ARTIGOS
Lugares de Memória das Ditaduras Civil-Militares Latino-Americanas e as Disputas pelo Patrimônio.
Places of Memory of Latin American Civil-Military Dictatorships and the Disputes over Heritage.
Lugares de Memória das Ditaduras Civil-Militares Latino-Americanas e as Disputas pelo Patrimônio.
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 28, núm. 3, e47748, 2023
Universidade Estadual de Londrina
Recepção: 15 Março 2023
Revised document received: 30 Abril 2023
Aprovação: 06 Setembro 2023
Resumo: O presente estudo versa sobre as disputas travadas nos processos de criação e de institucionalização de políticas públicas de preservação da memória política em quatro países do Cone Sul que foram submetidos a regimes de exceção (Argentina, Brasil, Chile e Uruguai). Para fundamentar este estudo, traçou-se, inicialmente, o referencial teórico sobre o conceito lugares de memória, como também sobre a institucionallização desses dispositivos e sua relação com o patrimônio cultural. Utilizou-se como aparato metodológico a técnica de estudos de casos. Os quatro países analisados foram selecionados por serem, até o presente, os que mais avançaram na aplicação da Justiça de Transição, com destaque para a responsabilização de agentes do Estado e criação dos chamados Lugares de Memória política. Foram selecionados, de cada país, exemplos de lugares de memória que ilustram os embates travados. Constata-se que a institucionalização de lugares de memória nasceu das pressões dos movimentos sociais organizados sobre o poder público. Constata-se, ainda, que as disputas pela memória são permanentes porque refletem os diferentes interesses políticos, econômicos e sociais presentes na sociedade.
Palavras-chave: Políticas públicas, organização do conhecimento, estudos de caso, história, ciência da informação.
Abstract: The article is a study on the disputes fought in the processes of creation and institutionalization of public policies for the preservation of political memory in four countries of the Southern Cone subjected to regimes of exception (Argentina, Brazil, Chile and Uruguay). It initially describes, in order to support the study, the theoretical reference on the concept of places of memory, the institutionalization of these devices and their relationship with cultural heritage. The technique of case study was used as a methodological support. The four countries were selected because they are, to date, the ones that have advanced the most in the application of Transitional Justice, with emphasis on the accountability of State officials and the creation of the so-called Places of Political Memory. From each country, examples of places of memory were selected in order to illustrate the clashes that took place. It appears that the institutionalization of places of memory results from the pressures of organized social movements on the State. It is also found that the disputes are permanent because they reflect the different political, economic and social interests present in society.
Keywords: Public policies, organization of information, case studies, history, information science.
Introdução
O tema central deste artigo incide nas disputas presentes na emergência e patrimonialização de Lugares de Memória, espaços que procuram expor, discutir, documentar e divulgar as violências cometidas pelas ditaduras civil-militares contra diversos segmentos sociais de quatro países do Cone Sul: Argentina, Brasil, Chile e Uruguai. Procurou-se evidenciar, através de exemplos, como a criação de instituições de preservação da memória política se entrelaça com as disputas pelo patrimônio cultural e os impactos de tais disputas na efetivação de políticas públicas voltadas aos direitos humanos.
De um modo geral, respeitadas as especificidades de cada país latino-americano, as ditaduras civil-militares foram instauradas de maneira violenta, por meio de golpes militares e da instituição do terrorismo de Estado4, cujos efeitos repercutem até hoje (Franco, 2015; Padrós, 2013). Ao final das ditaduras, nos casos analisados, os processos transicionais dos autoritarismos para os regimes democráticos foram conduzidos, fiscalizados, pactuados e implementados pelas Forças Armadas locais ao deixarem o poder, fato que explica a reduzida eficácia das medidas pactuadas, ao menos, em um primeiro momento (Linz; Stepan, 1999).
No âmbito da Justiça de Transição5, as iniciativas de reivindicação e ressignificação de lugares de memória foram oficializadas ou institucionalizadas pelos Estados democratizados e, assim, passaram a integrar o amplo rol de políticas públicas de construção da memória coletiva. Aleida Assmann e Linda Shortt (2012) apontam as premissas metodológicas do papel da memória nas transições e nas mudanças políticas: primeiro, a plasticidade da memória, sempre aberta às construções e reconstruções; segundo, as memórias são representações do passado, inseridas em contextos políticos, culturais e sociais específicos; terceiro, a coexistência heterogênea de memórias, muitas vezes antagônicas, que interagem em um mesmo espaço, que interagem entre si; quarto, por não ser possível separar nitidamente a memória do esquecimento, todo o trabalho de rememoração exige seleção, negociação e problematização; quinto, o poder de agenciamento da memória nas mudanças políticas. Essas características estão vinculadas aos atores humanos inseridos em quadros culturais, políticos, institucionais e sociais determinados. Para as autoras, essas premissas norteiam a ideia de que a memória não é somente suscetível a mudanças, mas é também um poderoso agente de mudanças políticas, capaz de transformar a relação dos indivíduos com o passado e promover a revisão de valores anteriormente formados.
As políticas públicas referentes à memória surgiram com maior ímpeto entre a metade dos anos 1990 e a primeira década dos anos 2000. Tal impulso teve início com a mobilização de organizações da sociedade civil, porém a consolidação dessas ações dependeu, em grande medida, do apoio estatal para sua efetivação (Winn, 2014), principalmente por meio de instrumentos de patrimonialização. Isso se traduziu na criação de instituições e espaços públicos muitas vezes inovadores, multifacetados, que desenvolvem diferentes tipos de ações políticas e simbólicas, de natureza pedagógica, para conscientizar e despertar o senso crítico (Catela, 2001; Jelin; Langland, 2003; Meneses, 2018).
No Cone Sul, o fenômeno de reconhecimento oficial da memória emergente das vítimas (Pollak, 1989), na forma de lugares, acabou por se tornar medidas de compensação simbólica e ressignificação da memória traumática para a construção da noção de futuro sem terrorismo de Estado (Jelin, 2002). Essa tendência, até mesmo por ser relativamente recente, merece análises detidas para se averiguar o papel desempenhado por esses lugares nas batalhas pela memória e na constituição de uma cultura política em prol dos direitos humanos.
No contexto pós-ditaduras civil-militares da América Latina, nas batalhas pela memória crítica, as forças sociais vêm demandando a instauração de marcos de memória crítica (Jelin; Langland, 2003). Com efeito, nas últimas décadas, a patrimonialização desses lugares passou a constituir uma importante ferramenta de consolidação e reconhecimento público das memórias emergentes. Pode-se afirmar, portanto, que as lutas sociais e políticas estão também associadas à questão patrimonial, objeto do estudo de casos deste trabalho.
