DOSSIER
Memória biocultural: cultura(s)-natureza(s) na contramão do capitaloceno
Memoria biocultural: cultura(s)-naturaleza(s) como antítesis al Capitaloceno
Biocultural memory: culture(s)-nature(s) as an antithesis to the Capitalocene
Memória biocultural: cultura(s)-natureza(s) na contramão do capitaloceno
Revista Tramas y Redes, núm. 3, pp. 25-49, 2022
Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales
Recepción: 28 Junio 2022
Aprobación: 27 Octubre 2022
Resumo: O artigo objetiva analisar o conceito de memória biocultural enquanto uma política de memória, na contramão da crise civilizatória imposta pelo modelo capitalista neoliberal no Capitaloceno. Inicialmente trarei algumas reflexões sobre os processos de desmemória no auge da crise civilizatória planetária. Em seguida, apresento o constructo da memória biocultural e proponho pensá-la enquanto política de memória. Depois, apresento a questão “Como recuperar as memórias perdidas?” e proponho três tópicos à análise: (r)evolucionar as epistemes e as práticas; descolonizar o pensamento e, por fim, a proposta de “não vamos comprar o que vocês querem nos vender”. Os tópicos visam apresentar estratégias teórico-práticas à retomada da memória biocultural nas sociedades ocidentais assoladas pelo modelo desenvolvimentista colonial e expropriador.
Palavras-chave: Capitaloceno, memória biocultural, ecologia de saberes, crise civilizatória.
Resumen: El artículo analiza el concepto de memoria biocultural como política de memoria ante la crisis civilizatoria impuesta por el modelo capitalista neoliberal en el Capitaloceno. Inicialmente, discuto los procesos de pérdida de memoria en la crisis de civilización planetaria. A continuación, presento el constructo de memoria biocultural y propongo pensarlo como una política de memoria. Luego, presento la cuestión de cómo recuperar las memorias perdidas, desde tres temas de análisis: (r)evolución de epistemes y prácticas; descolonizar el pensamiento; no comprar lo que nos quieren vender. Los temas presentan estrategias teórico-prácticas a la recuperación de la memoria biocultural en las sociedades occidentales devastadas por el modelo colonial y expropiador.
Palabras clave: Capitaloceno, memoria biocultural, ecología de saberes, crisis civilizatoria.
Abstract: The article analyzes the concept of biocultural memory as a memory policy in the face of the civilizational crisis imposed by the neoliberal capitalist model in the Capitalocene. Initially, I discuss the processes of memory loss in the crisis of planetary civilization. Next, I present the construct of biocultural memory and I propose to think of it as a memory policy. Then, I present the question of how to recover lost memories, from three themes of analysis: (r)evolution of epistemes and practices; decolonize thought; not buy what they want to sell us. The themes present theoretical-practical strategies for the recovery of biocultural memory in Western societies devastated by the colonial and expropriating model.
Keywords: Capitalocene, Biocultural memory, ecology of knowledges, civilizational crisis.
Crise civilizatória planetária
O conceito biocultural surge com a intenção de religar a natureza com a cultura, dimensões que foram divididas pela modernidade/colonialidade como formas hegemônicas de entender o mundo. Essa noção equivocada, que perdura há mais de 500 anos, reduziu o desenvolvimento científico, relegando ao social um status menor (soft) ligando-o às humanidades, às artes, portanto, sem rigor científico. Porém, essa separação não corresponde à dimensão do humano em relação ao planeta, ao cosmos, tampouco à nossa ecodependência, pois vivemos e somos natureza, uma espécie mais na natureza (Toledo e Barrera-Bassols, 2015).
O social foi construído sobre a égide do sujeito único, delimitado, mas essa construção vem demonstrando seus limites, principalmente quando concebemos que o social nunca é algo em si mesmo, ontologicamente separado, pois as “relações sociais incluem não humanos e humanos como parceiros socialmente ativos” (Haraway, 1997, p. 8).
Eu tento deslocá-lo (o social) de seu espaço exclusivo dos fazeres humanos, do modo que, no final das contas, a maioria dos teóricos sociais está realmente falando de relações sociais e história; e é basicamente uma forma humana que constitui a si mesma sobre e contra o que não é humano […] Acredito que “o social” como um substantivo é tão problemático quanto “o animal” ou “o humano”, mas, como verbo, ele é muito mais interessante. De algum modo, precisamos entender como não fazê-lo enquanto substantivo, mas sem perder suas qualidades positivas. Então, o que poderia significar social? Não se pode proceder por analogia porque você não quer antropomorfizar os parceiros não humanos como uma forma de encontrá-los. (Haraway, 2021, pp. 135-137)
A noção de individualismo radical imprime primazia ao indivíduo ideal, autoproduzido, livre de todas as amarras que, em realidade não existe, pois “qualquer indivíduo só vem ao mundo por meio de companheiros de sua espécie, de outras espécies e de outras naturezas” (Silva e Silva, 2021).
Donna Haraway em “O manifesto das espécies companheiras: Cachorros, pessoas e alteridade significativa” (Haraway, 2021) sublinha a inseparabilidade das “coisas” que os modernos se habituaram a dividir. A autora critica o Antropoceno que normaliza a ideia do ser humano como espécie central. Ela prefere adotar o termo Capitaloceno, definindo o imperativo inflexível do capitalismo e da lógica neoliberal de se expandir e crescer.
O termo Antropoceno foi criado pelo biólogo norte-americano Eugene F. Stoermer, em 1980, e popularizada pelo cientista holandês Paul Crutzen no início dos anos dos mil. Crutzen propôs que deixamos para trás a época conhecida como holoceno, substituindo a natureza como a força ambiental dominante na Terra. O antropoceno indica a marca geológica da Era dos Humanos na Terra. Em termos mundiais, a expansão de habitantes cresce em ritmo exponencial e explosivo (UNESCO, 2018). Um estudo publicado na revista Nature (Elhacham et al., 2020) demonstra que a massa de tudo o que foi construído pelo ser humano no planeta em 2020 (massa antropogênica) superou, pela primeira vez na história, a massa conjunta dos seres vivos (biomassa). Só a massa de plásticos existente no planeta já é duas vezes maior que a de todos os animais terrestres e aquáticos. Nossa “planetarização”, nossas atividades e interferências humanas afetam, direta ou indiretamente, o planeta e colocam em risco a própria sobrevivência da humanidade. As cidades talvez sejam o exemplo da marca geológica do impacto humano: os edifícios, o asfalto, as luzes, as paisagens alteradas em contraste com as áreas naturais. Ainda, o período com temperaturas mais quentes após a última glaciação. Assim, o antropoceno se caracteriza principalmente por três fatores: o acelerado progresso tecnológico pós Primeira Revolução Industrial; o crescimento populacional vertiginoso, das cidades e das infraestruturas e rotas de transporte; e o aumento da produção e do consumo, o que provocou um crescente aumento no consumo de recursos naturais, minerais e fósseis (UNESCO, 2018).
