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“Os Homens Estruturam um Mundo Deles e para Eles”: A Violência Política de Gênero como Estratégia Ortodoxa de Reprodução do Campo Político
Letícia Figueira Moutinho Kulaitis
Letícia Figueira Moutinho Kulaitis
“Os Homens Estruturam um Mundo Deles e para Eles”: A Violência Política de Gênero como Estratégia Ortodoxa de Reprodução do Campo Político
“Men Structure a World of Their Own and for Them”: Gender-Based Political Violence as an Orthodox Strategy for Reproducing the Political Field
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 29, no. 1, e49152, 2024
Universidade Estadual de Londrina
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Resumo: No campo político, as mulheres são reconhecidas como agentes recém-chegadas. Na disputa pelo capital político, os homens produzem estratégias ortodoxas para manter o status quo. A violência política de gênero, incluindo constrangimentos físicos, morais, psicológicos e sexuais, busca limitar a participação das mulheres na política. Para contribuir com o debate sobre o fenômeno, foram analisadas histórias de violência política de gênero que indicam a materialização desta estratégia e seus efeitos nas trajetórias de mulheres sujeitas a opressões de gênero, raça e classe. Essa violência também prejudica a democracia, impedindo uma representação diversa e inclusiva. Mulheres, em posição marginal no campo político, podem subverter esse estado de coisas, conforme sugerido por Erika Hilton, deputada federal negra e transgênero, desafiando a ideia de que o mundo é exclusivamente masculino.

Palavras-chave: Violência política, gênero, campo político, interseccionalidade, democracia.

Abstract: In the political field, women are recognized as newly emerged agents. In the pursuit of political capital, men devise orthodox strategies to uphold the status quo. Gender-based political violence, encompassing physical, moral, psychological, and sexual constraints, aims to curtail women's participation in politics. To contribute to the debate on this issue, stories of political gender violence were highlighted, indicating the materialization of this strategy and its effects on the trajectories of women subject to gender, racial, and class oppression. This violence also undermines democracy by hindering diverse and inclusive representation. Occupying a marginal position in the political realm, women have the potential to subvert this state of affairs, as suggested by Erika Hilton, a black and transgender federal deputy, by challenging the notion that the world is exclusively male dominated.

Keywords: Political violence, gender, political field, intersectionality, democracy.

Carátula del artículo

DOSSIÊ – Mulheres e Política, e Políticas para Mulheres no Século XXI

“Os Homens Estruturam um Mundo Deles e para Eles”: A Violência Política de Gênero como Estratégia Ortodoxa de Reprodução do Campo Político

“Men Structure a World of Their Own and for Them”: Gender-Based Political Violence as an Orthodox Strategy for Reproducing the Political Field

Letícia Figueira Moutinho Kulaitis*
Universidade Estadual de Londrina, Brasil
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 29, no. 1, e49152, 2024
Universidade Estadual de Londrina

Received: 15 October 2023

Accepted: 20 December 2023

Published: 22 March 2024

Introdução

No dia 03 de agosto de 2023, durante o depoimento de José Rainha, líder da Frente Nacional de Luta Campo e Cidade, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), o presidente da CPI, deputado Luciano Lorenzini Zucco (Republicanos – RS) dirigiu-se à deputada Sâmia Bomfim, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL – SP) e perguntou se ela queria “[...] um calmante ou um hambúrguer para se acalmar” (Congresso em Foco, 2023).

Esse é apenas um exemplo recente do fenômeno tomado neste artigo como problema sociológico: a violência política de gênero como impedimento ao exercício da representação política, conceito central nos sistemas democráticos. São igualmente recentes a definição e o enfrentamento no campo jurídico do fenômeno da violência política de gênero2.

A deputada Sâmia Bomfim reagiu aos ataques misóginos que sofreu na CPI do MST e encorajou as demais deputadas: “[...] nunca calem a boca, nunca se intimidem, nunca abaixem a cabeça para machista nenhum” (Congresso em Foco, 2023). No entanto, apesar de sua postura combativa, o exemplo de Sâmia Bonfim demonstra como a condição de gênero é um desafio constitutivo no exercício de um mandato.

O gênero institui as relações sociais a partir das diferenças percebidas entre os sexos, e tais relações, em nossa sociedade, são marcadas pela distribuição desigual de poder entre homens e mulheres. Joan Scott explicitou que formas de pensar, agir e sentir são atribuídas como diferenças “naturais” às mulheres e aos homens, caracterizando, portanto, expressões culturais, papéis sociais femininos e masculinos (Scott, 1995).

Em diálogo com Pierre Bourdieu, Scott observa que,

Estabelecidos como um conjunto objetivo de referências, os conceitos de gênero estruturam a percepção e a organização concreta e simbólica de toda a vida social. Na medida em que essas referências estabelecem distribuições de poder (um controle ou um acesso diferencial aos recursos materiais e simbólicos), o gênero torna-se implicado na concepção e na construção do próprio poder

(Scott, 1995, p. 93).

Estabelece-se, assim, o que Bourdieu denomina de dominação masculina, uma violência simbólica, que é conhecida e reconhecida tanto por quem domina quanto por quem é dominado. Entretanto, este reconhecimento se dá na ordem daquilo que é “natural”, definido a partir de esquemas de percepção, de pensamento e ação (Bourdieu, 2002, p. 17).

A questão apontada por Scott (1995) e Bourdieu (2002) é que o que reconhecemos como “natureza” do gênero feminino ou do gênero masculino são construções sociais. As posições e disposições percebidas como natureza produzem efeitos em toda a vida social.

O campo político apresenta-se na sociedade brasileira como um espaço predominantemente masculino, mais especificamente como “[...] lugar do privilégio masculino cis heteronormativo e branco, um lugar reservado na política formal/estatal” (Matos, 2022, p. 210). Embora tenha autonomia para constituir suas regras e dinâmicas, o campo político é enraizado em um contexto social mais amplo. Os agentes que nele interagem e buscam acumular capital político reproduzem esquemas de percepção, de pensamento e de ação constituídos, por sua vez, em uma estrutura social atravessada pelo patriarcalismo e pelo racismo.

A violência política de gênero, portanto, pode ser considerada como instrumento de obstrução de acúmulo de capital político, pois é uma

[...] forma de controle e disciplinamento do acesso e permanência das mulheres no campo político parlamentar (das mulheres negras e indígenas e, enfim, de todas as formas de pertencimento social que trazem marcas que não são masculinas, brancas e cis heteronormativas) [...]

(Matos, 2022, p. 201).

Sem igualdade de gênero não há, por sua vez, a realização da democracia como regime político que garante a igualdade de participação, seja direta ou através de representantes eleitos. A violência política de gênero apresenta-se como instrumento de ruptura com a democracia em contextos neoconservadores (Biroli, 2020).