I. As Batalhas pela Memória
A memória coletiva, por ser da ordem do presente, mantida por grupos vivos, é fluida, suscetível a usos e abusos (Nora, 1993; Ricoeur, 2018); é também objeto das disputas em jogo nas lutas sociais pelo poder:
[...] tornarem-se senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva
(Le Goff, 2013, p. 390).Os países que viveram a violência política e as práticas de terrorismo de Estado debatem, ainda hoje, as operações de construção e reconstrução da memória, com o objetivo de superar as fissuras causadas no tecido social e apresentam, de um modo geral, os mesmos dilemas sobre como historicizar criticamente a memória das ditaduras (Napolitano, 2015).
Contudo, conforme observa Elizabeth Jelin (2002), é impossível, em qualquer momento ou lugar, encontrar somente uma memória, uma só visão ou uma só interpretação do passado, compartilhada por toda a sociedade. Há momentos históricos de maior ou menor consenso, em que uma dada memória se torna hegemônica ou é revista, mas sempre coexistirão outras memórias, histórias, interpretações, resistências e conflitos. De fato, são permanentes as lutas pela preservação da memória ou por seu apagamento (Jelin, 2002). Em outras palavras, são batalhas sobre o que deve ser recordado e como deve ser recordado (Winn, 2014).
Em um primeiro momento, na transição dos regimes de exceção para os regimes democráticos, prevaleceu a proposta de conciliação e pacificação baseada na teoria dos dois demônios. Segundo essa teoria, a violência política fora praticada pelos dois lados que participaram da disputa política, tanto à direita quanto à esquerda, ou seja, tanto pelos agentes do Estado quanto por aqueles que resistiram às ditaduras (Jelin, 2002).
Mas as batalhas pela memória das vítimas e da resistência foram inicialmente impulsionadas pelos movimentos sociais em defesa dos direitos humanos, nas décadas de 1970 e 1980 (Gohn, 2007). Posteriormente, a experiência internacional de combate ao genocídio e ao terrorismo estatal serviu de modelo para as campanhas por memória, verdade e justiça, as quais foram adotadas na primeira década do século XXI, por governos progressistas (Winn, 2014). Nesse contexto, as lutas coletivas pela construção da memória apresentaram resultados distintos. A Argentina e o Chile foram pioneiros na luta pela constituição de uma memória crítica e de uma pedagogia da memória cujos traços mais marcantes podem ser resumidos nos seguintes aspectos: reconhecimento oficial das violações dos direitos humanos por parte do Estado, persecução penal dos agentes da repressão e patrimonialização de lugares de memória.
A análise dos embates entre as diversas concepções de memória constitui um campo de estudos relativamente novo, ainda em vias de consolidação (Napolitano, 2011). Esse novo campo de pesquisa busca problematizar o direito à memória das vítimas e compreender adequadamente os processos transicionais. Com efeito, quando os testemunhos das vítimas ganham o espaço público, os processos historiográficos são impactados. Assim, novos indícios materiais se somam e compensam as lacunas da documentação escrita ou oficial sobre as violências (Napolitano, 2018). Dentre os vestígios que se somam ao testemunho estão os lugares de memória.
Entretanto, como observa Rodrigo Patto Sá Motta (2013), o ponto de contato entre as memórias em disputa é a reivindicação de cada uma delas como verdadeira, sagrada e inquestionável. O papel do pesquisador que envereda por este campo das batalhas da memória deve ser o de submetê-las aos procedimentos críticos e ao confronto com outras evidências. Os agentes históricos não podem ser divididos apenas em vítimas e algozes ou mocinhos e bandidos (Fico, 2017). A memória, o esquecimento e o silêncio são componentes de um processo dinâmico, definido por circunstâncias históricas e políticas determinadas, motivo pelo qual é preciso debruçar-se sobre a complexidade social para entender os meandros das memórias das ditaduras (Cordeiro, 2009).
II. Usos e Abusos da Memória Coletiva
A memória coletiva possui um duplo viés em seus usos políticos. Pode tratar-se de uma conquista libertadora ou de um instrumento de dominação: “Devemos trabalhar de forma que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens” (Le Goff, 2013, p. 436). Para Andreas Huyssen (2000), a mobilização do passado e seus variados usos políticos pode tanto sustentar políticas nacionalistas, fundamentalistas, chauvinistas e mitos fundadores quanto contrariar as políticas que perseguem o esquecimento, por meio da adoção de discursos de pseudo-reconciliação ou de anistia.
O cerne do problema dos abusos da memória, segundo Ricoeur (2018), reside justamente na manipulação ideológica: “O processo ideológico é opaco por dois motivos. Primeiro, permanece dissimulado; diferentemente da utopia, é inconfessável; mascara-se ao se transformar em denúncia contra os adversários no campo da competição entre ideologias: é sempre o outro que atola na ideologia” (Ricoeur, 2018, p. 95).
O mesmo autor aponta três níveis operatórios desse fenômeno: distorção da realidade, legitimação do poder e integração (coesão) do mundo comum. A ideologia gira em torno do poder, busca legitimar a autoridade, constitui as razões para obedecer e atua como um mecanismo de distorção (Ricoeur, 2018). Os aspectos ideológicos tornam a memória frágil, servindo até mesmo para a legitimação dos atos violentos do passado. A glória de uns significou a humilhação de outros e, por isso, a construção de memórias e identidades nacionais ou oficiais configura-se como um “mau uso da memória” (Ricoeur, 2018, p. 94-95). Os abusos da memória decorrem, comumente, da ambição de controle sobre o processo de memorização que pode “resvalar do uso para o abuso” (Ricoeur, 2018, p. 73). Dessa forma, a memória coletiva precisa, antes de tudo, ser investida de uma função social, ser problematizada, para não ser somente um instrumento da ordem da ideologia (Huyssen, 2000; Meneses, 1992; Ricoeur, 2018).
Na outra extremidade dos abusos tem-se o excesso. Em sua forma fetichizada de produto cultural, desprovido de senso crítico, de ímpeto de indagação, de reflexão, iguala-se ao esquecimento pela ocultação deliberada do passado (Huyssen, 2000). Segundo Pierre Nora (1993), a memória coletiva, diante das rápidas mudanças ocorridas no século XX, tornou-se cada vez mais formal e desconectada do passado. É, sobretudo, uma memória fundada em vestígios materiais, que prolifera em espaços públicos sob a forma de monumentos, datas comemorativas, placas recordativas, em instituições (arquivos, museus, antiquários).
