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A marginalização da figura feminina negra empoderada como bruxa em Eu, Tituba bruxa negra de Salem (1986) de Maryse Condé

Elis Regina Fernandes Alves
Universidade Federal do Amazonas, Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente, Brazil
Henrique Moreira Pacheco
Universidade Federal do Amazonas, Instituto de Educação, Agricultura e Ambiente, Brazil

A marginalização da figura feminina negra empoderada como bruxa em Eu, Tituba bruxa negra de Salem (1986) de Maryse Condé

Muiraquitã, vol. 11, no. 1, pp. 150-174, 2023

Universidade Federal do Acre

Muiraquitã: Revista de Letras e Humanidades is licensed under CC BY-NC-ND 4.0

Received: 28 April 2023

Accepted: 27 June 2023

Resumo: Analisa-se o romance Eu, Tituba: bruxa negra de Salem, (1986), de Maryse Condé, com o objetivo de analisar a voz de Tituba sobre os acontecimentos de Salem, de forma a simbolizar a voz de “bruxas” e mulheres negras silenciadas pelas histórias oficializadas. Como teoria, utiliza-se o feminismo negro, que discute sobre as mulheres marginalizadas por questões raciais e de classe, com base em Davis (2016; 2018) e hooks (2018; 2019), bem como a discussão sobre a criação do estereótipo de bruxa imputado a mulheres empoderadas, com base em autores como Federici (2017) e Russel e Alexander (2019). A pesquisa revela que a ficção de Condé revisita a história e evidencia a exclusão das mulheres negras da historiografia oficial, como a história de Salem sugere. Ao figurar Tituba como protagonista dos julgamentos das bruxas de Salem, coloca-a em uma posição sempre negada pelo patriarcado e pelos movimentos de supremacia branca.

Palavras-chave: Feminismo negro, Bruxa, Protagonista feminina negra, Eu, Tituba: Bruxa negra de Salem.

Abstract: It is analyzed the novel I, Tituba: black witch of Salem, (1986), of Maryse Condé, aiming the analysis of the happenings in Salem, in a way of symbolizing the voice of the “witches” and black women silenced by the official history. As theory, it is used the black feminism which discusses women marginalized by racial and class issues, based on Davis (2016; 2018) and Hooks (2018; 2019), and also the debate on the creation of the witch stereotype imposed to empowered women, based on authors as Federici (2017) and Russel and Alexander (2019). The research reveals that Condé’s fiction revisits history and highlights the exclusion of black women from the official historiography, as Salem’s history suggests. When figuring Tituba as the protagonist of Salem’s trials, the writer puts her in a position that has always been denied by the patriarchy and the white supremacy movements.

Keywords: Black feminism, Witch, Black female protagonist, I, Tituba: black witch of Salem.

PROBLEMATIZANDO A QUESTÃO

A ideia de “transformar”, discursivamente, mulheres em bruxas tem origens menos religiosas e mais capitalistas, na visão de Silvia Federici (2017). A autora aponta que as religiões apoiaram a condenação de milhares de mulheres à fogueira ou forca, condenadas por bruxaria, mas os ideais por trás de tais condenações eram vários, como: retirar certo empoderamento feminino (embora pequeno) conseguido, principalmente, durante a Idade Média, quando as mulheres começaram a ter certo controle de natalidade, com ajuda de parteiras; aumentar a natalidade e impedir abortos com punições severas; acelerar os casamentos, que haviam se tornado mais tardios, etc. Tais medidas tinham o intento de aumentar a natalidade para criar mais trabalhadores para o sistema capitalista que florescia: “[...] a partir de agora seus úteros se transformaram em território político, controlados pelos homens e pelo Estado: a procriação foi colocada diretamente a serviço da acumulação capitalista.” (FEDERICI, 2017, p. 178). O apoio religioso foi fundamental para a disseminação do medo das bruxas, de tal modo que padres e pastores instigavam vizinhos a se vigiarem e denunciarem e qualquer morte de bebês no parto era considerada bruxaria.

Boa parte da literatura sobre o tema da caça às bruxas revela misoginia, focando nos “defeitos” das mulheres caçadas: depravadas, desonradas, fracassadas, como se houvesse alguma justificativa, numa tendência de acusar a vítima. Só com o fortalecimento dos movimentos feministas, principalmente nos anos 1960, nos Estados Unidos e na Europa com mais força, o tema foi revisitado, dada a identificação das feministas com as bruxas, pois a caça às bruxas só se deu por que mulheres desafiaram estruturas de poder (FEDERICI, 2017) e exigiram direitos só dados aos homens.

Dentro dos movimentos feministas, porém, as primeiras manifestações por igualdade foram de mulheres brancas de classe média ou alta, que pediam sua equiparação a homens brancos. Inicialmente, os feminismos como movimentos sociais buscaram dar espaço às mulheres brancas no mercado de trabalho, na educação, na vida política, etc. (WOLLSTONECRAFT, 2016). Mas, as mulheres negras e pobres foram excluídas das discussões destes feminismos que, hoje, são criticados por terem sido excludentes e, perigosamente, em certos momentos, terem flertado com movimentos de supremacia branca. (HOOKS, 2019). As mulheres negras eram escravizadas até boa parte do século XIX, trabalhavam como os homens negros, recebiam os mesmos castigos, além dos estupros, algo constante nas plantations. O feminismo negro é que começa a tratar da situação de mulheres negras, tornadas periféricas, que demoraram mais tempo para terem suas vozes ouvidas em todos os campos sociais.

Na literatura, o mesmo se deu, pois a exclusão de vozes femininas negras é vista até em obras canônicas do feminismo literário, como se nota em A Literature of Their Own, de Elaine Showalter, publicado em 1977, e Política sexual, de Kate Millet, de 1970, marcos do feminismo como crítica literária (RIBEIRO, 2018). Não se questiona aqui o valor dos movimentos feministas em termos sociais e literários, mas o que se busca é justamente o resgate de vozes silenciadas até mesmo pelos feminismos, e a análise da figuração de personagens negras em obras de autoria feminina negra. Assim, se as bruxas brancas foram excluídas da história e da literatura, as negras o foram duplamente, como é o caso de Tituba, protagonista do romance Eu, Tituba: bruxa negra de Salem, romance de Maryse Condé, publicado em 1986 e objeto de análise dessa pesquisa.

Nos Estados Unidos, o episódio mais marcante sobre a caça às bruxas se deu em Salem, em 1692, em que adolescentes apresentaram sintomas estranhos e passaram a acusar mulheres locais de bruxaria. A suspeita logo recaiu sobre Tituba, escravizada negra que contava lendas folclóricas de seu país, além de saber usar ervas medicinais. Para escapar da forca, Tituba confessou o ato de bruxaria e outras mulheres foram acusadas, com 20 mortes. A história contou o destino das mulheres, famílias e dos juízes de Salem, mas sobre Tituba, nada de efetivo se soube (RUSSEL e ALEXANDER, 2019). O romance Eu, Tituba: bruxa negra de Salem, (1986), de Maryse Condé, escritora negra de Guadalupe, dá voz à Tituba, mulher, escravizada e negra, já que sua voz foi silenciada na história e seu ponto de vista sobre os acontecimentos de Salem nunca foi ouvido. Como protagonista, Tituba nos conta suas raízes, como aprendeu a usar ervas medicinais e seu contato com conhecimentos de magia e ocultismo, além de como isso lhe trouxe certa independência e poder, ainda em Barbados. Nos Estados Unidos, porém, tais conhecimentos são condenáveis, dadas as crenças puritanas locais, que relegam as mulheres às posições de subalternidade, passividade e, principalmente, inferioridade intelectual.

Maryse Condé é considerada como umas das principais vozes da literatura contemporânea francófona a tematizar mulheres negras, principalmente aquelas vítimas de situações de colonização e escravização e das múltiplas formas de violência recaídas sobre elas (DIAS, 2017). O interesse em trazer a história de Tituba à tona surge da necessidade de expor o racismo vigente no puritanismo nos Estados Unidos. A escritora observa que a sociedade valoriza muito a cultura inglesa no país e exclui tudo o que não se encaixa nela. Pensando nisso, ela visa refletir sobre o evento no qual o puritanismo mais marcou, negativamente, a história do país, sendo ele o período da caça às bruxas. Entretanto, é assim, analisando os textos históricos oficiais sobre o ocorrido, bem como a peça teatral The Crucible (1961), de Arthur Miller, que tematiza o episódio de Salem sob uma ótica masculina, que ela percebe o quanto excluíram umas das figuras centrais desse evento, Tituba, mulher, negra e escravizada (OLIVEIRA, ALÓS, OLIVEIRA, 2018).

Diante de tais fatos, agora como protagonista, Tituba vem, através de Maryse Condé, nos revelar que nasceu como resultado de um estupro causado por um marinheiro quando sua mãe ainda estava sendo levada para ser escravizada em Barbados. Mais tarde, ela se torna órfã após sua mãe ser condenada à morte por tentar se defender de uma tentativa de estupro por seu senhor. Ainda criança, é expulsa da plantação onde vivia, passando a vagar sozinha pelas demais fazendas, sendo acolhida por Man Yaya, mulher ex-escravizada que transmite diversos dos seus conhecimentos e técnicas ancestrais de tratamento de doenças e orações de proteção e cura. Após o falecimento de sua mentora, Tituba se apaixona e passa a viver com seu marido John Indien, jovem também escravizado, em uma fazenda próxima, passando a servir a senhora dele.