Ao tomar a violência política de gênero como problema sociológico, o presente artigo objetiva contribuir para o debate sobre o fenômeno, explicitar sua operacionalização como estratégia “ortodoxa” de manutenção do status quo no campo político e caracterizar sua realização como entrave à participação de mulheres na vida política e à promoção da agenda da igualdade de gênero.

Os termos “heterodoxo” e “ortodoxo” são frequentemente utilizados para descrever abordagens, teorias ou pensamentos que diferem em relação ao mainstream ou à visão predominante em um determinado campo. No campo político, observa-se que a ortodoxia ou visão predominante é de que a política é uma atividade de domínio masculino. Sendo assim, a existência de mulheres parlamentares no campo político é percebida como um questionamento ou desafio de suas estruturas tradicionais. O exercício da atividade política pelas mulheres resulta na ampliação da diversidade de pensamento e de perspectivas no campo e desafia as normas estabelecidas, constituindo-se, portanto, como potencial estratégia de ruptura com a ortodoxia.

Para tanto, o texto foi dividido em três pontos. O primeiro trata dos avanços legislativos que buscaram, nos termos de Biroli (2020, p. 143), “generificar” o regime democrático brasileiro em contraste com a posição subalternizada ocupada por mulheres no campo político como recém-chegadas e, por fim, a sub-representação de mulheres nos espaços democráticos de poder e tomada de decisão. O segundo analisa como a violência política de gênero atravessou, com significativa influência do campo jornalístico, a trajetória da primeira mulher a exercer o cargo de presidenta da República, da campanha eleitoral ao golpe que a destituiu.  O terceiro apresenta histórias de violência política de gênero que a materializam e evidenciam os efeitos produzidos nas trajetórias sociais das mulheres que ingressaram no campo político.

As histórias de violência política de gênero abordam a trajetória de oito mulheres, Dilma Rousseff, Marielle Franco, Manuela D'Ávila, Érika Hilton, Áurea Carolina, Bruna Rodrigues, Daiana Santos e Benedita da Silva, ao longo de um período que tem início com a Assembleia Constituinte no final da década de 1980 e se estende até 2022. Tais histórias foram selecionadas a partir da leitura dos relatos biográficos presentes na obra Sempre foi sobre nós, organizada por Manuela D'Ávila e publicada em 2022. As trajetórias foram escolhidas por conta da diversidade de violências que exemplificam e por conta dos diferentes momentos em que tais violências se manifestaram.

Reações à Pressão por “Generificar” o Campo Político: Violência e Sub-Representação

A violência política de gênero é um fenômeno global3 marcado pela perpetração de atos violentos, abusivos e discriminatórios, com base na desigualdade de gênero, que são direcionados a mulheres que participam da vida política como eleitoras, candidatas, filiadas de partidos políticos, ativistas e líderes comunitárias em diferentes tempos e espaços.

No contexto brasileiro, a ruptura do domínio masculino sobre o exercício do poder político foi recente em tempo sócio-histórico. Em 1932, com a aprovação do novo Código Eleitoral, as mulheres puderam exercer o direito ao voto. A universalização do voto foi condição estabelecida pela Constituição de 1946 e reafirmada pelo Código Eleitoral de 1965 (Brasil, 2013).

Da conquista do direito ao voto feminino, do direito de mulheres serem eleitas para cargos públicos, da igualdade jurídica, proposta pela Constituição de 1988, seguiram-se avanços legislativos como a Lei 12.034/2009 (Brasil, 2009), que alterou o conjunto de leis das Eleições4, determinando a reserva de vagas de candidaturas por gênero (no mínimo 30% para um e no máximo 70% para o outro), e a Lei 13.165/2015 (Brasil, 2015) que objetiva incentivar a participação de mulheres candidatas na propaganda eleitoral. Tais avanços representaram respostas à pressão social por “generificar as democracias ainda que esse tinha sido igualmente um período [entre 1970 e os anos 2000] de reações” (Biroli, 2020, p. 143).

À medida que surgiam progressos legislativos que buscavam promover a presença das mulheres na esfera política, também eram realizados esforços para dificultar sua participação. Sobre os obstáculos enfrentados pelas mulheres no campo político, Miguel (2014, p. 105) apontou que

O acesso a posições formais na estrutura de poder não significa que se esteja, automaticamente, em posição de igualdade em relação a outros agentes que lá se encontram. A política se organiza na forma de um ‘campo’, no sentido atribuído ao termo pela sociologia de Pierre Bourdieu. É um espaço social estruturado, que possui uma hierarquia interna própria e que exige, dos agentes que nele ingressam, a aceitação de determinada lógica e de certos padrões de comportamento, sob pena de serem marginalizados. Constituído historicamente como um ambiente masculino, o campo político trabalha contra as mulheres (bem como os integrantes de outros grupos em posição de subalternidade), impondo a elas maiores obstáculos para que cheguem às posições de maior prestígio e influência, mesmo depois de terem alcançado cargos por meio do voto.

No campo político, as mulheres são reconhecidas como agentes recém-chegadas. Na disputa pelo capital político, os homens produzem estratégias ortodoxas para reprodução do status quo que os favorece, ou seja, que garante sua posição como dominante. A posição ocupada pelas mulheres é, portanto, marginal, atravessada pela subalternidade, cabendo a elas como estratégia heterodoxa a subversão do estado de coisas vigente (Peters, 2020).

A violência política de gênero se apresenta como estratégia ortodoxa de manutenção do campo político dado que a atuação política de mulheres é percebida como ameaça à ordem de gênero estabelecida. Suas múltiplas expressões resultam da fragilidade das instituições democráticas e da ausência ou ineficácia de medidas de proteção.

No campo político brasileiro, o período eleitoral se apresenta como um momento em que a violência política se agudiza (Instituto Marielle Franco, 2020). Na campanha eleitoral, as mulheres são submetidas a injúrias, difamação, desqualificação, insultos, discriminação, destruição de seu material de campanha, assédio.

Sobre a disputa eleitoral, Manuela D'Ávila, filiada ao Partido Comunista do Brasil (PC do B – RS), observou que “É impossível que uma de nós aceite disputar sem pensar em todas as maneiras como será violentada durante o processo. Será sobre o corpo? A vida afetiva e a sexualidade? Serão as suas crianças ameaçadas?” (D'Ávila, 2022a, p. 9-10). Por diversas vezes, as agressões sofridas por Manuela estenderam-se a seus familiares. Sua filha, recém-nascida, foi fisicamente agredida por uma eleitora, em seu colo. Seu marido foi hostilizado por eleitores do candidato oponente (D'Ávila, 2022a).