Em alguns casos, esses fenômenos de reificação do passado transformam os lugares de memória em objetos de consumo utilizados pela indústria cultural. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o ex-campo de concentração nazista de Auschwitz, na Polônia. O bombardeamento de filmes, fotografias, espetáculos, notícias, propagandas transformou o palco de incontáveis atrocidades em um destino turístico, um produto cultural a ser consumido indiscriminadamente, em detrimento do aspecto crítico de construção da memória (Chuveiros [...], 2015).
Em O Capital,Karl Marx (2017, p. 146), explica esse caráter fetichista ao afirmar que “a mercadoria aparenta ser algo simples, trivial, mas sua análise revela um caráter místico”. O fetichismo é inerente aos objetos produzidos como mercadorias. Segundo as proposições de Marx (2017), a forma universal do dinheiro é o vetor do fetichismo da mercadoria. Isto é, a sua forma fetichizada significa que aparece apenas como valor de troca e não como um produto social do trabalho humano. O fetichismo, no capitalismo, pressupõe uma máscara, uma maquiagem, uma cortina de fumaça sobre as relações sociais. Em outras palavras, as relações sociais são obscurecidas pelas formas econômicas (Bottomore, 2012). Para muitos estudiosos da teoria marxista, a reificação é um caso especial de alienação, assenta-se na transformação das relações humanas em relações entre coisas (mercadoria e dinheiro), o que acaba condicionando a vida humana a uma automação inanimada (Bottomore, 2012).
A memória assume a forma de mercadoria na medida em que é fetichizada, transformada em produto cultural distribuído e comercializado como tal. Com isso, ela perde a sua função social, sua força positiva e libertadora (Nora, 1993). Conforme Karl Polanyi (2000), os elementos da economia de mercado passaram a controlar e dirigir os elementos da vida social. A descrição desses elementos como mercadorias é uma construção ficcional no capitalismo. Nas palavras de Polanyi (2000, p. 94), “a ficção da mercadoria, portanto, oferece um princípio de organização vital em relação à sociedade como um todo”.
Assim, a memória é inserida na economia de mercado. A análise do fetichismo da mercadoria pode ser um ponto de partida para a compreensão das relações não originariamente econômicas, pois estabelece dicotomia entre a aparência e a realidade ocultada. Pode, ainda, ser transportada para a averiguação da ideologia (Bottomore, 2012), a qual, como já foi dito, é uma das principais formas de manipulação da memória (Ricoeur, 2018).
Segundo Adorno e Horkheimer (1985), a indústria cultural representa uma ficção da realidade para ser consumida, podendo ser considerada uma repetição de padrões de uma estética voltada para o consumismo, razão pela qual está tão vinculada à publicidade. Desse modo, se a indústria cultural tem o poder econômico para impor a repetição de padrões culturais ou artísticos, obviamente pode também influenciar a concepção dos museus e, por que não dizer, dos lugares de memória das ditaduras. Nesse sentido, transforma um lugar de consciência em lugar de alienação e consumo em massa:
O contraste técnico entre poucos centros de produção e uma recepção dispersa condicionaria a organização e o planejamento pela direção. Os padrões teriam resultado originariamente das necessidades dos consumidores: eis por que são aceitos sem resistência. De fato, o que o explica é o círculo da manipulação e da necessidade retroativa, no qual a unidade do sistema se torna cada vez mais coesa. O que não se diz é que o terreno no qual a técnica conquista seu poder sobre a sociedade é o poder que os economicamente mais fortes exercem sobre a sociedade. A racionalidade técnica hoje é a racionalidade da própria dominação. Ela é o caráter compulsivo da sociedade alienada de si mesma
(Adorno; Horkheimer, 1985, p. 114).Para Huyssen (2000), a economia de mercado e a fetichização são realidades do mundo capitalista globalizado. O autor indaga: em meio ao excesso de memória, o chamado boom de memória coletiva, como esperar que alguém se recorde efetivamente de algo, principalmente das vítimas? A única forma de contornar essa realidade é a democratização das memórias localmente, caracterizada como “rememoração ativa” (Huyssen, 2000, p. 67):
Quanto maior é a memória armazenada em bancos de dados e acervos de imagens, menor é a disponibilidade e a habilidade da nossa cultura para se engajar na rememoração ativa, pelo menos ao que parece. A rememoração dá forma aos nossos elos de ligação com o passado, e os modos de rememorar nos definem no presente. Como indivíduos e sociedades, precisamos do passado para construir e ancorar nossas identidades e alimentar uma visão de futuro.
Diante da fetichização da memória coletiva, Ulpiano Bezerra de Meneses (1992) afirma que a gestão da memória, na contemporaneidade, pode seguir dois caminhos. A primeira, de caráter conservador, baseia-se na fetichização da própria memória. A segunda, em resposta à alienação provocada pela expropriação da memória, representa a emergência da consciência, do despertar de senso crítico, da mobilização, como bandeira política e combustível para os movimentos sociais (Meneses, 1992).
III. Lugares de Memória Política
A definição de Lugares de Memória foi cunhada e desenvolvida pelo historiador Pierre Nora (1993), na coletânea Les lieux de mémoire, organizada na França. Segundo o autor, esses são os loci “onde a memória se cristaliza e se refugia” (Nora, 1993, p. 7). Para ser Lugar de Memória é necessário “ter vontade de memória” (Nora, 1993, p. 22), intenção em admitir um determinado vestígio material como detentor de memória coletiva. Nas palavras de Pierre Nora, “o lugar de memória é um lugar duplo; um lugar de excesso, fechado sobre si mesmo, fechado sobre sua identidade, e recolhido sobre seu nome, mas constantemente aberto sobre a extensão de suas significações” (Nora, 1993, p. 27).
Paul Ricoeur (2018, p. 131) menciona esses locais como “lugares socialmente marcados”. Se ausentes as inscrições de sentido conferidas por grupos vivos, no presente, o lugar deixa de ser habitado pela memória, torna-se vazio, frio, um lugar apenas de história. Ademais, nos Lugares de Nora (1993), coexistem três aspectos simultaneamente: o material, o simbólico e o funcional. O primeiro elemento (o material) fixa os lugares em realidades manejáveis; o segundo (o simbólico), obra da imaginação, “garante a cristalização das lembranças e sua transmissão” (Ricoeur, 2018, p. 416); o terceiro (o funcional) leva ao ritual (Ricoeur, 2018).
