RESUMO: Este estudo decorreu de uma pesquisa descritiva, com abordagens qualitativa e quantitativa, cujo objetivo geral foi analisar as consequências do estresse ocupacional, tendo como referência magistrados que atuam em Varas da Justiça do Trabalho da 5a Região (TRT5). O fundamento teórico ancorou-se nas teorias relacionadas às manifestações do estresse e suas decorrências, que fundamentaram este objeto. Os principais resultados apontaram que as fontes de tensão excessivas no trabalho estão relacionadas ao elevado número de audiências realizadas e sentenças proferidas. Identificaram-se também situações como o isolamento, o peso emocional do julgamento, além do ônus da responsabilidade sobre a liderança em relação às atividades administrativas e de gestão, além da competitividade entre os pares, apontada pela maioria dos pesquisados. Os principais sintomas de estresse identificados estão relacionados à insônia, irritabilidade excessiva, cefaleia, depressão, diminuição da libido e disfunções sexuais. Essas manifestações chamaram a atenção para o risco à saúde e consequente necessidade de adoção de medidas de prevenção e controle do estresse, que possam ser adotadas para uma melhor qualidade de vida no trabalhlo dos Magistrados pesquisados.
Palavras-chave: Magistrados do Trabalho, Estresse Ocupacional, Adoecimento Mental.
ABSTRACT: This study resulted from descriptive research, with qualitative and quantitative approaches, whose general objective was to analyze the consequences of occupational stress, having as reference magistrates who work in Labor Courts of the 5th Region (TRT5). The theoretical foundation was anchored in theories related to the manifestations of stress and its consequences, which support this object. The main results showed that the sources of excessive tension at work are related to the high number of hearings held and sentences handed down. Situations such as isolation, the emotional weight of judgment were also identified, in addition to the burden of responsibility on the leadership in relation to administrative and management activities, in addition to competitiveness among peers, pointed out by the majority of respondents. The main symptoms identified are related to insomnia, excessive irritability, headache, depression, decreased libido and sexual dysfunctions. These manifestations draw attention to the risk to health and the consequent need to adopt measures to prevent and control stress, which can be adopted for a better quality of life in the work of the Magistrates surveyed
Keywords: Labor Magistrates, Occupational Stress, Mental Illness.
Artigo
ESTRESSE OCUPACIONAL: ESTUDO COM MAGISTRADOS TRABALHISTAS
OCCUPATIONAL STRESS: STUDY WITH LABOR MAGISTRATES
Recepção: 06 Setembro 2021
Aprovação: 07 Junho 2022
O termo Magistrado tem origem na língua latina, derivado de magistratus, que, por sua vez, surgiu de magister, vocábulo que significa chefe ou superintendente. A palavra latina magistratus tanto significa o cargo de governar (magistratura) como pessoa que governa (Magistrado). Isso remete a Bourdieu (1965), o qual aponta a existência desse poder simbólico que
(...) se define na relação entre os que exercem o poder e os que lhe estão sujeitos, sendo o poder invisível exercido com a cumplicidade dos que não querem saber que lhe estão sujeitos ou que o exercem. Constrói a realidade estabelecendo uma ordem, um sentido imediato do mundo (BOURDIER, 1965, p. 14).
Os símbolos (capital simbólico) de poder na Magistratura são: toga, cetro, beca etc. De acordo com Biancamano (2016, p. 3), ao tratar da relação decisor/receptor, ressalta que “(...) a certeza da imparcialidade da decisão torna juiz e jurisdicionado elos de uma mesma cadeia, aquele que se conhece como decisor de litígios e, este, como receptor da decisão”. Com isso, a autora retoma à discussão sobre o duplo papel do Magistrado, referindo que esse representa a imparcialidade na decifração do normal social para atuar na solução dos litígios e a autoridade administrativa na direção das unidades da organização, sem a interferência de um sobre o outro, superando dificuldades no exercício da função. Há a necessidade de adequação de um modelo que contemple os deveres operacionais e administrativos para que o Poder Judiciário cumpra com seu papel constitucional, assim como para que o Magistrado consiga desempenhar um papel eficaz na sua dupla função.
Vieira e Costa (2013, p. 928) chamam a atenção para o fato de que o Poder Judiciário brasileiro tem sofrido grande pressão social por mudanças em razão da denominada “crise do judiciário” e que uma das causas desta crise é “(...) a carência em aspectos relacionados à gestão, que inclui o número insuficiente de recursos humanos e a falta de planejamento e de formação em gestão dos Magistrados”.
Pelo levantamento bibliográfico realizado para subsidiar este artigo, ressalta-se que a primeira grande pesquisa da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (ANAMATRA) foi realizada em 2008, em parceria com o CESIT e UNICAMP. A pesquisa contou com a participação de 792 dos cerca de 4.000 Magistrados brasileiros, ou seja, mais de 20% da população pesquisada.
A Anamatra (2011a; 2011b) continuou com parcerias com universidades e, em 2011, apoiou uma pesquisa da Fundação de Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisando os Magistrados associados à saúde e exercício profissional. Essa pesquisa confirmou que o trabalho desses profissionais é intenso, ocorrendo inclusive em finais de semana e férias, sob condições precárias. O adoecimento foi frequentemente referido pelos participantes:
(...) a proporção de magistrados do trabalho que relataram doença do coração, hipertensão e depressão é maior do que a proporção dos respondentes da população geral brasileira, além do uso de medicamentos para depressão, ansiedade, insônia, diabetes, reumatismo, hipertensão e transtornos mentais (ANAMATRA; 2011, a, p. 14-15).
