Dosier
En las redes y las calles: estratégias de atuação do coletivo argentino Ni Una Menos
En las redes y las calles: estrategias de acción del colectivo argentino Ni Una Menos
On social media and in the streets: action strategies of the Argentinian collective Ni Una Menos
En las redes y las calles: estratégias de atuação do coletivo argentino Ni Una Menos
Autoctonía (Santiago), vol. 8, Esp., pp. 18-58, 2024
Universidad Bernardo O'Higgins, Centro de Estudios Históricos
Received: 22 July 2024
Accepted: 30 August 2024
Resumo: Os movimentos feministas na América Latina vivem um novo momento de efervescência nas redes sociais e nas ruas. A retomada dos protestos contra a violência de gênero e a luta pela legalização do aborto provocaram verdadeiros levantes feministas nos últimos anos. Nesse contexto, surgiu na Argentina, em 2015, o coletivo feminista Ni Una Menos. Com táticas inovadoras e de impacto mobilizador massivo, o grupo iniciou sua atuação a partir de denúncias sobre a violência machista e misógina. Aliando estratégias de uso de redes pelos movimentos sociais a grandes marchas e a criação de laços transnacionais, o Ni Una Menos colocou a violência de gênero no centro do debate na América Latina. O presente artigo visa, dessa forma, apresentar o movimento Ni Una Menos, a partir do seu histórico de atuação e, ainda, analisar suas estratégias, processos de mudança e adaptação dos métodos de ativismo do coletivo, especialmente o digital, além de acompanhar, no momento presente, as mudanças que colocam em risco as conquistas das mulheres no país, e as respostas feministas a estas.
Palavras-chave: Ni Una Menos, Feminismo, redes sociais, transnacionalização, feminismo-latino-americano, Argentina.
Abstract: Feminist movements in Latin America are experiencing a new moment of effervescence on social networks and in the streets. The resumption of protests against gender violence and the fight to legalize abortion have sparked real feminist uprisings in recent years. In this context, the feminist collective Ni Una Menos emerged in Argentina in 2015. With innovative tactics and a massive mobilizing impact, the group began its work by denouncing sexist and misogynist violence. Combining strategies for the use of networks by social movements with large marches and the creation of transnational links, Ni Una Menos has put gender violence at the center of the debate in Latin America. The aim of this article is to present the Ni Una Menos movement, based on its history of action, and also to analyze its strategies, processes of change and adaptation of the collective's methods of activism, especially the digital one, as well as to monitor the current changes that are putting women's achievements in the country at risk, and the feminist responses to them.
Keywords: Ni Una Menos, feminism, social media, transnationalization, latin american feminism, Argentina.
1. Introdução
Nos últimos anos a América Latina tem vivido uma nova «onda feminista» (Galeana, 2021; Garrido-Rodríguez, 2021; Bonilla, 2023). A partir de 2015, ano tido por muitas como marco desse novo momento do feminismo latino-americano, diversos países da região passaram por ondas de protestos feministas (Buarque de Holanda, 2018). Para intelectuais e ativistas, o feminismo (em suas múltiplas variantes) seria o movimento social mais importante da nossa região na atualidade. Além disso, os movimentos feministas latino-americanos são entendidos como os mais potentes, mobilizadores e contra hegemônicos existentes no mundo hoje (Alvarez, 2022).
Embora os países do nosso continente estejam vivendo este ciclo de articulação e de ação coletiva feminista de forma diversa, uma vez que os movimentos respondem às demandas de cada território, existem pautas coletivas, como a luta contra os feminicídios -assassinatos de mulheres pelo fato de serem mulheres- que contribuíram para a transnacionalização do movimento na região (Alvarez, 2014).
Assim, ainda que a evolução das reivindicações e das demandas dos movimentos na América Latina variem ao longo do tempo e em função dos contextos locais, bem como sejam diversas as formas e as intensidades de mobilizações, a nova onda feminista é marcada por práticas horizontais nas quais existem muitas redes interconectadas que integram as demandas dos diferentes territórios. Da mesma forma, a internet e as redes sociais se tornaram importantes plataformas de mobilização das atuais demandas feministas (Alvarez, 2022).
No Brasil, milhares de mulheres se manifestaram nas ruas pela legalização do aborto e contra o projeto de lei que dificultava o aborto legal em caso de estupro, além de terem se organizado contra a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, movimento conhecido pela hashtag#EleNão (Ricoldi, Peres, 2019). No México, o acréscimo alarmante dos casos de feminicídio também provocou diversos atos de protestos (Orozco Mendoza, 2017). Inclusive, a última grande manifestação em função do Dia Internacional das Mulheres na região antes da pandemia de Covid-19 ocorreu na Cidade do México (Reina, 2020). Já no Chile, durante o que ficou conhecido «Maio Feminista» em 2018, o que se viu foi uma tomada de dezenas de universidades e escolas secundárias pelas feministas. No ano seguinte, ocorreu o evento histórico de levante social, chamado de Estallido Social, que também contou com o protagonismo das mulheres (Alvarado, Dulci, 2021). Esses processos agitaram a sociedade chilena de forma tão intensa que foram denominados de «tsunami feminista» (Gonzalez, Vidal, 2019).
A Argentina foi um dos países da América Latina em que houve uma intensificação da luta feminista contra a violência patriarcal. Entre 2018 e 2020 ocorreram diversas manifestações ao longo dos debates legislativos sobre o aborto seguido de meses de mobilizações em massa para cada votação decisiva no Congresso. Foi também notável a magnitude e a desenvoltura criativa desses protestos, que chegaram a ser conhecidos como «Maré Verde», pois faziam referência aos lenços verdes que enfeitavam os corpos das participantes. Estes se tornaram um lema transnacional pelo direito à interrupção da gravidez não só na nossa região, mas também no resto mundo (Gutiérrez, 2021; Sutton, 2020; Vacarezza, 2021).
O movimento feminista argentino conjuga massividade e radicalidade, o que se verificou a partir do surgimento, ainda em 2015, de um coletivo formado por jornalistas, artistas e ativistas na cidade de Buenos Aires. Fruto de conversas na rede social Facebook, o coletivo denominado Ni Una Menos, foi criado com o objetivo de denunciar os feminicídios no país. E ao longo de oito anos acabou ganhando as ruas de Buenos Aires, da Argentina, dos demais países da América Latina e do resto do mundo. Neste período a consigna Ni Una Menos passou a representar um movimento massivo e transnacional, e a hashtag #NiUnaMenos, além de um símbolo utilizado nas redes sociais, se tornou também um poderoso instrumento ativista de denúncia e de mudança social (Daby, Moseley, 2022).