Quanto à materialidade, é importante destacar que a aceleração do tempo histórico e a febre de memória contemporâneas fizeram com que o sentimento de continuidade entre o presente e o passado se tornasse residual, restrito aos lugares: “Há locais de memória porque não há mais meios de memória” (Nora, 1993, p. 7). É notável que a materialização da memória esteja vinculada ao elogio do patrimônio, locais nos quais se ancora a memória coletiva (Ricoeur, 2018).
Assim que o trabalho de Nora (1993) se tornou conhecido, foi levantada a questão sobre a aplicabilidade do conceito fora do contexto celebrativo francês. Diante de tal questionamento, foram colocadas ressalvas, como, por exemplo, quanto à transposição do conceito francês para outras realidades (Allier-Montaño, 2008). Com relação às divergências sobre a aplicação do conceito no contexto de memória traumática das ditaduras latino-americanas, pode-se citar Allier-Montaño (2008), uma das vozes que defende a possibilidade de importação do conceito, por sua plasticidade, sob a justificativa de que não se trata de um conceito acabado, devendo ser discutido e aperfeiçoado. Por outro lado, a pesquisadora Ludmila Catela (2001) critica a concepção de Nora e defende outro tipo de abordagem, sob a denominação “territórios de memória”. A crítica ocorre no sentido de que o conceito do historiador francês, por ser estático, não confere espaço para as memórias marginais, subversivas, subterrâneas e tampouco enfatiza o caráter político das disputas por memória:
[...] a noção de território refere-se às relações ou ao processo de articulação entre os diversos espaços marcados e às práticas de todos os que se envolvem no trabalho de produção de memórias sobre a repressão; ressalta os vínculos, a hierarquia e a reprodução de um tecido de lugares que potencialmente pode ser representado por um mapa
(Catela, 2001, p. 208).De todo modo, os estudos dos lugares de memória podem ser utilizados como pontos de partida para a análise mais geral das lutas por memória do passado recente de repressão política e de terrorismo de Estado (Jelin; Langland, 2003). A memória depositada nesses lugares, transformada em política pública, deve ser trabalhada para se tornar conhecimento. Obviamente, a constituição de lugares dessa natureza não substitui as medidas jurídicas, como a persecução penal dos agentes perpetradores de violações dos direitos humanos, tampouco se destina a exercer o papel de tribunais e proferir julgamentos genéricos sobre os eventos do passado (Meneses, 2018).
Apesar de todas as limitações impostas, a institucionalização desses lugares por parte do Estado simboliza o êxito de determinados grupos sociais nas batalhas pela memória, bem como representa uma declaração pública em prol da construção de uma cultura política na qual o autoritarismo não deve ter espaço. Para entender a importância e o efetivo papel dos lugares de memória, é importante ter em mente que, do ponto de vista das Ciências Humanas, a memória pode ser compreendida como um trabalho permanente, constante, muitas vezes árduo e doloroso, que implica escolha, seleção, enquadramento, ressignificação e esquecimento (Assmann; Shortt, 2012; Bosi, 1979; Halbwachs, 1990; Meneses, 1992; Nora, 1993; Pollak, 1989; Ricoeur, 2018).
IV. Patrimonialização de Lugares de Memória
Desde a Revolução Francesa, com a transferência dos bens da nobreza e do clero para a nação, esses bens se transformaram em valores que precisavam ser preservados sob pena de prejuízo financeiro. As antiguidades e obras arquitetônicas logo adquiriram significado histórico e afetivo, e a função de preservação foi delegada ao Estado, pois, como esse patrimônio se tornou propriedade comum de todos os cidadãos, sua conservação passou a ser um tema estatal. Dessa forma, começou a se formar a ideia de monumento histórico e o instituto do tombamento6 para sua salvaguarda (Choay, 2017).
Segundo Ignacio González-Varas Ibáñez (2014), o patrimônio cultural é uma seleção subjetiva e simbólica de elementos culturais do passado, revitalizados a partir do presente. A sua preservação procura garantir a manutenção da identidade histórica enquanto comunidade humana. Trata-se de um processo dialético, não estático, variável, não apenas racional ou científico, mas também político, ideológico, em que são frequentemente invocados os sentimentos das comunidades e dos cidadãos. Nesse processo dialético de construção e desconstrução da memória, pode-se chegar à modificação do sentido e dos valores que são atribuídos ao patrimônio.
Historicamente, memória e identidade estão intimamente associadas. Conforme Jacques Le Goff (2013), a memória é um elemento essencial da identidade coletiva, tanto como autoafirmação quanto como dever. A autoafirmação pode conferir à identidade e à memória uma força positiva e libertadora, principalmente para os grupos sociais e étnicos que procuram reforçar sua identidade de grupo (Nora, 2009). No entanto, a construção de uma identidade nacional genérica pressupõe a condição de semelhança, em contraposição à de alteridade; é mais um processo de reconhecimento do que de conhecimento (Meneses, 1993). A diferenciação é a base de todas as classificações, discriminações e hierarquizações sociais. O problema reside em apontar as diferenças para fundamentar a defesa de privilégios. Por esse motivo, “se quisermos nos afastar da ilusão de uma totalidade íntegra e coesa, teremos que forçosamente enfrentar o problema das divisões e do conflito” (Meneses, 1993, p. 211).
Há o perigo de a memória coletiva se tornar memória oficial, produto de seleções arbitrárias e montagem ideológica para fundamentar uma certa ideia de identidade nacional (Pollak, 1989). A memória, assim erigida, sem participação coletiva e democrática, configura-se como um “mau uso da memória” (Ricoeur, 2018, p. 94-95), pois legitima os atos violentos do passado. A memória vista apenas como elemento de coesão social, legitimadora de poder, iguala-se ao esquecimento voluntário pela ocultação deliberada do passado, obstando as lutas sociais por memória (Huyssen, 2000).
Os lugares de memória, na concepção cunhada por Nora (1993), podem se aproximar da noção de patrimônio. Assim como ocorre com o patrimônio cultural, no contexto da memória traumática pós-ditaduras civil-militares latino-americanas, o estabelecimento de lugares de memória resulta de luta política em que forças sociais adversárias demandam marcas de memória ou o apagamento dessas marcas. Os lugares podem, desse modo, ser tratados como veículos de memória (Jelin; Langland, 2003), pois as marcas territoriais não são mais do que suportes de ambiguidades abertas ao trabalho subjetivo, à ação política e simbólica coletiva.