Mais adiante, a protagonista é vendida, bem como seu marido, para Samuel Parris, um pastor puritano que os leva para os Estados Unidos, se fixando mais tarde na vila de Salem, onde Tituba enfrenta sérias acusações feitas pelas crianças da família Parris sobre praticar bruxaria, sendo presa e tendo que acusar outras mulheres como suas cúmplices para assim não ser executada. Mais tarde, é vendida para um homem judeu que a acolhe e a ama, dando sua liberdade e oportunidade de voltar a Barbados após a família dele sofrer ataques de intolerância religiosa dos puritanos.

Retornando a Barbados, Tituba é tratada com respeito, pois todos contam histórias fantásticas da bruxa que sobreviveu ao massacre realizado pelos puritanos dos Estados Unidos. Nesse tempo em Barbados, Tituba se reúne com um grupo de pessoas escravizadas foragidas que viviam escondidas nas montanhas, mas não consegue ficar ali por muito tempo e volta para a sua casa escondida na floresta, onde viveu por muito tempo antes de sair de Barbados. Um dia, levam um jovem negro à beira da morte, resultado de uma punição realizada pelos seus senhores, para que Tituba o curasse. Ela e o jovem começam um caso de amor e ele, consumido pela revolta, planeja uma rebelião com outros escravizados para tentar acabar com a escravidão do seu povo, mas no fim acabam sendo pegos, também Tituba, tendo seu desfecho na forca por ser considerada cúmplice da rebelião.

Esta pesquisa propõe a análise da voz de Tituba sobre os acontecimentos de Salem, de forma a simbolizar a voz de “bruxas” e mulheres negras silenciadas pelas histórias oficializadas. A ficção de Condé revisita este espaço e consegue evidenciar a exclusão das mulheres negras da historiografia oficial, como a história de Salem sugere. Para isso, propõe-se a utilização das considerações do feminismo negro para entender a dupla objetificação da mulher negra, além de discussões sobre a história da bruxaria, para entender os mecanismos que criaram o estereótipo de bruxa para mulheres empoderadas. Ao analisar a situação das mulheres negras, desde a escravidão negra nos Estados Unidos, Angela Davis e bell hooks dão o aporte teórico necessário para que se aprofunde a temática da mulher negra colocada em posição periférica em relação às mulheres brancas, o que se evidencia na história de Tituba, apagada até mesmo das histórias sobre bruxaria em Salem. (DAVIS, 2016). Ao figurar Tituba como a protagonista dos julgamentos das bruxas de Salem, Condé posiciona a mulher negra e bruxa como protagonista, o que lhe foi sempre negado pelo patriarcado e também pelos movimentos de supremacia branca.

O FEMINISMO NEGRO

Os primeiros movimentos feministas, segundo algumas críticas como Angela Davis (2016; 2018), bell hooks (2018; 2019), Djamila Ribeiro (2018) e Joice Berth (2019), surgiram de um viés elitista, pautados por uma premissa branca e burguesa. As mulheres que deram repercussão aos movimentos os utilizavam como meio de expor as suas insatisfações ao tratamento que o sistema patriarcal destinava às mulheres. Porém, historicamente, apesar da ação definir os movimentos feministas como representações da mulher de modo generalizado, eles não englobavam, de fato, todas as mulheres, logo, alcançariam apenas os interesses de certos grupos.

As feministas brancas e de classes média e alta ansiavam por um espaço maior dentro da sociedade capitalista patriarcal, por esse motivo pretendiam se desvincular dos papéis de donas de casa e servidoras dos maridos e filhos. Ao longo dos séculos, o encargo das mulheres na sociedade esteve muito associado à sua condição biológica, sendo decidido que deveriam ser as responsáveis por gerar e nutrir o futuro da espécie, logo, “a diferença anatômica entre os órgãos sexuais, pode assim ser vista como justificativa natural da diferença socialmente construída entre os gêneros e, principalmente, da divisão social do trabalho” (BOURDIEU, 2019, p. 20). Então, deveriam cuidar da casa, alimentar e educar os filhos, atender as expectativas dos maridos e do círculo social ao qual pertenciam. A mulher era o sujeito da procriação. Já que tais funções eram naturais do seu sexo (ou não eram?), como poderia a mãe e esposa ser audaciosa o bastante a ponto de desafiar as leis da natureza? (LERNER, 2019).

Simone de Beauvoir (2009) discorre que essa função de procriadora passou a ser exaltada para o sexo feminino no momento em que a propriedade passa a ser essencial, afinal, pensa-se no futuro e em como dar prosseguimento na posse dessa propriedade, daí as mulheres têm papel importante, pois dão sequência à linhagem da propriedade. Essas “senhoras do lar”, como entendeu Woolf (2019) eram detentoras de uma boa educação, porém estavam sujeitas a administração das tarefas de casa, ocupando pouco ou nenhum espaço político.

Cheias de insatisfação, potencialidades intelectuais para além dos serviços do lar, subestimadas e muito oprimidas pelo grupo dominante, as precursoras dos movimentos feministas queriam que a sua igualdade em participação social juntamente com o gênero dominante fosse enfim estabelecida, ansiavam por uma maior liberdade. A primeira luta era que pudessem trabalhar, causa considerada um tanto estranha para as muitas trabalhadoras da classe proletária que já sofriam com as injustiças do trabalho. E se pensarmos nas mulheres negras que não desfrutavam de nenhum direito humano nos campos de algodões e nas senzalas, essa reivindicação não fazia sentido algum. bell hooks destaca que enquanto

[...] elas reclamavam dos perigos do confinamento no lar, a maioria das mulheres da nação era da classe trabalhadora. E muitas dessas trabalhadoras, que se dedicavam a longas horas de trabalho, com baixos salários, e ainda faziam todo o trabalho doméstico, teriam enxergado o direito de ficar em casa como “liberdade” (2018, p. 56).

Logo, o que se percebe é que essas feministas não enxergavam a causa de todas as mulheres, principalmente quando analisamos que essas eram na sua maioria de classe média. Cogitar a mulher negra como integrante da sua causa era algo impensável, já que essa estava em plantations ou, após a abolição da escravidão negras nos Estados Unidos, trabalhando como empregada doméstica, babá ou faxineira em alguma casa de muitas dessas feministas brancas que desejavam a emancipação das mulheres, pelo menos de algumas. Considerando que os sujeitos negros eram colocados em uma categoria desumanizada, principalmente esses sendo mulheres, não era comum que causas geradas por brancos levassem em consideração as necessidades do povo negro. A autora continua sua crítica, ao expor que:

Não foi a discriminação de gênero nem a opressão sexista que impediram mulheres privilegiadas de todas as raças de trabalhar fora de casa. Foi o fato de os trabalhos disponíveis para elas terem sido os mesmos trabalhos de mão de obra não qualificada e pouco remunerada disponíveis para todas as mulheres trabalhadoras (HOOKS, 2018, p. 56).

É possível perceber que existe um teor racista por parte dessas feministas de classes burguesas, tendo em vista que existiam sim trabalhos disponíveis para elas, porém eram trabalhos braçais, recusados por elas. Apesar disso, parecia que para as mulheres mais pobres e negras periféricas, as quais estes eram os únicos trabalhos disponíveis, tais funções seriam adequadas, já que as burguesas não se manifestavam em relação à condição dessas mulheres e ainda se aproveitavam dessa mão de obra barata.

Em teoria, os feminismos nascem com a proposta de defender os direitos de todas as mulheres. Mesmo que por vezes eles tenham se perdido em seus objetivos, vale ressaltar que ainda eram movimentos embrionários. As mulheres do período que começavam a constituir sua teoria feminista, de fato, eram oprimidas e as vezes acabavam oprimindo direta ou indiretamente os outros grupos de mulheres menos favorecidas. Apesar de algumas inconsistências, é irreal acreditar que essas feministas brancas e de classe média não trouxeram contribuições importantes para as revoluções das mulheres. Foram umas das primeiras a revelar a discussão de opressão com base em gênero no campo social. Só a partir daí é que a reflexão sobre esse e outros tipos de opressões começou a se aprofundar.

Desse ponto de vista, essas mulheres feministas iniciaram suas campanhas para adquirirem seus direitos em meio a uma sociedade dominada por homens brancos, detentores do capital. A busca pelo poder de votar, movimentação realizada entendida como sufrágio, foi uma das revoluções mais marcantes na história desse movimento. As mulheres acreditavam que se conseguissem espaço na política vigente, conseguiriam então tornar os objetivos da sua emancipação uma realidade. Entretanto, essa ação, ao pensar em unir e defender os interesses das mulheres, acabou por excluí-las e dividi-las ao mesmo tempo, privilegiando uma parte que, de certo modo, já era privilegiada, comparada com as demais. De acordo com a crítica feminista Angela Davis, o sujeito pelo qual se almejava conseguir tais méritos era, primordialmente, a “Mulher”

[...] mas nem toda mulher parecia estar qualificada. As mulheres negras, claro, eram praticamente invisíveis no interior da longa campanha pelo sufrágio feminino. Quanto às mulheres brancas da classe trabalhadora, as líderes sufragistas provavelmente ficaram impressionadas, no início, com seus esforços de organização e sua militância. Mas, como se viu depois, as próprias trabalhadoras não abraçaram a causa do sufrágio feminino com entusiasmo (2016, p. 166).