O Ni Una Menos transformou o debate sobre as múltiplas violências em espaços físicos e digitais (Bedrosian, 2022). A partir de uma perspectiva interseccional, o coletivo passou a denunciar diversas opressões (sexistas, racistas, classistas, econômicas, capacitistas, homofóbicas, etaristas, entre outras) e a necessidade de lidar com elas simultaneamente. E além de terem contribuído para a politização do feminicídio em escala transnacional, as ativistas do Ni Una Menos contribuíram também para ampliar e diversificar as estratégias de luta ao inovarem os repertórios dos movimentos sociais. Sua pauta, que começou centrada no tema dos feminicídios e na defesa da vida, foi dilatada para incluir uma crítica radical ao patriarcado e ao capitalismo (Friedman, Rodríguez Gustá, 2023).
Tendo isso em vista, o presente artigo pretende apresentar algumas das estratégias do Ni Una Menos no espaço das redes sociais. Estratégias estas que levaram ao seu alcance massivo e transnacional e que representaram um giro no ativismo feminista latino-americano. O marco teórico escolhido é o feminismo interseccional por entendermos que ele compreende este novo momento do feminismo latino-americano, uma vez que os movimentos, como é o caso do Ni Una Menos, incorporam em suas lutas diversas correntes horizontais feministas, como o feminismo negro, e também as lutas que englobam a comunidade LGBTQI+ (Silva, Pedro, 2016). Já a pesquisa qualitativa foi realizada a partir de revisão bibliográfica a respeito do tema, estudo de algumas ações presenciais do coletivo, bem como o exame da sua atuação no espaço das redes sociais (Minayo, 2007).
Assim, em um primeiro momento, exporemos brevemente temas relacionados a história do coletivo e parte das suas estratégias de articulação. Na sequência, trataremos do Ni Una Menos no marco do feminismo transnacional. Por fim, examinaremos algumas ações de atuação do coletivo nas redes sociais, com destaque para o hashtagtivismo e as consignas.
2. Ni Una Menos na Argentina
Em 2015, um grupo de mulheres jornalistas, artistas e ativistas se uniu no Facebook com o objetivo de organizar maratonas de leitura, projeções e performances para denunciar casos de feminicídio em Buenos Aires. Deste grupo surgiu o coletivo Ni Una Menos, que desempenhou um papel fundamental nas rebeliões feministas que surgiram na América Latina no século XXI (Bedrosian, 2022).
A ideia de criar uma «maratona de leitura» surgiu em março de 2015, após o feminicídio da jovem Diana García. A integrante Vanina Escales sugeriu o nome Ni Una Menos1 para a convocatória. O evento ocorreu na Biblioteca Nacional de Buenos Aires em 26 de março de 2015, marcando o início das atividades do coletivo (Fuentes, 2020). Tendo em vista que a maioria das integrantes eram jornalistas, inicialmente o foco estava também em denunciar a cobertura midiática dos feminicídios como uma forma de violência simbólica que reforçava a vitimização e o disciplinamento (Fuentes, 2020).
Embora o Ni Una Menos não seja o ponto inicial dessa luta, o coletivo foi um catalisador importante para uma mobilização social que colocou a politização do feminicídio no centro do debate, especialmente pelas suas estratégias de ação (Fuentes, 2019). Com o tempo, houve uma ampliação da agenda de reivindicações, que vai desde a descriminalização do aborto até a denúncia da exploração patriarcal e das violências institucionais. Vale destacar que o Ni Una Menos se articula de diversas formas: assembleias abertas, comícios, greves, campanhas nas redes sociais e performances em espaços públicos (Fuentes, 2020).
A frase que nomeia o coletivo estabelece um limite: nenhuma morte mais será tolerada. Ela nega a subtração de vidas e afirma «ainda estamos todas» por meio da memorialização e ressignificação das vidas das vítimas. Agustina Paz Frontera, uma das fundadoras do Ni Una Menos, explica o uso de «Ni Una Menos» ao invés de «Ni Una Más», dizendo: «não queremos nem uma mulher a menos, queremos ser todas as que somos». Além disso, acrescenta: «‘Ni una menos’ fala de um conjunto disforme, heterogêneo, inclusivo, paradoxal, de todas as mulheres que somos, que estamos; fala de um desejo coletivo e fortalece o amplo grupo que somos. ‘Ni una menos’ é tão elíptica que por trás está o mundo» (Frontera, 2015).
A importância do nome Ni Una Menos não está apenas em relação à preocupação em evitar mais perdas de vidas no sentido material, mas também na consideração de identidades autodefinidas e dissidências, que não devem ser excluídas dessas reivindicações. O termo «uma» refere-se tanto ao valor de cada vida quanto ao valor do conjunto, plural, dinâmico e aberto, que deve ser incluído nesta luta (Fuentes, 2020).
Logo após o chamado para a Primeira Marcha do Ni Una Menos em 2015, os principais jornais argentinos rapidamente coletaram números e depoimentos da organização La Casa del Encuentro. Esta entidade civil em defesa das mulheres mantinha estatísticas dos feminicídios cometidos nos últimos anos devido à falta de números oficiais: 1.808 mulheres haviam sido assassinadas por questões de gênero desde 2008. O relatório anual revelou que apenas em 2014, 277 mulheres foram assassinadas e, na maioria dos casos, tanto as vítimas quanto os agressores eram adolescentes. A cada 30 horas, uma mulher era assassinada na Argentina simplesmente por ser mulher (Annunziata et al., 2016).
No seu início, o Ni Una Menos já se mostrou capaz de reunir pessoas para além das feministas, rompendo com certas limitações que geralmente têm os eventos que reivindicam os direitos das mulheres. A convocatória rapidamente se transformou em algo massivo, alcançando pessoas de todas as idades e trajetórias políticas, de acordo com dados do Estudo de Opinião Pública «Marcha Ni Una Menos», realizado pelo Centro de Opinião Pública e Estudos Sociais da Universidade da Universidade de Buenos Aires. A Primeira Marcha contou com mais de 150 mil pessoas e 88% das mulheres que participaram disseram não se sentir identificadas com a militância feminista (Copes, 2016).
Após o grande êxito dessa Primeira Marcha, ocorreram várias manifestações simultâneas em mais de 200 lugares da Argentina e ao redor do mundo (Gabardo, Lopes, 2018). Vale dizer que as Marchas do Ni Una Menos se espalharam pelos países da América Latina rapidamente. O Chile foi o primeiro (ainda em 2015), e as demais se reproduziram nos anos seguintes no México, no Brasil, no Uruguai e no Peru (Iribarren et al, 2018).