Depois de concorrer por sete vezes a cargos públicos, Manuela evidenciou que, ao enfrentar um processo eleitoral, as mulheres têm suas vidas privadas atravessadas pela violência desde o início de suas campanhas:

É como se a nós, mulheres, fosse imposto, para seguirmos na vida pública, ter uma vida como a cigarra imortalizada por Mercedes Sosa, cantando ao sol depois de um ano embaixo da terra, como sobreviventes de uma guerra que não decidimos travar. Nós optamos pela vida pública, não por uma prova de resistência física e emocional sobre nossa vida privada

(D'Ávila, 2022a, p. 11).

As redes de disseminação de fake news são responsáveis por submeter as mulheres candidatas à prova de resistência física e emocional a que se referiu Manuela. Em suas campanhas, o fenômeno surgiu a partir de 2014:

E então, entre 2014 e 2020, tornei-me um dos alvos preferenciais das máquinas de destruição de reputação de mulheres. ‘Colhi os frutos’ dessa destruição permanente e continuada nas eleições de 2018, quando todos os atributos negativos construídos a meu respeito foram utilizados ao mesmo tempo: a Manuela ‘hipócrita’, que defendia o socialismo mas fazia enxoval milionário em Miami; a Manuela ‘drogada’, com tatuagens horrorosas e olheiras profundas; a Manuela ‘vagabunda’, que tinha fotos (falsas) nua circulando por aí; a Manuela ‘ardilosa’, que articulava o assassinato do seu adversário; a Manuela que manifestava ora uma fé, ora outra, em montagens e edições exibidas inclusive em canais televisivos

(D'Ávila, 2022b, p. 127-128).

Os atos e ameaças de violência política de gênero, como a disseminação de fake news, objetivam impedir que candidatas persistam na disputa. Por vezes, o objetivo é, após o processo eleitoral, forçar a renúncia de mulheres que se consagrem vitoriosas no processo eleitoral.

Nas eleições presidenciais de 2014, dois dias antes da vitória de Dilma Rousseff nas urnas, seu impeachment foi anunciado como inevitável por um colunista do jornal O Globo (Rousseff, 2022, p. 66). Para ele, sua vitória deveria, de algum modo, significar uma derrota. Intensificava-se, com a vitória de Dilma em 2014, a violência política de gênero exercida pelo aparato midiático com vistas a desqualificar e interditar sua atuação no campo político.

A campanha iniciada pelo jornalista após a eleição tinha, segundo Dilma, “[...] o objetivo de influenciar, controlar, distorcer e, enfim, dominar a visão da sociedade sobre mim e o meu governo, propiciando a ruptura institucional do golpe de 2016, com o suporte específico da misoginia” (Rousseff, 2022, p. 58).

A violência política de gênero é, portanto, legitimada por sua naturalização como parte do processo eleitoral. Por outro lado, o exemplo do clamor na mídia pelo impeachment de Dilma em 2014 demonstra que o campo político, com a cumplicidade tácita do campo jornalístico, produz legitimidade com vistas a regular as relações sociais e garantir a reprodução social. Para tanto, utilizam como recurso o poder que lhes foi assegurado de nomear e criar realidade: “Nomear, como se sabe, é fazer ver, é criar, levar à existência” (Bourdieu, 1997, p. 26).

A naturalização da violência torna-se manifesta quando se observa que parte significativa da violência política sofrida pelas mulheres no processo eleitoral é institucionalizada, ou seja, ocorre na relação estabelecida entre mulheres e os partidos políticos. Nesse contexto, os partidos dificultam a formalização de candidaturas femininas; obrigam as mulheres a se candidatar a vagas que não apresentam chances reais de vitória no pleito eleitoral ou as convocam a exercer um papel secundário em chapas lideradas por candidatos homens (ONU Mulheres, 2021).

Em julho de 2022, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou as estatísticas acerca do perfil do eleitorado brasileiro. As mulheres eram, na ocasião, “a maioria das pessoas aptas a votar nas Eleições 2022” (Brasil, 2022), totalizando 52,65% do eleitorado. Em uma democracia representativa, as mulheres deveriam ter a oportunidade de ser representadas ou de participar ativamente da vida política.

No entanto, os resultados das últimas eleições realizadas no país explicitam a sub-representação de mulheres nos espaços democráticos de poder e tomada de decisão. De modo geral, o Brasil ocupa a 133ª posição em ranking sobre a participação de mulheres no Parlamento. Do total de integrantes do Parlamento, 17,5% são mulheres (Brasil, 2023).

Os dados apresentados pela plataforma TSE Mulheres atestam o não reconhecimento das mulheres como representantes legítimas do campo político. Até o momento, os esforços empreendidos para manter o status quo têm obstaculizado a realização da agenda de igualdade de gênero, reproduzindo o desequilíbrio de poder entre homens e mulheres no campo político. 

Nesse contexto, o processo democrático sofre com os efeitos produzidos pela violência política de gênero: “A violência política é uma ferida aberta no coração de todo projeto democrático” (Matos, 2022, p. 209) dado que “[...] estes [Estados democráticos] discriminam e invisibilizam as demandas das mulheres, refletindo, mais uma vez, processos frágeis e inacabados de consolidação democrática” (Matos, 2022, p. 209).

No balanço entre os avanços legislativos e os efeitos produzidos pela violência política de gênero, como estratégia ortodoxa de manutenção do campo político, observa-se que o texto jurídico, em seu conjunto, não foi capaz de “generificar” a democracia, legitimando as mulheres como agentes políticas.

Nesse sentido, Bourdieu (2011, p. 163) sublinhou que,

[...] na luta pela imposição da visão legítima do mundo social, os detentores de uma autoridade burocrática nunca obtêm um monopólio absoluto […]. De fato, sempre existem, numa sociedade, conflitos entre poderes simbólicos que visam impor a visão das divisões legítimas, isto é, construir grupos. O poder simbólico, nesse sentido, é um poder de worldmaking.

A sub-representação das mulheres nos cargos no Executivo e no Legislativo e a naturalização da violência política de gênero indicam que a democracia brasileira perde sua capacidade de representatividade e inclusão diante da imposição simbólica violenta do campo político como espaço masculino. 

Da Primeira Presidenta ao Golpe Misógino: A Homologia de Posições e Disposições no Campo Político e no Campo Jornalístico

Passados 78 anos da conquista do voto feminino no sistema, o cargo de presidente da República é ocupado pela primeira vez, no sistema político brasileiro, por uma mulher. Dilma Vana Rousseff, eleita pelo Partido dos Trabalhadores (RS), assumiu a Presidência da República em 1º de janeiro de 2011, sendo reconduzida ao cargo em 2014. O segundo mandato foi interrompido em 31 de agosto de 2016 por conta de um processo de impeachment.

