DOSSIÊ – Hegemonia Cibernética, Tecnoextrativismo e Colonialidade
Tecnoextrativismo Ontológico, o Caso Amazônia NFT: “Compre NFT para Salvar NFT”, disse Leviatã 5.0
Ontological Techno-Extractivism, the Amazon NFT Case: “Buy NFT to Save NFT,” said Leviathan 5.0
Tecnoextrativismo Ontológico, o Caso Amazônia NFT: “Compre NFT para Salvar NFT”, disse Leviatã 5.0
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 29, no. 2, e49876, 2024
Universidade Estadual de Londrina
Received: 19 February 2023
Accepted: 25 March 2024
Published: 29 August 2024
Resumo: Este artigo tem a originalidade de apresentar o conceito de tecnoextrativismo ontológico a partir de um estudo de caso: Amazônia NFT (Non-Fungible Territory). Em termos metodológicos, três campos são aproximados (Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias, Sociologias da Utopia Crítica e das Mudanças Climáticas) e no nível interpretativo-crítico é mobilizada a análise crítica de narrativa. Como resultado são identificados sete grupos de agentes humanos e não humanos compostos por algumas figuras ideológico-utópicas centrais (e. g., ancestralidade, agentes artificiais, filantropo climático) e uma configuração entendida como Leviatã Ciberclimático.
Palavras-chave: Tecnoextrativismo ontológico, políticas de mudanças climáticas, sociologia das ciências e das tecnologias, utopia crítica, Amazônia NFT.
Abstract: This article has the originality of presenting the concept of ontological techno-extractivism based on a case study: Amazonia NFT (Non-Fungible Territory). In methodological terms, three fields are approached (Social Studies of Science and Technology, Sociology of Critical Utopia and Sociology of Climate Change), and at the interpretative-critical level, it mobilizes critical narrative analysis. As a result, seven groups of human and non-human agents are identified, made up of some central ideological-utopian figures (e.g. ancestry, artificial agents, climate philanthropist) and a configuration understood as Cyber-Climate Leviathan or 5.0.
Keywords: Ontological techno-extractivism, politics of climate change, sociology of science and technology, critical utopia, Amazon NFT.
Introdução
Como todos os outros [cientistas], e pelo mesmo motivo, os sociólogos trabalham com o Leviatã. Seu trabalho é definir a natureza do Leviatã, se ele é único ou se há mais de um, o que ele quer e como se transforma e evolui
(Callon; Latour, 2015, p. 298).O presente trabalho apresenta um novo tipo de extrativismo identificado a partir do estudo de caso da empresa de tecnologia Nemus e suas práticas narrativo-tecnológicas em terras indígenas na Região Amazônica, em particular os povos originários Apurinã dos Territórios Indígenas (TI) Baixo Seruini e Baixo Tumiã. A principal prática tecnológica se ancora na infraestrutura de Non-Fungible Token (NFT), e as práticas narrativas são compostas por um conjunto de figuras ideológicas e utópicas de horizonte salvacionista do clima.
Este trabalho visa preencher a lacuna da produção de estudos sobre a questão climática e a questão tecnológica a partir das Ciências Sociais no Brasil. Estudos recentes demonstram que menos de 5% (cinco por centro) dessas produções científicas é originária desse campo, em especial da Sociologia (Salmi; Fleury, 2022a), principalmente produzidas à luz da Sociologia das Ciências e das Tecnologias (David et al., 2022) e da Sociologia da Utopia Crítica (Salmi; Fleury, 2022b).
Em termos sociológicos, este artigo é sobre monstros tecnocientíficos produzidos e alimentados por uma ideologia neoliberal extrativista rentista. Entidades híbridas sociopolíticas que devoram ancestralidades, ontologias e epistemologias outras. Monstros e configurações que compõem uma complexa gramática tecnopolítica climática. Este trabalho parte do arcabouço dos Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias (ESCT) e é inspirado nos argumentos seminais da “Sociologia dos Monstros” (Law, 1991), assim como nas críticas das relações de poder entre tecnologia, ciência e política, em especial na perspectiva das Sociologias das Inteligências Artificiais (IA), da Utopia Crítica e das Mudanças Climáticas (Elliott, 2022; Feenberg, 2017; Lindgren, 2023; Salmi; Fleury, 2022b; Urry, 2016). Este trabalho visa apresentar uma nova configuração ideológica-utópica a partir da mobilização do conceito do Leviatã. Este é mobilizado a partir do arcabouço conceitual dos ESCT, que aqui é entendido como uma ideologia política otimizada pela atual tecnociência digital. Essa figura enquadrada como uma metaestrutura3 nos ajuda a compreender alguns processos sociopolíticos da era digital e do apocalipse político-climático anunciado.