Ao promover a politização do feminicídio, ou seja, ao apontar a responsabilização direta do Estado, o coletivo propôs mudanças para acabar com o uso de termos tradicionais quando se trata da morte de mulheres, como «homicídio agravado por vínculo» e «violência doméstica». O Ni Una Menos passou a defender que o termo «feminicídio» fosse usado em todos esses casos, o que inclusive se consolidou como um tipo penal específico: o «homicídio qualificado por feminicídio» (Iribarren et al, 2018). Essa reivindicação pelo reconhecimento do crime de feminicídio surtiu efeitos no legislativo argentino quando a Lei 27.5332, também conhecida como «Lei de Proteção Integral da Mulher», foi aprovada em 2019, com a seguinte redação:
«Artigo 1º - O objetivo da presente lei é tornar visível, prevenir e erradicar a violência política contra as mulheres. Artigo 2º - Altera-se o artigo 4º da lei 26.485, que passará a ter a seguinte redação: Definição. Entende-se por violência contra as mulheres qualquer conduta, por ação ou omissão, baseada em motivos de gênero, que, direta ou indiretamente, tanto no âmbito público como no privado, com base em uma relação desigual de poder, afete sua vida, liberdade, dignidade, integridade física, psicológica, sexual, econômica ou patrimonial, participação política, bem como sua segurança pessoal. Estão incluídas as perpetradas pelo Estado ou por seus agentes».
Apesar da importante conquista em termos legislativos, que possibilitou, entre outras coisas, obter números mais confiáveis de feminicídios no país, esse avanço também trouxe consigo a triste realidade de que os números seguiam aumentando paulatinamente. De acordo com o mapeamento realizado pelo Observatório Nacional Mumala - Mulheres de La Matria Latinoamericana, intitulado 8 anõs del 1er #NiUnaMenos (2023), a partir de dados do Registro Nacional de Feminicídios, ocorreram 2209 feminicídios na Argentina entre os anos de 2015 e 2023.
Outros dados que o Observatório apresenta ajudam a entender melhor o quadro de violência: ocorrem 0,5 feminicídios a cada 100.000 mulheres e 51% das vítimas são mulheres de entre 19 e 40 anos. Nos últimos oito anos, 210 mulheres maiores de 60 anos (9%) e 141 crianças menores de 12 anos (7%) foram vítimas de feminicídio. A respeito dos perfis dos feminicidas, Ingrid Becker, uma das integrantes do coletivo, em entrevista à CNN, afirma que «Os feminicídios não são fenômenos isolados, não são crimes de algum louco solto por aí, mas são o último elo na cadeia de violência. A ideia de um assassino ou estuprador solto na rua está bastante distante da realidade, porque a maioria dos feminicídios ocorre dentro das casas, onde as mulheres supostamente deveriam estar mais seguras» (Martino, 2023).
De acordo com os registros judiciais levantados na mesma matéria da CNN, em 2022, em 88% dos casos, as vítimas diretas de feminicídio tinham um relacionamento prévio com o agressor. Em 59% dos feminicídios, o perpetrador do crime era parceiro, ex-parceiro ou mantinha algum outro tipo de relação afetiva-sexual com a vítima. E em 13% dos casos, o feminicida era um membro da família da vítima e em 16% tinham outro tipo de vínculo.
Entre as vítimas e agressores que se conheciam, 42% conviviam no momento do crime. E conforme indicado nos registros judiciais, apenas 5% não tinham um relacionamento prévio. Além disso, em quase 4 de 10 casos de feminicídio havia antecedentes de violência de gênero. Em pelo menos 38 casos, houve denúncias formais contra os agressores, e em 58 foram registrados incidentes prévios de violência de gênero que não foram formalmente denunciados. Por fim, pelo menos 14 vítimas tinham medidas de proteção em vigor e 7 tinham medidas de proteção vencidas (Martino, 2023).
Esses dados nos permitem compreender as principais demanda do Ni Una Menos atualmente: a inclusão da perspectiva de gênero nos concursos para cargos no Poder Judiciário, Poder Executivo e Poder Legislativo, a criação de fóruns especializados em violência de gênero no âmbito da justiça e a criação de tribunais específicos em todas as jurisdições do país e sistemas de plantão 24 horas (Martino, 2023).
Em 2019 foi aprovada a Lei 27499, chamada de Lei Micaela3, que estabelece «a capacitação obrigatória em gênero e violência de gênero para todas as pessoas que ocupam cargos na administração pública em todos os níveis e hierarquias». A importância da implementação dessa lei se dá em um contexto em que o apoio da justiça às vítimas de violência de gênero é fundamental para prevenir os feminicídios. Cumpre mencionar também que em 2023 o governo argentino, em um momento considerado histórico, assumiu a sua responsabilidade enquanto Estado, através da fala do Secretário de Direitos Humanos, Horacio Pietragalla Corti: «O Estado argentino reconhece sua responsabilidade, pois falhou em seu dever de prevenção ao colocar uma vítima de violência de gênero sob os cuidados da mesma delegacia de polícia onde seu agressor trabalhava» (Gobierno de Buenos Aires, 2023).
Isso posto, podemos perceber a importância do Ni Una Menos e das mudanças que o coletivo ajudou a promover em termos de políticas públicas no país ao longo dos seus anos de atuação. O Ni Una Menos soube, a partir de diferentes estratégias nas redes sociais e nas ruas, pautar o debate público e colocar a vida das mulheres no centro das discussões. Para isso, as redes sociais foram importantes aliadas na disseminação das pautas do coletivo. Espaços como o Twitter, para além de simples mediadores, se tornaram um fim em si mesmos, trazendo o ativismo para o espaço virtual (Daby, Moseley, 2022).
Como afirmamos anteriormente, o Ni Una Menos ganhou visibilidade e massividade na Argentina, porém, dada a sua forma de atuação, seu alcance foi para além do seu território. A criação de uma ampla rede de solidariedade transnacional se destacou como uma das suas principais características. Isto é, a promoção de alianças internacionais, seja fisicamente ou no espaço online, permitiu um maior alcance do grupo, que se tornou para além de um coletivo argentino, um movimento também regional e mundial (Gutiérrez, 2021; Sutton, 2020; Vaccarezza, 2021).
3. O feminismo transnacional e o Ni Una Menos
Veronica Gago, uma das mais prolíficas teóricas do coletivo, em seu livro A potência feminista, ou o desejo de transformar tudo, afirma que uma das novidades mais importantes do movimento feminista nos últimos anos se encontra no fato de ter se convertido em um fenômeno mundial que emerge do Sul Global (Gago, 2020). Para ela, o movimento feminista do Sul procura combater a ofensiva neoliberal e conservadora e sua força está na América Latina, epicentro do movimento, enraizada em múltiplas camadas de história, lutas e organizações. A partir daí, passou a existir um forte internacionalismo que desafia as escalas, os alcances e as formas de coordenação de um movimento que, por estar situado, cresce sem perder potência (Gago, 2020).