Dilma foi julgada por um “crime de responsabilidade” que deixou de existir imediatamente após seu julgamento, o que reforça a substituição da expressão processo de impeachment por golpe parlamentar5. Sobre o processo de impeachment, Dilma registrou:

O Senado Federal tomou uma decisão que entra para a história das grandes injustiças. Os senadores que votaram pelo impeachment escolheram rasgar a Constituição Federal. Decidiram pela interrupção do mandato de uma presidenta que não cometeu crime de responsabilidade. Condenaram uma inocente e consumaram um golpe parlamentar

(Rousseff, 2023).

Retoma-se, nesse ponto, a proposição de Bourdieu quanto à capacidade de produzir, ou melhor, de instituir significado como um poder exercido pelas instituições:

O poder constituinte da linguagem (religiosa ou política) e dos esquemas de percepção e de pensamento que ele concede, nunca é tão visível como nas situações de crise: essas situações paradoxais, extraordinárias, requerem um discurso extraordinário, capaz de pôr ao nível dos princípios explícitos, geradores de respostas (quase) sistemáticas, os princípios práticos do ethos e de exprimir tudo o que a situação criada pela crise pode ter de inaudito, de inefável

(Bourdieu, 1998, p. 137).

A crise econômica de 2014 (Barbosa Filho, 2017) possibilitou a criação do real por meio da linguagem instituída. A definição de um crime de responsabilidade tornou-se real e deixou de sê-lo quando uma mulher foi destituída do exercício da Presidência da República. O golpe parlamentar foi o ápice da misoginia sofrida por Dilma Rousseff. 

Entretanto, as questões de gênero atravessaram sua trajetória política desde os primeiros cargos públicos ocupados no governo de Luís Inácio Lula da Silva. Economista, chefiou duas pastas no governo Lula: Ministério de Minas e Energia e Casa Civil. Em seguida, lançou-se candidata e elegeu-se presidenta da República no ano de 2010 e foi candidata à reeleição em 2014.

Pesquisas sobre a cobertura pela imprensa da campanha eleitoral de 2014 em que Dilma Rousseff enfrentava Aécio Neves (PSDB – MG) indicavam a manipulação dos fatos pela mídia e a misoginia como um padrão, um modus operandi. Um exemplo é a pesquisa realizada pela linguista Letícia Sallorenzo (2018) que “[...] analisou 340 manchetes e títulos dos jornais o Globo e Folha de São Paulo nas quatro semanas finais da campanha do segundo turno, e identificou também forte conteúdo misógino na escolha das palavras e na sintaxe dos títulos” (Rousseff, 2022, p. 62).

De uma campanha marcada pela violência misógina para um cotidiano igualmente violento, marcado pelo questionamento de sua competência, de sua forma física, de seu temperamento, de seu discurso, enfim, uma investigação minuciosa de sua capacidade de governar o país, observa-se que Dilma Rousseff moveu-se da luta para eleger-se à luta para governar.

A imprensa realizou diversos ataques à presidenta utilizando como recurso a escolha de imagens que a identificassem como uma mulher incapaz de controlar suas emoções e que tratava seus subordinados com desrespeito e truculência. A construção desta personalidade a caracterizava como alguém inapta para governar o país.

Dilma Rousseff relembrou dois episódios em que foi atacada violentamente pela imprensa. O primeiro deles realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo6:

Uma foto publicada no Estadão, na cerimônia de lançamento da pira olímpica, exibe uma sobreposição de imagens que cria a ilusão de ótica segundo a qual a minha cabeça estaria em meio a chamas. A imagem fazia lembrar os mais atentos a condenação a que eram submetidas, na Idade Média, as mulheres acusadas de bruxaria, por afrontar os dogmas e a servidão feminina impostos por um mundo em que apenas os homens, da aristocracia e do clero, mandavam e tinham direitos

(Rousseff, 2022, p. 68).

No segundo episódio, matéria de capa da Revista Isto É, na edição nº 2.4177 em abril de 2016, uma foto da presidenta é retirada de contexto e textos no editorial e em coluna da revista a apresentam como uma mulher “irascível”, “agressiva” e em “crise” (Pardellas; Bergamasco, 2016). Dilma se posicionou sobre a utilização indevida de sua imagem:

A imagem da capa era uma fraude para sustentar o insulto: uma foto em que eu gritava, de fato, comemorando em um estádio um gol da seleção brasileira, e que, cortada em close no meu rosto, fazia com que parecesse uma reação histérica de descontrole em outro ambiente

(Rousseff, 2022, p. 69).

Na mesma edição da Isto É, o editorial intitulado “Hora da xepa no Planalto”, assinado por Carlos José Marques, diretor editorial, compara o Palácio do Planalto, local onde Dilma Rousseff exercia as atividades de seu cargo público, a uma casa de tolerância, ou seja, a um local em que a atividade exercida é de prostituição (Marques, 2016).

Embora sejam comuns críticas às decisões político-administrativas tomadas por quem ocupa cargos eletivos, no caso das mulheres tais críticas são carregadas de conteúdos misóginos:

Se falar ou não presidenta não demonstra necessariamente misoginia, as interpelações feitas à Dilma ao criticá-la são mais sintomáticas: muitas pessoas, ao se referirem a ela, utilizam interpelações como puta, vadia, feia e bruxa. Ora, algum político brasileiro, desses “com o saco roxo”, e também alvo de controvérsias e/ou críticas políticas acaso seria chamado de puto, vadio, bruxo ou feio ao sofrerem críticas?

(Zdebskyi; Maranhão; Pedro, 2015, p. 230).

É importante apontar que, definidos como microcosmos sociais relativamente autônomos, espaços de relações objetivas que são o lugar de uma lógica e de uma necessidade específicas e irredutíveis às que regem outros campos (Bourdieu, 1992, p. 72), os campos político e jornalístico apresentam, no contexto brasileiro, homologias de posições, entre os agentes dominantes, quanto à reprodução do patriarcalismo.

Ao analisar a relação entre os dois campos, Miguel (2002, p. 162) ressaltou que

Alguns poucos monopolizam a capacidade de intervir no campo político – exatamente porque os outros internalizam a própria impotência e oferecem o reconhecimento de que aqueles poucos são os “líderes”. Se o reconhecimento social é a chave da conquista do capital político, avulta a importância da mídia, principal difusora do prestígio e do reconhecimento social nas sociedades contemporâneas.