Nesse mesmo ano, a Anamatra (2011, p. 2) revelou que 33% dos juízes estiveram de licença-médica nos últimos 30 dias anteriores da coleta dos dados; 26% deixaram de realizar tarefas habituais devido a problema de saúde; 41,5% tinham diagnóstico de depressão; 17,5% usavam remédios para depressão; 54% informaram que dormiam mal; 28% encontravam-se tristes; e 51% disseram ser frequentemente vítimas de insônia.
Em 2014, essa mesma Associação trouxe outra discussão: “O volume de processos tem aumentado o número de licenças médicas de juízes”, revelando que os Magistrados do trabalho estavam cansados e estressados diante da adoção de metas e da implantação do processo eletrônico e que estes trabalhavam, em média, nove horas por dia, não dando conta do volume de trabalho. O então Presidente da Anamatra ressaltou que os dados eram preocupantes, considerando as doenças ocupacionais identificadas e que pioraram com a implantação do processo eletrônico na instituição. Acrescentou:
Há ainda um grau de tendência ao suicídio altíssimo entre juízes em geral. Com base nessas constatações, a Entidade deve pleitear junto ao CNJ flexibilização das metas, levando em consideração a preservação da saúde dos Magistrados (ANAMATRA, 2014, p. 2).
Diante do exposto até então, torna-se relevante pesquisar as manifestações de estresse ocupacional dos Magistrados Trabalhistas, objeto deste estudo. Nessa direção, a questão norteadora da pesquisa foi assim formulada: Quais as consequências do estresse em Magistrados Trabalhistas que atuam em varas da Justiça do Trabalho da 5a Região (TRT5)? Em decorrência dessa questão, o objetivo geral do estudo consistiu em analisar as consequências do estresse ocupacional, considerando as fontes de tensão, sintomas e estratégias de enfrentamento, em relação aos Magistrados que atuam em Varas da Justiça do Trabalho da 5a Região (TRT5).
A palavra estresse deriva do latim, e foi utilizada nos séculos XVIII e XIX para expressar pressão ou forte esforço. Inicialmente, o termo foi empregado na Física, e neste campo de conhecimento, esta terminologia estava relacionada à força ou tensão aplicada sobre uma estrutura de ferro antes que ela deformasse. Somente a partir do século XX é que o termo passou a ter a conotação dos dias atuais (ZILLE; ZILLE, 2010; ZILLE; BRAGA; MARQUES, 2014; ZILLE, et al., 2018).
Para Canova e Porto (2010), o termo estresse foi utilizado primeiramente pelo médico Hans Selye, em 1936, que transpôs este termo para medicina e a biologia, significando esforço de adaptação do organismo para enfrentar situações ameaçadoras à vida e a seu equilíbrio interno. Selye (1936; 1956) observou que muitas pessoas sofriam de várias doenças físicas e referiam alguns sinais e sintomas em comum, tais como: inapetência, emagrecimento, desânimo e fadiga, independente do diagnóstico. Essas reações inicialmente foram definidas como “síndrome de estar apenas doente”.
Na sequência de seus estudos, em 1956, Selye publicou o livro “The Stress of Life”, no qual utilizou a palavra “stress” para referenciar as reações do corpo, explicando o mecanismo bioquímico destas manifestações (SELYE, 1956). Selye (1956, p. 64) define o estresse como “o estado manifestado por uma síndrome específica que consiste em todas as mudanças não específicas induzidas dentro de um sistema biológico”.
Considerando os estudos de Couto, Vieira e Lima (2007, p. 113), o estresse pode ser definido como “[...] um quadro caracterizado por desgaste anormal e/ou redução da capacidade de trabalho, ocasionado basicamente por uma desproporção prolongada entre o grau de tensão a que o indivíduo está exposto e a capacidade de suportá-lo”.
O desgaste sofrido pelo organismo humano é causado por uma tensão crônica, característica da vida moderna, podendo levar a alterações psicofisiológicas, quando há a necessidade de enfrentar uma situação que exige elevado esforço emocional para o qual o individuo julga não estar preparado (LIPP, 2001; COUTO; VIEIRA; LIMA, 2007; COUTO; COUTO, 2020).
Portanto, as manifestações de estresse podem estar relacionadas como o início de um processo de adoecimento do indivíduo, caracterizado pelo desequilíbrio entre as demandas do ambiente no qual o mesmo encontra-se inserido e sua capacidade de adaptação. As consequências geradas na saúde refletem esse desequilíbrio e contribuem para a geração de tensão excessiva no ambiente de trabalho, podendo precipitar manifestações físicas e psíquicas como dor nos músculos do percoço e ombros, dor de cabeça por tensão, insônia, períodos de depressão, angústia, irritabilidade, entre outras, com reflexos importantes no desempenho profissional (ZILLE, et al. 2018; COUTO; COUTO, 2020).
Grande parte dos fatores estressores relacionados ao trabalho tem relação com a estrutura física do ambiente ocupacional, organização do trabalho, relacionamentos interpessoais conflitantes, preocupações com a carreira, além dos excessos mentais exigidos pelo próprio trabalho, ou seja, o trabalho de alta densidade. O estresse ocupacional, na maioria das vezes, contribui para o aumento do absenteísmo, como no caso dos afastamentos por doenças, dentre outras ocorrências (COUTO, 2014; GRACE, 2018).
Levi (2005; 2008) afirma que o impacto que o estresse exerce na vida do indivíduo está relacionado a três níveis principais: a saúde do trabalhador, as questões relacionadas à produtividade e às relações sociais e familiares, o que poderá levar a quadros de isolamento e depressão, além de outras manifestações relacionadas.