Os primeiros movimentos feministas, como se nota, apesar de pequenas participações desses grupos menos favorecidos de mulheres, não conseguiam manter essas participantes ativas no movimento. As discussões acerca de suas teorias e do seu funcionamento na prática eram um privilégio para poucas pessoas. Por esse motivo, estes movimentos são descritos algumas vezes como brancos e elitistas, pertencentes e feitos para aquelas que detinham maior poder econômico. Diante disso, as mulheres de classes mais baixas não puderam desfrutar das discussões e teorizações de como o feminismo poderia ajudá-las a alcançar sua emancipação. Para corroborar, Davis (2018) salienta que em

[...] alguns sentidos, a luta pelos direitos das mulheres foi ideologicamente definida como uma luta pelos direitos das mulheres brancas de classe média, expulsando mulheres pobres e da classe trabalhadora, expulsando mulheres negras, latinas e de outras minorias étnicas do campo do discurso coberto pela categoria “mulher” (p. 103).

Para entender melhor sobre esses grupos desconsiderados pelos primeiros movimentos feministas, é importante nos atentarmos para um público mais periférico àquela elite do período, visto que desse ponto encontraremos abaixo da pirâmide social as mulheres negras. Pois, se a mulher proletária já estava distante dos ideais desses feminismos elitistas, a mulher negra estigmatizada e escravizada nem entrava em pauta. Logo, fez-se necessário um movimento que voltasse sua atenção para as grandes massas, que visasse a cultura através de um ponto de vista pautado no gênero, raça e classe para assim englobar aqueles aspectos que os movimentos feministas brancos e elitistas deixaram de fora (HOOKS, 2019).

Se delimitarmos a nossa visão às lutas feministas para o continente americano, especificamente para os Estados Unidos, tendo em vista que as autoras hooks (2018; 2019) e Davis (2016; 2018), que aqui foram mais utilizadas para embasamento teórico e são americanas, perceberemos melhor a quais condições as mulheres negras estavam sujeitas. Apesar dos primeiros movimentos feministas terem o seu surgimento em berço francês após o período da Revolução Francesa, os movimentos do feminismo negro ganham destaque nos EUA, devido às condições escravistas que marcam a história do país.

Ao observar o regime regente nos Estados Unidos, ainda colonial e escravocrata, nos emergem as condições deploráveis que as mulheres negras enfrentavam no continente americano, vítimas da opressão racista da escravidão. Elas, diferentemente das mulheres brancas, eram vistas não com base no seu gênero apenas, mas sim com relação à sua negritude, que, por muitos séculos, foi desumanizada pela supremacia ariana. Logo, essas mulheres não foram expostas à mesma opressão das mulheres brancas. Enquanto as arianas eram consideradas pelo sistema patriarcal como frágeis e dóceis, sendo-lhes impossível as mesmas atividades que os homens e também deter a mesma supremacia que eles, as negras eram vistas de outra forma, como se observa: “No que dizia respeito ao trabalho, a força e a produtividade sob a ameaça do açoite eram mais relevantes do que questões relativas ao sexo. Nesse sentido, a opressão das mulheres era idêntica à dos homens” (DAVIS, 2016, p. 32).

O estereótipo de fragilidade imputado às mulheres brancas era, na verdade, uma arma para controlar essas mulheres, fazê-las crer que eram frágeis, fracas, incapazes (BOURDIEU, 2019). Já as mulheres negras não entravam nessa categoria de “mulher” quando o assunto era trabalho, já que os ideais de fragilidade, impostos sobre as mulheres brancas, desapareciam nas mulheres negras, que eram colocadas para trabalhar nas grandes plantações de trabalho escravo, tais como os homens, mesmo grávidas ou com crianças em amamentação. Logo, as mulheres eram “classificadas” sob um olhar ideológico e capitalista, pois as brancas serviam para a castidade, matrimônio, reprodução dos dominantes patriarcais etc., por isso não podiam disputar espaço no mercado de trabalho, dominado pelos homens. Já as negras serviam para o trabalho braçal, em serviços que nem os homens brancos queriam fazer (HOOKS, 2019).

Não havia muita distinção para os senhores de plantations, entre um homem negro e uma mulher negra, a não ser pelo fato de que geralmente as mulheres eram oprimidas com base em um tipo muito pior de opressão, o estrupo. Elas trabalhavam pela mesma quantidade de horas, realizando as mesmas tarefas que os seus companheiros, mas eram para as mulheres negras que os homens brancos demonstravam o poder de supremacia acerca da vida delas com mais frequência. Eram elas submetidas a frequentes violações sobre seus corpos, não apenas pelos açoites utilizados como punição, mas “[...] também sofriam de forma diferente, porque eram vítimas de abuso sexual e outros maus-tratos bárbaros que só poderiam ser infligidos a elas” (DAVIS, 2016, p. 32).

Para a crítica feminista Angela Davis, em sua obra Mulheres, raça e classe, o estupro nada mais era do que um mecanismo pelo qual os senhores mostravam para aquelas mulheres o domínio que exerciam sobre elas. “O estupro era uma arma de dominação, uma arma de repressão, cujo objetivo oculto era aniquilar o desejo das escravas de resistir e, nesse processo, desmoralizar seus companheiros” (DAVIS, 2016, p. 46). Dessa forma, essa é uma das poucas diferenças de opressão com base no gênero que as mulheres negras sofriam na escravidão. O estupro da mulher negra também evidenciava o olhar ideológico diferenciado em relação à mulher branca, pois estas deviam ser virgens e puras, pois seriam mulheres que serviriam para o casamento. As negras, por serem escravizadas, eram vistas como objetos sexuais, que, quanto mais engravidassem, mais lucros dariam aos seus escravizadores.

Tituba, por exemplo, no romance de Condé é colocada como o fruto de um estupro, sua mãe, Abena, foi abusada por um marinheiro a caminho de Barbados e outra vez sofreu uma tentativa de estupro, agora pelo seu comprador. No trecho a seguir, é descrita a tentativa de estupro que o fazendeiro Darnell comete sobre ela e as futuras consequências deste ato. Quando o senhor Darnell observa Abena e Tituba andando pelas plantações ele chama a sua atenção:

— É você, Abena? Mas que bom, o marido que eu te dei te transformou numa maravilha! Venha cá!

Minha mãe recuou de forma tão brusca que o cesto contendo um facão e uma cabaça de água, que trazia em equilíbrio sobre a cabeça, caiu. A cabaça se quebrou em três pedaços, espalhando seu conteúdo na relva. O facão caiu na terra, congelado e mortal, e o cesto se pôs a rolar pela trilha, como se quisesse fugir do drama que se instalaria. Apavorada, eu me lancei em sua busca e acabei por pegá-lo.

Quando voltei para perto da minha mãe, ela se detinha, ofegante, as costas contra uma cabaceira. Darnell estava parado em pé, a menos de um metro de onde ela estava. A camisa dele estava no chão e a calça estava aberta, revelando a brancura de suas roupas íntimas. A mão esquerda procurava algo bem na altura de seu sexo. Minha mãe berrou, virando a cabeça na minha direção:

— O facão! Me dá o facão!

Eu obedeci tão rápido quanto pude, segurando a enorme lâmina com minhas mãos frágeis. Minha mãe bateu duas vezes. Lentamente, a camisa de linho branco se tornou escarlate (CONDÉ, 2019, p.30-31).

Abena, assim, comete o maior dos erros aos olhos de sua sociedade escravocrata e racista, pois se defende da agressão sexual que iria ser cometida pelo seu senhor. Uma mulher negra, sem qualquer direito sobre seu corpo diante do sistema escravocrata, ao levantar um facão sobre o seu senhor era passível de punição, de morte, mesmo não causando graves ferimentos contra ele. Dessa forma, Abena é enforcada e sua família se despedaça, ficando órfã. O trecho que mostra a resistência de Abena busca dar dramaticidade à cena, na queda e quebra da cabaça, no facão mortal, que já revela o destino deste abusador.

A mulher negra não era marginalizada apenas com base no seu sexo, mas também com base em sua negritude, duplamente oprimida. Por essa e muitas outras razões não foi possível as feministas brancas representarem essas mulheres, pois desconsideram completamente a sua condição. Neste sentido, estes movimentos feministas brancos acabavam por perpetuar a inferiorização feminina também.

Logo, as mulheres negras precisavam ter sua própria voz, que as representassem por inteiras, daí pensou-se na necessidade de um feminismo negro, pois só assim seria possível essas mulheres dialogarem a respeito dos seus interesses com maior convicção. Pois era notório que o fato de ser apenas mulher não era a única questão relevante para ser discutida, afinal ainda havia a situação econômica e a negritude. hooks (2018) enfatiza que

[...] quando mulheres negras e mulheres de outras etnias levantaram a questão sobre o preconceito racial como fator que moldava o pensamento feminista, havia um início de resistência contra a noção de que muito do que as mulheres de classe privilegiada tinham identificado como verdadeiro para a experiência da mulher poderia ser falho, mas ao longo do tempo a teoria feminista mudou (p. 39).