Como observado, um dos pilares da Justiça Transicional é a construção da memória, que se manifesta de diferentes maneiras. Nesse sentido, uma das principais políticas públicas no Cone Sul é a patrimonialização de lugares de memória. Os lugares, quando oficializados e transformados em instituições de memória, são responsáveis por custodiar documentos e produzir outros, bem como constituir acervos de relatos orais, dentre outras ações de construção, ressignificação e difusão da memória. Desempenham atividades educacionais, culturais, sociais, de pesquisa, de conscientização e de difusão do conhecimento para ser apropriado por diferentes públicos.
Nessa esteira, a emergência de memória latino-americana, na forma de lugares, ocorre de fato entre a metade da primeira década e a metade da segunda década dos anos 2000, mais precisamente entre 2005 e 2016. O boom de reconhecimento de lugares coincide com o advento de governos progressistas no Cone Sul. Porém, essa não é a regra, tendo em vista que as iniciativas partem da mobilização da sociedade civil organizada, cuja pressão sobre o Estado é fundamental e indispensável para o reconhecimento das memórias até então não oficiais.
V. Patrimonialização de Lugares em Perspectiva
Com o fim das ditaduras civil-militares no Cone Sul, os países aqui analisados seguiram caminhos distintos de redemocratização, assim como de aplicação dos preceitos de Justiça de Transição. Como observado, a transição política, a construção da memória e a consolidação de patrimônios culturais não são processos lineares puramente racionais e estáticos (Ibáñez, 2014; Jelin; Langland, 2003). Nos países estudados a seguir, foram implementadas Comissões da Verdade, bem como, em maior ou menor grau, as demais medidas de Justiça Transicional, como a criação ou oficialização de Lugares de Memória, mas, mesmo assim, enfrentaram suas contradições político-institucionais para tanto. Argentina e Chile se destacaram pela persecução penal dos agentes de Estado perpetradores de violações dos direitos humanos, enquanto, na prática, no Brasil e Uruguai ainda vigora a anistia aos torturadores. Neste artigo, procuramos apresentar e analisar casos emblemáticos de lutas sociais pelo reconhecimento oficial de lugares, que simbolizaram a vitória de movimentos sociais ou os fracassos e as fragilidades das políticas de patrimonialização.
V.1. Argentina
Durante a última ditadura argentina foi elaborada a Lei de Autoanistia e decretada a destruição dos arquivos que comprometiam os militares. No governo Alfonsín (1983-1989), foi anulada a Lei de Autoanistia e criada a Comisión Nacional sobre la Desaparición de Personas (Conadep, 1984), sob direção do escritor Ernesto Sábato. O relatório final da Comissão, publicado como livro, com o título Nunca Más, foi utilizado nas ações judiciais de 1985 contra a Junta Militar, processo que resultou na condenação de nove comandantes militares, cinco deles à prisão perpétua, dentre os quais o ditador Videla. No entanto, em 1986, ainda no governo de Alfonsín, foram aprovadas a Lei do Ponto Final e, no ano seguinte, a Lei de Obediência Devida, medidas que, em tese, anistiaram novamente os militares, inclusive os que haviam sido condenados (Kreft; Le Saux; Lauzán, 2011).
O ímpeto por medidas de justiça, reparação e memória foi retomado no governo de Néstor Kirchner (2003-2007). A Lei do Ponto Final foi anulada, o que possibilitou a reabertura dos processos contra os repressores. Kirchner, em ato simbólico, pediu perdão, por parte do Estado argentino, juntamente com a entrega da ex-Escuela de Mecánica de la Armada (ESMA), para se tornar um lugar de memória modelo para os argentinos. Em 2011, foi aprovada a Lei 26.691 (Argentina, 2011), que converteu os antigos Centros Clandestinos de Detenção (CCD) em Sítios de Memória do Terrorismo de Estado, através da declaração desses locais como patrimônios históricos nacionais. Serão descritos, a seguir, dois lugares de memória: o Museo Sitio de Memoria ESMA e a Casa Mariani-Teruggi.
V.1.1. Museo Sitio de Memoria ESMA
Este museu integra o espaço de memória e direitos humanos na antiga ESMA, na cidade de Buenos Aires. A instituição autônoma está situada no edifício do antigo cassino dos oficiais. Criado oficialmente em 24 março de 2004 (28º aniversário do golpe de Estado argentino), o símbolo do terrorismo de Estado na Argentina é hoje um sítio de memória modelo, referência internacional em políticas públicas de memória e educação em direitos humanos. O espaço recebe mais de 200 mil visitantes anualmente (Argentina, 2015).
Os primeiros edifícios da ESMA foram construídos em 1924. A partir de 1976, ela foi, ao mesmo tempo, instituição de ensino militar, CCD e base de operações do denominado Grupo de Tareas 3.3.2 (GT 3.3.2). De lá, os presos sequestrados eram embarcados nos chamados “voos da morte” e jogados no mar (Novaro; Palermo, 2007).
Em 1998, sob o governo de Carlos Menem, foram determinadas a desocupação da ESMA e sua demolição, para dar lugar a um parque público e a um monumento pela reconciliação nacional. Porém, essa medida foi barrada pelas ações dos familiares das vítimas e de organizações da sociedade civil. O ato de Menem promoveu um amplo debate na sociedade argentina. Nesse processo, a Justiça Federal considerou o complexo ESMA como prova judicial dos horrores perpetrados no passado recente do país (Argentina, 2015).
Somente em 2004, sob o governo de Néstor Kirchner, após um longo embate, o complexo da antiga ESMA foi declarado patrimônio nacional. Prevaleceu a intenção de preservar o local por seu valor histórico e simbólico. Os edifícios foram desocupados em novembro de 2007. O Museo Sitio de Memoria ESMA foi inaugurado em 2015, após revitalização, mediante ampla pesquisa, com base em testemunhos de sobreviventes (Neves, 2014).

V.1.2. Casa Mariani-Teruggi
Este sítio de memória, localizado em La Plata, é um imóvel particular, sede da Asociación Anahí, declarado monumento histórico nacional da Argentina. Na residência, onde viviam os militantes do grupo revolucionário armado Montoneros Diana Teruggi e Daniel Mariani, junto com sua filha de 3 meses, Clara Anahí, era impressa a revista Evita Montonera. Em novembro de 1976, a casa foi bombardeada e invadida por agentes da repressão. Na operação foram assassinados os militantes. A criança de 3 meses foi apropriada pelos agentes repressivos e não se teve mais notícias de seu paradeiro. A avó de Clara, María Isabel “Chicha” Mariani, uma das fundadoras das Abuelas de la Plaza de Mayo, conseguiu reaver o imóvel, em 1998, que ainda levava as marcas da repressão. Assim, criou a Asociación Anahí, em busca da neta desaparecida. Chicha Mariani faleceu em 2018 sem conseguir recuperar sua neta desaparecida. Contudo, o sítio de memória, sede da associação, segue também como um memorial, com espaço expositivo, que realiza visitas guiadas gratuitas, principalmente para escolas locais (Argentina, 2015).