Do ponto de vista das instituições, as doenças resultantes do estresse ocupacional, além de gerar queda nos resultados do trabalho, afetam o nível de comprometimento do empregado, ocasionando reflexos negativos no desempenho das organizações. Situações dessa natureza levam à necessidade de rever as políticas, condições e processo de trabalho. Nesse contexto, é importante ressaltar que as doenças ocupacionais oriundas do estresse geram custos relevantes para as instituições e, consequentemente, para a sociedade (ZANELLI, 2010; OLIVEIRA et al., 2011; ZILLE; CREMONEZI, 2013; OCDE, 2018).
O estresse pode se manifestar de maneiras diferentes, onde o estresse da realização está ligado à ativação do organismo, mediante a produção de adrenalina e outros hormônios, tornando-o capaz de produzir respostas relacionas à realização e fuga, denominado de “eustresse” (SELYE, 1974; COUTO, 1987, 2014; LIPP, 2013).
Por outro lado, o termo “distresse” é a terminologia utilizada quando os mecanismos de adaptação psicológicos e fisiológicos não suportam as tensões sofridas pelo indivíduo e passam a causar danos ao organismo. Além de afetar sua estrutura psíquica, causa também danos físicos. “Essa manifestação também é denominada de ‘estresse da derrota’, estando ligada à ativação crônica do organismo, que busca adaptar-se às situações imprevistas e percebidas como estressoras e nocivas” (SELYE, 1956; COUTO, 2014; COUTO; COUTO, 2020).
Outras tipologias são o “estresse de sobrecarga” e o “estresse de monotonia”. O estresse de sobrecarga é observado quando a estrutura psíquica do indivíduo não é capaz de responder às demandas psíquicas do meio, levando ao desequilíbrio psíquico, com implicações no desempenho do trabalhador entre outras intercorrências. De outro lado, quando o indivíduo está exposto a níveis de exigências muito inferiores a que suporta a sua estrutura psíquica e intelectual, ocorre o que se denomina de estresse de monotonia (COUTO; COUTO, 2020).
Por fim, têm-se as manifestações de estresse decorrente de uma reação imediata do organismo causada por estressores breves e específicos, denominada de “estresse agudo”, em que o organismo é capaz de elaborar respostas rápidas de luta ou fuga. Já na forma de “estresse crônico”, os agentes estressores perduram por mais tempo, duas ou mais semanas e, dessa maneira, o organismo não consegue se adaptar de modo satisfatório ao contexto e daí ocorrem as manifestações de estresse denominadas “crônicas” (COUTO, 2014; COUTO; COUTO, 2020).
Lipp e Tanganeli (2006, p. 11) pesquisaram sobre “Stress ocupacional de Magistrados da Justiça do Trabalho” com a participação de “(...) 75 juízes do TRT15, visando avaliar as manifestações de estresse (...). Verificou-se que 71% dos pesquisados apresentaram sintomas e consequentes manifestações de estresse (...). Com isso, confirmaram que, do estresse decorrem doenças como: úlceras gástricas; gastrites; doenças inflamatórias; colites; obesidade; problemas dermatológicos e sexuais, entre outros. Além das patologias físicas e mentais, observou-se também diminuição na capacidade de concentrar-se e de pensar de modo lógico, com a consequente queda nos resultados de trabalho.
Na Magistratura, algumas situações levam ao adoecimento mental e, nesse sentido, Teixeira (2013) destaca a depressão e assinala: um juiz em depressão é tão danoso para a sociedade como um médico ou policial sem condições de exercerem suas atividades.
Esta é uma investigação descritiva, de abordagem quantitativa e qualitativa, onde os dados foram extraídos com base em questionário e entrevista semiestruturada realizada junto aos pesquisados.
O locus da pesquisa foi a justiça do trabalho do TRT5. Os contatos iniciais para a realização do estudo foram realizados por meio da Presidência da Associação dos Magistrados Trabalhistas (ANAMATRA 5), a qual fez a intermediação com a Presidência do TRT5 e com os Magistrados Trabalhistas titulares das 39 varas.
O projeto apresentado ao TRT5 já havia sido aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Salvador (Unifacs). Posteriormente, foi entregue a carta solicitando a anuência para a realização da pesquisa, assim como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), respeitando o previsto na Resolução 466/2013 (BRASIL, 2013). Diante dessas providências preliminares, o TRT5 concedeu a anuência para a coleta dos dados e, consequentemente, a realização do estudo.
Os indivíduos participantes da pesquisa foram 16 Magistrados titulares das 39 varas do TRT5. A partir das definições relativas à investigação, foram seguidas as orientações de Neves (1996) e Günther (2006), sendo utilizado um questionário estruturado, com perguntas fechadas e de múltipla escolha, e um roteiro semiestruturado para a realização das entrevistas, o que foi precedido por uma carta de apresentação dos pesquisadores aos Magistrados, sujeitos da pesquisa.
Em relação à análise dos dados, no que se refere à abordagem quantitativa, os dados foram tratados com base na estatística descritiva, colocando em evidência números absolutos e relativos.
Para a análise qualitativa, recorreu-se à análise de conteúdo categorial ou temática (BARDIN, 2011). Após a realização das entrevistas, procedeu-se à leitura flutuante dos dados, os quais foram codificados, registrados em matrizes e alocados nas respectivas categorias e subcategorias para posterior análise, sendo desenvolvidas as seguintes etapas: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados e, por fim, inferência e interpretação.
Para resguardar a identificação dos participantes em relação aos relatos apresentados na análise dos dados, eles foram codificados com a letra “E”, seguindo dos numerais de 1 a 16.
