( González, 2009: 94-95).
5 Disponível em < https://www.chamada.com.br/ > (Acessado em: 16/10/2023).
6 Disponível em: < https://www.instagram.com/philosbrasil/ > (Acessado em: 16/10/2023).
7 Disponível em: < https://www.icejbrasil.com.br/.> (Acessado em: 16/10/2023).
8 O uso anacrônico de símbolos recentes do judaísmo foi percebido na visita ao Jardim Bíblico da Igreja Universal do Reino de Deus em São Paulo (junto ao Templo de Salomão). Ali está construída uma réplica do Tabernáculo em tamanho real. Dentro do Mar de Bronze foi colocada uma taça de bronze, tendo gravada em uma de suas laterais a Estrela de Davi – um símbolo que sequer é bíblico, assimilado pelas comunidades judaicas a partir do século XVII. Mas era percebido como parte da essência judaica e, por isso mesmo, fazendo parte do imaginário iurdiano em torno do tabernáculo mosaico.
9 Disponível em: < https://www.jewishvirtuallibrary.org/the-israeli-flag> (Acessado em: 16/10/2023).
10 Diversas instituições judaicas manifestaram repúdio ao uso da bandeira de Israel em movimentos político-partidários do governo Bolsonaro, como uma nota emitida pela Confederação Israelita do Brasil em 2020. Disponível em: < https://conib.org.br/noticias/todas-as-noticias/conib-faz-alerta-sobre-uso--de-bandeiras-de-israel-em-manifestacoes.html> (Acessado em: 16/10/2023.).

Autor notes

* Doutor em Teologia pelas Faculdades EST. E-mail: andre_reinke@yahoo.com. ORCID iD: < https://orcid.org/0000-0002-9438-4353 >.
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