Noventa e nove por cento da humanidade pode estar a viver sobre as ruínas que o neoliberalismo neoextrativista contemporâneo consegue externalizar (Brown, 2019; Caillé, 2020; Haraway, 2016), porém com a revolução digital (e. g., a tecnologia blockchain, criptomoedas, algoritmos e inteligências artificiais) se produzem novos espaços ontológico-epistêmicos e com eles novas macroentidades e metaestruturas, algumas atualizadas ao novo contexto tecnoeconômico.
Essas macroentidades híbridas (humanas e além de humanas, bióticas e artificiais) performam novas práticas tecnopolíticas adequadas a essa realidade – uma realidade também híbrida e que se impõe a todos os seres que habitam um planeta finito. A utopia tecnológica de outrora (Law, 1991) transforma-se em uma distopia neoliberal digital vívida. As críticas sobre as formas de adaptação e apropriação desse monstro neoliberal na era digital, grosso modo, remetem à apresentação dos seus efeitos – normalmente desiguais seja nos diferentes espaços (físico ou digital), seja sobre os diferentes agentes (bióticos ou artificiais) – com aumento das iniquidades sociais, digitais e ecológicas4 (Freller, 2023; Silveira; Souza; Cassino, 2021).
A atual mudança climática acopla outra camada nesse cenário. O aumento dos efeitos da mudança climática contemporânea começa a ser observado a olho nu, assim como o aumento das iniquidades sociais e climáticas (Dunlap; Brulle, 2015; Elliott, 2018). Alguns exemplos empíricos são os eventos climáticos extremos (aumento da intensidade de ciclones extratropicais na região sul do Brasil, recordes de temperaturas nos biomas caatinga, cerrado e amazônico, aumento do período de secas no Pantanal, sem contar uma diversidade de outros eventos climáticos extremos em outros territórios do planeta) – todos esses eventos afetam de modos bem diferentes as diversas comunidades e sociedades.
Nesse contexto há um novo fenômeno emergente que é invisível aos olhos humanos, todavia alguns de seus efeitos podem ser capturados com novos enquadramentos a partir da aproximação de campos das Ciências Sociais, em especial, da Sociologia. Diante do aceleracionismo tecnológico e do avanço de uma ideologia tecno-neoliberal extrativista (e. g., dataísmo, algoritarismo, capitalismo de plataforma, capitalismo de carbono), não é fácil observar por olhos humanos algumas macroentidades que se configuram no tempo presente, em particular na dimensão do imaterial, do imaginal e do pensamento5.
Este trabalho lança luz sobre novas formas de extrativismo tecnológico, e parte-se do conceito de Leviatã Climático (Wainwright; Mann, 2018) para compreender como uma atualização dessa metaestrutura sociopolítica está em operação. Partindo da premissa de que as tecnologias digitais ativas e descentralizadas como plataformas blockchain, criptomoedas, algoritmos complexos, machine learning e inteligências artificiais vieram a público recentemente, o Leviatã Climático agrega a dimensão tecnológica como forma de extrativismo.
Caminho Metodológico
O fenômeno social tecnoclimático analisado se concentra no recorte empírico que tem a empresa Nemus e suas práticas narrativo-tecnológicas, e esse arranjo social é enquadrado como objeto sociológico de uma gramática tecnopolítica. O presente trabalho possui os seguintes objetivos: 1) identificar os agentes humanos e não humanos envolvidos nessa rede tecnopolítica a partir do fenômeno-evento “Amazônia NFT”; 2) identificar as figuras ideológicas e utópicas mobilizadas para construir uma narrativa que subsidie a ideologia tecnoextrativista, 3) compreender como se dá a dinâmica dessas figuras, e 4) apresentar a configuração ideológico-utópica resultante que emerge a partir do caso analisado.
Para isso se analisa o caso do projeto Non-Fungible Territory, também conhecido como “Amazônia NFT”, da corporação-fundação Nemus. As lentes da Sociologia da Utopia Crítica (El-Ojeili, 2020; Salmi; Fleury, 2022b) e da Sociologia das Ciências e das Tecnologias (David et al., 2022; Feenberg, 2017), ambas interseccionadas com a Sociologia das Mudanças Climáticas (Dryzek; Norgaard; Schlosberg, 2011; Fleury; Miguel; Taddei, 2019; Salmi; Fleury, 2022a), são mobilizadas.