Jason W. Moore (2016), historiador ambiental e geógrafo histórico, é o autor que sugere utilizar o termo Capitaloceno buscando melhor descrever os impactos humanos concretos sobre a geologia da Terra, pois é o sistema capitalista que produz a crise ecológica global que tem nos levado a uma mudança de era geológica (UNESCO, 2018). O Capitaloceno propõe pensar a crise ecológica mundial em que as condições do desenvolvimento capitalista não se reduzem ao desenvolvimento tecnológico, nem às lógicas do mercado neoliberal mundial, nem a separação entre os meios de produção e a força de trabalho. Assim, a natureza ocupa o centro do pensamento sobre o trabalho e o trabalho o centro do pensamento sobre a natureza. Os impactos humanos sobre a Terra têm a digital das sociedades capitalistas, baseadas em novas formas de organizar as relações entre o trabalho, a reprodução e as condições de vida, externalizando radicalmente a natureza dessas condições.
O limite que é o Antropoceno/Capitaloceno significa muitas coisas, incluindo o fato de que a imensa destruição irreversível está realmente ocorrendo, não só para os 11 bilhões ou mais de pessoas que vão estar na terra perto do final do século 21, mas também para uma miríade de outros seres. (O número incompreensível, mas sóbrio, de cerca de 11 bilhões somente será mantido se as taxas de natalidade de bebês humanos, em todo o mundo atual, permanecerem baixas; se elas subirem novamente, todas as apostas caem por terra). “À beira da extinção” não é apenas uma metáfora; e “colapso de sistema” não é um filme de suspense. Pergunte a qualquer refugiado, de qualquer espécie. (Haraway, 2016, p. 141)
Nos termos de Haraway, não existe “futuro vivível” no capitalismo. Em termos ambientais vivemos um regresso absurdo ao obscurantismo, em que nos desvinculamos da natureza esquecendo as relações profundas entre diversidade biológica e diversidade cultural, produzindo processos e efeitos de amnésia biocultural.
Porém um futuro vivível passa por inventar maneiras de viver e morrer bem juntos, ainda sob condições cada vez mais adversas. Mesmo para os humanos, que têm a pretensão de ter se estabelecido como a maior força deste planeta — simplesmente porque podem destruir a Terra, seja num piscar de olhos ou em uma lenta morte agoniante —, viver uma vida plena e morrer de maneira digna são enormes privilégios. Para as outras espécies sob nosso jugo, a situação também é terrível: algumas poucas são multiplicadas infinitamente para produzir valor, enquanto outras desaparecem para sempre. (Silva e Silva, 2021, s/p)
A industrialização, a Ciência Positivista e a constituição das cidades foram nos separando da natureza. Essa industrialização se dá pela exploração de recursos não renováveis, que concentra a energia na cidade, gerando periferias urbanas e rurais. Na agravada crise do modelo civilizatório não há limite ao crescimento (Toledo e Barrera-Bassols, 2015). Diante de nossos olhos vemos um verdadeiro atentado contra a sociobiodiversidade e a memória da espécie humana, em que seus conhecimentos acumulados vão sendo exterminados.
A natureza está desvinculada da sociedade desde a origem do capitalismo. A crise civilizatória planetária é, pois, um aprofundamento dessa separação. A atual crise ambiental se caracteriza pelas marcas que vamos deixando, a “pegada de carbono”; a “pegada hídrica”; a diminuição dos recursos energéticos e materiais; a mudança e crise climática; a subtração de sistemas biodiversos; e um contundente limite na capacidade de sobrevivência de muitos ecosistemas, impactando diretamente nossa segurança alimentar. À crise ambiental se soma a crise econômica e social, o que nos permite falar de um colapso socioeconômico mundial.
A fim de superar a cisão ontológica tradicional da metafísica moderna, Haraway (2021) propõe o termo natureza(s)-cultura(s), interligados, de “devir conjunto entre humanos e outros viventes”. As natureza(s)-cultura(s) se tornam um lugar de encontro: de carne e linguagem, história e mundo (Silva e Silva, 2021).
O termo natureza(s)-cultura(s), portanto, sublinha a inseparabilidade das coisas que os modernos se habituaram a dividir. Ele enfatiza mesmo a indecidibilidade a nível teórico, e que dirá pragmático, se algo é cultura ou é natureza. Naturezas-culturas antecedem e sucedem qualquer tentativa de purificação definitiva desses polos. Isto é, pode-se afirmar que algo é natureza ou é cultura apenas temporária e tentativamente em uma rede material-semiótica muito específica, na medida em que se separa o que estava junto e se coloca muito trabalho em mantê-los separados. (Silva e Silva, 2021, s/p)
O conhecimento da espécie humana vai além do conhecimento científico ocidental e dos teoremas modernos que veem a Terra como se estivessem fora dela, adotando modelos explicativos globais que desprezam os entornos locais. Mas, “o projeto de habitar o mundo com atenção e cuidado a seus companheiros e companheiras em múltiplas escalas é um convite a cultivar outros modos de vida […]” (Silva e Silva, 2021, s/p).
Pensando nos entornos locais, é na periferia rural que reside a possibilidade de retomar as memórias perdidas, inclusive das relações e do trabalho humano com a natureza. As culturas ancestrais se caracterizam por enriquecer a natureza ao ocuparem um lugar, produzindo biodiversidade coevoluíram com a natureza e geraram um importante acervo de memória biocultural que expressa costumes, ritmos, alimentos e relações com outras espécies integradas aos territórios. As línguas, por exemplo, são mais do que esquemas de signos linguísticos, são ecologias de comunidades práticas, experiências históricas (Toledo e Barrera-Bassols, 2015).