As informações inerentes à Tabela 1, a seguir apresentada, constam os dados demográficos da população que foi objeto deste estudo, como: gênero, estado civil, faixa etária, ingressos no curso de direito e magistratura, tempo de magistratura, formação em nível de pós-graduação, função desempenhada, jornada de trabalho semanal, horas dedicadas aos estudos, turno de trabalho e número de audiências realizadas mensalmente.

Tendo como referência dos dados da Tabela 1, em termos de gênero, a predominância foi para o feminino, sendo a maioria casada, onde a faixa etária se dividiu entre 37 e 49 anos e 50 e 52 anos. A maioria dos pesquisados (62%) iniciaram o curso de direito entre 21 e 22 anos, e ingressaram na magistratura entre 26 e 29 anos, ainda jovens. Aproximadamente um terço dos magistrados já estão na magistratura entre 9 e 13 anos e o outro terço entre 24 e 28 anos. Em termos de escolaridade, além do curso de direito, que é uma exigência legal para a função, em termos de pós-graduação todos possuem especialização (pós-graduação lato sensu), 31% mestrado e 19% doutorado. A maioria (94%) atua em função judicante e administrativa, onde a jornada de trabalho varia de 40 a 60 horas semanais, sendo que a maior frequência (25%) recai em 46 horas. A maioria (63%) reserva de 1 a 4 horas por semana para aprofundar os estudos e, em relação aos turnos de trabalho, 69% dos pesquisados atuam em 2 turnos, com uma média de audiência por mês, variando de 140 a acima de 200, com maior concentração entre 161 e 180 audiências. Considerando em média 22 dias úteis por mês, a média diária de audiências varia de 6 a 9 audiências diárias.
Quando se trata de hábitos de vida e saúde, observou-se que 19% dos magistrados fazem uso de cigarro; 25% consomem bebida alcoólica de forma regular e 56% afirmaram que a consomem raramente e 19% se consideram sedentários.
A seguir, serão apresentados e analisados os resultados inerentes às variáveis centrais do estudo, relacionadas ao estresse ocupacional, envolvendo as fontes de tensão no trabalho, os sintomas de estresse e as estratégias de enfrentamento na visão dos Magistrados.
Com relação às Fontes de Tensão no Trabalho, a identificação se deu considerando a categorização proposta por Melo, Cassini e Lopes (2011, p. 89), a seguir apresentada: a) tensão em decorrência da função (sobrecarga, ambiguidades conflitos); b) negatividade; c) isolamento (sentimento de solidão, desafio causador de ansiedade e de insegurança); d) ônus da responsabilidade da liderança (tensão existente por ser portador de autoridade decisiva e de responsabilidade definitiva). Essas categorias foram identificadas a partir do questionário aplicado, com aprofundamento da análise baseada nos conteúdos das entrevistas realizadas com os Magistrados.
Em relação à primeira categoria, “tensão da função”, as fontes de tensão identificadas foram as seguintes: salário incompartivel com a função desempenhada; metas estabelecidas acima da possibilitade de cumprimento e excessivas cobranças por resultados; excesso de trabalho e suas decorrências; conflito por perceber em sobrecarga e não ter possibilidade de questionar; tecnologia levando a um número excessivo de processos, sem o preparo adequado para manuseá-los; infraestrutura institucional deficitária e quadro de servidores aquém das necessidades da Vara; avaliação de desempenho por merecimento como estratégia para promoções; e, finalmente, dificuldades na administração do tempo.
No que se refre à categoria “negatividade”, as fontes de tensão identificadas consistiram em dificuldades nos relacionamentos; insegurança nas relações de trabalho; convívio com indivíduos de personalidade difícil e hostil; competitividade destrutiva entre os Magistrados; pressão social relacionada à função; e dificuldades no plano psicológico.
Para a categoria “isolamento”, as fontes de tensão se concentraram na solidão em relação ao ato de julgar; sentimento de isolamento e/ou de se sentir só diante das responsabilidades da função; e o peso emocional do julgamento.
Na quarta categoria, “ônus da responsabilidade da liderança”, as seguintes fontes de tensão se mostrarm prevalentes: expectativa em relação à liderança do Magistrado; formação inadequada ou ausência de formação para o exercício da liderança e gestão; dificuldades para o exercício da liderança; demandas diversas diante da função de liderança; e a própria função do Magistrado, que envolve conflito de papéis (judicante e gestor).
Recorrendo à análise qualitativa, foi possivel observar que a categoria “Tensão da Função” foi a mais presente nas entrevistas, evidenciado algumas subcategorias que retrataram a tensão vivenciada pelos Magistrados como: excesso de trabalho, muitas metas a serem cumpridas em espaço de tempo incompatível e cobranças excessivas por resultados.
A segunda categoria “Negatividade” evidenciou-se por meio de agressões psicológicas, conforme ilustrado pelo relato a seguir:
Você participar, por exemplo, de um grupo do WhatsApp, e durante todo o tempo recebe insinuações de que você é um sem fazer nada, que você é rico, muitas vezes por grupos de colegas. Eu já saí de vários grupos porque eu não queria ficar brigando e, também, porque não queria ficar ouvindo estas piadas de mau gosto. Isto é um fato que estressa muito. Isso é um estigma (E3).