V.2. Brasil
Com base na Lei de Anistia (Lei no 6.683 de 23 de agosto de 1979) (Brasil, 1979), em vigor até hoje, nenhum ditador ou agente da repressão foi julgado ou condenado pelas violações dos direitos humanos ocorridas durante a ditadura civil-militar. Em 1995 foi criada a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos (CEMDP), impulsionada com a publicação do “Dossiê dos mortos e desaparecidos políticos a partir de 1964”, elaborado pela Comissão dos Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos. Em 2001, foi criada a Comissão de Anistia para promover a reparação de vítimas e familiares de mortos, desaparecidos e ex-presos políticos.
As ações por memória, reparação e justiça ganharam maior fôlego a partir de 2003, sob os governos de Lula, por meio de projetos como o Centro de Referência “Memórias Reveladas”; a Lei de Acesso à Informação Pública; o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) e as Caravanas da Anistia (2009). Mas a principal medida de Justiça de Transição adotada no Brasil foi a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), em 2011, determinada pela presidenta Dilma Rousseff, ex-presa política. Essa Comissão apresentou seu relatório final em 2014, recomendando a revisão da Lei de Anistia e a responsabilização criminal, civil e administrativa dos agentes perpetradores de violações dos direitos humanos praticados sob a égide do Estado. No Brasil, a instalação da CNV simbolizou o auge de um processo transicional complexo, até então mais restrito à reparação. Apesar de seu notório atraso de 30 anos e de suas limitações políticas, jurídicas e institucionais, essa comissão foi um marco fundamental na consolidação do Estado de Direito no país (Quinalha, 2013). Em que pesem os avanços produzidos nas últimas décadas, o caso brasileiro segue caracterizado pela ausência de responsabilização criminal dos torturadores (Kreft; Le Saux; Lauzán, 2011).
Pode-se constatar, ainda, que o caso brasileiro difere um pouco dos demais do Cone Sul aqui estudados. Talvez por suas dimensões territoriais, densidade demográfica, características administrativas e pelas circunstâncias transicionais, a patrimonialização de lugares de memória das ditaduras é comumente efetivada pelos organismos de patrimônio estaduais ou municipais, enquanto nos demais países analisados fica a cargo dos órgãos federais. A seguir, serão descritos o Memorial da Resistência de São Paulo, o antigo DOI-CODI de São Paulo e a Casa da Morte de Petrópolis no Rio de Janeiro.
V.2.1. Memorial da Resistência de São Paulo
O Memorial, localizado na cidade de São Paulo, no largo General Osório, na rua Mauá, região central da cidade, ocupa hoje o edifício que foi sede do antigo DEOPS, que foi um dos principais aparatos repressivos no estado de São Paulo. O memorial, inaugurado em 2008, atua na preservação da memória da ditadura civil-militar brasileira. Ele divide o espaço com a Estação Pinacoteca do Estado de São Paulo. O edifício, do século XIX, foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT), em 1999, somente por seu valor arquitetônico.
O edifício foi construído originalmente para abrigar os escritórios administrativos da Estrada de Ferro Sorocabana. Além dos escritórios, o prédio, inaugurado em 1914, abrigava armazéns para os itens transportados pela ferrovia. Esses usos permaneceram até o ano de 1938. A partir de 1940, o DEOPS foi instalado no local, onde permaneceu até 1983, quando foi extinto no processo de redemocratização.
Durante a maior parte do período ditatorial, o DEOPS atuou como polícia política do estado de São Paulo, e seu edifício funcionou como centro de detenção de presos políticos. A partir de 1983, recebeu outros usos vinculados aos órgãos públicos. O processo de tombamento, aberto em 1976, durou mais de 20 anos.
Sua patrimonialização, mesmo que ocorrida em período democrático, realizou-se à margem de uma participação social mais ampla, tendo sido privilegiado o histórico arquitetônico associado à Estrada de Ferro Sorocabana e à modernização da cidade. As reformas realizadas no edifício ocorreram em tempos de democracia, com o nítido intuito de ocultação da história do período ditatorial (Neves, 2014). A carceragem do DEOPS, onde diversos presos políticos foram detidos e torturados, foi quase totalmente descaracterizada entre a passagem dos anos 1990 e 2000 (São Paulo, 2017). A restauração foi concluída em 2002, e o prédio recebeu usos diversos, enquanto centro expositivo. A partir de 2004, quando o edifício passou a ser de responsabilidade da Pinacoteca, o Fórum de Ex-Presos e Perseguidos Políticos, em conjunto com outras organizações da sociedade civil. Como a Comissão de Familiares e Presos Políticos, passou a discutir e a pressionar para sua ocupação como sítio de memória crítico à repressão e ao terrorismo de Estado.
O espaço foi inaugurado com a denominação Memorial da Resistência, em 2008. Com base em ampla pesquisa e testemunhos de ex-presos políticos detidos no local, quatro celas da carceragem foram reconstituídas e as inscrições nas paredes foram refeitas pelos ex-presos em um ato simbólico. A intervenção museológica foi uma tentativa de minimizar os danos causados pelo apagamento dos rastros traumáticos do passado (Neves, 2014). Atualmente, o Memorial da Resistência de São Paulo conta com um centro de referência para pesquisa, atua na salvaguarda de acervo custodiado, possui auditório, área de exposição permanente, área para exposições temporárias e desempenha ações educativas e culturais com enfoque temático sobre a resistência, controle e repressão política. Porém, além de dividir o espaço com a Pinacoteca do Estado de São Paulo, um museu de arte, ambas as instituições são administradas pela mesma Organização Social da Cultura, o que levanta debates e questionamentos acerca da preservação e fetichização da memória inscrita nesse edifício.
V.2.2. DOI-CODI de São Paulo
Este lugar de memória está situado na rua Tutóia, na cidade de São Paulo. Entre 1969 e 1983, o local foi sede da Operação Bandeirante (OBAN) e, em seguida, do Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) paulista, um dos principais organismos da repressão da ditadura civil-militar brasileira. O local também funcionou como centro clandestino de detenção (CCD), onde foi torturado e assassinado o jornalista Vladimir Herzog, entre muitos outros opositores à ditadura. O complexo de edifícios foi tombado por unanimidade pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (CONDEPHAAT) em 2014. Porém, até o momento não foi completamente desocupado. Um dos edifícios abriga, ainda hoje, uma delegacia de polícia. Após o tombamento, moradores do bairro organizaram um abaixo-assinado contrário à retirada de um equipamento de segurança pública da região, paralisando as negociações de desocupação completa do local (Neves, 2018). Mesmo assim, organizações da sociedade civil promovem visitas guiadas ao local e todos os anos se reúnem ali para exigir a ressignificação do espaço e homenagear os mortos e desaparecidos da ditadura.