Memória biocultural e políticas de memória
A espécie humana compartilha com outras espécies seus processos de memória, ou seja, os povos coevoluíram com a natureza. Nesse sentido, a história é acumulativa interespécies. Todos os componentes da natureza, os genes, as espécies têm memória. Nossa espécie humana tem um cérebro muito particular, que nos permite recordar e, ao nos comunicarmos, falarmos dessas recordações e suas significações. Recordamos conjunturas, eventos, que nos permitem adaptar-nos às surpresas da natureza (Toledo e Barrera-Bassols, 2015).
A memória biocultural é essa herança, essa recordação que nossa espécie tem de nossa “passagem” pela Terra. Essa memória é, a um só tempo, individual, social, civilizatória, mas também é memória genética e biológica. Ainda que a cultura nos diferencie de outros seres, também nos alinha a eles (Toledo e Barrera-Bassols, 2015).
Podemos pensar que a cultura nos permite colocarmo-nos ao mesmo nível das asas das aves, por exemplo, pois nos permite imitar e inventar esses dispositivos e tecnologias que nos permitem voar. Trata-se do plano sociogenético de nosso desenvolvimento, em que a cultura alarga nossas potencialidades filogenéticas, enquanto espécie humana, e promove o desenvolvimento de um conjunto de saberes de forma coletiva e inventiva (Vygotsky, 2013).
Conforme Toledo e Barrera-Bassols (2015), desde a revolução neolítica ou agrícola, há 10-12 mil anos atrás, os povos agrícolas inventaram novas espécies, novos objetos-sujeitos e assim “moldaram” a natureza, criaram novas paisagens. Esse é um constructo eco-sociológico que se dá do encontro inseparável entre natureza(s)-cultura(s).
Para os autores, a memória biocultural envolve um processo evolutivo de diversificação que passou por diferentes ondas: 1ª. A diversificação biológica, a adaptação e a diversificação de organismos em todo o planeta; 2ª. A diversificação do ser humano, os processos de colonização e expansão geográfica e, consequentemente, a diversidade cultural genética, linguística e cognitiva; 3ª. A criação de novas espécies, a revolução agrícola, a grande diversidade dos sistemas agrícolas que domesticou uma enorme variedade de animais, espécies de cultivo, plantas, manejo de paisagens, levando ao aumento da biodiversidade; 4ª. A criação humana de novas paisagens com manejo ecológico, geomorfológico e hidrológico, em que as sociedades agrícolas modificaram os habitats para criar áreas de produções de bens e serviços, gerando novas paisagens.
A diversidade biocultural envolve um “complexo biológico-cultural” originado historicamente, envolvendo diversidade biológica, genética, linguística, cognitiva, agrícola, pecuária e paisagística. “Esse processo biocultural de diversificação é a expressão da articulação e amálgama da diversidade da vida humana e não humana e representa, em estrito sentido, a memória da espécie” (Toledo e Barrera-Bassols, 2015, p. 40).
[…] Pode-se dizer, então, que é nessa ampla e complexa coleção de saberes locais, de cuja análise em conjunto devemos obter recordações-chave e identificar eventos que tiveram uma influência profunda e duradoura sobre toda a espécie, que se encontra a memória da espécie humana, ou o que ainda resta dela. Essas sabedorias localizadas, que existem como consciências históricas comunitárias, uma vez totalmente conjugadas, operam como a sede principal das lembranças da espécie. São, portanto, o hipocampo do cérebro da humanidade, o reservatório mnemônico que permite que qualquer espécie animal se adapte continuamente a um complexo mundo em constante mudança. (Toledo e Barrera-Bassols, 2015, p. 41)
Na concepção dos autores, a essência da memória biocultural reside nos conhecimentos tradicionais que não se restringem aos aspectos estruturais da natureza, mas também às dimensões dinâmicas, de processos e relacionais, ligadas aos eventos naturais e utilitários dos recursos naturais e paisagens.
Retomar memórias bioculturais é operar políticas de memória. Na Psicologia Política, a “memória política” é uma dimensão analítica fundamental ao estudo dos fenômenos políticos no contemporâneo, em suas condições objetivas e subjetivas. Um de seus elementos centrais é sua dinâmica afetivo-emocional, inclusive o termo recordar, re cordis do latim, significa voltar a passar pelo coração (Hernandez, 2020).
Lifschitz (2014) indica que todos os povos têm diferentes graus de memória em relação aos acontecimentos políticos, sendo que o campo de práticas em torno à memória política está associado aos processos políticos vividos a partir da segunda metade do século XX. Segundo Rancière (1995, p. 242), os modelos historiográficos do século XX neutralizaram o “objeto” próprio do saber histórico, do acontecimento, negando sua racionalidade própria “aquela do real, que não se preocupa em se fazer preceder, justificar, fundamentar por sua possibilidade”.
Assim, Ansara (2012, p. 306) pondera que o grande desafio de pensar políticas de memória é que estas deem conta das demandas dos movimentos que lutam pela construção de uma memória popular ou, por assim dizer, de uma “memória dos vencidos”, ou seja, pelos grupos e minorias que criam novos suportes e “lugares da memória”.
No que tange à memória histórica Pierre Nora (1993, em Lifschitz, 2014) refere que o Estado desempenha papel ativo na construção de memórias nacionais, uma construção intencional e oficial. Nesse sentido, Pollak (1989) aponta que há sempre uma escolha dos fragmentos que serão contados e dos que serão silenciados. Há, pois, uma relação tensão colocada entre a intencionalidade de oficializar algumas memórias e subjugar outras. Assim sendo, Pollak sugere que as “memórias subterrâneas” quando situadas no presente acabam esgarçando as versões da História oficial, trazendo à superfície experiências e saberes coletivos, de grupos e sujeitos comuns.
O problema que se coloca a longo prazo para as memórias clandestinas e inaudíveis (subterrâneas) é o de sua transmissão intacta até o dia em que elas possam aproveitar uma ocasião para invadir o espaço público e passar do “não-dito” à contestação e à reivindicação. (Pollak, 1989, p. 9)
Políticas de memória são uma ação de retomada de memórias que precisam sobreviver. Nesse sentido, retomar memórias bioculturais constitui uma política de afirmação e visibilidade, pois é recordando que se faz existir. A memória política biocultural é um registro de resistência elaborada e narrada por povos, grupos e comunidades a partir de seus próprios interesses e recordações (Hernandez, 2020). Operar políticas de memória supõe retomar, ocupar contextos de experiência narrativa e prática no presente. Será fundamental que os sujeitos das memórias narrem seus saberes e experiências, expondo sua relação intrínseca e única com o acontecimento social e político.