Ao buscar uma vertente do feminismo que defendesse as particularidades da sua opressão divergente das mulheres privilegiadas, a mulher negra reconhece a ação excludente daquele feminismo branco. No princípio do movimento

[...] mulheres de classes privilegiadas conseguiram tornar suas preocupações “as” questões que deveriam ser o foco, em parte porque elas eram o grupo de mulheres que recebia atenção pública. Elas atraíam a mídia de massa. As questões mais relevantes para as trabalhadoras ou para o grande grupo de mulheres nunca eram destacadas pela mídia de massa convencional (HOOKS, 2018, p. 55).

A partir daí, a imagem da mulher branca e burguesa ficou sendo aquela que representava o movimento, monopolizando-o. Porém, a autora ressalta que apesar desse início elitista do movimento feminista, no decorrer do tempo, o mesmo foi se alterando, justamente por essas incoerências excludentes que ele apresentava. Desta forma, há o surgimento de eixos feministas para englobar o máximo de representatividade, descentralizando o seu domínio.

Compreendida a necessidade de um feminismo mais representativo, as estudiosas críticas negras tiveram que teorizar e embasar esse novo eixo do feminismo, deixar claro os seus anseios. “O feminismo negro não é uma luta meramente identitária, até porque branquitude e masculinidade também são identidades. Pensar feminismos negros é pensar projetos democráticos” (RIBEIRO, 2018, p. 6). Pensando nisso, o feminismo negro, além de evocar a identidade negra, também discute as estruturas sociais, trazendo à tona uma crítica contra a permanência da subordinação das classes e pessoas que não se encontram em pé de igualdade com a elite branca.

Partindo dos pressupostos desse novo viés defendido por elas, as feministas negras descentralizaram a discussão do feminismo apenas em relação a gênero, pois a opressão que essas presenciaram e observavam nos grupos menos favorecidos estava muito além do gênero em si. Era preciso analisar questões raciais, sexuais e econômicas também. “O feminismo negro [...] visa trazer estratégias de superação das opressões estruturais, como ampliar o conceito de humanidade.” (BERTH, 2019, p.59). Com base nos séculos de escravidão, as mulheres negras criaram um olhar mais humano sobre os diferentes tipos de opressão.

Para Berth (2019), “[..] os estudos e experiências do feminismo negro, bem como as lutas empreendidas nesse campo de resistência, têm ressignificado os caminhos que se acreditou, até então, serem oportunos para o empoderamento de grupos minoritários.” (p.64) Esse movimento baseia-se na descentralização do oprimido, permitindo que englobe um grupo maior de oprimidos, atingindo um maior número de pessoas. Apesar desse eixo do feminismo ser o feminismo negro, não significa que discuta apenas sobre a condição da mulher, mas sim que essas são as que trazem à tona todo tipo de opressões sofridas pelas minorias sociais, políticas etc. A fim de comprovar, Bairros (2020) exprime que o

[...] pensamento feminista negro seria então um conjunto de experiências e ideias compartilhadas por mulheres afro-americanas que oferecem um ângulo particular de visão do eu, da comunidade e da sociedade. Ele envolve interpretações teóricas da realidade de mulheres negras por aquelas que a vivem (p. 247).

Portanto, só o feminismo negro poderia trazer à tona as questões referentes a opressão da mulher negra, bem como dos grupos menos favorecidos, simpatizantes do movimento. Desta forma, o feminismo negro busca revisitar histórias de mulheres negras, rememorando um passado histórico construído pelo olhar branco, redesenhando trajetórias femininas negras apagadas propositadamente, como é o caso de Tituba, mulher negra, escravizada e vista como bruxa.

A MULHER E O SEU ESTEREÓTIPO DE BRUXA

Se nos atentarmos para o processo histórico da luta das mulheres em busca da sua emancipação, aquisição de direitos que permitissem uma maior autonomia para estudar, trabalhar, herdar patrimônios, administrar seus bens, votar, dentre outras coisas que um homem não seria impedido de fazer com base no seu sexo, conseguiremos perceber que suas lutas eram bem fundamentadas, já que por vários séculos a mulher era considerada ora um ser infantil, incapaz de exercer qualquer tipo de autonomia, ora uma bestialidade, inumana. Para exemplificar essa trajetória, vale destacar o período correspondente aos séculos XV a XVII, nos quais um muitas de mulheres perderam suas vidas, uma grande quantidade de mulheres foram enforcadas, guilhotinadas, queimadas em fogueiras no centro da cidade, dentre outras formas inimagináveis de suplícios aterrorizantes. Esse momento é nomeado pela história como a era da caça às bruxas, uma época sombria para qualquer pessoa que ousasse marchar em alguma direção contrária à qual o regime vigente determinava, principalmente as mulheres.

O romance de Maryse Condé, que narra um contexto do final do século XVII, demonstra um dos últimos momentos dessa perseguição de mulheres acusadas de bruxaria e é por meio desse cenário que conseguiremos analisar melhor como todo o processo se dava. É possível identificar que o conhecimento de Tituba, a protagonista, acerca das bruxas, a princípio é limitado, ela não compreende muito bem o porquê de os cristãos temerem tanto essa figura.

Na cultura dela, o demônio cristão e a sua associação com mulheres em busca de poder não fazia nenhum sentido, pois Man Yaya, mulher do povo nagô que a acolhe, possuía habilidades de se comunicar com os invisíveis (espíritos ancestrais) e criar poções de cura, não feria a ninguém. Suas habilidades revelavam que as “pessoas tinham medo dela, mas vinham de longe para vê-la por causa do seu poder” (CONDÉ, 2019, p. 32). Logo, para Tituba, esses conhecimentos ancestrais eram formas de ajudar os necessitados, então não podiam ter ligação com esse mal do qual tanto falavam. Mesmo assim, aos poucos, ainda em Barbados, ela começa a perceber que em alguns momentos as pessoas a chamam de bruxa, bem como Man Yaya. É possível notar a sua confusão em relação à terminologia de bruxa quando a personagem é nomeada assim por John Indien (rapaz escravizado que mais adiante viria a ser seu esposo), então ela se questiona e reflete sobre o termo:

O que é uma bruxa?

Percebi que em sua boca a palavra estava manchada de degradação. Como é isso? Como? A faculdade de se comunicar com os invisíveis, de manter um laço constante com os finados, de cuidar, de curar, não era uma graça superior da natureza a inspirar respeito, admiração e gratidão? Por consequência, a bruxa, se desejam assim nomear aquela que possui essa graça, não deveria ser adulada e reverenciada em vez de temida? (CONDÉ, 2019, p. 42).

Contudo, aos poucos ela vai aprendendo sobre essa perseguição contra mulheres com conhecimento e liberdade acima do permitido, principalmente quando é levada para Boston, agora como escravizada da família Parris. Assim, em meio a um passeio com as duas meninas, filha e sobrinha de Parris, ela testemunha o enforcamento de uma suposta bruxa em praça pública e passa a notar a seriedade daquele termo:

Numa tarde, voltando de Long Wharf, fomos testemunhas de um espetáculo, cuja terrível impressão nunca mais se dissipou de mim. Estávamos em Front Street quando vimos muitos negros, na praça situada entre a prisão, o Tribunal e a igreja. Haveria uma execução. A multidão se apertava então aos pés do palanque elevado, sobre o qual estava a forca. Ao redor dela se agitavam homens sinistros com chapéus de abas largas. Quando nos aproximamos, percebemos que uma mulher, uma velha, estava em pé, com a corda ao redor do seu pescoço. Bruscamente, um dos homens empurrou o pedaço de madeira sobre o qual os pés dela descansavam. Seu corpo se arqueou. Ouvimos um grito horrível e sua cabeça caiu para o lado (CONDÉ, 2019, p. 82).

Talvez, nesse momento, Tituba conseguiu entender que estava em um cenário de desgraça, ainda maior para qualquer mulher que ousasse se desviar dos caminhos traçados para o seu sexo, principalmente em consideração as suas irmãs escravizadas, levando em consideração que essas não tinham direito civil algum e que por isso ninguém ousaria defendê-las diante de qualquer acusação. Em meio a uma cultura puritana, ela nota que o “diabo” era mencionado frequentemente e também como essa cultura de ódio estava enraizada até mesmo nos mais pequeninos, isso se comprova quando Abigail, filha de Parris, adverte Tituba pela sua reação de horror diante daquele assassinato:

— É, fica quieta! Ela só teve o que mereceu porque era uma bruxa. Ela tinha enfeitiçado os filhos de uma família honrada.

Consegui me levantar e encontrar o caminho da casa. A cidade inteira só falava da execução. Aqueles que tinham visto contavam àqueles que não tinham visto que a senhora Glover berrou ao ver a morte, que um cachorro uivou para a lua, que sua alma escapou sob a forma de um morcego, mas como um purê repugnante que escorria por suas pernas finas, prova da vilania do seu ser. Eu não tinha visto nada daquilo. Eu havia assistido a um espetáculo de completa barbárie (CONDÉ, 2019. p. 83).