Há, portanto, uma desigualdade de representação, que tem origem na distribuição desigual do capital político, nas informações e imagens produzidas e veiculadas pelo campo jornalístico. A ausência de “voz” na mídia afeta a democracia (Miguel, 2002).

Dilma Rousseff foi firme ao insistir na utilização do termo “presidenta”, mas foi chamada de querida por diversos deputados que se despediam dela expondo sua misoginia durante a votação do processo de impeachment que levou o vice-presidente Michel Temer (PMDB – SP) ao poder. Dilma refletiu sobre as palavras que a ela foram dirigidas e suas consequências para o futuro do país:

Tal ressentimento [o ódio misógino] já havia sido copiosamente exibido na infame sessão plenária da Câmara que deu andamento ao impeachment. Foi ali que, em meio a tantas manifestações grosseiras e abjetas, um deputado do baixo clero cometeu a ignomínia de prestar homenagem ao homem que, segundo ele, foi o meu ‘terror’ porque teria me torturado durante a minha prisão na ditadura militar. O deputado não foi punido por isso e não foi rechaçado pela mídia com a devida seriedade. Pelo contrário, dois anos depois, saltou do papel de defensor de torturador em plenário para presidente da República eleito, sob o obsequioso apoio, explícito ou implícito, da imprensa. Não pelo que ele era, pois todos sabiam o que ele era, mas pelo que ele representava, como aposta do mercado e do neoliberalismo

(Rousseff, 2022, p. 68).

A presidenta usou seu poder para fortalecer o papel das mulheres na política brasileira, agindo para expandir e consolidar as várias políticas estabelecidas no governo Luís Inácio Lula da Silva para explicitamente favorecer mulheres. No início de seu primeiro mandato, nove das 37 pastas foram chefiadas por mulheres, um número que foi aumentando ao longo de sua gestão. Ao final de seu governo, Dilma havia nomeado 18 mulheres ministras, o maior número já registrado no país (Pagliarini, 2021).

Dilma Rousseff foi impedida de seguir com seu 2º mandato.  O afastamento, em definitivo, da primeira presidenta da República brasileira no dia 31 de agosto de 2016 representou também o afastamento de 18 mulheres ministras e representaria, mais tarde, a perda do status de ministério da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres e o consequente contingenciamento dos recursos da pasta (Lindner, 2020). Como observa Dilma,

Desfechado o golpe, a foto oficial do ministério nomeado pelo golpista-chefe, Michel Temer, é praticamente um retrato da ordem misógina: um numeroso grupo de homens, exclusivamente, e não por acaso, também, todos brancos, nenhum deles jovens, sucedendo o governo de uma mulher, num período no qual houvera crescido a participação feminina na política, em postos de poder e direitos. Claramente, o tablado em que se exibiam era o pódio da vitória do patriarcado neoliberal

(Rousseff, 2022, p. 67).

O governo Temer foi seguido por um governo identificado com a misoginia como estratégia política. O campo político brasileiro, com a destituição da primeira presidenta eleita democraticamente, retornava ao estado de coisas reconhecido como legítimo por seu grupo dominante. 

As Eleições de 2018 e o Recrudescimento da Violência de Gênero: Ele, Não!

O ano de 2018 foi marcado por um ato de violência política de gênero brutal. No dia 14 de março, a vereadora Marielle Franco (PSOL – RJ) e o motorista Anderson Gomes foram assassinados ao sair da Casa das Pretas, no Rio de Janeiro. O crime, embora tenha mobilizado manifestações internacionais por justiça, permanece com sua investigação inconclusa.

Para Anielle Franco8 (2022, p. 13), “[...] o assassinato de Marielle e Anderson expôs ao mundo as rachaduras estruturais presentes na frágil democracia brasileira”. A violência política de gênero apresentou-se como uma realidade que não podia mais ser negada e invisibilizada. 

Eleita em 2016 pelo Partido Socialismo e Liberdade, Marielle Franco apresentou-se na campanha como uma mulher negra, “cria da comunidade da Maré” e lésbica, e foi a quinta vereadora mais votada do município. 

Marielle ficou conhecida por seus discursos assertivos na tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro e pelo enfrentamento da misoginia no campo político. Em um dos mais difundidos, em 08 de março de 2018, ao ser interrompida pelo vereador Ítalo Ciba, que lhe entregou uma flor, ela afirmou: “Não vem me interromper agora, não é? Homem fazendo ‘homice’. Meu Deus do céu. Obrigada, Ítalo. Muito obrigada! Amém. Obrigada” (Franco, 2018).

Ao ser interrompida novamente, desta vez por um cidadão na galeria, ela retomou seu discurso e marcou uma posição firme: Não seria interrompida!

[...] Tem um senhor que está defendendo a ditadura e falando alguma coisa contrária? É isso? Eu peço que a Presidência da Casa, no caso de maiores manifestações que venham a atrapalhar minha fala, proceda como fazemos quando a Galeria interrompe qualquer vereador. Não serei interrompida, não aturo interrupção dos vereadores desta Casa, não aturarei de um cidadão que vem aqui e não sabe ouvir a posição de uma mulher eleita Presidente da Comissão da Mulher nesta Casa. [...] Não será a última nem a primeira vez, mas o embate, para quem vem da favela, e minha fala estava falando da violência contra as mulheres, nesses 20 minutos. Nós somos violadas e violentadas há muito tempo, em muitos momentos

(Franco, 2018).

No mesmo ano em que perderam Marielle Franco, lideranças políticas femininas e feministas tiveram que ir às ruas para lutar contra a eleição de um candidato que colocava em risco “[...] os fundamentos da agenda da igualdade de gênero em conjunto com os fundamentos da democracia e do Estado de direito” (Biroli, 2020, p. 137).

As declarações misóginas do então candidato à presidência Jair Bolsonaro levaram às ruas milhares de pessoas em manifestações lideradas por mulheres que objetivavam protestar contra a postura machista, racista, homofóbica e antidemocrática do candidato. O símbolo das manifestações foi a hashtag “elenão” utilizada nas redes sociais.

Na agenda do candidato, a “defesa da família” e a luta contra a “ideologia de gênero” são propostas características dos processos de erosão da democracia, como observou Biroli (2020, p. 136-137):

As campanhas contra o gênero colaboram para a erosão das democracias na medida em que comprometem valores e requisitos institucionais fundamentais como pluralidade, laicidade, proteção a minorias, direito à livre expressão e à oposição. A segunda razão é que elas têm servido para legitimar alternativas e lideranças autoritárias em tempos de antipolítica. A “defesa da família” tem justificado restrições a direitos, naturalizado desigualdades e colocado em xeque mesmo legislações e políticas que visam garantir a integridade física de mulheres e pessoas LGBTQI.