Há uma concentração histórica entre a diversidade sociocultural e biológica, o conhecimento e as culturas. Na Figura 1 apresento uma síntese das quatro ondas da memória biocultural, a partir três elementos: Cosmos (1ª onda), Corpus (2ª onda) e Práxis (3ª e 4ª onda).
O fluxograma busca ilustrar como o cosmos, o corpus e a práxis foram se integrando e formando o que hoje conhecemos como memória biocultural. Pensando em um exemplo dessa integração, poderia se dizer que quando um camponês planta, ele também “é plantado” em seu território, ou seja, seus saberes se transpõem em formas culturais que produzem seu alimento, o alimento, por sua vez, o sustenta, o identifica e (re)produz. A um só tempo seu ato de plantar e produzir o alimento é: ação transgeracional, ação tecnológica-prática, ação sagrada, ação cognitiva — que transmite conhecimentos. Conhecer, crer e saber fazer são as tramas da memória biocultural. Como refere Maria Carpi em seu poema:
Tudo o que planto é metade de tudo o que sou plantada. O que planto é um por um; o que sou plantada é sem conta. O que planto é semente comum, em tempo comum, de acordo com o zênite do sol, distribuído em valas e freguesia. E o que sou plantada é semeadura especial, com uma luz fixa e um barco móvel, real. O que planto, água contida; o que sou plantada é sem lacre, chuvas, rios, pranto. O que planto, vejo e reclino, o que sou plantada me vê e apura. O que planto, disperso e colho. O que sou, plantada, me reúne e cura. (Carpi, 1996, p. 18)
O camponês cuida do território, aposta na semente, antes mesmo de produzir o alimento. Almeida (1988) ao estudar o saber camponês chamou atenção para o “governo da lua”. Os camponeses que estudou não concebiam o ciclo lunar como lua cheia, minguante, nova, crescente. A lua transitava entre as condições de “forte” e “fraca” e a lavoura devia seguir esse “governo” que estabelecia os tempos distintos para o plantio. Plantas fortes não deveriam ser plantadas em terra fraca, pois retiravam força do solo. A lavoura camponesa expressa uma ética de equilíbrio, que envolve o cuidado com a natureza, feita numa perspectiva etnoecológica (Woortmann, 2009).
Como recuperar as memórias perdidas?
A história da espécie humana está em contagem regressiva. O pensamento ocidental, a Ciência moderna, as visões eurocêntrica e antropocêntrica objetivaram a natureza e acabamos por nos afastarmos dela. Precisamos de uma retomada radical — desde as raízes — de nossas memórias bioculturais. Urge voltar a lembrar.
Nesse sentido, são os povos originários, tradicionais os que conseguiram preservar uma relação direta e valorativa com/da natureza por considerá-la um “ente inteligente”, com capacidade de agência, com capacidade de estabelecer diálogos e relações com os humanos.
Mas, se nossa memória biocultural depende de uma política do sensível, que atente e cuide dos conhecimentos dos povos originários, tradicionais e camponeses, cabe a pergunta: Onde e como estão os povos originários no Brasil? Numa breve contextualização histórica, voltando ao ano da invasão portuguesa em 1500, estima-se que havia no Brasil uma população próxima a 10 milhões de indígenas, dividida em centenas de etnias e mais de 1300 línguas e dialetos (Bezerra, 2022).
Porém, o século XVI ficou marcado como um projeto de extermínio progressivo dessas populações. A colonização, orquestrada do litoral ao interior do Brasil, dizimou os povos originários brasileiros. Esses povos foram resistindo à aniquilação colonial, sempre aquém das políticas de Estado, enfrentando sérios problemas trazidos pelas mãos de um projeto de desenvolvimento acelerado: destruição de florestas e áreas de mata para abertura de estradas, urbanização de áreas rurais, avanço da mineração, da exploração madeireira, do garimpo, da agricultura do monocultivo, ou seja, da subtração sistemática das terras e riquezas bioculturais. Muitas tribos que, até então haviam sobrevivido graças ao isolamento geográfico, passaram a enfrentar problemas decorrentes dessa expansão da agricultura, do extrativismo vegetal, da pecuária extensiva e das atividades desenvolvimentistas já descritas. Em decorrência, muitos desses povos desapareceram (Bezerra, 2022).
Não obstante, nunca tivemos no Brasil políticas indigenistas robustas. Até 1970, a lei brasileira estabelecia a tutela do Estado para que os povos indígenas fossem “integrados” à sociedade nacional, mantendo a lógica de um Estado colonial que catequiza, converte e tutela, numa posição hierarquicamente superior. Só com a Carta Constitucional de 1988 se reconheceu o direito indígena à terra, à preservação biocultural e à autodeterminação. Porém, há uma distância abismal entre o que promulgou a Constituição Federal e o que acontece, de fato, com os povos indígenas.
Em nosso imaginário social colonial, os povos originários ocupam o lugar menor, dos fundos, quando em realidade são o registo vivo (ou que resta dele) da relação intrínseca entre as cultura(s)-natureza(s) no território. O futuro possível das próximas sociedades reside em que, no presente, possamos retomar esses acervos de memória biocultural já acumulados.
Em pleno século XXI o extermínio segue seu curso. Nossos indígenas estão jogados a beira das estradas ou nos meios-fios das calçadas das cidades, famigerados, adoecidos. Uma das primeiras medidas de Bolsonaro, logo após ser empossado presidente, foi transferir a demarcação das terras indígenas e das terras dos quilombolas para o Ministério da Agricultura entregando o futuro da floresta e de seus povos àqueles que os destroem, os grupos ruralistas, os defensores do agronegócio, da mineração, do extrativismo e do latifúndio brasileiro (Brum, 2019).
O Estado brasileiro sempre apoiou e se manteve ao lado de um modelo rural, primeiro colonial e exploratório, posteriormente neocolonial e exploratório, par e passo com o avanço do modelo capitalista mundial em sua lógica desenvolvimentista tecnicista. Esse avanço teve a inegável contribuição do Estado, através de políticas públicas e programas. O agronegócio é a principal expressão do projeto capitalista no campo e o “Brasil é mais latifundiário do que se pensa” (Fabrini, 2008, p. 48).