A bruxaria, como é possível perceber acima, era uma verdade absoluta para aquela sociedade, pois a repercussão dos boatos acerca da prática era validada por todos. Tituba, não contaminada por tais pensamentos de demonização de outras mulheres, é lúcida e tenta ser autêntica, mas logo percebe que a hipocrisia imperava. O medo, também, tornava as pessoas à sua volta tão crentes dessa figuração demoníaca feita sobre essas mulheres e assim não ousavam questionar, principalmente porque aqueles que julgavam e distribuíam a literatura acerca do que era a bruxaria e como ela corrompia suas sociedades eram pessoas muito influentes. A bruxaria não era apenas um boato feito por vizinhos maldosos, era algo levado muito a sério e por esse motivo é importante entender como se deu esse processo de perseguição, em sua maioria, contra mulheres.

Segundo Federici (2017), geralmente o que se acredita é que o período em que ocorreu a caça às bruxas foi a era das trevas, porém, para a surpresa de muitos, uma atrocidade como essa não é marca de um período no qual o ser humano era regido por medo e “ignorância”, longe disso, o tempo em que esses eventos ocorrem estava definido por grandes revoluções filosóficas, entendida como a transição da idade média para o Renascimento. E é nesse contexto, do surgimento de renomados intelectuais revisitados até mesmo nos tempos atuais, que a demonização do ser humano, especificamente esse sendo uma mulher, como servo do diabo, é constituída. Para Russel & Alexander (2019):

Quando se iniciou a caça às bruxas, no fim da Idade Média, as suas crenças mais importantes eram: as cavalgadas noturnas; o pacto com o Diabo; o repúdio formal ao cristianismo; as reuniões secretas e noturnas; a profanação da eucaristia e do crucifixo; a orgia; o infanticídio sacrifical; e o canibalismo (p. 73).

Vale ressaltar que esses eram pensamentos que predominavam, e desde o cidadão mais pobre até mesmo os donos das maiores fortunas desse período temiam a profanação da sua fé. O medo era o principal regente da perseguição de tudo aquilo que não conseguiam explicar de maneira racional, daí quando um cidadão era acusado de praticar rituais ligados ao diabo, ninguém ousava duvidar. Os fatos, sendo verídicos ou não, eram perpassados através de ilustres da literatura, governantes e religiosos, sendo essas pessoas respeitáveis, das quais a grande maioria não arriscava duvidar. Caça às bruxas era considerado um ato divino para a salvação do mundo.

Federici (2017) explica que no princípio da história sobre bruxaria, ainda na Idade média, no continente europeu, era comum a prática de feitiçaria, aliada à crença aos deuses medievais, e rituais para uma colheita farta, por exemplo, eram constantemente utilizados como cerimônias públicas, com a participação de toda a sociedade. A magia nesse período era aceita como algo positivo, desde que beneficiasse a comunidade inteira. A partir do momento em que as pessoas começaram a praticar a magia individualmente, reservando seus segredos dentro de grupos pequenos, a feitiçaria passou a ser vista como algo perigoso e começou a haver uma distinção entre feitiçaria e bruxaria, sendo que a primeira era boa ou má, porém mais ligada aos elementos da natureza e a relação do feiticeiro com esses, ao passo que a segunda começou a ser vista como algo perigoso e que poderia prejudicar a organização da sociedade como um todo, passando a ser proibida por lei (RUSSEL & ALEXANDER, 2019).

Entretanto, o que de fato fez com que a feitiçaria fosse vista como algo perverso é exatamente o fortalecimento do cristianismo, que entendia a magia como alguma coisa relacionada ao diabo, figura que personificava todo tipo de mal, imagem contrária à do bem, representada pela figura do deus cristão. Para os “hereges” da Europa oriental, nome dado pelos cristãos a qualquer outra pessoa que seguisse uma doutrina que não fosse aquela que exaltasse o seu “único deus”, não havia personificações separadas de um bem e um mal, pois seus deuses podiam representar tanto o bem quanto o mal, daí é que surgem muitas figuras que tornam-se imagens de todo tipo de demônios (RUSSEL & ALEXANDER, 2019).

Muitas religiões presentes no continente africano, por exemplo, tinham uma relação muito forte com a magia, principalmente sua ligação com os espíritos ancestrais, com os quais as pessoas acreditavam se comunicar e pedir orientação e proteção, esses por sua vez os agraciavam com todo tipo de poder. Quando os cristãos observaram esses costumes, os compararam com seres que serviam a demônios, pois na religião cristã não havia poder entre os mortais, pois apenas o seu deus, santos e arcanjos podiam realizar coisas extraordinárias (RUSSEL & ALEXANDER, 2019). Vale destacar aqui Man Yaya, personagem que cuidou de Tituba quando esta ficou órfã, também foi a responsável por passar para essa todo o seu conhecimento. Tituba apresenta a mulher aos leitores dizendo:

Uma velha me acolheu. Parecia corajosa, pois havia visto morrer torturados seu companheiro e seus dois filhos, acusados de fomentar uma revolta. Na verdade, ela só tinha os pés sobre a nossa terra e vivia constantemente na companhia deles, cultivara o extremo dom de se comunicar com os invisíveis. Não era uma axanti como minha mãe e Yao, mas uma nagô, da costa, cujo nome, Yetunde, sofrera uma transformação para o crioulo, Man Yaya. As pessoas tinham medo dela. Mas vinham de longe para vê-la por causa do seu poder.

Ela começou me dando um banho, no qual boiavam raízes fétidas, e deixando a água escorrer pelos meus membros. Em seguida, ela me fez beber uma poção que ela mesma tinha criado e amarrou ao redor do meu pescoço um colar feito de pequenas pedras vermelhas (CONDÉ, 2019, p. 31).

Esse conhecimento de Man Yaya é herança de sua cultura africana, do seu povo, é sua crença, logo, tem extremo valor para ela e ao passar todo esse conhecimento para Tituba é possível perceber que é uma maneira de deixá-lo vivo, como forma de resistência, visando o não esquecimento dos seus costumes tradicionais. Tituba aprende o máximo que consegue enquanto sua mestra vive. É esse conhecimento que por muito tempo lhe dá independência, mas, paradoxalmente, também um dos fatores que a levam à ruína dentro de uma sociedade que o abomina, o que acontece mais adiante no texto.

Muitas foram as formas de validar essa perseguição pelas bruxas, documentos oficiais, como o Malleus Maleficarum, dos inquisidores Heinrich Kramer e James Sprenger, foram fortes registros que condenaram a prática da magia, bem como descreveram as características dos praticantes de bruxaria e como esses deveriam ser punidos. Eles “[...] ajudaram a construir uma imagem fantástica sobre pessoas, na maior parte das vezes mulheres, capazes de se transformarem em animais, voarem [...]” (ZORDAN, 2005, p. 339), o que hoje percebemos como absurdos. Contudo, na época em que esses massacres ocorriam, muitos eram aqueles que validavam essas informações, principalmente na literatura. Exemplificando isso, vale destacar um diálogo entre Hester e Tituba, ambas presas, uma por adultério e a outra por bruxaria:

— ... nesta sociedade, eles dão à função de “bruxa” uma conotação errônea. A “bruxa”, se vamos mesmo usar essa palavra, corrige as coisas, endireita, consola, cura...

Ela me interrompeu com uma gargalhada:

— Então, você não leu Cotton Mather? — ela encheu o peito, tomando um ar solene — “As bruxas fazem coisas estranhas e maléficas. Elas não podem fazer milagres verdadeiros, esses podem apenas ser feitos pelos Eleitos e pelos Embaixadores do Senhor.” (CONDÉ, 2019, p. 145).

Tituba, ainda muito indignada com as inacreditáveis acusações sobre ela, estava em negação acerca da sua situação. Entretanto, Hester, nascida em berço puritano, explica muitas coisas sobre o que os cristãos entendiam acerca da bruxaria e a sua associação com o “diabo”, assim lhe atualiza sobre essas informações para as utilizar no seu depoimento, com o intuito de amedrontá-los e debochar de seus acusadores. Hester é uma personagem apresentada em contexto de intertextualidade, pois remete à protagonista Hester Prynne, de A Letra escarlate, romance de Nathaniel Hawthorne publicado em 1850, nos Estados Unidos. Nesta obra, Hester é uma mulher vista como subversiva, pois não revela quem era o pai de seu bebê, fruto de adultério, e por isso, fica presa. No diálogo entre os romances, Condé posiciona as duas personagens num encontro fictício, numa troca de saberes, pois ambas, marginalizadas e punidas injustamente, parecem desenvolver certa sororidade na prisão e se ajudam. Hester, conhecedora do que sua sociedade puritana pensava sobre as supostas bruxas, a aconselha:

— Bota medo neles, Tituba! Medo pelo dinheiro deles! Descreva-o na forma de um bode com um nariz de bico de águia, um corpo todo coberto de longos pelos pretos e, preso à cintura, um cinto de cabeças de escorpião. Eles vão tremer, e que tremam, que desmaiem! Que dancem ao som de sua flauta, ouvida de longe! Descreva as reuniões das bruxas, cada uma chegando com a sua vassoura, as mandíbulas escorrendo de desejo ao pensar no banquete de fetos e recém-nascidos que seria servido com muitas canecas de sangue fresco... (CONDÉ, 2019, p. 149).