Ao lutar contra a misoginia que se ocultava na agenda em “defesa da família”, as mulheres seguiriam sendo interrompidas. Durante o processo eleitoral, o programa de entrevista Roda Viva da TV Cultura, de São Paulo, recebeu pré-candidatos à presidência:

[...] Durante a participação que durou, aproximadamente, 90 minutos, [Manuela] D'Ávila teve a sua fala interrompida 62 vezes pelos entrevistadores, enquanto os também pré-candidatos Ciro Gomes e Guilherme Boulos tiveram, respectivamente, 8 e 12 interrupções. A discrepância foi tão grande que até a ex-presidenta da república, Dilma Rousseff, se pronunciou sobre o caso. Em nota, Rousseff manifestou sua integral solidariedade à Manuela pelos ataques machistas e misóginos

(Coelho; Volotão, 2020, p. 161).

A nota redigida por Dilma e publicada na página do PC do B na internet, partido de Manuela D'Ávila, destaca que a pré-candidata saiu do Programa “[...] engrandecida, como política e como mulher” (Rousseff, 2018).

O recrudescimento da violência política de gênero no Brasil atrelou-se, então, a um contexto internacional atravessado, por sua vez, pelo neoconservadorismo. No cerne da agenda neoconservadora, a ênfase recaía sobre a oposição à “ideologia de gênero”, conforme observado por Biroli (2020, p. 136):

De que modo a erosão das democracias, que vem sendo definida como um processo de desdemocratização, se conecta com as reações neoconservadoras à igualdade de gênero e à diversidade sexual? Como explicar o fato de que, em diversas partes do mundo, lideranças de extrema direita ou descritas como populistas tragam para o centro de sua agenda a cruzada contra a ‘ideologia de gênero’?

Ela responde:

O antagonismo de que tratamos implica mais do que visões distintas em disputa. De um lado, a agenda de direitos é referenciada pelo pluralismo ético; de outro, a defesa da família e de uma ordem sexual com base nos valores cristãos é fundada em concepções morais unitárias

(Biroli, 2020, p. 136-137).

Ao tomar a frente da agenda de direitos, em um contexto atravessado por tendências liberais, as mulheres tornam-se o alvo da “cruzada contra a ideologia de gênero” e encontram-se expostas à violência que se apresenta especificamente direcionadas a elas no campo político.

A guerra contra a ‘ideologia de gênero’ respalda a oposição mais ampla aos direitos das mulheres e de pessoas LGBTQI como direitos humanos e à igualdade de gênero como uma dimensão da cidadania nas democracias. A imagem do feminismo como inimigo também é importante para compreendermos como se constrói a ideia de que os direitos das mulheres e de pessoas LGBTQI são promovidos por uma minoria que estaria distanciada das tradições nacionais e dos interesses do “povo”. É sobre essas duas questões – o escopo e a política do inimigo

(Biroli, 2020, p. 162-163).

Apesar de todos os esforços empreendidos pelas mulheres, Bolsonaro foi eleito presidente em 29 de outubro de 2018, derrotando no segundo turno a chapa formada por Fernando Haddad (PT) e Manuela D'Ávila (PSOL). A partir de então, o campo político foi dominado por um grupo político em que, como expresso em seu discurso e seus atos, a misoginia constituía-se em modus operandi e posições de poder:

O atual momento político brasileiro [governo Bolsonaro], especialmente cruel e perverso com as mulheres em geral, e ainda mais com as mulheres políticas (candidatas e ou eleitas), tem um papel especial no agravamento desse cenário. Sob os efeitos de uma política genocida, de um projeto de necropoder, que ocupou o governo brasileiro, para o qual algumas vidas são perfeitamente descartáveis, a violência política contra a mulher tem se naturalizado e vem rapidamente se transformando na linguagem da desdemocratização no Brasil

(Matos, 2022, p. 216).

É importante ressaltar que os efeitos produzidos pela violência política de gênero não são vivenciados pelas mulheres parlamentares do mesmo modo. Existem opressões que se intercruzam, e, desse modo, mulheres negras, indígenas e pessoas LGBTQIA+ que vivenciam ativamente o exercício da atividade política sofrem múltiplas discriminações.

Em uma perspectiva interseccional, desigualdades de poder, racismo, sexismo e classismo se intercruzam e atravessam os corpos de mulheres negras que, assim como Marielle Franco, desafiam o campo político e representam outras mulheres igualmente pobres e racializadas.

A interseccionalidade, importante perspectiva teórica e política, constituída pelo feminismo negro, é definida como metáfora de avenidas que se cruzam. Nas palavras de Kimberlé Crenshaw:

Utilizando uma metáfora de intersecção, faremos inicialmente uma analogia em que os vários eixos de poder, isto é, raça, etnia, gênero e classe constituem as avenidas que estruturam os terrenos sociais, econômicos e políticos. É através delas que as dinâmicas do desempoderamento se movem

(Crenshaw, 2002, p. 177).

É a partir desta perspectiva que se torna possível a análise de um contexto no qual o aumento da violência política de gênero foi também proporcional à visibilidade que as mulheres negras, oriundas de comunidades periféricas e pessoas LGBTQIA+ alcançaram para seus projetos e opiniões no campo político.

Erika Hilton (PSOL – SP) foi a primeira vereadora negra e transvestigênere de São Paulo, conquistando a posição de vereadora mais votada do país em 2020, e a primeira deputada federal trans na Câmara de Deputados.

Em seu mandato como vereadora, um homem que a perseguia e a ameaçava na internet foi retirado pela segurança ao invadir seu gabinete (Hilton, 2022, p. 17). A violência política de gênero manifesta-se, segundo Erika Hilton, de inúmeras formas. Outro exemplo de sua expressão é o fato de as mulheres serem preteridas nas comissões formadas na Câmara. Nas diferentes expressões encontra-se uma motivação e um objetivo comum, o incômodo com a presença das mulheres no campo político e o propósito de obstaculizar o exercício da representação política:

Se de fato fôssemos menos capazes, se realmente não entendêssemos nada de política, se não tivéssemos nada para contribuir com o debate social, certamente não haveria motivo para tanto pavor e incômodo. Mas é justamente o contrário. É justamente pelo fato de saberem que somos capazes de discutir o orçamento das cidades, dos estados e do país que podemos falar sobre saúde, cultura, educação ou qualquer outro tema relevante e que impacte a vida das pessoas, é por isso que eles ficam em pânico e querem nos tirar, a qualquer custo, da vida política. Trata-se, evidentemente, de uma recusa em dividir o poder. Com exceção das antigas e de algumas contemporâneas sociedades matriarcais, os homens estruturam um mundo deles e para eles, nos quais devemos ser coadjuvantes num roteiro escrito por eles. Nem preciso dizer o quanto isso é delirante. E que nossa presença na política institucional atrapalha essa fantasia

(Hilton, 2022, p. 19).