Nos dados do censo de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 817 mil pessoas se declararam indígenas, o que representa um percentual de 0,42% da população brasileira. Mais de 60% dessa população está localizada na Amazônia Legal, região formada pelos estados da Região Norte, por Tocantins, Mato Grosso e parte do Maranhão, mas a presença indígena se espalha por todos os estados brasileiros.
No mapa que segue (Figura 1) podemos ver a distribuição dos povos indígenas nas cinco regiões do Brasil, e as terras já demarcadas concentradas na região Norte, mas também vemos a quantidade de terra por identificar e aquelas que ainda estão em estágio de demarcação.
De acordo com o censo (IBGE, 2010), existem 305 grupos étnicos no Brasil. Dentre eles, há dois troncos principais:
No livro Ideias para adiar o fim do mundo, publicado em 2020, Ailton Krenak1 refere:
Em 2018, quando estávamos na iminência de ser assaltados por uma situação nova no Brasil (referindo-se ao governo de Bolsonaro), me perguntaram: “Como os índios vão fazer diante disso tudo?”. Eu falei: “Tem quinhentos anos que os índios estão resistindo, eu estou preocupado é com os brancos, como que vão fazer para escapar dessa”. A gente resistiu expandindo a nossa subjetividade, não aceitando essa ideia de que somos todos iguais. Ainda existem aproximadamente 250 etnias que querem ser diferentes uma das outras no Brasil, que falam mais de 150 línguas e dialetos. (Krenak, 2020, p. 31, grifos nossos)
Chama atenção que, em uma década, entre a divulgação do Censo do IBGE e a publicação de Krenak, o Brasil tenha perdido 55 etnias (de 305 etnias no Censo para 250 registradas por Krenak). Esse dado registra as políticas negacionistas e de extermínio oriundas da “matriz colonial de poder”, conforme Quijano (2011).
Porém, são esses povos originários, campesinos os que ainda coexistem seus modos de vida com a preservação da riqueza biocultural. Para Toledo e Barrera-Bassols (2015) esses povos são os últimos focos de saúde do planeta. Por isso, será preciso voltar a eles, e buscar dispositivos de negociação, de diálogo, de discursos, com efeitos de aprendizagem do que não fomos capazes de aprender nos últimos 500 anos. Esses povos são os maiores possuidores dos conhecimentos mais profundos que a espécie humana tem acerca da natureza:
O que é feito de nossos rios, nossas florestas, nossas paisagens? Nós ficamos tão perturbados com o desarranjo regional que vivemos, ficamos tão fora do sério com a falta de perspectiva política, que não conseguimos nos erguer e respirar, ver o que importa mesmo para as pessoas, os coletivos e as comunidades nas suas ecologias. Para citar o Boaventura de Sousa Santos2, a ecologia dos saberes deveria também integrar nossa experiência cotidiana, inspirar nossas escolhas sobre o lugar em que queremos viver, nossa experiência como comunidade. Precisamos ser críticos a essa ideia plasmada de humanidade homogênea na qual há muito tempo o consumo tomou o lugar daquilo que antes era cidadania. (Krenak, 2020, p. 24)
A ciência apresenta seus limites enquanto chave interpretativa que objetifica e racionaliza a natureza. Esses limites devem ser discutidos com os povos e comunidades que possuem o conhecimento encarnado — saberes situados, pois são grupos culturais capazes de expressar e reconhecer a natureza desde outra perspectiva, pois a ecologia dos saberes deve se integrar à nossa experiência cotidiana.
Mas, como tecer uma rede biocultural de conservação, desenvolvimento e sustentabilidade? Como operar uma ecologia de saberes em que saberes tradicionais e científicos dialoguem? Como apropriar conhecimentos com base nas trocas entre diferentes cosmovisões?
(R)evolução epistêmica e prática
A ecologia de saberes implica diálogos entre saberes, implica abertura, sinergia, a fim de entender a(s) realidade(s) em suas multiplicidades, diferentes cosmovisões e pontos de vista. Nesse sentido, o papel da ciência deixa de ser o de traduzir a realidade em conceitos e modelos heurísticos, mas o de acompanhar os processos de aprendizagem em que os povos originários, camponeses, agricultores possam ensinar. A ecologia de saberes se dispõe a superar os déficits ontológicos e epistemológicos impostos a esses povos.
É dentro desse panorama que se destaca o importante trabalho de valorização realizado por esse exército de estudiosos dos conhecimentos tradicionais e, especialmente, aqueles que se dedicam a documentar, analisar e reavaliar as sabedorias tradicionais pré-modernas sobre a natureza, um esforço intelectual que vai na contracorrente e tem crescido nas ultimas quatro décadas. Esses estudos centram-se na análise desse acúmulo de saberes, não científicos, que há na mente de produtores rurais (agricultores, pastores, pescadores, pecuaristas, caçadores, coletores) e tem servido durante milênios para que a espécie humana se aproprie dos bens e serviços da natureza. (Toledo e Barrera-Bassols, 2015, p. 34)
Estabelecer diálogos entre saberes é inovar, desde a tradição. Para tal, será preciso sair dos laboratórios e espaços herméticos da Universidade e adentrar nos territórios de pluridiversidade, em que os aspectos técnicos ficam em segundo plano e a(s) cultura(s)-natureza(s) ganham protagonismo.
Como afirma Krenak, “tem quinhentos anos que os índios estão resistindo”, então, não se trata de uma insurgência política, mas de formas de enfrentar, resistir e (r)existir ante as adversidades e violências que lhes são impostas desde a invasão. Essas formas de existir, de ser, de agir demonstram que esses povos vêm se adaptando em defesa da diversidade, contra a homogeneização cultural globalizada. Esses povos são muitos outros mundos possíveis. São povos que não aceitam a passividade como resposta.
Nas palavras de Krenak, um dos efeitos no capitalismo global é a produção de uma sensação de que “não conseguimos nos erguer e respirar, ver o que importa mesmo para as pessoas, os coletivos e as comunidades nas suas ecologias”.
Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência de vida. Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente espalhadas pelo mundo que dança, canta, faz chover. O tipo de humanidade zumbi que estamos convocados a integrar não tolera tanto prazer, tanta fruição da vida. Então, pregam o fim do mundo como uma possibilidade de fazer a gente desistir dos nossos próprios sonhos. E a minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história. Se pudermos fazer isso, estaremos adiando o fim do mundo. (Krenak, 2020, p. 27, grifos nossos)
São esses povos que se preocupam com a natureza (povos indígenas, quilombolas, camponeses, agricultores familiares, ribeirinhos etc.), os movimentos capazes de contar mais uma história, recuperando as recordações mais importantes para defender essas porções ameaçadas de memória biocultural planetária.
Só a ecologia de saberes promoverá essa reaproximação, permitindo que, entre todas e todos cheguemos à solução ou remediação dos problemas socioambientais complexos que vivemos atualmente: a crise climática, os refugiados climáticos, o agronegócio, a produção de alimentos transgênicos, a crise hídrica e energética etc. Cabe sublinhar que podemos aprender com esses povos, para os quais a natureza nunca foi um mero “recurso” ou fonte econômica. Para indígenas, camponeses, povos do campo e da floresta, a natureza é sagrada, um recurso biocultural emancipador, produtor de diversidade identitária e cultural.
Trata-se de uma (r)evolução epistemológica e prática que promova e enriqueça as autonomias desses povos, para que decidam os projetos de vida e de desenvolvimento que querem seguir em relação com os demais. Para ciência será preciso inovar pela tradição, estabelecendo novas conexões, a partir do diálogo entre saberes. O camponês terá de se encontrar e contar ao engenheiro de alimentos como vêm, há anos, produzindo comida saudável, não transgênica e de modo sustentável.
A agroecologia é, pois, essa disciplina que surge das ausências e das emergências, principalmente em sociedades que passaram por um longo processo colonização e desenvolveram uma “matriz colonial de poder” (Quijano, 2011). É disciplina atual nos círculos e currículos acadêmicos e científicos, no âmago da crise ambiental, alimentar e civilizatória que vivemos. A agroecologia propõe essa transição, uma via de recuperar essa relação direta com a natureza.
A vertente sociológica da agroecologia se popularizou em Andaluzia, na Espanha, no entendimento de interação entre as disciplinas científicas (naturais e sociais) e as comunidades rurais, da ecologia aplicada à agricultura (Caldart et al., 2012, p. 57). Na Latinoamérica, se trata de uma concepção teórica e prática que dialoga, por exemplo, com a agricultura indígena, das roças tradicionais, que estão diretamente ligadas à ancestralidade e a história dos povos, possuindo uma dimensão sagrada (Rebollar, Bicalho e Semeraro, 2022).
Da perspectiva agroecológica, todas as formas de vida presentes em um ciclo da agricultura (solo, animais, microrganismos, árvores, plantas, pessoas) têm importância enquanto partes de uma complexa estrutura.
No documentário lançado pela Vallente Filmes (2020) intitulado “Guardiões da Terra — Agroecologia em evolução”, acadêmicos, produtores rurais, militantes e estudiosos descrevem como no Brasil o movimento agroecológico começou se gestar nas décadas de 1960 e 1970 nas Comunidades Eclesiais de Base (CEB) disseminadas por todo o país, como resposta às ameaças que a Revolução Verde trazia para diversos coletivos rurais. Falava-se na época de agricultura alternativa. Na década de 2000, os movimentos sociais populares do campo, principalmente os vinculados à Via Campesina, incorporaram a agroecologia à sua estratégia política. Uma estratégia que busca construir outro projeto de campo contrapondo-se ao modelo de exploração capitalista, e tendo como alguns de seus alicerces a soberania alimentar e energética. (Rebollar, Bicalho e Semeraro, 2022, p. 203)
Nesse sentido, a agroecologia coloca os saberes tradicionais e científicos em confluência, reclamando por uma nova ecologia, que é epistemológica, política e cultural, perspectivando outros modos de sociedades. A agroecologia recupera os conhecimentos tradicionais dos povos indígenas e camponeses que, de alguma forma, resistiram ao avanço avassalador do modelo desenvolvimentista capitalista na agricultura. É uma proposta científica interdisciplinar e, enquanto práxis política, retoma as práticas tradicionais de manejo, promovendo a inclusão e autonomia de famílias do campo, “afirmando-se como um modelo de agricultura e de sociedade que tem na Educação do Campo seu esteio” (Silva e Santos, 2016).
A agroecologia, para além de uma teoria, representa uma práxis política e cultural com vistas à preservação ambiental, alimentação saudável, além da valorização e protagonismo dos produtores diretos, pelo direito a produzir e comercializar comida localmente, respeitando a cultura e modos de vida do povo de um lugar.
Nessa perspectiva, inclui a produção agroecológica urbana e periurbana, a capacidade de se produzir alimentos na cidade e em seus contornos, fazendo com que os grupos citadinos voltem a tocar a terra, a cuidar e dialogar com a natureza, produzindo parte de seus alimentos.
Porém, à medida em que se ampliou a crítica a modelo agrário capitalista, os termos “agroecologia” e “sustentabilidade” foram cooptados por setores representantes dos interesses capitalistas (Guhur e Toná, 2012). Os críticos negam a capacidade do modelo agroecológico de produzir em grande escala, inviabilizando a satisfação das demandas alimentares globais.
Ainda, a agroecologia discute novos fundamentos econômicos, na contramão do modelo capitalista e das diferentes formas de opressão, como o colonialismo e o patriarcado que, apesar de distintos, estão aliados aos interesses capitais. Nesse sentido, não podemos deixar de afirmar que a agroecologia é uma luta das mulheres trabalhadoras.
Diante do exposto, a agroecologia pode ser um vértice na (r)evolução de pensamento e ação na redefinição de rumos civilizatórios, enquanto proposta exequível e necessária à novas economias e ecologias de vida.
Descolonizar o pensamento
Conforme Acosta (2016), o fato das epistemologias Sul-Sul constituírem um projeto epistemológico e político ainda em construção não deve ser considerado um problema. A não existência de uma trilha predeterminada nos liberta das linhas já traçadas pelas visões modernas, antropocêntricas e eurocêntricas. O horizonte se torna a linha imaginada aonde se quer chegar. O horizonte é ponto de partida, nunca de chegada.