Gago ressalta que a característica própria desse movimento feminista é que está territorializado em lutas específicas que produzem vínculos em diferentes latitudes. Nesse movimento, o internacionalismo se torna transnacionalismo porque se constitui de alianças que desafiam a noção de nacional-estatal. Ou seja, o diálogo permanente com as lutas de mulheres de outros territórios, a partir da operacionalização do conceito de «corpo-território»4, gera um «tremor simultâneo das camas, das casas e dos territórios» (Gago, 2020: 131).
A dimensão transacional do movimento feminista defendido por Gago não se dá a partir de uma abstração das lutas em favor de uma unidade programática ou por concessão a uma estrutura, mas sim via transnacionalismo que qualifica cada situação concreta, tornando-a mais rica e complexa, sem que ela tenha de abandonar sua raiz; convertendo-a em mais cosmopolita, sem que tenha que também pagar o preço da abstração. Com isso, esse transnacionalismo amplia a imaginação política ao passo que cria uma ubiquidade prática, «uma sensação que se grita quando se diz: estamos em todos os lugares!» (GAGO, 2020: 189).
Portanto, a dimensão internacionalista do movimento feminista se transforma também em um método. E este é igualmente um elemento-chave da estratégia de articulação-ação do Ni Una Menos. Vale ressaltar que o ativismo feminista transnacional é uma faceta da «globalização de baixo para cima», que desafia uma estrutura social centrada nos homens e é moldada pelos avanços nas tecnologias de informação e comunicação. Neste cenário, a internet desempenha um papel crucial, facilitando conexões, colaborações e mobilizações (Moghadam, 2015).
Para definir teoricamente as redes de ativismo feministas transnacionais, Valentina Moghadam (2015) recorre à Lisa Disch e Mary Hawkesworth (2016). Estas autoras descrevem mobilizações feministas internacionais como grupos de mulheres em mais de um país ou região que, com base em uma identidade ideológica coletiva, lutam por melhores condições de vida para mulheres em contextos específicos.
Essas redes feministas transnacionais são estruturas flexíveis e não hierárquicas que abrangem espaços locais e globais. Moghadam identifica quatro tipos de redes feministas transnacionais: as que abordam a agenda política econômica neoliberal, as que se concentram no combate ao fundamentalismo e na defesa dos direitos humanos das mulheres, as que lidam com questões de conflito, guerra e império, e os movimentos que se concentram no humanitarismo feminista e na sociedade internacional. No entanto, é importante observar que os movimentos feministas não são uníssonos. Eles podem diferir em prioridades e estratégias, desde questões específicas, como o direito ao aborto, até uma agenda mais ampla que busca reformas legais e políticas para a igualdade das mulheres. Além disso, esses movimentos podem se concentrar em nível nacional ou adotar uma perspectiva transnacional, especialmente quando enfrentam repressão interna ou falta de interesse na discussão de suas agendas nas instâncias de poder (Moghadam, 2015).
Igualmente, é importante reconhecer que este transnacionalismo não é uma novidade. As mulheres têm se articulado para além das fronteiras nacionais desde a primeira onda do feminismo no início do século XX (Buarque de Holanda, 2018). Essa colaboração abrangeu uma variedade de correntes ideológicas e prioridades ao longo do tempo e enfrentou divisões internas, incluindo aquelas entre grupos do chamado «Primeiro Mundo» e do «Terceiro Mundo». Ou seja, houve fissuras entre o feminismo de recorte ocidental liberal e os «outros» feminismos, o que gerou diferentes ênfases em questões como igualdade legal, direitos reprodutivos, desenvolvimento, colonialismo e imperialismo (Moghadam, 2015).
Nos últimos anos, as redes feministas transnacionais têm exercido influência sobre a agenda política global e as políticas locais em muitos países, incluindo as nações latino-americanas, onde o Ni Una Menos tem desempenhado um papel significativo. Como afirmamos anteriormente, o movimento se espalhou pela região, unindo pessoas que compartilham preocupações semelhantes relacionadas à violência e à desigualdade de gênero. As concentrações massivas e os protestos organizados pelo coletivo na Argentina demonstraram a capacidade do movimento de mobilizar no próprio país e além das fronteiras nacionais, uma vez que em 2017 o grupo já estava envolvido em eventos coordenados com coletivos de outros países latino-americanos.
Em sua «Carta Orgánica», o Ni Una Menos se considera um coletivo horizontal feminista, mas também um lema e um movimento social que quer desafiar as bases da desigualdade e transformá-la (Ni Una Menos, 2017). Assim, fica claro que o grupo tem um comprometimento profundo com uma agenda feminista e pressiona, não apenas pela ação do Estado ou pela punição de quem comete crimes de gênero, mas entende a violência contra a mulher como uma questão estrutural que deve ser transformada. Ou seja, o Ni Una Menos considera o feminicídio uma questão vinculada ao local, ao político, ao institucional e ao internacional e afirma que esse tipo de crime, direcionado às mulheres, deve ser compreendido e debatido dentro do contexto de uma sociedade patriarcal, uma vez que os homens naturalizam o domínio sobre os corpos femininos, o que sustenta a recorrente violência contra as mulheres a partir de um modelo hegemônico universal (Marques, 2019).
Deste modo, o Ni Una Menos pertence a uma rede feminista transnacional que questiona a agenda neoliberal dos Estados e luta pela inclusão de medidas de conscientização, proteção e reconhecimento de mulheres, bem como denuncia o patriarcado e reivindica a proteção ao corpo feminino (Gago, 2018).
Como já dito, as concentrações massivas contra o feminicídio e a luta por direitos das mulheres na Argentina, realizadas em 2015 e 2016, mostraram um forte poder de mobilização para além das fronteiras. Além disso, o movimento se propagou por toda a região principalmente pelas redes sociais. Em 2017 o grupo já participava de uma vasta rede de coordenação de movimentos feministas entre diferentes países da nossa região. Salienta-se que a rede do Ni Una Menos difunde um complexo conteúdo ideológico na organização estratégica e discursiva (Marques, 2019). Ademais, é possível associar a sua trajetória de atuação à estrutura de organização e difusão em rede do modelo teórico feminista apresentado por Moghadam (2015). No mais, a atuação nas redes feita pelo coletivo procura criticar a estrutura patriarcal e a hegemonia masculina, típicas da globalização e do neoliberalismo do Sul Global (Gago, 2018).
Por fim, um forte exemplo de consolidação do Ni Una Menos como um movimento transnacional, é a utilização da consigna Ni Una Menos para denominar outros coletivos tanto na América Latina, quanto em outras regiões do mundo. Isso pode ser observado nas imagens destacadas na sequência.




4. Hashtagtivismo: o ativismo através das redes sociais e o poder das consignas
O uso da internet pelos movimentos sociais não é algo novo. Manuel Castells (2001: 182) assinala a experiência zapatista em Chiapas, no México, na década de 1990, como um exemplo de uso da internet pelos movimentos sociais. Esta experiência ficou conhecida no mundo todo por causa da internet em conexão com a mídia e uma estrutura descentralizada de grupos de solidariedade.