Tituba acha tudo aquilo ridículo, nada fazia sentido para ela, mas era naquilo que os cristãos acreditavam, então era importante saber tudo sobre o que tanto lhe acusavam. O que parecia ser uma novidade para Tituba, para os puritanos era resultado de uma longa cultura de perseguição contra as representações do demônio no mundo (FEDERICI, 2017). Afinal, a discussão sobre bruxaria é bastante antiga, os babilônios foram uns dos principais influenciadores da literatura sobre bruxarias, com suas demonologias demonstraram que esses seres praticantes da bruxaria tinham esse poder porque vendiam suas almas para demônios em troca de poderem realizar suas maldades. Os cristãos exaltaram esse tipo de literatura, aliados ao seu livro sagrado e seus demais conhecimentos, condenavam as bruxas a torturas para que confessassem sua prática de bruxaria e assim pudessem ser condenadas à morte (ZORDAN, 2015). É importante destacar que as ditas bruxas não foram perseguidas apenas por religiosos, mas também

[...] foram os juristas, os magistrados e os demonólogos, frequentemente encarnados na mesma pessoa, os que mais contribuíram na perseguição: eles sistematizaram os argumentos, responderam aos críticos e aperfeiçoaram a maquinaria legal que, por volta do final do século XVI, deu um formato padronizado, quase burocrático, aos julgamentos, o que explica as semelhanças entre as confissões para além das fronteiras nacionais (FEDERICI, 2017, p. 299).

Esses homens que eram responsáveis por aplicar a lei, caçando, julgando e condenando as bruxas, eram conhecidos como inquisidores. A partir dessa observação, é preciso entender que a caça às bruxas foi uma perseguição muito bem planejada e não eram casos isolados, pois houve grandes casos espalhados pela Europa, África do Sul, América, entre outras regiões, que não podem ser ignorados.

Russel & Alexander (2019) revelam que as mulheres foram depreciadas por quase que todas as sociedades “e a misoginia da civilização ocidental foi alimentada por, pelo menos, três fontes: a tradição literária clássica, a religião hebraica e o dualismo” (p. 147). Na literatura, a mulher esteve sempre ligada a um estereótipo submisso, em segundo plano, e quando essa chegava a um primeiro plano era só para gerar grandes conflitos que logo seriam solucionados por algum homem. Na religião hebraica, reforçada pelos conflitos entre corpo e espírito, ligados ao mal e bem, respectivamente, fazendo alusão aos pecados da carne, a mulher ficou inferiorizada por ser responsabilizada como condutora de tais atos: “Teoricamente, esse dualismo condena tanto a carnalidade masculina quanto a feminina, mas em uma sociedade dominada por homens, a luxúria viril era projetada nas mulheres” (p. 147), logo essas seriam responsabilizadas por trazerem o pecado. Afinal, com o

[...] domínio masculino na religião, na literatura e no direito criou um simbolismo e uma mitologia especiais acerca das mulheres, que se caracterizaram por uma ambivalência tripartite. A mulher é a virgem pura; a mulher é a mãe carinhosa; a mulher é a megera maléfica e carnal (RUSSEL & ALEXANDER, 2019, p. 149).

Diante de tal fato, vale ressaltar essa diferenciação no tratamento entre dois indivíduos que eram acusados de adultério, por exemplo, quando isso era considerado punível de prisão e em tempos anteriores em que as mulheres eram apedrejadas, já que sempre os homens escapavam desses julgamentos. Pensando nisso, na obra de Maryse Condé, conseguimos observar o quanto as mulheres estiveram sujeitas a penalidades muito mais severas e que por mais que fossem iguais a dos homens, apenas elas eram punidas.Tal fato ocorre com a personagem Hester, que encontra a protagonista Tituba na prisão e logo tornam-se aliadas, ligadas pela dor causada pelo sistema patriarcal, sustentado pela religião vigente, afinal Hester estava presa por adultério, enquanto o homem que cometeu tal ato com ela estava livre. Através do diálogo entre as duas conseguimos ver isso, quando Tituba a questiona:

- [...] Do que te acusam?

Ela diz ligeiro:

- De adultério!

Olhei para ela com terror, pois sabia da gravidade dessa ofensa aos olhos dos puritanos. Ela seguiu:

- E enquanto apodreço aqui, aquele que me fez esse filho está livre para ir e vir. (CONDÉ, 2019, p. 145).

Mesmo Hester sendo uma mulher branca, não estava livre de sofrer acusações contra atos que eram considerados pecaminosos por esse sistema construído com base religiosa. E são essas as concepções que reforçam os padrões de bruxaria, com base em teores religiosos, a mulher por vezes é exaltada a um nível angelical, mas também é rebaixada a um nível de bestialidade. A justificativa para tais julgamentos é entendida como uma maneira de retirar certas liberdades que as mulheres adquiriram com o passar do tempo, como entendeu Federici (2017). E a literatura acabou se apropriando destes estereótipos de anjos ou demônios para caracterizar suas personagens femininas, demonstrando sua passividade nos traços angelicais, enquanto a sua revolta é descrita como algo diabólico, na tentativa de mantê-las presas aos padrões exigidos.

Depois que a reforma protestante ocorreu, muitos conventos foram fechados e as mulheres que ali viviam foram colocadas na sociedade para tentar sobreviver. As que tinham família puderam retornar para suas antigas casas e ficaram sob a proteção de seus familiares, muitas se casaram, enquanto que outras passaram a viver à margem da sociedade, pois nesse período mulheres solteiras e que moravam sozinhas ou acompanhadas de outras mulheres eram marginalizadas e por esse motivo se tornaram alvos fáceis de acusações por bruxarias (FEDERICI, 2017).

Federici (2017) traz ainda outra justificativa, pois apesar de a reforma protestante ser de fato um grande contribuidor para essa marginalização da mulher, não foi o único. Segundo a autora, o processo de sistematização do sistema capitalista na sociedade foi um dos mais importantes condutores de todo o caos que gerou a perseguição das mulheres e aponta fenômenos que foram gerados com o decaimento em miséria dos camponeses a partir do processo de cercamento de terras ao fim do período do feudalismo. No tempo anterior aos cercamentos, as mulheres tinham um número considerável de direitos, até mesmo o de herdar pequenas terras conquistadas dentro da sua linhagem de família. Logo, muitas mulheres tornaram-se administradoras de pequenas fazendas, animais e demais produtos que poderiam gerar.

Entretanto, quando as terras que eram tidas como comuns, onde poderiam colocar animais para pastar e fazer plantações, foram privatizadas, aqueles que não tinham grandes terras em sua posse foram entrando em decadência, pois começaram a ter que pagar impostos por tudo que quisessem fazer nessas terras. Eram muitas as habilidades que essas mulheres possuíam, herdadas por seus antepassados, principalmente das suas mães e avós. Desde então elas começaram a realizar outras atividades pela sociedade, eram chamadas pelos seus conhecimentos com ervas, as parteiras, por exemplo, eram as únicas que tinham o conhecimento na realização do parto, desde o nascimento ou maneiras de realizar abortos e prevenções para a mulher que não queria engravidar. A autora continua:

Se considerarmos o contexto histórico no qual se produziu a caça às bruxas, o gênero e a classe das acusadas, bem como os efeitos da perseguição, podemos concluir que a caça às bruxas [...] foi um ataque à resistência que as mulheres apresentaram contra a difusão das relações capitalistas e contra o poder que obtiveram em virtude de sua sexualidade, de seu controle sobre a reprodução e de sua capacidade de cura (FEDERICI, 2017, p. 305).

As mulheres, principalmente as mais velhas, que por muito tempo foram o rosto que representava a mulher bruxa, idosa, solitária, pedinte e com feições ranzinzas, eram na verdade aquelas que lembravam das injustiças que o sistema capitalista causou sobre si. Eram também aquelas que estiveram à frente nas organizações das lutas contra o avanço desse sistema que prejudicava as classes mais carentes, portanto eram elas um impasse para os sistemas que tinham o poderio nessa fase. Por isso, é importante destacar:

A caça às bruxas aprofundou a divisão entre mulheres e homens, inculcou nos homens o medo do poder das mulheres e destruiu um universo de práticas, crenças e sujeitos sociais cuja existência era incompatível com a disciplina do trabalho capitalista, redefinindo assim os principais elementos da reprodução social (FEDERICI, 2017, p. 294).

Os conhecimentos tradicionais que eram exclusivos das mulheres, principalmente os referentes às questões sexuais, tais como o controle de natalidade, geraram conflitos entre os homens, logo esses pensaram em um jeito de retirar o poder feminino, taxando-as de bruxas. Os homens temiam perder seu poder, pois a decadência do patriarcado significava que eles deveriam ser igualados às mulheres, coisa que não admitiam, então para evitar organizações de lutas, reuniões dos grupos que desafiavam, criaram o conceito do Sabá (FEDERICI, 2017). Zordan (2005) destaca que:

[...] os sabás eram tidos como odes a Satã, festas macabras nas quais se comia carne de recém-nascidos, entrava-se em transe e após danças frenéticas as bruxas copulavam com o diabo. Foram descritos como missas negras, nas quais os adeptos renegavam a fé cristã por meio do que a Inquisição supunha ser um arremedo das práticas católicas (p. 334).