Este trabalho utiliza para a coleta de dados dois métodos em confluência: a netnografia (Kozinets, 2014; Polivanov, 2014) e a observação participante em ambiente digital (Polivanov, 2014). Não obstante, não foi utilizada em uma perspectiva stricto sensu a estrutura clássica das duas técnicas. Para o presente trabalho se utilizou o que denominamos de netnografia participante. Foram mobilizados cadernos de campo físico e digital para coletar dados a partir da plataforma X (antigo Twitter) e desdobramentos por meio da participação nos grupos digitais da rede do Observatório do Clima.
O caso Amazônia NFT foi capturado a partir do ecossistema digital da coalizão Observatório do Clima. O caso em análise foi primeiramente observado no espaço digital (X/Twitter) por meio das postagens do usuário InfoAmazônia, organização-entidade que possui a plataforma científica Plenamata – essa última atua como um monitor de problemas socioambientais e climáticos e utiliza, entre outras tecnologias, o Mapbiomas em seu arranjo tecnopolítico. A plataforma tecnocientífica Mapbiomas, por sua vez, é um arranjo tecnocientífico organizado pela rede Observatório do Clima. Como parte do procedimento metodológico, as postagens em destaque com alta interação social (e. g., critérios da Plataforma Ecomídia), quando associadas aos hiperlinks para outra plataforma (e .g., sites de notícias, YouTube, Instagram), eram seguidas por meio dos diferentes tipos de ciberespaço (entra-se nos conteúdos dos hiperlinks ou em outras plataformas da web 2.0 ou 3.0) até que se alcançasse o núcleo do conteúdo temático que é foco de uma dada micronarrativa, neste caso: o fenômeno-evento “Amazônia NFT”. Este trabalho não buscará discutir com mais detalhes os limites e potencialidades metodológicas da atual estratégia6, porém, pode abrir perspectivas para futuros estudos.
Após a coleta de dados, a estratégia metodológica escolhida mobiliza a organização de dados e informações de tal forma a capturar quem são os agentes em posição de decisão, ou, nos termos das políticas da dádiva, os agentes decisórios que atuam em redes de utopias coletivas (Martins, 2023, p. 206) e os demais agentes mobilizados em torno do eixo ontológico-epistêmico pesquisado. Dito em outros termos, esse eixo é configurado por dois núcleos de sentido: 1) ancorado nos modos de viver e habitar dos povos originários Apurinã do Território Indígena (TI) Baixo Seruini/Baixo Tumiã (ontologia ancestral e de epistemologia indígena); e 2) ancorado na tecnologia digital, em especial nas plataformas de base blockchaine dos tokens não fungíveis – NFT (ontologia algorítmica e de epistemologia tecnoliberal).
Os conceitos da Sociologia da Utopia Crítica – utopia como método sociológico e como categoria analítica (El-Ojeili, 2020; Salmi; Fleury, 2022b) na intersecção com o arcabouço da virada ontológica da Sociologia das Mudanças Climáticas e da Sociologia das Ciências e das Tecnologias (SCT) no Brasil (David et al., 2022; Fleury; Miguel; Taddei, 2019; Salmi; Fleury, 2022a) – são mobilizados para a realização da análise com foco na dimensão ideológica e utópica dessa rede tecnopolítica. Cabe ressaltar que a Sociologia das Ciências e das Tecnologias no nexo da Teoria Crítica (Feenberg, 2017) é mobilizada com seu arcabouço que possibilita aproximar a utopia crítica da SCT. Nesse sentido, os conceitos-categoria de futuro imaginado como fato social (Beckert; Suckert, 2021) e de redes tanto sociotécnicas como sociopolíticas são utilizadas como vetores analíticos complementares.
No nível discursivo-interpretativo crítico se mobiliza análise crítica de narrativa para contextos em que o clima é problematizado como força sociopolítica (Clot-Garrell, 2023; Moor, 2022; Salmi; Fleury; Dowbor, 2023). Esse tipo de análise tem por objetivo identificar as figuras ideológicas ou utópicas bem como compreender como elas se configuram para fomentar e adensar os núcleos de sentido político-discursivos e, por fim, estabilizar um conglomerado tecnopolítico ou macroentidade ideológica utópica.
Em suma, o presente trabalho encaminha quatro questões: 1) Quem são os agentes humanos e não humanos envolvidos na rede tecnopolítica do fenômeno “Non-Fungible Territory / Amazônia NFT da Nemus”? 2) Quem são as figuras ideológicas ou utópicas mobilizadas para construir a narrativa em movimento? 3) Que macroentidade emerge dessa dinâmica? E finalmente 4) Qual a configuração ideológico-utópica resultante?