Em um contexto de ascensão de demandas feministas, em 2006 surge nos Estados Unidos o movimento Me Too. Criado pela ativista social estadunidense Tarana Burke, o movimento buscava unir vítimas para que juntas encontrassem apoio umas nas outras e buscassem soluções contra os crimes de assédio e abuso. Anos mais tarde, a atriz Alyssa Milano motivou diversas mulheres a compartilharem suas histórias de assédio nas redes sociais utilizando a hashtag #metoo (Mendes, Ringrose, Keller, 2018: 36).
Ainda de acordo com Castells (2001: 183), a internet não é um instrumento vantajoso somente porque está ao nosso alcance, mas sim porque se molda às características do tipo de movimentos sociais que surgiram nas últimas décadas. Esses movimentos encontraram no espaço da internet um meio de organização que permitiu a abertura de novos espaços de troca social. Nesse contexto do online, a comunicação de valores e a mobilização em torno de significados tornaram-se fundamentais.
Para Geoffrey Players (2013: 94) a análise dos movimentos contemporâneos deve considerar as lógicas da ação coletiva e as da «ação conectiva», mas também e, especialmente, suas interações. As subjetividades políticas e os atores dos movimentos sociais atuais surgem da articulação e da alimentação recíproca entre a vida cotidiana e a política, entre o mundo online e o das praças públicas, entre as redes sociais e os espaços militantes.
De encontro a isso, temos a atuação do Ni Una Menos, que se centrou muito no espaço virtual. A forte presença do coletivo nas redes sociais, especialmente no Twitter, onde as ativistas usaram a hashtag #NiUnaMenos pela primeira vez em maio de 2015, destacou-se como chamamento a uma ação prática em resposta a uma situação limite de violência de gênero na Argentina. Através do poder das hashtags, o coletivo conseguiu estabelecer uma conexão ampla e imediata com pessoas de diferentes partes do mundo, permitindo que a consigna Ni Una Menos se tornasse um movimento, ou melhor, um símbolo em torno da luta pelo fim dos feminicídios para além da Argentina (Gago, 2020).
O Twitter (agora denominado X) desempenhou um papel crucial no início do ativismo online do Ni Una Menos, uma vez que foi nessa plataforma que o coletivo iniciou sua mobilização nas redes sociais. Esta rede tem uma relevância política considerável, visto que a grande maioria das figuras públicas possui uma conta na plataforma e a utiliza com frequência para uma interação mais direta com o público. Além disso, os portais de notícias recorrem ao Twitter como fonte para citar declarações de políticas/os e outras personalidades influentes. Como resultado, a plataforma se estabeleceu como uma rede social profundamente enraizada na esfera política, permitindo a discussão de eventos em tempo real (Guerrero, 2023).
Em muitos países, o Twitter passou a ser utilizado para amplificar formas mais convencionais de comunicação política, como comunicados oficiais ou coletivas de imprensa. E mesmo que o Twitter não seja tão popular quanto outras redes sociais, o que é compartilhado nele ganha visibilidade. Seu uso também se reflete em matérias jornalísticas que se baseiam em declarações de fontes que utilizam a plataforma ou em hashtags que se tornaram um indicador dos tópicos discutidos no momento, seja em âmbito local ou global (Justel-Vázquez, 2018).
As hashtags são representadas pelo símbolo «#» seguido de uma palavra, formando uma espécie de etiqueta. Podemos considerá-las como palavras-chave que, no contexto do Twitter, têm uma função agregadora, tornando-se mais dinâmicas do que as palavras-chave tradicionais. O termo se popularizou globalmente na versão em inglês (hashtag). Isso porque o significado que possui para os usuários no idioma original é amplamente preferido em relação às suas traduções alternativas, como «palavra-chave» ou «etiqueta», que não transmitem a mesma ideia que a hashtag, especialmente quando consideramos seu uso específico nesta plataforma (Silveira, 2013).
Além disso, as hashtags transcenderam as redes sociais e passaram a ser usadas em manifestações de movimentos sociais. O símbolo «#» está presente em cartazes, faixas, roupas, murais, acessórios etc., materializando as conexões virtuais em espaços reais (Pereira, 2020). Isso tem um significado amplo que vai além do ambiente da internet, pois as hashtags funcionam como ferramentas tanto organizacionais, quanto ideológicas (Menna, 2012).
No dia 3 de junho de 2015, durante a primeira Marcha do Ni Una Menos, a hashtag #NiUnaMenos alcançou o topo dos Trending Topics no Twitter em todo o mundo, com mais de 13.400 menções por minuto e um total de mais de 600 mil menções. Ressalte-se que após o surgimento da hashtag #NiUnaMenos, os meios de comunicação passaram a dar maior visibilidade aos casos de feminicídio, além de registrar o posicionamento de figuras públicas, de várias instituições políticas e da sociedade civil que aderiram ao movimento, o que demonstra uma efetiva mudança social (Annunziata et al, 2016).
Outro dado importante é que o uso da hashtag #NiUnaMenos no Twitter e o apoio à marcha passou a demarcar uma postura progressista por parte de quem o fazia. Conforme observado por Paula Rodríguez (2016), autora do livro #NiUnaMenos, embora a cultura machista ainda persista, #NiUnaMenos representou uma quebra de paradigma e uma mudança de era. Rodríguez afirma que, assim como a frase «se va a acabar» marcou uma época (a da última ditadura argentina), para a geração seguinte foi a frase «que se vayan todos»5 (acerca da crise econômica conhecida como corralito) e para as novas gerações é a hashtag #NiUnaMenos.
Além disso, cumpre enfatizar que as marchas fizeram com que o tema do feminicídio se tornasse presente em diversos espaços, privados e públicos, como residências, muros, escolas e universidades, entidades governamentais, museus e galerias, associações de entidades de classe, bares e restaurantes, entre outros (Garcia, 2017).
Em relação ao seu ativismo online, as mudanças provocadas pelo coletivo foram tangíveis e visíveis na sociedade argentina e além dela. O Ni Una Menos utilizou habilmente as redes sociais e suas ferramentas como estratégia discursiva para criar experiências de convergência e disseminação de uma campanha que promoveu o conhecimento e a conscientização. Para Marcela Fuentes (2020), o Ni Una Menos construiu uma representação mais abrangente da violência de gênero do que apenas o feminicídio, unindo o ativismo online e offline de forma eficaz, transformando o discurso nas redes sociais em uma extensão do discurso das ruas e vice-versa.