Tais acusações eram sempre feitas em ocasiões importantes, por exemplo, se ocorriam muitas mortes de recém-nascidos o fato era logo associado aos sacrifícios de crianças para os demônios, e a culpa recaía para a parteira, a bruxa responsável pela morte dos bebês. Na obra de Condé, a personagem Tituba percebe essa forte influência da religião diante dessas acusações de bruxaria e descreve:

Eu não tinha entendido completamente a medida da devastação que a religião de Samuel Parris poderia causar, nem mesmo compreendido sua verdadeira natureza, antes de viver em Salem. Imagine uma comunidade de homens e mulheres esmagada pela presença do Maligno entre eles, procurando caçá-lo em todas as suas manifestações. Uma vaca que morreu, uma criança que teve convulsões, uma jovem que demorou a conhecer seu fluxo menstrual e estava sujeita a infinitas especulações. Quem, tendo se unido por um pacto com o terrível inimigo, havia provocado essas catástrofes? Era culpa de Bridget Bishop, que não aparecia na igreja por dois domingos seguidos? Não... era porque tínhamos visto Gilles Corey alimentando um animal abandonado na tarde do dia da missa? (CONDÉ, 2019, p. 103).

Nada acontecia por acaso para aquelas pessoas, qualquer atitude fora daquilo que era adequado, ou que não pudesse ser explicada era tachada como maligno. Para Tituba existiam outras explicações, pois suas crenças eram outras e Man Yaya não a ensinou a temer os acontecimentos estranhos, mas sim a tentar compreendê-los. Mas muitas vezes, essas sociedades que tanto condenavam esses conhecimentos dessas mulheres, bruxas ou não, sempre buscavam auxílio daquilo que tanto renegavam, as parteiras por exemplo:

[...] eram contratadas para vigiar as mulheres (para verificar, por exemplo, se não ocultavam uma gravidez ou se tinham filhos fora do casamento) ou eram marginalizadas. Tanto na França quanto na Inglaterra, a partir do final do século XVI, poucas mulheres foram autorizadas a praticar a obstetrícia, uma atividade que, até então, havia sido seu mistério inviolável (FEDERICI, 2017, p. 329).

E assim os poderosos homens foram retirando a autonomia daquelas mulheres, tornando-as reféns de um sistema opressor. As prostitutas, por exemplo, eram descritas como seres de puro desejo sexual e que copulavam com o diabo e assim o serviam, também estavam responsáveis por corromper os pobres homens de fé da sociedade. “Rompendo leis que certamente ignoravam, as bruxas encarnam tudo o que é rebelde, indomável e [...] demanda severas punições para que o feminino ‘selvagem’ se dobre ao masculino ‘civilizado’” (ZORDAN, 2005, p. 332). Ser bruxa, na verdade, era sinônimo de ser livre de quaisquer conceitos pré-concebidos do que uma mulher deveria ser.

Um dos acontecimentos que a literatura geralmente cita, relacionado a caça às bruxas, foi o ocorrido em Salem, colônia na América do norte, no ano de 1692, onde diversas mulheres foram mortas por serem acusadas, no princípio, por duas garotinhas, de aterrorizar os cidadãos com bruxarias satânicas. Essa colônia era habitada por puritanos migrados da Inglaterra, de onde trouxeram esses ideais contra supostas bruxarias. Apesar de relatarem estar sofrendo com as tentações do diabo por meio das bruxas que ali habitavam, historiadores destacam que na verdade o que acontecia era uma sequência de conflitos entre a colônia de Salem e a capital de Salem, ambas querendo ter o poder sobre a outra. A oportunidade do caso das bruxas serviu para plantar a discórdia e assim se livrar de possíveis inimigos, pois as acusações eram feitas em ambas as partes (RUSSEL & ALEXANDER, 2019). Na obra de Condé, conseguimos perceber isso já no momento em que obrigam Tituba a confessar seu ato de bruxaria e logo em seguida que acuse suas comparsas, no diálogo:

— O que o senhor quer de mim?

Um deles senta na beira da minha cama e, ao se inclinar sobre mim para me tocar, articula:

— Quando você estiver diante do Tribunal, confesse que aquilo é obra sua. Eu urrei:

— Jamais! Jamais!

O golpe cruzou minha boca, e dela espirrou sangue.

— Confesse que aquilo é obra sua, mas que não agiu sozinha e denuncie suas cúmplices. Good e Osborne, depois as outras.

— Eu não tenho cúmplices porque eu não fiz nada!

Um dos homens subiu em mim como se eu fosse mesmo um cavalo e começou a bater na minha cara com seus punhos, duros como pedras. Um outro ergueu a minha saia e enfiou um pedaço de pau com a ponta bem talhada na parte mais sensível do meu corpo enquanto ria:

— Toma, toma, é o pau de John Indien!

Quando eu já tinha sofrido bastante, eles pararam e um dos três retomou a palavra:

— Você não é a única criatura do Anticristo em Salem. Há outras que você vai nomear diante dos juízes (CONDÉ, 2019, p. 138).

É possível perceber que existe um interesse maior por trás dessas acusações e eles precisam que Tituba acuse novas bruxas, mulheres que realmente queriam que fossem criminalizadas. A lei não estava a favor dela, logo aqueles homens poderiam fazer qualquer coisa contra ela e mesmo assim sairiam livres. Percebemos ainda que como uma escravizada, ela é explorada por aqueles homens de forma desumana, bem compatível com o tipo de tratamento dado a uma pessoa negra nesse período. Tituba mais adiante percebe o complô por trás de tudo aquilo, quando já acusada recebe a visita da senhora Parris em sua cela improvisada em uma cabana próxima da casa dos seus senhores, a senhora esclarece que existe um interesse capitalista por parte dos acusadores e assim tenta se desculpar com ela: “- Eu fui usada, eu fui usada! Agora eu vejo quem está por trás disso. Sim: é um complô de Parris e seus companheiros para sujar e arruinar...” (CONDÉ, 2019, p. 159). Mais adiante, na obra, Tituba nos narra sobre o que se deu no futuro acerca desse massacre contra essas mulheres “bruxas”, quando encontra uma conhecida escravizada, Mary black, da aldeia de Salem: “- Ah, sim! Toda a maquinação sinistra foi descoberta agora! As meninas foram manipuladas pelos pais. História de terra, muito dinheiro, velhas rivalidades [...]” (CONDÉ, 2019, p. 186).

Morais (2015) destaca que nessa sociedade havia uma distinção de quem era cidadão de fato, pois eram eles “[...] homens adultos e membros da Igreja e, em vista disso, podiam participar da Corte Geral. A vontade de Deus, para esses colonos constituía lei [...]” (p. 148). Logo, é possível perceber que as mulheres não eram consideradas cidadãs para esses colonos, quanto mais as negras, e por esse motivo é fato que foram elas as mais prejudicadas pelas perseguições. Essa visão tida sobre o feminino se reforça logo quando Parris chega na aldeia para assumir a congregação e demonstra por meio da sua fala ficar horrorizado ao se deparar com uma mulher à frente das questões relacionadas à congregação:

- Eu sou a irmã Mary Sibley. Acendi o fogo para vocês. Também deixei na cozinha um pedaço de carne, cenouras, nabos e uma dúzia de ovos.

Samuel Parris agradeceu e continuou:

- Você, uma mulher, é quem representa a congregação? (CONDÉ, 2019, p. 92).

Para uma mulher, estar em uma posição de poder, além de ser muito inapropriado, era quase que impossível, e durante a caça às bruxas, ter um pouco disso era um fator que contribuiria para que um alvo fosse posto sobre elas. Apesar desse ocorrido ter se dado somente em 1692, o próprio processo de colonização das Américas, bem como de outras regiões invadidas, torna a perseguição por bruxaria como um mecanismo de imposição cultural sobre os povos nativos. Afinal, a “[...] caça às bruxas e as acusações de adoração ao demônio foram levadas à América para romper a resistência das populações locais, justificando assim a colonização e o tráfico de escravos ante os olhos do mundo” (FEDERICI, 2017, p. 357). Essa também foi uma das justificativas utilizadas para a demonização dos povos africanos e consequentemente a sua escravização, pois o diabo era descrito de uma maneira racista, caracterizado como um homem preto e robusto, então, por essa razão, eram os escravizados africanos feitos à sua imagem e semelhança (RUSSEL & ALEXANDER).

Entendida essa caracterização, vale destacar, neste romance histórico, a figura da mulher negra, acusada por iniciar as práticas de bruxaria em Salem, personificada na escravizada Tituba, que fora comprada pela família cujas meninas começaram a ter acessos de convulsões, causadas por razões até então desconhecidas, mas que historiadores sugerem ter sido oriundas das histórias que Tituba contava para as garotas sobre a sua cultura. A partir dos surtos que apresentavam, os familiares acusaram a escravizada de ter enfeitiçado as jovens, logo a mulher foi presa e em seguida teve que acusar, sob fortes ameaças e para assim tentar escapar da morte, suas cúmplices supostamente bruxas como ela (MORAIS, 2015).

Acusadas de bruxaria, as mulheres passam por uma série de torturas até revelarem suas cúmplices. Após severos suplícios, todas as acusadas por bruxaria acabam confessando e então apontando outras bruxas, as quais eram geralmente pessoas que incomodavam aqueles que estavam no poder. Os torturadores das bruxas, por meio de uma série de afirmações disfarçadas de perguntas, num tom sugestivo, levavam suas vítimas a acusar aqueles que queriam (FEDERICI, 2017). Logo, é compreensível que as disputas de poder em Salem foram o real motivo de toda essa perseguição na colônia ter acontecido.