Resultados: Grupos de Figuras Ideológico-Utópicas de Vetor Tecnoclimático
Para responder a primeira questão – Quem são os agentes humanos e não humanos envolvidos na rede tecnopolítica do fenômeno “Amazônia NFT” –, apresentamos os sete grupos (Quadro 1). Cada grupo é entendido como um conjunto específico de agentes dessa rede de utopia coletiva de caráter tecnoclimático que, ao fim e ao cabo, estruturam e dinamizam o tecnoextrativismo ontológico.

O primeiro grupo é identificado como um grupo pautado por uma ideologia tecnoliberal: a empresa Nemus (idealizadora e operadora ideológica) é a materialização dessa ideologia extrativista – um tipo de extrativismo que não é material, mas ontológico.
Alguns exemplos empíricos produzidos e divulgados pela Nemus em sua plataforma-site:
Os guardiões são o principal motor da atividade no ecossistema. Os guardiões podem comprar NFTs, e/ou conservar, ou explorar estas NFTs para melhorar sua coleção. Eles também desempenham um papel fundamental na decisão dos tipos de atividades que ocorrem na terra através da participação no Nemus. [...] Chamando todos os Guardiões. Os meios para proteger a floresta tropical têm sido historicamente limitados. Os meios antigos não estão funcionando. Nemus convida você a se juntar a uma geração de Guardiões que irão consertar isso
(Nemus, 2023a).Do ponto de vista legal, a Nemus é uma empresa com sede no Brasil e atuação global nos diferentes tipos de ciberespaço. Em sua página no LinkedIn a empresa se autodeclara como uma corporação que atua com “serviços de arrecadação de fundos filantrópicos” (Nemus, 2023b). O site oficial apresenta o objetivo: “Nemus é uma experiência NFT colecionável projetada para conservar e proteger a Floresta Amazônica. Visite o aplicativo, compre seus ingressos e prepare-se para entrar na floresta amazônica!” (Nemus, 2023a).

Do ponto de vista sociológico, a Nemus é um arranjo social de uma ideologia tecnoextrativista (Figura 1) dinamizado por figuras como a Tecnologia (e. g., criação das artes por meio da tecnologia NFT) e o Capital (e. g., venda desse conteúdo tecnológico). A criação do “Nemus NFT” é possível ao se conjugar o poder tecnoeconômico (saber fazer tecnológico) à sede extrativista que mobiliza comunidades indígenas como horizonte de uma utopia preservacionista de um bioma ameaçado: o amazônico. Estratégias como a troca do nome da aldeia indígena para Non-Fungible Territory (ver o quarto cluster, o legalista) e colocá-lo à venda é a expressão desse tipo de distopia tecnoclimática.
O segundo grupo é identificado como um tipo de cluster ancorado em uma utopia digital. Plataforma de blockchain, NFT (non-fungible token) e criptomoedas Etherium (Etherscan, [2023])7 são exemplos materiais (que operam nos espaços digitais). Também considerados agentes artificiais são as plataformas YouTube e Twitter (Nemus, 2023c), ambas mobilizadas pelo agente neoliberal tecnológico Nemus, além das empresas Open Sea, LooksRare e Coinbase NFT (Figura 2).

Exemplos narrativos são os conteúdos elaborados para o site da Nemus, como: “Blockchain: O elo que faltava. Nemus funde o poder das NFTs e da moeda criptográfica com iniciativas do mundo físico (material) para a conservação de nossas florestas” (https://nemus.earth/pt_br/) e o nexo entre a distopia liberal e a ecotopia indígena: “O Nemus NFT. Tudo o que é preciso para se tornar um Guardião é adquirir um NFT. Os detentores de NFT ganham acesso à DeFi e à mecânica do jogo para ganhar recompensas e otimizar sua coleção” (Nemus, 2023a).
O “guardião da floresta tropical” como significante vazio8, quando incorporado diretamente à dimensão tecnológica, torna-se conteúdo inofensivo ao público consumidor de tecnologia9 que é um dos alvos da Nemus.