O uso estratégico e muito acertado do espaço das redes sociais ocorreu muito pela preocupação em sintetizar demandas, resumir pautas urgentes em frases breves, construídas coletivamente, onde se demarcava qual era a reivindicação. Esse exercício de sintetizar demandas se deu através do uso de consignas. Como já dito anteriormente, o nome do coletivo se tornou uma consigna, pois, a menção a #NiUnaMenos já havia se estabelecido como símbolo da luta contra os feminicídios no imaginário não somente argentino (Laudano, 2017).
Ademais, o coletivo foi incorporando outras consignas conforme aumentava seu repertório de demandas. Isso potencializou o ativismo digital feminista do grupo, pois o «ciberfeminismo» social do Ni Una Menos foi se adaptando as peculiaridades de cada contexto (Laudano, 2019). Assim, analisar o Ni Una Menos através das suas consignas não somente nos ajuda a entender suas pautas, como permite realizar, sob uma perspectiva feminista, um percurso pelas diferentes conjunturas sociais e políticas vividas pela Argentina a partir de 2015.
De acordo com Gago (2021), as consignas são o eixo condutor de muitas atividades do coletivo. Em fala no evento online promovido pelo coletivo durante a pandemia, em 2021, (a «Asamblea Latinoamericana Feminista 3J»), com a presença de militantes de diversos países da região, Gago destacou que as consignas foram escolhidas como o ponto de partida do evento para debater questões em comum por conta da centralidade das mesmas para os diferentes movimentos sociais da região. Importa sublinhar que a elaboração permanente de consignas é um componente muito rico dos movimentos feministas latino-americanos e a criação de palavras de ordem e slogans de forma coletiva é um dos principais elementos das pedagogias feministas (Silva, Rosa, 2019). Ainda para Gago:
«Algo muito rico do movimento feminista é esta elaboração permanente de palavras de ordem, frases, slogans que vão tramando um saber coletivo e uma pedagogia feminista, conceituando, nomeando e tramando, compartilhando o que fazemos - o que pode ser sistematizado também como saber» (Gago, 2021: 213).
Nesse sentido, o saber coletivo conceitua, nomeia e difunde as principais demandas dos movimentos feministas nos nossos territórios. Além disso, as consignas dão conta de sintetizar experiências diferentes, ao passo que resultam em textos políticos construídos de forma coletiva, que surgem em determinados locais e vão se espalhando para outras latitudes, em um processo de tradução que gera agendas feministas para além das fronteiras dos Estados nacionais. Esse elemento foi ressaltado por Lucia Cavallero (2021), também integrante do Ni Una Menos, que destacou a importância da linguagem feminista construída pelas feministas.
Na sequência, apresentamos alguns exemplos de consignas que o Ni Una Menos aderiu e construiu. Elas demonstram a confluência de um discurso que passa das redes sociais para as ruas e vice-versa, e que exprime demandas complexas e extensas em lemas de fácil compreensão.
#Vivasnosqueremos
Em julho de 2014, o coletivo feminista mexicano Mujeres Grabando Resistencias passou a difundir a campanha internacional #Vivasnosqueremos. A convocatória fazia parte de um projeto político-cultural para criar mensagens claras e de fácil entendimento a respeito da violência contra as mulheres, os feminicídios e o direito a autodefesa. O objetivo era realizar intervenções tanto no México, quanto em outros países da região (Rovetto, 2021).
O Ni Una Menos, respondendo a este chamado em 2015, passou a adotar em suas estratégias de comunicação a consigna, que rapidamente se espalhou. Em manifesto intitulado El grito en común: ¡Vivas nos queremos! (2016) o coletivo afirma:
Dizer «Ni Una Menos» não foi, não é, um pedido nem um apelo. É enfrentar o que não queremos: nem mais uma vítima, e afirmar que nos queremos vivas, íntegras, autônomas, soberanas. Donas de nossos corpos e de nossos caminhos de vida. Donas de nossas escolhas: como queremos, quando queremos, com quem queremos (grifo nosso).
Além das redes sociais, a consigna se via também nas ruas. Os muros das cidades e os cartazes das manifestações demonstravam a consonância dos discursos virtual e físico.

#Nosotrasparamos
Ao lançarem em 2016 a consigna #Nosotrasparamos, o intuito do Ni Una Menos foi o de promover uma mudança no entendimento do instrumento da greve, ferramenta tradicional do movimento operário organizado. O objetivo era reconfigurar, reconceitualizar e reutilizar a greve tendo em conta as realidades de vida e de trabalho que escapam aos limites sindicais. Conforme ressalta Gago:
«A greve como horizonte prático e como perspectiva analítica a partir das lutas é o que possibilitou impulsionar um feminismo popular e antiliberal, que conectou as tramas das violências econômicas às violências concentradas contra o corpo das mulheres e os corpos feminizados» (Gago, 2021: 17)



Para Fuentes (2020), o Ni Una Menos pode ser entendido como uma «constelação de performances», pois se utiliza de diversas estratégias performáticas, que se interligam, formando uma verdadeira rede. Essas performances ocorrem tanto nos espaços físicos, quanto virtuais. Nesse sentido, ferramentas como hashtags facilitam experiências de convergência e de disseminação sem liderança ou com lideranças tênues, que podem ser vistas em comunhão com uma ética feminista comunitária que enfatiza a horizontalidade e a interdependência. Além disso, as hashtags possibilitam a produção de conhecimento e a conscientização.
Quando postas em publicações em redes sociais em relação contígua, como etiquetas conceituais, as hashtags estabelecem conexões entre diferentes formas de violência de gênero. Ao colocar #NiUnaMenos ao lado de outras hashtags como #AbortoLegal, as ativistas feministas demonstram que os feminicídios são apenas a ponta de um iceberg que abrange um amplo espectro de casos de violência institucional, cultural e interpessoal. Deste modo, a continuidade das consignas, ou seja, sua repetição e recombinação, gera conhecimento adicional sobre a extensão do problema (Fuentes, 2020).
Um exemplo disso se deu com a junção de #NiUnaMenos a #LibertadParaBelén. Essa consigna diz respeito ao caso da jovem condenada a oito anos de prisão após sofrer um aborto espontâneo, que ficou em prisão preventiva até 2016, quando a Suprema Corte de Justiça da Província de Tucumán decidiu pela sua liberdade (Anística Internacional, 2016). Já o lema #LiberenAMilagroSala se refere ao caso de Milagro Sala, uma líder comunitária da organização popular Tupac Amaru de Jujuy, província situada no noroeste da Argentina. Sala foi a primeira presa política do governo de Mauricio Macri em 2016. As organizações de direitos humanos da Argentina declararam ilegal a prisão e exigiram a sua liberação imediata (Fuentes, 2020).