O fato é que, por diversas vezes, a violência política mostra-se eficaz ao atingir seu objetivo. Um exemplo é a trajetória da cientista social e educadora popular Áurea Carolina.

Eleita deputada federal pelo PSOL (MG), Áurea definiu-se como defensora “[...] das causas das mulheres, da negritude, das juventudes, dos povos e comunidades tradicionais e das pessoas que vivem nas periferias” (Carolina, 2022, p. 26); considerava que “é ‘normal’ ser alvo de agressões e críticas desqualificadoras. [...] Na atual conjuntura, a violência vem no pacote como ingrediente básico” (Carolina, 2022, p. 26). A conjuntura a que Áurea se refere foi a eleição de um perpetrador de violência política de gênero à Presidência da República9.

Quando exerceu o mandato de vereadora na cidade de Belo Horizonte, Áurea relata ter enfrentado piadas sexistas, comentários sobre seu cabelo, suas roupas e tatuagens, perguntas e insinuações sobre sua vida privada. Constantemente seus colegas de vereança a chamavam de “menina”.

Na Câmara de Deputados, sofreu assédio sexual; em sua percepção, a violência política de gênero, em suas múltiplas expressões, apresenta-se como “[...] um dispositivo capaz de eliminar a nossa presença nos espaços de poder” (Carolina, 2022, p. 30).

O exercício da representação política era motivo de satisfação para Áurea Carolina, e o suporte de sua equipe lhe permitia cumprir seu papel de “[...] agente na institucionalidade a serviço das lutas populares” (Carolina, 2022, p. 26).

Em sua trajetória como deputada federal, Áurea Carolina integrou a Gabinetona10, mandato coletivo que teve início em 2017 e reuniu ainda Cida Falabella (PSOL – MG), Bella Gonçalves (PSOL – MG), vereadoras em Belo Horizonte, e Andréia de Jesus (PT – MG), deputada estadual na Assembleia de Minas Gerais. Nem mesmo a frente feminista formada por parlamentares, experiência inédita até então, foi capaz de encorajar Áurea a seguir em frente na política.

Ao fim de seu mandato, ela optou por não disputar a reeleição e apoiou a candidatura de Célia Xakriabá, que atuou em sua assessoria parlamentar. Célia foi eleita a primeira deputada federal indígena por Minas Gerais. Em depoimento à Revista Piauí, Áurea contou que “Acabou o mandato, e comemorei como Galvão Bueno na Copa de 94” (Carolina, 2023).

No campo político, Áurea Carolina, em sua condição de mulher negra e de origem periférica, foi posta diante da misoginia, do racismo e da discriminação de classe social dado que

A história de contradições, em que classe, raça e gênero constituem padrões seletivos que limitam regras, práticas e valores democráticos, por sua vez, remete às disputas em torno do sentido da democracia, em espaços institucionais e não institucionais

(Biroli, 2020, p. 141).

Benedita da Silva, deputada federal (PT – RJ), defende, desde que participou da Assembleia Constituinte em 1988, um sentido de democracia que se realiza pela igualdade de gênero e pelo antirracismo. Dentre as muitas conquistas em sua trajetória, foi “[...] graças à sua consulta junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), [que] as candidaturas de pessoas negras conquistaram, em 2020, a redistribuição do fundo partidário e do tempo de propaganda eleitoral” (Silva, 2022, p. 33).

Ao longo desta trajetória, Benedita foi vereadora, deputada federal, senadora, ministra e governadora do Estado do Rio de Janeiro e sofreu crimes de ódio, racismo e machismo (Silva, 2022, p. 33). Na Assembleia Nacional Constituinte, ela se recorda do seguinte:

Mas, se por um lado eu era uma deputada, uma autoridade, fazendo uma das tarefas mais importantes que um parlamentar eleito pode fazer, que é ajudar a escrever a Constituição democrática, para nos livrar dos resquícios da ditadura e proteger nosso povo, de outro, ainda enfrentava a dor que todas as negras e todos os negros enfrentam cotidianamente no nosso país. Ou você acha que eu era tratada como os brancos dentro do Congresso Nacional, nos prédios onde entrava? Porque o racismo não respeita nem mesmo a autoridade que os votos nos conferem. Quando cheguei à Câmara dos Deputados e fui pegar o elevador, um funcionário muito educado foi me dizer que ali era só para deputados. Eu respondi: “Que bom, aqui que é o meu lugar”. Não sou de abaixar a cabeça, nem ceder”

(Silva, 2022, p. 38).

Ocupar o campo político e enfrentar resistências, sob a forma de violência de política de gênero, é uma realidade desde 1988. Bruna Rodrigues e Daiana Santos, mulheres negras e filhas de empregadas domésticas (Rodrigues; Santos, 2022, p. 45), vereadoras no município de Porto Alegre eleitas pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) em 2020 enfrentaram desafios semelhantes aos vividos por Benedita da Silva.

Inspirada pela trajetória política de Manuela D'Ávila, Bruna Rodrigues iniciou sua caminhada no campo político, mas observou que

Aprendi muito sobre o quanto é difícil ser mulher e ocupar espaços políticos. Tais lugares são reservados aos homens por “tradição”. Imagine, então, ser uma preta, uma mulher a quem a sociedade impõe lugares subalternos preestabelecidos. Ocupar a política é luta dobrada. Foram as minhas vivências e a luta coletiva que me fizeram chegar até o parlamento

(Rodrigues; Santos, 2022, p. 48).

Bruna Rodrigues relatou que foi barrada três vezes na tentativa de acessar o plenário na primeira sessão, após sua posse. Por conta da pandemia de COVID-19, o acesso às galerias era restrito e ela não foi “reconhecida” como vereadora:

Esses episódios foram tão violentos que demorei a falar publicamente sobre eles. Tenho dito que a soma do machismo, do racismo e da homofobia são formas muito potentes de manutenção da desigualdade. São aquelas barreiras tão grandes que, mesmo você sendo a melhor das melhores, podem te derrubar. Porque não se trata de ti, ou do quanto tu estás disposta a ser boa. Trata-se da forma como a sociedade te vê, de como ela te concebe. E de quais oportunidades estarão a tua disposição

(Rodrigues; Santos, 2022, p. 49).