Conteúdos relativos à terceira categoria “Isolamento” não aparecem de forma explícita nas entrevistas. Mas, em relação à quarta categoria “Ônus da responsabilidade da liderança”, um dos entrevistados se refere ao “peso” da própria função de Magistrado, quando relata:
Quando você não é Substituto, que não tem a convocação sem previsão, sabe que está numa Vara pode programar a sua vida, é uma vantagem. Como Titular, hoje, o grau de estresse é 70% menos. Eu sei que dia vou viajar, que hora vou viajar. Na atualidade, apesar de eu achar que as condições de trabalho melhoraram, o estresse aumentou. Hoje, na Bahia, tem assistente, antes não. Para mim, a carga de trabalho melhorou, mas eu vejo os colegas reclamando: não tem folga, as férias são utilizadas para trabalhar. Eu, graças a Deus, não tenho tido mais isto. Desde que me tornei Titular, não trabalho sábado, nem domingo, nem feriado, nem nas férias (E2).
Além das fontes citadas, outra fonte que emergiu ao longo das entrevistas foi em relação à “Pressão Social” sobre os Magistrados Trabalhistas, identificada por meio da seguinte pergunta: “Na sua percepção, qual é o pensamento da sociedade brasileira sobre a Magistratura Trabalhista”? Vale apresentar depoimentos de entrevistados que sinalizaram para opiniões diversas das pessoas sobre a Magistratura e que se constituem em fontes importantes de manifestações de estresse e o consequente adoecimento mental na percepção dos Magistrados pesquisados. Os relatos a seguir ilustram esta situação.
Eu acho que tem opiniões variadas, né? Acho que algumas pessoas, pelo fato de a gente fazer audiência só alguns dias ou alguns turnos, acham que levamos uma vida tranquila. Algumas pessoas acham que somos privilegiados. Não é questão de ser marajá. É questão de tempo: ah! Você pode ficar com suas meninas [...] você pode porque é Magistrada. Agora, por outro lado, tem algumas pessoas que enxergam que o Juiz do Trabalho trabalha muito. [...] Juiz do Trabalho é uma loucura. A gente vai lá, vê uma confusão, vê a quantidade de audiências. Eu acho que tem essa visão variada: uns acham que a gente trabalha muito, outros acham que a gente trabalha pouco (E1).
Os magistrados vivem sob pressão em todos os lugares. Espera-se do Magistrado um poder, mas um poder que a população quer. Se o poder exercido pelo Magistrado agrada, o Magistrado é ótimo. Mas, a maioria das vezes, o Magistrado não agrada. Na própria família, sofre críticas. Atribui-nos uma riqueza que não temos, um excesso de autoridade que não temos, falta de compromisso com o trabalho, que não é a nossa realidade porque trabalhamos muito e temos compromisso com horário, prazo, mas somos tidos como quem não trabalha. Isso é um fator importante de estresse (E3).
A gente tem um nível de estresse muito grande e só aquelas pessoas que estão vivendo isto sabem, porque, quem tá fora não percebe o quanto a gente tem de demanda de trabalho, cobrança grande e responsabilidade com o processo, com a parte, com o tempo de duração razoável de um processo. E aí, o que acontece? Isso gera, na gente, preocupação, ansiedade no sentido de querer estar prestando o melhor trabalho. As cobranças, eu considero injustas porque, quem tá de fora, né, o próprio CNJ tem algumas cobranças que fogem da razoabilidade. São metas que a gente não tem como cumprir. A gente fica naquela ansiedade, na preocupação, que gera, realmente, adoecimento. Em casa, a gente não consegue descansar mentalmente porque o processo tá lá, o processo invade a nossa casa. Por causa do PJR, a gente trabalha em casa e acaba não tendo aquele tempo de descanso nem de convívio familiar. A gente tem isso assegurado, mas a gente não está conseguindo (E5).
Identificou-se também a fonte de tensão “Reação a Mudanças”, por meio da pergunta: “Como o Magistrado acolhe mudanças que ocorrem na Justiça do Trabalho, que impactam nas suas atividades?”. A resposta aparece em todas as entrevistas com “momentos” que revelam reações positivas e negativas. Os relatos a seguir apresentados vão nessa direção.
Esta pergunta é extremamente pertimente em função da Reforma Trabalhista. As mudanças alteraram significativamente o nosso dia a dia, né, ou seja, a forma de a gente proceder na sala de audiência proferindo sentenças. Fica mais difícil, mais complexo. Foge um pouco do que se idealizou, entendeu? Porque veio com uma perda de direitos trabalhistas, veio com uma perda de acesso à Justiça do Trabalho. Vamos estudar, ver o que precisa adaptar. É lógico que no dia que veio a mudança, fiquei triste. Não era isto que eu queria! [...] as mudanças da Reforma trouxeram um nível grande de estresse. Tenho visto em algumas reuniões. [...] As pessoas chegam muito estressadas para estudar porque não concordam [...] O PJR adoeceu outra parte. O processo físico acometia determinados ligamentos, determinados músculos. O PJS é outro problema, mas sempre é fato que, no ritmo constante de audiência e sentença, o adoecimento vem. Um instante de audiência, de sentença, o adoecimento vem ... (E1).
Sou favorável às mudanças. Comecei em 94 e tinha juízes classistas, máquina de escrever elétrica, cansamos de ir para lugares que não tinha computador. Vieram os processos eletrônicos e sou favorável. A tecnologia ajudou. Hoje, por exemplo, posso fazer uma pesquisa na internet. No início da carreira tinha que ir à Biblioteca, viajar com livros, pois tinha que estudar. Com os processos eletrônicos, eu ligo para um colega e digo: tenho uma decisão assim, como é que você pensa? Eu considero positivo. A Reforma Trabalhista é outra parte, mas eu considero uma espécie de vingança para alguns excessos que estavam ocorrendo contra a atuação do nosso trabalho, alguns abusos. Pequenas coisas são razoáveis, mas foi um poço de maldade (E2).