Estas duas consignas são bons exemplos para compreendermos como os temas da criminalização do aborto e do protesto social são colocados pelo Ni Una Menos como parte da violência sistêmica institucional. Ademais, através dessa contiguidade das hashtags, as ativistas podem mapear uma ampla cartografia de violência de gênero que vai além do problema do feminicídio, permitindo assim situar casos específicos dentro de um conjunto mais amplo de relações de poder. Outrossim, usando as mesmas consignas, ativistas internacionais não apenas demonstraram solidariedade com o movimento argentino, mas também revelaram a dimensão global da escalada da violência de gênero em áreas urbanas e rurais (Fuentes, 2020).
Nesse sentido, o uso de hashtags como #NiUnaMenos, #NotOneWomanLess e #NonUnaDiMeno demonstra a arquitetura de um movimento em rede que não depende necessariamente de um ponto central. Além disso, também permite estabelecer conexões com outros movimentos de mulheres que transcenderam seus contextos locais (Fuentes, 2020). Isso pode ser percebido na Segunda Marcha em junho de 2016. Naquela ocasião, o coletivo adotou a hashtag #VivasNosQueremos, fazendo referência à campanha nacional contra a violência de gênero no México. Posteriormente, em 19 de outubro do mesmo ano, utilizaram as hashtags #NosotrasParamos e #MiércolesNegro, seguindo os passos das ativistas polonesas que usaram #BlackMonday (#SegundaFeiraNegra) para promover uma greve contra uma iniciativa de seu governo para proibir o aborto.
Portanto, através das consignas, vemos que o Ni Una Menos estabelece uma rede feminista transancional que possui uma agenda de pautas conjuntas. Ademais, as consignas permitem fazer um mapeamento e, consequentemente, estabelecer pontos e diálogos em comum, criando uma rede regional e global de denúncias, protestos e solidariedade internacionalista no espaço virtual, que se traduz no espaço físico. Datas como o 8M são especialmente mobilizadas, gerando protestos massivos na Argentina e em diversos outros países.
Atentas e também mobilizadas durante o período de eleição presidencial, as argentinas vêm retomando a onda de ativismos, especialmente entre setembro de 2023 e março de 2024, após a vitória de Javier Milei. Em um país em crise, as mulheres se articulam e seguem resistindo.
4.1. De maré a tsunami: a reação das argentinas a um governo antifeminista
Em novembro de 2023, no segundo turno das eleições presidenciais argentinas, também denominado de balotaje, foi eleito presidente o candidato representante da ultradireita, Javier Milei, com 55,7% dos votos (Figueiredo, 2023). Ainda em setembro do mesmo ano, de forma estratégica, na data histórica de 28 de setembro, dia da Luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe, as mulheres saíram as ruas também para dizer que estavam contra o candidato que ameaçava os direitos das mulheres.

Em um cenário de disputa entre um candidato democrático, contra um candidato declaradamente anti-democrático, o coletivo Ni Una Menos declarou apoio a Sérgio Massa, numa tentativa de evitar a iminente eleição do candidato que ameaça em seus discursos, as mulheres e as dissidências.
Em sua campanha, Milei negava a violência por razões de gênero -apesar dos 322 feminicídios em 2023, o que corresponde a 1 feminicídio a cada 27 horas no país, conforme apontou levantamento realizado pelo Observatório de Feminicídios da Defensoria del Pueblo de la Nación (2023)- e a diferença salarial entre homens e mulheres, que é de 26,4% de acordo com dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INDEC). Sob a ameaça do que viria poucos meses depois, as argentinas passaram a chamar votos estratégicos para Massa.
Já como presidente, Milei passou do discurso à prática, eliminando o Ministério das Mulheres, Gêneros e Diversidade e proibindo a linguagem inclusiva e a perspectiva de gênero em toda a administração pública (Lambertucci, 2024).


Como sabemos, as mulheres argentinas não conseguiram impedir a eleição de Milei -no primeiro turno o voto feminino representou 45% do eleitorado de Massa (Peker, 2021)- e uma vez mais se organizaram para lutar contra o governo de um presidente dono de uma retórica não só antifeminista, mas anti-mulher. Sob a ameaça de retrocesso de todas as conquistas do movimento feminista no país, as mulheres precisaram voltar ao espaço das assembleias e das marchas, agora para denunciar um governo cujo líder despreza seu movimento e suas proezas.
Além das inúmeras medidas que a nova gestão passou a tomar e que afeta diretamente a vida das mulheres - econômica e socialmente - o governo em fevereiro de 2024, por meio de sua base de deputados, apresentou um projeto para revogar a Lei de Interrupção Voluntária da Gravidez, a maior conquista das argentinas nas últimas décadas. O texto, assinado pela deputada Rocío Bonacci, e apoiado pelos/as legisladores/as Beltrán Benedit, María Fernanda Araújo, Lilia Lemoine, Manuel Quintar e Oscar Zago, visa criminalizar o aborto para «evitar um perigo iminente para a vida da mãe, desde que o perigo não possa ser evitado por outros meios» (Taddeo, 2024).
A resposta feminista, articulada pelo Ni Una Menos e diversos outros coletivos e organizações, veio na Marcha do 8 de março, dia Internacional das Mulheres, sob a consigna «fuimos marea, ahora seremos tsunami». O 8M reuniu um milhão de mulheres em toda a Argentina:
«O que têm as Marchas feministas? Antes de tudo, rebeldia. Nenhuma força política, provavelmente hoje em dia, alcança o poder de convocatória que se viu ontem, com todas as garotas soltas. A multitudinária manifestação foi no marco do primeiro 7 de março com um governo encabeçado pelo presidente Javier Milei, explicitamente antifeminista, que proíbe a linguagem inclusiva na administração pública e anuncia que eliminará a perspectiva de gênero nas políticas públicas, além de expressar permanentemente seu rechaço a Lei de interrupção voluntária da gravidez» (Carbajal, 2024).
A organização para o 8M se deu no mesmo formato das Marchas do Ni Una Menos, com Assembleias prévias. E o que se percebeu na deste ano, conforme registros divulgados no Twitter e Instagram do coletivo, foi o grande número de participantes.

Para Verónica Gago (2024), este trabalho de preparação, por meio de Assembleias, de logística para a mobilização e, também, de planejar o depois para as que não puderam ir até a Marcha, é parte de um modo de cuidado e atenção com que se faz o enredo político feminista.
«Capaz de concentrar uma multiplicidade de ações em unidade. Capaz de dar conta dos níveis de dano e precariedade com os que hoje acompanham qualquer iniciativa. Capaz de fazer do trabalho organizado um modo de se sustentar. Se em algum momento as narrativas de fuga seduziam com a possibilidade de deserção da norma, em um momento de governo do caos - em um modo de governo anarcocapitalista de Milei - sustentar é o mais difícil e necessário» (Gago, 2024).