Tituba foi apenas uma peça no jogo dos poderosos, tendo em vista que era a pessoa mais marginalizada, foi perfeita para ser responsabilizada pelos atos e qualquer pessoa que estivesse ligada a ela seria severamente punida. A mulher entendida como bruxa estava sujeita aos caprichos dos considerados cidadãos de valor, e quando essa era uma escravizada seria então desprezada e humilhada ainda mais. A mulher que foi a primeira a ser acusada na colônia, Tituba, e assim revelou diversos cúmplices, é apagada da história por estar em uma posição de nenhuma importância para a literatura elitista. O fato é que se mulheres brancas, pobres, de classe média ou burguesa já sofreram com tais ocorridos, uma mulher negra que tentava manter a sua cultura viva, por meio das histórias e de suas poções ancestrais, vem a ser demonizada duplamente, por uma visão elitista que deseja apagar suas ligações com sua ancestralidade, condenando seus costumes.

MARYSE CONDÉ E SUA REPARAÇÃO HISTÓRICA

Se tratando de uma ficção, fica claro que muitos dos acontecimentos na obra surgem das suposições e elaborações imaginativas da autora sobre acontecimentos do passado e futuro de Tituba após o acontecimento de Salem. Afinal, após realizar suas pesquisas acerca dessa figura histórica, nota-se que apesar de haver registros sobre o que aconteceu com as acusadas de bruxaria e outras figuras ilustres como os juízes e demais políticos participantes do massacre em Salem, nada se falava da figura central desse evento. Para Oliveira, Alós e Oliveira (2018, p. 55) no “livro de Condé, a ficção é o meio que permite uma revisão da história contada acerca de Tituba, uma vez que quem a havia relatado, até o momento, eram aqueles que a controlavam e a submetiam”. Logo, tudo o que foi relatado sobre Tituba vem de uma visão de uma sociedade puritana e racista que menciona apenas o que lhes interessava, ou seja, queriam uma bruxa, então criaram uma. Para Corrêa (2008)

Quando retoma os fatos históricos e a narrativa de Arthur Miller, Condé estabelece uma interação entre as personagens apresentadas, revelando, em seus diálogos, uma série de críticas severas ao comportamento social da época no tocante à condição feminina e, ainda mais importante e abrangente, questiona os ‘silêncios’ e a ‘submissão’, o ‘poder’ e o ‘fazer’ inexoravelmente presentes na condição da mulher sob diferentes pontos de vista, além de questionar o que realmente representaria ser uma ‘feiticeira’ em uma sociedade que de tão conservadora, revelava-se, em verdade, hipócrita em demasia (p. 4).

E é diante desses questionamentos de representação da bruxa que percebemos que a perseguição recai como uma forma de sobrepujar a mulher à submissão. Diante disso, todas aquelas que representavam uma ameaça para o sistema patriarcal são alvos fáceis para a perseguição. Entretanto, em Salem, isso vem mais como uma intolerância religiosa e de interesses políticos na região, como aquisição de propriedades de valor. Tituba não é apenas a escravizada bruxa que acusou outras bruxas para escapar da morte, Condé nos faz visualizar quanta coisa está por traz desse evento. Dias (2017) corrobora:

Percebe-se, de imediato, o potencial transgressor do romance de Condé, visto que sua produção literária retira Tituba da margem e a coloca no centro da narração, em uma tentativa de preencher lacunas tanto históricas como literárias. Paralelamente a isso, o deslocamento realizado por Maryse proporciona também a desestabilização da imagem construída de Tituba, seja pela história oficial seja pelo texto de Miller. Se, anteriormente, a imagem de Tituba estava construída sobre um discurso que solapava sua humanidade, voz e relevância histórica, a representação de Condé apresenta uma personagem complexa, que demonstra afetos e questionamentos, sendo, enfim, retratada como sujeito e não como coisa.(p.2669).

E é pensando nisso que nasce a necessidade de descobrir o que acontece com Tituba após todos esses eventos e Condé nos traz algumas possíveis conclusões. Quando utiliza o “Eu” no título da obra, Condé assume o papel de descendente de Tituba, de herança do legado da bruxa negra que, assim como as outras que foram enforcadas, merecia ser vista pela história, caso não ocorrido com ela. Condé nos apresenta uma possibilidade bastante aceitável, levando em consideração o período, que seria Tituba continuar presa:

Em maio de 1693, o governador Phips, após um acordo com Londres, declarou perdão geral, e as portas das prisões se abriram diante dos acusados de Salem. Pais reencontraram suas crianças; maridos, suas esposas; mães, suas filhas. Eu não reencontrei nada. Esse perdão não mudava nada. Ninguém se preocupava com a minha sorte.

Noyes, o chefe da polícia, veio me ver:

- Sabe quanto você deve à Colônia? (CONDÉ, 2019, p. 175).

Nesse período, enquanto uma pessoa estivesse presa, deveria pagar os dias que ficasse detida, dívida assumida geralmente por seus familiares. Uma pessoa como Tituba, escravizada, não teria sua dívida quitada por ninguém, logo, o que geralmente aconteceria era ser vendida para que cobrisse as despesas e foi exatamente isso que aconteceu, Tituba foi vendida para um Judeu:

Benjamin Cohen d’Azevedo, o judeu que acabara de me comprar, tinha perdido a mulher e as filhas mais novas numa epidemia de coqueluche. Ainda lhe restavam cinco meninas e quatro meninos para os quais ele necessitava com urgência de uma mão feminina. Como ele não pretendia se casar novamente como todos os homens da colônia, preferiu procurar cuidados de uma pessoa escravizada (CONDÉ, 2019, p. 179).

Ela passa um longo tempo com essa família, se relaciona com Benjamin e cuida muito bem das crianças, mas almeja sua liberdade, com anseio de voltar para Barbados. A princípio, seu senhor recusa, porém, após um ataque sofrido pelos puritanos que ateiam fogo na sua casa, matando seus filhos, ele acaba permitindo que ela parta, acreditando que aquilo tinha sido uma punição contra ele por não ter permitido que Tituba fosse livre antes. Após ser liberta, Tituba volta para Barbados e lá volta para sua casa no meio da floresta.

Um dia ela recebe a visita de alguns escravizados que levam para ela um jovem que sofrera punições muito sérias do seu senhor. Quando os outros perceberam que ele estava vivo o levam para ela para que assim o curasse com as suas habilidades. Tituba cura o rapaz e acaba criando uma relação de amor com ele. O jovem planeja uma rebelião com outros escravizados e no fim acaba sendo descoberto, sendo preso e condenado à morte, levando Tituba para o mesmo destino, acusada de ser cúmplice do movimento:

[...] A punição da qual eu tinha “escapado” em Salem, era agora apropriada. Um homem, vestido com um pesado manto preto e vermelho, recordou todos os meus crimes, passados e presentes. Eu tinha enfeitiçado os habitantes de uma aldeia pacífica e insultado Deus. Tinha chamado Satanás pra estar entre eles e jogá-los um contra o outro, submissos e furiosos. Havia queimado a casa de um comerciante honesto que não sabia sobre meus crimes e tinha pagado sua ingenuidade com a morte de seus filhos [...].

Eu fui a última a ser conduzida à forca (CONDÉ, 2019, p. 242).

O destino de Tituba parece inevitável, sendo ela uma escravizada, mais cedo ou mais tarde encontrariam uma maneira de fazê-la pagar pela sua suposta bruxaria. Na obra, Condé traz ainda em seu Epílogo que, após sua morte, como não havia deixado nenhum descendente de sangue, Tituba poderia escolher uma jovem viva para ser da sua família, receber seu legado, e parece certo dizer que Condé é um legado de Tituba, bem como muitas mulheres negras que podem se sentir representadas por essa figura empoderada que é Tituba.

CONSIDERAÇÃO (NUNCA) FINAIS

Esta pesquisa visou analisar a obra Eu, Tituba: bruxa negra de Salem (1986) de Maryse Condé, a fim de discutir o apagamento da figura Tituba dos registros históricos e os motivos para tal feito, bem como o seu papel de protagonista na obra e como ela se relaciona como mulher negra, escravizada e acusada de bruxaria com outras figuras da obra, mulheres e homens que estão acima dela em relação de poder.

Pensando nisso, foi perceptível que um dos maiores motivos que fizeram com que Tituba passasse pelo que passou, além da sua negritude, gênero e situação de escravizada, foram seus talentos que lhe davam certo empoderamento. Tituba é bastante livre de certos padrões, ela demonstra obter muito empoderamento, graças aos seus conhecimentos ancestrais passados por sua mentora Man Yaya, sua religião não se baseia na fé cristã, mas sim na de seu povo ancestral, seu pensamento diante do outro sexo é mais livre, logo, tudo isso lhe traz um peso negativo, pois representa resistência diante dos moldes exercidos por aqueles que detêm o poder.

Portanto, vale destacar que através da pesquisa e relação da obra com o referencial teórico, observou-se a importância do feminismo negro diante do tratamento da mulher negra na sociedade. Ao trazer Tituba para análise, conseguimos identificar como a mulher negra foi tratada durante os séculos e de como alguns desses legados ainda são vigentes na atualidade.

REFERÊNCIAS

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