Nós temos lidado com muitas mudanças em pouco tempo. Fomos educados em dois sistemas jurídicos: o PJe e a CLT. Lidamos a vida inteira com papel e, agora, está tudo eletrônico. Tivemos essas grandes mudanças de adaptação, tanto na aplicação do direito como na forma de trabalho com ele. O uso do PJe me causou uma hérnia cervical e cansaço na visão, meus olhos não aguentam estar diante de uma tela de computador em dois turnos seguidos. [...] dor na lombar, que me afeta muito, nas articulações, e o estresse que me envolvo aqui na Justiça (E3).
Esses depoimentos revelam como as pressões externas e internas, na percepção dos Magistrados, são fontes importantes de tensão no trabalho e as consequentes manifestações de estresse, na medida em que coloca os Magistrados Trabalhistas em constante “estado de alerta”.
As manifestações de estresse estão relacionadas com sintomas físicos e psíquicos e foram identificados e consolidados conforme apresentados por meio da Tabela 2, a seguir.

Com base nos dados da Tabela 2, foram identificados 29 sintomas de estresse, sendo 11 de natureza física e 8 de natureza psíquica. Os principais sintomas identificados (frequência de 50% ou acima), de acordo com a percepção dos Magistrados pesquisados, vêm sendo observados em pesquisas que têm como objetivo avaliar a incidência do estresse ocupacional em diversas categorias profissionais (ZILLE, 2005; ZILLE et al., 2011, 2018; COOPER; DEWE, 2008; ZILLE; BRAGA; MARQUES, 2014; BARON; FRANKLIN; HMIELESKI, 2016; COUTO; COUTO, 2020).
Retomando a análise qualitativa, foi possivel perceber com base nas entrevistas realizadas a menção de alguns indicativos de sintomas de estresse como desânimo e enxaqueca (E2); desgaste emocional, dor lombar, dor nas articulações e cansaço visual (E3); angústia e conflitos no âmbito do trabalho (E4); ansiedade, cansaço mental e físico (E5). Esses dados vêm reforçar o que foi identificado e mencionados na Tabela 2.
Ainda com base nos dados identificados nesta pesquisa, foi possivel perceber alguns problemas de saúde e adoecimento mencionados pelos Magistrados, conforme constam da Tabela 3, a seguir.

Com base nos dados obtidos por meio das entrevistas, alguns indicativos que retratam o adoecimento foram revelados, como gastrite com evolução para úlcera (E2) e outras manifestações relatadas, conforme apresentadas a seguir.
Marquei com a Médica do Trabalho para conversar. A gente tem se preocupado em enxergar adoecimento. Então, se o nível de adoecimento já está alto, a probabilidade é de ser maior ainda. A Anamatra, por meio do atual Presidente está pesquisando sobre adoecimento (questionário). Na verdade, um questionário que eles querem que a gente informe quais os magistrados que estão afastados por doença relacionada ao trabalho para, aí, fazerem alguma coisa [...] (E1).
Depois de sete anos na Magistratura, quando eu já estava extremamente desgastada, seguiu um período que quase entrei num processo de anorexia por não conseguir nem comer (E3).
Eu acho que a gente julga muitos processos em que há ligação de assédio, de estresse pelo trabalho, de rinite, de adoecimento, e a gente não se olha muito (E4).
Revisitando a literatura, foi observada a relação do trabalho com o aparecimento de algumas “doenças” detectadas nesta pesquisa. Nesse sentido, vale lembrar o alerta apontado por Feliciano (2017), ou seja, que todos os elementos necessários para uma produção uniforme, massificada e célere, detonadoras de doenças, estão presentes na Resolução CNJ 106, de 6 de abril de 2010 (CNJ, 2010), especialmente, ocasionadas pela competitividade na busca pela melhor classificação entre os pares, ou seja, quanto mais o Magistrado produzir, isto é, quanto mais audiências, sentenças, acórdãos, conciliações e/ou decisões interlocutórias realizar em comparação com seus pares de unidades similares, melhor classificado estará.
Os dados desta pesquisa reforçam o que foi obtido pela Anamatra (2011), ao revelar que os Magistrados do Trabalho relataram doenças que poderiam estar relacionadas às manifestações de estresse como cefaleia, gastrite, úlcera, depressão, ansiedade, hipertensão, entre outras, que são relatadas pela literatura (COOPER; SLOAN; WILLIAMS, 1988; KARASEK et al., 2000; LEVI, 2005, 2008; COUTO, 2014; COUTO; COUTO, 2020).
Lipp e Tanganeli (2006), em pesquisa com Magistrados do Trabalho do TRT15, identificaram que 71% dos Magistrados Trabalhistas apresentaram sintomas de estresse. Apontaram que, em decorrência do estresse, evidenciaram algumas doenças como úlceras, gastrites, doenças inflamatórias, colites, problemas dermatológicos (micoses, psoríase, queda de cabelo), problemas relacionados à obesidade, problemas sexuais, como impotência e frigidez, além de queda na habilidade de concentrar-se e de pensar de modo lógico com consequente queda na produtividade.
Pesquisas com outras categorias funcionais também revelaram a relação entre trabalho, estresse e adoecimento. Zille, Braga e Marques (2014) assinalam que 27,0% de gerentes pesquisados informaram apresentar algum tipo de doença, sendo a maior incidência, 64,3%, de doenças gástricas (gastrite e úlcera), 21,4% de doenças alérgicas, 5,7% de hipertensão e 1,0% foi acometida de infarto cardíaco. Encontraram, ainda, em menor grau, manifestações como acidente vascular cerebral (AVC), dor de cabeça por tensão, abuso de álcool e de drogas.