Reconhecendo-se como um corpo atravessado por múltiplas opressões, Bruna Rodrigues foi vítima, no exercício da atividade parlamentar, de assédio sexual. Sua companheira de mandato, Daiana Santos, também vivenciou a violência política de gênero logo após a posse. Um comentário em um post em uma rede social ameaçava: “se prepare que só vai levar na cabeça”; por e-mail, ela recebeu uma ameaça de morte: “comunista, preta e sapatão, uma desgraça tripla. Só por isso merece morrer” (Rodrigues; Santos, 2022, p. 51-52).

Embora sejam fisicamente bem diferentes, as vereadoras tinham seus nomes constantemente confundidos durante as sessões da Câmara: “Sabemos que isso tem a ver com a desconstrução e a desumanização de nossa personalidade. Assim fica mais fácil nos agredir, assim fica mais fácil nos desqualificar” (Rodrigues; Santos, 2022, p. 53-54).

As agressões racistas e classistas também foram perpetradas pelo público que ocupava o plenário da Câmara. Em uma ocasião, um grupo que protestava contra a exigência de passaporte vacinal foi expulso ao ostentar um símbolo nazista, e ao saírem do plenário, integrantes dele gritaram para as vereadoras: “Tu é minha empregada”; “Eu sou loira, sou linda, vocês são lixo” (Rodrigues; Santos, 2022, p. 54-55).

As presenças de Áurea Carolina, Benedita da Silva, Bruna Rodrigues, Daiana Santos, Erika Hilton e Marielle Franco no campo político explicitam que as mulheres não são um grupo minimamente homogêneo (Biroli, 2016) e que ao exercício pleno da democracia corresponde a possibilidade de representação política, de uma agenda política e de pautas que se assemelhem a estes diferentes corpos e suas trajetórias em relação à raça e à classe social.

Considerações Finais

A construção de um breve panorama sobre a operacionalização da violência política de gênero como estratégia ortodoxa de manutenção do status quo no campo político objetivou demonstrar os efeitos produzidos por esse fenômeno no processo democrático.

Os atos de violência física, moral, psicológica e sexual dirigidos a mulheres que ingressam no campo político, bem como ameaças, disseminação de fake news e outras formas de atingi-las em sua dignidade, produzem como efeitos a diminuição da participação de mulheres em instituições democráticas, o esmorecimento de suas aspirações políticas e, por fim, entraves ao exercício pleno de seus direitos políticos.

Por fim, a violência política de gênero acaba produzindo efeitos sobre o processo democrático, tornando-o, nos termos de Matos (2022), um processo inacabado ou fragilizado por conta da ausência de diversidade e inclusão no campo político.

Sabendo que a posição que ocupam no campo político é marginal, cabe às mulheres como estratégia heterodoxa a subversão do estado de coisas vigente. Desse modo, será possível romper, como observa Erika Hilton (2022 p. 19), deputada federal negra e transvestigênere, com a fantasia de que o mundo é dos homens e para os homens e que às mulheres cabem apenas papéis coadjuvantes.

A resistência à violência de gênero é um esforço que abrange não só a resistência exercida pelas mulheres que participam da vida política, mas também a criminalização e enfrentamento da violência política de gênero, bem como o fortalecimento de instituições e plataformas que promovam a igualdade de gênero e a participação política.

O campo político e o campo jornalístico, exemplificados na análise aqui proposta, como produtores de realidade e de legitimidade de posições e discursos em resposta a estratégias heterodoxas, podem integrar-se à ruptura com o estado de coisas que não reconhece as mulheres como representantes políticas legítimas.

As estratégias heterodoxas, que desafiam o domínio masculino e questionam a violência política de gênero como “norma” no campo político, realizadas por Áurea Carolina, Anielle Franco, Benedita da Silva, Bruna Rodrigues, Daiana Santos, Dilma Rousseff, Erika Hilton, Manuela D'Ávila e Marielle Franco, produzirão como efeito o reconhecimento de novos corpos políticos, de novas práticas e de novos sistemas de crenças que ocuparão o campo político brasileiro.

Supplementary material
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Notes
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2 Promulgada em agosto de 2021, a Lei nº 14.192 criminaliza atos que violem os direitos políticos das mulheres (Brasil, 2021).
3 Biroli (2020) recortou Polônia, Hungria, Filipinas, Estados Unidos, Peru, Paraguai, Espanha e Itália como espaços sociais marcados pela violência política de gênero.
4 O conjunto é formado pelas Leis n. 9.096, de 19 de setembro de 1995 - Lei dos Partidos Políticos, 9.504, de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições, e 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.
5 Em matéria publicada pelo Jornal do Brasil, o advogado Ricardo Lodi, integrante do corpo de defesa da presidenta Dilma no processo de impeachment, explica a criação da Lei nº 13.332 que legitimou a prática de edição de decretos de créditos suplementares para aprovação do orçamento do governo federal. Ver: (Após [...], [2023].)
8 Anielle Franco, professora, jornalista e ativista, tornou-se, após a morte de sua irmã Marielle, diretora do Instituto Marielle Franco. Em 11 de janeiro de 2023, Anielle Franco tomou posse como ministra da Igualdade Racial no governo de Luís Inácio Lula da Silva. A ministra afirmou em seu discurso que pretendia realizar “um projeto de país onde uma mulher negra possa acessar e permanecer em diferentes espaços de tomada de decisão da sociedade, sem ser interrompida ou violentada” (Leia [...], 2023).
9 Jair Messias Bolsonaro, eleito presidente da República em 2018, foi condenado “ao pagamento de indenização por danos morais no valor de 10 mil reais à autora da ação, deputada Maria do Rosário Nunes, do Partido dos Trabalhadores. O [então] deputado ainda foi condenado a postar a presente sentença em sua página oficial no canal YouTube, sob pena de multa de mil reais” (Brasília, 2015). À época, Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que Maria do Rosário “não merecia ser estuprada porque ele a considera ‘muito feia’ e ela não faz o ‘tipo’ dele” (Oliveira, 2019).
10 De acordo com o Portal Memória Gabinetona (2021), “A Gabinetona é um mandato coletivo que teve início em 2017, em Belo Horizonte. Ao longo de quatro anos, essa experiência inovadora de ocupação da política institucional reuniu parlamentares das três esferas do Legislativo, por meio do compartilhamento de equipes, ações e estratégias comuns, em diálogo e cooperação com as lutas populares e diversos segmentos sociais” (O QUE [...], 2021). Para saber mais, acesse: gabinetona.org
Author notes
* Letícia Figueira Moutinho Kulaitis. Doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná (2016). Docente colaboradora junto ao Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina. E-mail: leticiafk@uel.br.
Editoras de Seção: Daniela Tonelli Manica, https://orcid.org/0000-0001-8014-9996 Martha Celia Ramirez Gálvez, https://orcid.org/0000-0003-3802-393X
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