V.2.3. Casa da Morte de Petrópolis
Esse lugar de memória está localizado em Petrópolis/RJ. O imóvel foi um CCD, na década de 1970, administrado pelo Centro de Informações do Exército (CIE). O centro ficou conhecido pela perversidade dos agentes da repressão e como um símbolo do terrorismo de Estado brasileiro. Acredita-se que a militante Inês Etienne Romeu tenha sido a única sobrevivente. Nos anos 1980, ela conseguiu identificar o local e denunciá-lo à imprensa.
O imóvel foi cedido aos agentes da ditadura por um simpatizante do nazismo, emigrado da Alemanha. Com a redemocratização, a casa foi vendida como forma de apagar os vestígios dos crimes que foram ali praticados. Em 2018, atendendo à iniciativa popular e do Ministério Público do Rio de Janeiro, o imóvel foi tombado pela prefeitura de Petrópolis. No entanto, no início de 2020, o Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro atendeu ao pedido do atual proprietário e anulou o tombamento municipal, devido a “irregularidades técnicas” (Konchinski, 2020).
V.3. Chile
Em 1988, o eleitorado chileno compareceu maciçamente ao pleito pela não continuidade da ditadura. No entanto, os militares ainda teriam mais de um ano até as eleições presidenciais de 1989, para prepararem uma saída segura e impune (Angell, 2015). Em 1990, Patrício Aylwin assumiu o posto de presidente, mantendo Augusto Pinochet como comandante-em-chefe das Forças Armadas.
Visando a acalmar a pressão popular, foi instaurada, em 1990, a Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación, também conhecida como Comissão Rettig. Seu relatório final, de 1991, apurou em torno de 3 mil violações dos direitos humanos, porém sem apontar culpados (Sader, 2006). Em seguida, criou-se a Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación (CNRR), para promover a reparação das vítimas. Até então o discurso predominante na transição chilena era o de conciliação e apaziguamento.
Porém, diante do recrudescimento da mobilização popular e política por justiça, foi instituída, em 2003, a Comisión Nacional sobre Prisión Política y Tortura, que ficou conhecida como Comissão Valech, com a missão de investigar as violações dos direitos humanos, e seu relatório final foi publicado no ano seguinte. As políticas públicas mais efetivas para a construção da memória foram impulsionadas durante o mandato de Michelle Bachelet, a partir de 2006, com a patrimonialização de lugares de memória e a construção do Museo de la Memoria y los Derechos Humanos (Kreft; Le Saux; Lauzán, 2011). A seguir serão descritos o Londres 38 e o Venda Sexy ou Discoteque.
V.3.1. Londres 38
O sítio de memória Londres 38 está situado na rua Londres nº 40, na zona central da capital Santiago, muito próximo ao palácio presidencial de La Moneda. O nome do lugar de memória, que leva o nº 38, está relacionado à tentativa dos agentes da repressão pinochetista de encobrir as ações clandestinas, alterando a numeração do imóvel. Este foi a sede do Partido Socialista chileno. Entre 1973 e 1975, após ser confiscado pela ditadura, o local funcionou como sede operativa da Dirección de Inteligencia Nacional (DINA), logo após o golpe de Estado (Cabeza Monteira et al., 2017).
Somente em 2005, mediante ampla mobilização popular, o imóvel foi tombado pelo Consejo de Monumentos Nacionales de Chile (CMN). Em 2010, foi inaugurado com a participação de organizações da sociedade civil. Na instituição se desenvolvem visitas guiadas, pesquisas e oficinas sobre a memória da ditadura chilena, coleta de materiais, manutenção de um arquivo digital e, ainda, implementam-se projetos de conservação e recuperação arquitetônica urbana e de integração com outras instituições de memória (Chile, 2022).
V.3.2. Venda Sexy ou Discoteque
O lugar de memória está localizado na comuna de Macul, zona metropolitana de Santiago. Trata-se de um imóvel residencial. Entre 1974 e 1975, foi alugado por agentes da DINA para ser utilizado como CCD. O alvo principal do centro de torturas eram os estudantes universitários, e ele recebeu o apelido de Venda Sexy ou Discoteque, devido aos crimes sexuais ocorridos no local e ao fato de os agentes da repressão colocarem música alta para encobrir as práticas de torturas (Cabeza Monteira et al., 2017). O lugar de memória é emblemático por ter sido usado para a tortura sexual, particularmente contra mulheres, inclusive com a utilização de animais, o que demonstra a estarrecedora dimensão do terrorismo de Estado instaurado pela ditadura civil-militar de Pinochet. Essa forma de violência sistemática foi primeiro revelada pelo Informe da Comissão Valech (Valech, 2005).
Em meio à mobilização popular pela recuperação e ressignificação desse espaço, o CMN declarou o imóvel patrimônio nacional em 2016 (Cabeza Monteira et al., 2017). O Estado realizou uma oferta ao proprietário para adquirir o imóvel, que não foi aceita. Logo em seguida, o então proprietário o vendeu por valor muito inferior ao oferecido pelo Estado, levantando suspeitas sobre sua destinação.
V.4. Uruguai
O restabelecimento de eleições democráticas, em 1985, manteve a impunidade dos agentes do Estado perpetradores de violações dos direitos humanos, por meio da Ley de Caducidad de 1986 (Uruguai, 1986), uma espécie de anistia. No entanto, com o intuito de mitigar as divergências e responder às mobilizações sociais por medidas de Justiça de Transição, foi criada a Comisión para la Paz (COMPAZ) em 2000 (Kreft; Le Saux; Lauzán, 2011). A Ley de Caducidad foi discutida em dois plebiscitos (1989 e 2009), mas foi mantida. Esta lei foi investigada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que gerou a condenação do Estado uruguaio, no caso do desaparecimento de Maria Claudia Gelman (Kreft; Le Saux; Lauzán, 2011), o que gerou a sua anulação em 2011. Contudo, mesmo diante da impunidade persistente, as iniciativas por memória, verdade e justiça têm se multiplicado no país. Em 2018 foi promulgada a Lei nº 19.641 (Uruguai, 2018), uma legislação bastante avançada que cria e define sítios de memória da ditadura. A seguir, serão descritos o centro de compras Punta Carretas e o ex-SID (Servicio de Información de Defensa).