Marques, Martins e Cruz Sobrinho (2011), em pesquisa documental, descritiva, com servidores públicos, apontaram que os transtornos mentais e comportamentais e as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo predominaram na população pesquisada.
Por fim, Bernstorff e Rosso (2008) sinalizam para a relação estresse-doença, apontando, principalmente, ansiedade, depressão, dores nas costas e dores de cabeça por tesão, como manifestações relacionadas aos episódios de estresse.
As estratégias apontadas por meio da Tabela 4, a seguir, apontam a visão dos Magistrados pesquisando em relação ao enfrentamento das tensões excessivas vivenciadas nas diversas situações de trabalho, no enfrentamento às manifestações de estresse ocupacional.

Pela sua natureza, do ponto de vista teórico, todas as estratégias apontadas se enquadrariam na prevenção primária, quando o processo de adoecimento ainda não ocorreu e as pessoas devem evitá-lo. No entanto, qualquer uma dessas estratégias pode ser caracterizada como prevenção secundária no caso de a pessoa já estar vivenciando o adoecimento, mesmo sem estar ausente do trabalho. Como já sinalizado, a ênfase é em estratégias relacionadas com a prevenção primária (promoção/divulgação do estresse), acrescidas, muito pouco, daquelas que correspondem à prevenção secundária (estratégias para enfrentamento da manifestação de sinais e sintomas do estresse) (BRAUN; FOREYT; JOHNSTON, 2016).
No que se refre à prevenção terciária, tratamento e reabilitação do estresse, não foi tratada de forma objetiva nas pesquisas revisadas, uma vez que todas tiveram como população e/ou amostra indivíduos no exercício de suas funções, não citando a existência de trabalhadores na “ativa” em fase de tratamento do estresse e/ou de reabilitação/readaptação. Nesta pesquisa não foi diferente, visto que todos os Magistrados Trabalhistas, independentemente da sua situação de estresse ou não, se encontravam trabalhando, ou seja, na “ativa”. Esse fato explica o porquê de as estratégias apontadas estarem no âmbito da prevenção primária e/ou secundária.
No entanto, um dos entrevistados deixa uma mensagem que revela o adoecimento, mesmo trabalhando, a dificuldade ou impossibilidade de parar de trabalhar, além da convivência com a dor durante o trabalho, o que denota que o adoecimento está presente mesmo em Magistrados na ativa:
No início, comecei a apresentar enxaqueca, depois gastrite que virou úlcera e, por último, tendinite de um lado. Parar para fazer o tratamento não é fácil. Mas consegui logo depois que fui promovido para Titular. Eu sinto um pouco de dor mas não é algo que compromete o meu trabalho agora, mas, quando sinto alguma dor, eu paro (E2).
Apesar das limitações, a tentativa de evitar problemas por parte dos Magistrados é real. Um dos entrevistados informou que, diante do adoecimento, lançou mão de algumas estratégias:
[...] o uso do PJe, por ser em 2 telas, me causou uma hérnia cervical. Então, não posso mais usar 2 computadores, 2 telas, e me adaptei a usar telas sobrepostas para não continuar com essa dor e resolvi o problema. Descobri que de tanto ficar girando, girando, eu tive essa doença. Eu, agora, por conta do cansaço na minha visão, eu não trabalho mais 2 turnos seguidos. Eu trabalho de manhã e à noite porque meus olhos não aguentam estar diante de uma tela de computador em 2 turnos seguidos. Novamente criei esta estratégia para não ter sofrimento. Assim, eu me adapto. Faço musculação. Tenho um aparelho de musculação que faz com que não me dê problema de dor na lombar, que me afeta muito, e nas articulações. Eu faço trabalho de força de braços e de pernas e, para o estresse que me envolvo aqui na Justiça, a corrida (esporte) me libera (E3).
Pelo fato de os magistrados ficarem muitas horas na frente do computador, prejudicando a visão e gerando lesões por esforço repetitivo, pelo uso do mouse, a atitude do TRF4 foi instalar um programa no computador para que o mesmo pare de funcionar de tempos em tempos para o juiz e/ou servidor descansar (ANAMATRA, 2014), é uma estratégia que pode ser estendida aos demais TRFs.
Vale, também, ressaltar a indicação do então Presidente da Anamatra, que, ao constatar tendência ao suicídio por juízes, solicitou ao CNJ a flexibilização das metas, conforme assinala a Anamatra (2014), o que nao foi evidenciado neste estudo.
Finalmente, de acordo com Perales et al. (2011), diante dos resultados encontrados em pesquisa com magistrados trabalhistas de Lima, Capital do Peru, recomendam, como estratégia, que os programas de prevenção do estresse manejem, conjuntamente, a ansiedade e a depressão, dada a elevada associação entre ambas.
Diante da questão norteadora desta pesquisa: Quais as consequências do estresse em Magistrados Trabalhistas que atuam em varas da Justiça do Trabalho da 5a Região (TRT5)? O seu objetivo foi atingido, consistindo em analisar as consequências do estresse ocupacional, considerando as fontes de tensão, sintomas e estratégias de enfrentamento, em relação aos Magistrados que atuam em Varas da Justiça do Trabalho da 5a Região (TRT5).
Em termos metodológicos, a pesquisa foi de natureza descritiva com abordagem qualitativa e quantitativa, envolvendo Magistrados Trabalhistas que atuam em varas da Justiça do Trabalho da 5a Região, TRT5 na cidade de Salvador - Bahia.