No dia da Marcha, se viu em Buenos Aires, e em outras cidades da Argentina, milhares de mulheres. Eram muitas, de diferentes idades, e estavam juntas contra o governo Milei e por seus direitos e suas vidas.

Conforme narra Mariana Carbajal (2024):
«Foi ar fresco, alegria compartilhada, abraços que se multiplicavam, e a ilusão de pensar em construir desde um sentido coletivo, em um contexto político que oprime, com um Governo que tomou o feminismo como alvo de seus ataques quase cotidianos, a ponto de anunciar -sem dúvidas, como forma de provocação- no mesmo Dia Internacional das Mulheres a mudança de nome do Salão Mulheres do Bicentenário da Casa Rosada - onde reunia quadros de figuras históricas, pioneiras de distintos tempos e que, é preciso lembrar, durante o macrismo foi convertido em escritórios, com repartições e computadores - em Salão dos Heróis porque, em definitivo -alegou o porta-voz presidencial- se estava “discriminando aos homens”». (Carbajal, 2024).
A partir do que se viu no 8M e das mobilizações prévias a esta, as feministas argentinas seguem mobilizadas, mais do que nunca, contra os inimigos comuns. Se Milei e parlamentares de extrema-direita cotidianamente demonstram seu desprezo pelas feministas e suas conquistas, elas respondem com a força de maré e tsnunami, tanto nas redes quanto nas ruas, com a solidariedade feminista que une, ampara e potencializa a força de cada uma. Em um momento de fragilidade democrática e crise econômica, as mulheres se reinventam, se sob o governo de Milei o feminismo é um de seus adversários políticos (Teruggi, 2024), as mulheres respondem com luta organizada nas ruas.
5. Considerações finais
O Ni Una Menos representa uma mudança significativa no ativismo feminista latino-americano, marcando um momento crucial na luta pelos direitos das mulheres na região. A trajetória deste coletivo, desde sua fundação em 2015 até os dias de hoje, mostra como o ativismo online e o uso de hashtags desempenharam um papel fundamental na promoção e na mobilização em torno da causa feminista.
O Ni Una Menos conseguiu transcender as fronteiras geográficas e tornar-se um movimento transnacional. O uso estratégico das redes sociais, especialmente o Twitter, permitiu que a hashtag #NiUnaMenos se espalhasse pelo mundo, unindo pessoas de diferentes países em uma luta comum contra o feminicídio e a violência de gênero. Isso demonstra o poder das redes sociais como poderosas ferramentas para a conscientização e a mobilização social. Por sua vez, a consigna Ni Una Menos tornou-se um símbolo global na luta pelos direitos das mulheres, sendo adotada por coletivos e organizações de diferentes países. Isso também demonstra como as redes sociais podem conectar movimentos sociais em nível internacional, permitindo a solidariedade e a cooperação entre ativistas de todo o mundo.
A trajetória do coletivo mostra como o ativismo online e offline podem se entrelaçar e criar impacto em nível local e transnacional. Ni Una Menos desafiou o status quo e trouxe o feminicídio e a violência de gênero para o centro do debate público, contribuindo para uma transformação na sociedade argentina e para além das fronteiras portenhas. As performances e os rituais realizados pelo coletivo nas redes sociais, não apenas denunciam a violência de gênero, mas também desafiam e questionam o sistema patriarcal-capitalista-neoliberal. E essas ações online ganham repercussões significativas, ampliando o debate sobre o feminicídio e promovendo uma mudança na narrativa em torno da violência de gênero.
A abordagem do Ni Una Menos como uma «constelação performática» representa, igualmente, uma forma inovadora de pensar o ativismo online e offline como interligados e complementares. O coletivo não apenas utiliza as redes sociais como meio de comunicação, mas também as incorpora às suas ações de protesto, criando uma dinâmica única de mobilização.
Assim, em um mundo cada vez mais interconectado, o ativismo online e o uso estratégico das redes sociais se tornaram instrumentos poderosos para disseminar mensagens e promover mudanças sociais. Nesse contexto, o hashtagtivismo desempenhou um papel fundamental. Conforme apresentamos, a atuação do Ni Una Menos nas redes sociais, com ênfase no Twitter, foi decisiva para a disseminação da hashtag #NiUnaMenos e a transformação da mesma em um movimento global de luta contra os feminicídios.
A força das hashtags, com seu poder agregador e sua instantaneidade, permitiu também uma uma conexão imediata com pessoas em todo o mundo, ampliando o impacto das ações do coletivo. O Twitter, como plataforma inicial do ativismo online do Ni Una Menos, teve uma função de destaque devido à sua relevância política e sua capacidade de disseminar informações em tempo real. Mesmo sendo menos popular do que outras redes sociais, o que é compartilhado no Twitter ganha visibilidade, pois é amplamente utilizado por figuras públicas e veículos de notícias.
As hashtags transcenderam o ambiente virtual e passaram a ser usadas em manifestações e protestos reais, o que transformou as conexões virtuais em ações palpáveis. Elas desempenharam um papel organizacional e ideológico, consolidando demandas e potencializando a luta feminista. Também permitiram a conexão de diferentes formas de violência de gênero, ampliando a compreensão do problema e situando casos específicos dentro de um contexto mais amplo. Com isso, o Ni Una Menos conseguiu conectar-se a outros movimentos de mulheres em todo o mundo, demonstrando a dimensão global da violência de gênero e a necessidade de estabelecer conexões que intensifiquem a solidariedade internacional.
A estratégia de sintetizar demandas em frases curtas e de fácil compreensão através das consignas desempenhou uma função fundamental no ativismo do Ni Una Menos. A consigna #NiUnaMenos se tornou um símbolo da luta contra os feminicídios, e o coletivo incorporou outras consignas à medida que expandia seu repertório de demandas. Estas não apenas ajudaram a definir as suas pautas, mas serviram como um meio de expressão política. Escolhidas estrategicamente devido à sua centralidade para os movimentos sociais e sua capacidade de sintetizar experiências complexas de forma acessível, as consignas não se limitaram ao ambiente online, mas também foram manifestadas nas ruas, demonstrando a inter-relação entre o discurso virtual e a ação presencial.
Em resumo, o hashtagtivismo e as consignas foram cruciais no ativismo do Ni Una Menos, possibilitando a disseminação de mensagens, a organização de demandas e a conexão com outros movimentos. Nesse sentido, o Ni Una Menos e seu uso estratégico das redes sociais oferecem lições valiosas sobre como o ativismo online pode se traduzir em ações tangíveis e em mudanças sociais reais.
O coletivo segue atuante e servindo de inspiração para mais mulheres de outros cantos do mundo se somarem à luta pelo fim da violência de gênero, pela vida das mulheres, pela autonomia dos seus corpos, pelo fim do machismo, da misoginia, da homofobia, entre outros. Ni Una Menos, nenhum passo atrás!
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Notes