Na matriz colonial-imperial, países como o Brasil — e nossos irmãos na Latinoamérica, se constituíram mediante lógicas de dominação operadas com o objetivo de controlar as vidas, a natureza, a espiritualidade, a cultura dos povos “subalternizados”. Assim, foram também sendo controlados os saberes, as subjetividades, os imaginários, os corpos-terras-territórios. Nesse sentido, a ativista indígena guatemalteca Lorena Cabnal (2019) esclarece que o feminismo comunitário, desde a perspectiva decolonial das Epistemologias Sul-Sul busca alternativas possíveis à uma vida digna na Terra, tendo em vista superar as desigualdades sociais e os regimes de opressão. Trata-se da defesa radical do corpo-terra como forma de ocupar e cuidar dos territórios. Parte das memórias, saberes e experiências das mulheres em suas comunidades: no enfrentamento dos conflitos; nas lutas pela terra; em defesa da agroecologia e produção de alimentos saudáveis; na formação de redes ativistas e movimentos; da participação e controle social das políticas públicas; da invenção de novos mercados; da defesa dos corpos emancipados em terras em disputa etc. O feminismo comunitário interpela a lógica e os processos neoliberais de mercantilização da vida sobre a Terra e sobre os corpos e busca, junto as mulheres e suas comunidades, reunir um conjunto de práxis possíveis a descapitalizar e descolonizar nossos corpos-terra-territórios.
Nessa perspectiva, no final dos anos noventa, um conjunto de estudos sobre a colonialidade passou a ser articulado a partir dos estudos do sociólogo peruano Aníbal Quijano (2011). Tais estudos têm procurado retomar uma série de problemáticas históricas e epistemológicas que eram dadas como resolvidas nas Ciências Sociais. Para Quijano, o conceito de colonialidade se refere às condições estabelecidas pelo capitalismo, como modelo de funcionamento das relações de poder na modernidade, mediante a imposição de uma classificação racial-étnica da população.
O capitalismo opera mediante uma lógica de penetração subjetiva e coletiva, subsidiando um paradigma novo de império: a “colonialidade do poder”, da classificação social mediante os aspectos culturais de controle e dominação dos povos outrora subalternizados pelo colonialismo (Quijano, 2011).
Para Guerrero Arias (2010), duas construções ideológico-político-sociais se tornaram chaves para o exercício da colonialidade: o universalismo e o racismo. O universalismo naturaliza e legitima a superioridade dos dominadores. Os colonizadores legitimaram o direito de exercer a dominação e justificaram a tarefa “civilizatória” sobre os outros povos.
O racismo naturalizou a inferioridade dos dominados e se converteu em eixo da configuração geopolítica que determinou a produção e a reprodução da diferenciação colonial, impôs a classificação, hierarquização e subalternização de alguns povos, seus saberes e suas culturas. A diferenciação colonial originou a dicotomia, ainda vigente em nossa história, dos civilizados-desenvolvidos-modernos versus os primitivos-subdesenvolvidos-pré-modernos, sendo a primeira parte do par opositor a considerada superior.
A colonialidade equivale a uma “matriz ou padrão colonial de poder”, um complexo de relações que se esconde atrás da retórica da modernidade, do relato da salvação, do progresso que trará felicidade (Mignolo, 2017). O colonizador se impõe como horizonte civilizatório universal, um espelho no qual os outros povos devem se fixar e refletir. Com o passar dos anos se legitimou uma ordem cultural hegemônica que fez apagar as riquezas e memórias da biodiversidade e outras formas plurais de tecer a vida (Guerrero Arias, 2010).
Para Mignolo (2017), descolonizar o pensamento é resposta necessária às promessas desenvolvimentistas falaciosas que a modernidade propagou. Descolonizar as epistemologias implica em articular interdisciplinarmente diferentes conhecimentos culturais e científicos, desprendidos das grandes narrativas ocidentais. A decolonialidade não consiste, pois, em um novo universal, mas num novo modo de pensar desvinculado dos paradigmas modernos, pós-moderno, antropocêntrico e eurocêntrico.
Conforme Mignolo (2017), a opção decolonial não é só uma opção de conhecimento, mas uma opção de vida, de pensamento e de ação, enquanto práxis política. A decolonialidade busca transformar as estruturas e materialidades do poder, transformando por dentro suas instituições. Mas, sobretudo, enfrentando a transformando as subjetividades, os imaginários e as sensibilidades que colonizam os pensamentos.
Não vamos comprar o que vocês querem nos vender
O termo Bem Viver é uma tradução dos termos usados pelos povos que vivem nos atuais Estados do Peru, Equador e Bolívia ao se referirem aos seus modos de vida, intrínsecos às práticas dos povos originários da América (Quijano, 2011). A partir dos estudos e sistematizações de antropólogos em contato com experiências das comunidades indígenas andinas foi possível perceber a existência de lógicas próprias na elaboração das crenças, condutas e valores daquelas comunidades.
Para Cubillo-Guevara, Hidalgo-Capitán e García-Álvarez (2017), o conceito de Bem Viver passa a cobrar grande relevância acadêmica desde que foi reconhecido e incorporado nas constituições do Equador e da Bolívia. A partir de então, segundo comentam os autores, houve uma grande expansão do pensamento sobre o Bem Viver, envolvendo discussões ligadas à intelectuais andinos, latino-americanos e, inclusive, autores europeus.
No trabalho de Cubillo-Guevara (2017) é possível encontrar uma das poucas sistematizações sobre as concepções vinculadas às distintas correntes do Bem Viver: a corrente indigenista ou culturalista, se caracteriza pela relevância que os autores dão a autodeterminação dos povos indígenas na construção do Bem Viver, a identidade e aos elementos espirituais da cosmovisão andina. A corrente socialista ou ecomarxista, dando destaque a gestão política estatal do Bem Viver, bem como aos elementos relativos à equidade social, deixando em segundo plano as questões ambientais, culturais e identitárias. A terceira, a corrente do pós-desenvolvimento ou ecológica em que ganha relevância a preservação da natureza e a construção participativa do Bem Viver, com a inclusão dos movimentos sociais.
Em todas as concepções, há um ponto de convergência, de que o Bem Viver se contrapõe à noção eurocêntrica de desenvolvimento, buscando analisar os problemas já causados, assumindo uma proposta alternativa ao desenvolvimento enquanto oportunidade de construir coletivamente novas forma de vida e aprendizagem com os espaços e lugares, retomando as comunidades e suas práticas, suas ancestralidades e cosmologias.