V.4.1. Punta Carretas Shopping
O Punta Carretas Shopping, na cidade de Montevideo, é um antigo presídio por onde passaram centenas de presos políticos da ditadura civil-militar uruguaia. Sua fachada foi mantida, mas seu interior foi transformado em um centro de compras. O complexo foi deixado abandonado por anos até que, em 1991, um consórcio privado o adquiriu e transformou as 384 celas em 170 lojas. Essa penitenciária, um dos símbolos do terrorismo de Estado uruguaio, foi convertida em um lugar de esquecimento e consumismo, um lugar de amnésia (Allier-Montaño, 2008). Contudo, em 2021 foi inaugurado o Memorial Penal Punta Carretas, com o nome das pessoas que foram ali detidas, situado na praça pública em frente ao centro de compras.
V.4.2. Ex-Servicio de Información de Defensa (SID)
O sítio de memória está situado em um amplo casarão, no Bulevar Artigas, em Montevidéu. O imóvel, durante a ditadura civil-militar uruguaia, foi sede do Servicio de Información de Defensa (SID), o principal órgão de repressão política do terrorismo de Estado no Uruguai. Em 1976, um grupo de uruguaios capturados na Argentina, no âmbito da Operação Condor, foram transferidos de Buenos Aires para Montevidéu e permaneceram sequestrados na sede do SID, onde sofreram torturas e, posteriormente, foram desaparecidos. Durante esse período, também foram mantidas em cativeiro pelo menos três crianças, filhos dos presos políticos, uma delas nascida no local. Hoje, o imóvel tombado abriga a instituição nacional de defesa dos direitos humanos e também um museu.
VI. Considerações Finais
O presente artigo procurou expor as principais características das batalhas pela memória das ditaduras civil-militares da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai. Nota-se que a patrimonialização de lugares é um importante instrumento de reconhecimento público, preservação e consolidação de políticas públicas de construção crítica da memória das ditaduras. Com efeito, trata-se de um processo político indispensável, previsto no âmbito da Justiça de Transição, para impulsionar a criação de instituições voltadas para a difusão de informações sobre as violações ocorridas no passado.
Ao longo deste trabalho, foram descritos e analisados casos de embates pela memória em quatro países do Cone Sul. Na Argentina, o complexo de prédios da Ex-ESMA foi salvo da demolição pela ação de organizações da sociedade civil e se tornou símbolo da construção da memória no país. A Casa Mariani-Terruggi é um caso de recuperação de lugar de memória implementado exclusivamente pela iniciativa privada e, posteriormente, reconhecido pelo poder público, através da patrimonialização.
No Brasil, muito embora o êxito na salvaguarda do edifício do Memorial da Resistência, o seu processo de tombamento se deu exclusivamente pelo valor arquitetônico e, atualmente, o espaço é dividido com um museu de arte, fato que instiga críticas e debates sobre o método como é trabalhada e difundida a memória nesse local. O antigo DOI-CODI paulista foi patrimonializado pelo poder público estadual, devido às pressões de segmentos da sociedade. No entanto, também por pressão de segmentos sociais antagônicos, que desejam o apagamento das marcas da violência do Estado, o espaço segue ocupado por uma delegacia de polícia. A Casa da Morte de Petrópolis, símbolo da perversidade do terrorismo de Estado brasileiro foi patrimonializada pelo município, mas teve seu processo de tombamento anulado judicialmente, o que levanta dúvidas sobre os rumos da construção da memória no país.
No Chile, o Londres 38 foi uma tentativa de apagamento pelos agentes da repressão, mas foi recuperado pela sociedade, oficializado pelo Estado e, atualmente, desenvolve papel importante para as pesquisas sobre o período. O Venda Sexy ou Discoteque, por sua vez, denota os esforços sociais, por meio do Estado, para se apropriar de um lugar de memória, mas que esbarraram em interesses privados. Igualmente, no Uruguai, o Punta Carretas Shopping foi completamente descaracterizado devido a interesses econômicos, mas a sociedade, por meio do Estado, conseguiu instalar um marco memorialístico em frente ao local, como forma de mitigar o apagamento perpetrado anteriormente. Finalmente, o Ex-SID evidencia um caso de lugar antes voltado para repressão que foi ressignificado para abrigar uma instituição de defesa dos direitos humanos.
Assim, como afirmou Winn (2014), a consolidação de políticas públicas de memória requer o estabelecimento da verdade, juntamente com a responsabilização dos agentes que praticaram atos repressivos e violências, que resultaram em traumas, mortes e desaparecimentos forçados. A democratização e a reparação não se completam sem a persecução penal dos agentes de Estado que violaram os direitos humanos. Esse processo é marcado por batalhas permanentes. No caso da memorialização, esses embates podem resultar em usos variados: de um lado, promover a conscientização, porém, de outro, fundamentar o negacionismo, promover o esquecimento, justificar os atos violentos (Huyssen, 2000). Outros aspectos negativos podem ser citados: o excesso de informação descontextualizada, por exemplo, pode confundir e promover interpretações equivocadas. A reificação do passado pode transformar os lugares de memória em lugares de turismo sombrio. A informação ofertada é consumida como mercadoria descontextualizada, distante, portanto, dos objetivos de ser um lugar de construção da memória sobre as atrocidades. Concretiza-se, assim, a transformação de lugares de memória política em locais de consumo de informações vazias de significado. Consuma-se, dessa forma, a alienação, a dicotomia entre aparência e realidade, aspecto inerente à mercadoria (Marx, 2017).
Os lugares de memória dos países do Cone Sul apresentados neste artigo são expressões dos embates e dos usos políticos da memória. Nesse contexto, as pesquisas acadêmicas sobre as ditaduras civil-militares têm tido papel importante para revelar fatos e informações “sensíveis” do passado traumático na região. Os passos a serem seguidos nas pesquisas estão traçados: a memória coletiva depositada nesses lugares, tanto quanto os vestígios materiais, devem ser submetidos aos procedimentos críticos e metodológicos, para transformá-los em fontes de conhecimento acessível ao público. Deve-se lembrar que os abusos de memória podem ocorrer pelo silenciamento seletivo ou forçado, pela repetição compulsória, pela manipulação ideológica, na forma de negacionismos e revisionismos. As diversas formas de abuso se transmutam em estratégias diretas de esquecimento. Cabe à pesquisa sobre a memória política enfrentar e neutralizar essas estratégias de apagamento.
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Notas
Autor notes