Em relação aos resultados, observou-se que 94% dos magistrados exercem dupla função, ou seja, judicante e administrativa/gestora. Quanto às horas trabalhadas, a maioria aponta que não há limite, exercendo as aividades em períodos variados, onde aproximadamente um terço trabalha nos três turnos, ou seja, manhã, tarde e noite. A média mensal de processos julgados por magistrado é, aproximadamente, 45, com uma média mensal de 187 audiências.
Na percepção dos Magistrados Trabalhistas em relação ao ingresso na carreira da magistratura, esta se deu, principalmente, por fatores relacionados à remuneração e demais vantagens, além do poder adquirido em função do cargo exercido.
Em relação às alterações relacionadas às reformas trabalhistas, estas foram observadas de forma positiva e negativa. Houve reconhecimento da necessidade das reformas, mas houve também a revelação de certo “desconforto” diante das alterações trazidas para o dia a dia do Magistrado, principalmente no que se refere à perda de direitos trabalhistas, dificuldades no acesso à Justiça do Trabalho por parte da sociedade e aumento do nível de estresse e do adoecimento dos Magistrados, principalmente em decorrência das mudanças.
Quanto ao adoecimento, são mencionadas algumas doenças como hérnia cervical, dor na lombar e nas articulações, cansaço na visão e o próprio estresse, diante do volume de processos e do trabalho contínuo desenvolvido.
Os entrevistados revelaram ainda opiniões da sociedade sobre a Magistratura que acabam contribuindo para o processo de adoecimento, incluindo tensões elevadas e o estresse. O Magistrado, diante da carga de trabalho, está sujeito à ansiedade e ao estresse, como também à má distribuição do tempo entre casa e trabalho, a visão da sociedade sobre os ganhos salariais elevados, riqueza e pouco trabalho.
Quanto às fontes de estresse, considerando as caracteristicas inerentes à função, todos os pesquisados apontaram que a mais significativa se constitui no elevado número de audiências realizadas e sentenças proferidas. Identificaram-se também situações como o isolamento, o peso emocional do julgamento, além do ônus da responsabilidade sobre a liderança em relação às atividades administrativas e de gestão, além da competitividade entre os pares, apontada por 63% dos esquisados.
Mais especificamente em relação às manifestações de estresse percebidas e citadas pelos Magistrados, alguns sintomas relacionados foram revelados como insônia, irritabilidade excessiva, cefaleia, depressão, diminuição da libido e dificuldades sexuais. Em relação à categorização, observaram-se sintomas de natureza física, psíquica e comportamental.
Essas manifestações chamam a atenção para o risco à saúde e consequente necessidade de adoção de medidas de prevenção e controle do estresse, que possam ser adotadas para uma melhor qualidade de vida no trabalhlo dos Magistrados.
Diante desses resultados, pode-se considerar que a questão que norteou esta pesquisa foi pertinente e que os objetivos foram atendidos com base nos métodos adotados, que se mostraram adequados ao objeto em foco. Os resultados alcançados são corroborados pela literatura referenciada, indicando que as manifestações do estresse e suas consequências fazem parte do dia a dia de trabalho dos Magistrados do Tribunal Regional do Trabalho da 5a Região, que atuam em varas da cidade de Salvador/BA.
Do ponto de vista de contribuições deste estudo em relação à prevenção das manifestações de estresse, uma das recomendações é que instâncias superiores às varas da Justiça do Trabalho não implementem mudanças numa velocidade tão acelerada. As mudanças muito aceleradas conbribuem para comprometer a “sensação de estabilidade” que se mostra muito importante para os Magistrados que, uma vez comprometida, geram dificuldades em relação à capacidade de adaptação com reflexos físicos e psicológicos, que se tornam comprometedores à saúde e o próprio desempenho no trabalho.
Ressalta-se também a importância da realização anual de check up médico para os Magistrados, além de estimular atividades físicas e terapêuticas, tanto no trabalho quanto fora dele. Uma recomendação importante também consiste em criar mecanismos para evitar o “peso excessivo” da tecnologia sobre o trabalho e, consequentemente, em relação à saúde dos magistrados. Nessa direção, ressalta-se a importância de treinamento no manejo da tecnologia e adoção de estratégias, especialmente aquelas que dizem respeito a minimizar o cansaço nos olhos e dores lombares, garantindo o descanso dos magistrados enquanto o computador está em pausa programada.
Outro aspecto de grande importância é a atenção especial para a manutanção de um “bom clima organizacional”, minimizando a competitividade destrutiva entre os pares, estimulando a cooperação e gerando maior segurança nas relações interpessoais no trabalho.
Para aqueles Magistrados que exercem funções concomitantes de administração/gestão, é de grande importância a realização de programas de qualificação, como uma necessidade imediata, haja vista que na formação destes profissionais estes conteúdos não são contemplados e se tornam essenciais para o desempenho eficaz destas atividades. Aliada a essa questão, torna-se de grande relevãncia a determinação de um percentual de horas que o Magistrado deverá dedicar-se às atividades administrativas/gestão, judicante e aos estudos, visando um certo equilíbrio em relação ao trabalho.
Em relação às pesquisas futuras, sugere-se um maior aprofundamento em relação às fontes de tensão excessiva no trabalho dos Magistrados, que vêm contribuindo para os adoecimentos identificados neste estudo, relacionado às licenças médicas e o absenteismo de causa médica, aspectos estes que podem ser considerados limitantes do presente estudo. Considera-se que os resultados obtidos são relevantes e podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida no trabalho dos Magistrados, bem como a indicação de caminhos para a realização de pesquisas futuras na Justiça do Trabalho de outras regiões do pais.