Conforme a proposição de Cubillo-Guevara (2017), o projeto reclama um espaço epistêmico do Sul global, que situa a Latinoamérica como lócus de enunciação. Assim, o Bem Viver é uma proposta epistemológica e prática para ressignificar as noções modernas de desenvolvimento rumo ao progresso “custe a quem custar”. Acosta (2016) destaca que o Bem Viver não se circunscreve às realidades andinas e amazônica, mas é filosofia universal que, embora embasada na cosmologia e modo de vida ameríndio, se traduz nas mais diversas culturas.
O Bem Viver é uma oportunidade para construir coletivamente novas formas de vida, é parte da busca por alternativas forjadas nas lutas de grupos humanos e outras espécies por uma vida autônoma emancipada dos modos capitalistas. Enquanto práxis, busca construir alternativas ao desenvolvimento, buscando a confluência natureza(s)-cultura(s), na lógica do sensível e do cuidado, com vistas à sustentabilidade.
A agenda do Bem Viver se embasa nas características vivas, dinâmicas que as comunidades estabelecem e produzem no/com seus territórios, diferentes dos modos de vida pasteurizados nas sociedades ocidentalizadas. Para Gudynas (2014) o Bem Viver é campo aberto, plural, em que a análise crítica das realidades deve levar à ações coletivas alternativas em relação com os territórios.
Para Gudynas (2014) o Bem Viver não é um manual a ser seguido, mas um projeto epistemológico e prático que exige disposição a inventar e construir. Nesse sentido, Ibáñez (2016) refere só ser possível pensar em alternativas a partir do existente. As lutas, (r)existências, experiências locais dos povos em seus territórios são ponto de partida para estabelecer democraticamente sociedades sustentáveis (Acosta, 2016).
Porém, não se trata de reformar ou remendar o Estado atual ou contrapor propostas indígenas e não indígenas. A construção de um Estado plurinacional se faz num processo de descolonização intelectual nos âmbitos político, social, econômico e cultural, no enfrentamento da colonialidade do poder.
O Bem Viver nos desafia a repensar nossa relação com a natureza e formas de vida interespécies. Para Acosta (2011), o Bem Viver supõe uma visão holística e integradora da espécie humana, imersa na grande comunidade da Terra que inclui muitas espécies além de nós humanos, o ar, a água, as montanhas, as árvores, os animais e, inclusive, os seres que não vemos e são substanciais à nossa existência (como os fungos, as bactérias etc.).
Li uma história de um pesquisador europeu do começo do século XX que estava nos Estados Unidos e chegou a um território Hopi. Ele tinha pedido que alguém daquela aldeia facilitasse o encontro dele com uma anciã que ele queria entrevistar. Quando foi encontrá-la, ela estava parada perto de uma rocha. O pesquisador ficou esperando, até que ele falou: “Ela não vai conversar comigo, não?”. Ao que seu facilitador respondeu: “Ela está conversando com a irmã dela”. Mas é uma pedra. E o camarada disse: “Qual é o problema?”. (Krenak, 2020, p. 17)
Para Escobar (2014) temos de voltar a recordar, lembrar dos saberes ancestrais dos povos originários, pois ao colocar em prática seus modos vemos que a lógica do modelo e do mercado neoliberais não são a única lógica possível. Os povos e comunidades originários nos mostram outras formas de encarar a vida, de relação com o território e a(s) natureza(s). É a oportunidade de construir práticas culturais alternativas à colonialidade global. Grupos, comunidades, sociedades em que caibam outros mundos possíveis, sustentados na convivência em diversidade, dos conhecimentos partilhados entre os diversos povos e suas cultura(s)-natureza(s).
O Bem Viver nos obriga a repensar a forma atual de organização da vida nas cidades, nas periferias, no campo, exigindo uma revisão profunda do estilo de vida das sociedades contemporâneas. No Brasil atual, do (des)governo de Bolsonaro, pode-se falar de vidas precárias e deterioradas mediante a crise política, econômica e ambiental que assola o país. Perdeu-se soberania em todos os âmbitos. Voltamos ao quadro da fome, da miséria, do desemprego e, consequentemente, da marginalização e criminalização da pobreza.
Essas são lógicas antagonistas ao Bem Viver, pois apagam as memórias bioculturais e retroalimentam as materialidades e modos de subjetivação neoliberais, no enquadramento de um Estado mínimo alinhado com a iniciativa privada. Ante contextos adversos de produção e reprodução da vida, ao Bem Viver interessa a “suficiência”, buscando o que é suficiente em função do que realmente se necessita para viver com dignidade. Trata-se de enfrentar a produção de subjetividades capitalizadas, individualizadas, competitivas, que consomem de forma desenfreada “o que querem nos vender”. Relações estreitas, de vínculo com o planeta, com a terra estão em risco, por essas ambições vertiginosas.
Mas, não queremos comprar. O Bem Viver condena ferozmente a economia com vistas à acumulação, controlada por monopólios de especuladores (Acosta, 2011), e propõe uma relação dinâmica e equilibrada entre mercados, Estado e sociedade. Ao invés de uma sociedade de Mercado — maiúsculo e no singular, aposta na promoção de mercados múltiplos e alternativos de distribuição de insumos, alimentos e bens. Esta nova organização social e econômica deve respeitar os limites da natureza e erradicar a miséria das maiorias populares.
Frente à crise ambiental e econômica, vivida na maior parte dos países do mundo, que concepções de cultura, de natureza, de desenvolvimento servem à vida no planeta? O desenvolvimento sustentável deve ser colocado, como propõe Loureiro (2012), em termos de capacidade sociocultural, das sociedades coexistirem com suas cultura(s)-natureza(s) em equilíbrio. Para tal, há de se assumir a impossibilidade de existir um modelo único, linear e universal de bem-estar a ser alcançado.
Finalmente, trata-se de uma mudança civilizatória, um caminho que deve ser imaginado para ser construído pelos diversos grupos humanos, mediante circuitos políticos, cognitivos, afetivos, culturais com nossas espécies companheiras. Um mundo onde caibam outros mundos possíveis e sustentáveis. “Quando, por vezes, me falam em imaginar outro mundo possível, é no sentido de reordenamento das relações e dos espaços, de novos entendimentos sobre como podemos nos relacionar com aquilo que se admite ser natureza”, pois somos natureza (Krenak, 2020, p. 67).
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Notas