A Figura 3 mostra como a tecnologia NFT captura a ontologia indígena. O mapa apresenta os “lotes” de NFT que podem ser adquiridos pelos usuários-consumidores. Nas plataformas de blockchain e criptomoedas, o Nemus NFT é mobilizado pela ideologia tecnoliberal nos ciberespaços que não são regulados no Brasil10, mas mantidos desregulados pelas oligarquias digitais como as Big Tech. Nessa linha, mais do que territórios extrativistas – nos termos de Svampa (2023) –, entendemos os ‘lotes de NFT’ como territórios digitais em regime de extrativismo, e mais, sob um processo extrativista orientado para a ancestralidade de territórios indígenas.

O terceiro grupo está ancorado em um tipo de utopia ancestral. Esse tipo de utopia pode ser observado na presença dos povos indígenas originários no Brasil, em particular na Terra Indígena (TI) Baixo Seruini/Baixo Tumiã dos Apurinã. Neste grupo citamos a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), aqui entendida como entidade indutora11 da ontologia originária destes povos indígenas em território brasileiro. Também fazem parte deste grupo: a entidade do terceiro setor Conselho Indigenista Missionário (CIMI) — organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que atualmente atua a favor dos povos indígenas do Brasil. Além das entidades mencionadas, outros coletivos associados a um tipo de ecotopia ou retropia também se somam a este núcleo de vetor sociopolítico que de fato visa preservar os povos indígenas e a floresta em pé em todas as suas dimensões.
O quarto grupo está ancorado em uma ideologia-utopia legalista – no sentido de ordenamento jurídico de Honneth (Fraser; Honneth, 2003). O Ministério Público Federal (MPF) é um exemplo deste tipo de entidade. Também neste grupo se encontra o Congresso Nacional, independentemente de sua organização interna; ou seja, tanto a Câmara dos Deputados como o Senado Federal são entendidos como entidades produtoras de ordenamento legislativo jurídico legitimado de alguma forma por parte da população. Neste sentido, o Congresso Nacional é entendido como uma associação de alta densidade produtora de normatividades política e juridicamente mediadas. Também nesse grupo citamos o Ministério do Meio Ambiente e da Mudança do Clima (MMA) e a nova Câmara, criada em junho de 2023. denominada Câmara Setorial de Guardiãs e Guardiões da Biodiversidade. Vale ressaltar outra figura, a máquina de legitimação documental-jurídica: o Cartório (Figura do Regramento Legal). Essa entidade produziu a formalização (legitimação da ideologia tecnoliberal) do nome da terra indígena para “Non-Fungible Territory” sem nenhuma crítica por parte do Cartório local ou dos órgãos estatais que legitima(ra)m tal prática extrativista ontoepistêmica dos povos originários.

Nota-se que a assinatura (Figura 4), ou seja, a legitimação, é feita por impressão digital do indígena – e, ao promover um produto audiovisual para a divulgação do novo nome da área indígena “Non-Fungible Territory”, pode-se observar como as práticas extrativistas ontoepistêmicas, além de serem explícitas (divulgação ampla através da plataforma YouTube e outras mídias digitais), ainda são normalizadas como se práticas de sequestro da ancestralidade fossem cotidianas nos espaços estatais que têm, em princípio, a função de salvaguardar os direitos fundamentais de todos os cidadãos em territórios brasileiros, inclusive os povos indígenas.
Ressalta-se ainda que, na mais recente publicação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP, 2023, p. 14, grifo nosso), é constatado que
[...] há um significativo déficit na implementação da Política Nacional de Defesa Civil e na integração entre as Defesas Civis nas três esferas de poder, bem como nas políticas de ordenamento territorial, desenvolvimento urbano, saúde, assistência social, meio ambiente, mudanças climáticas, gestão de recursos hídricos, geologia, infra-estrutura, educação, ciência e tecnologia e as demais políticas setoriais.
E mais, ao longo do relatório “Desastres socioambientais e mudanças climáticas” do CNMP, não há nenhuma menção de ativos digitais, criptomoedas, tecnologia blockchain, NFT ou qualquer outra tecnologia da indústria 5.0. Grosso modo, no Brasil não há um eixo sociopolítico para que se regulem ou modulem de forma mais enfática essas novas tecnologias.
O quinto grupo está ancorado em uma utopia da contestação (Cruz, 2011), ou seja, fazem parte dele entidades que possuem um papel social de divulgação de dados, denúncia e contestação de eventos hegemônicos pouco visíveis. Tais práticas ocorrem em uma perspectiva jornalística crítica. Exemplos dessas entidades são a própria rede Observatório do Clima – entendida como uma figura do tipo Metacoalizão12, ou seja, uma figura que agencia outras organizações e redes como a InfoAmazônia – e organizações jornalísticas como o Brasil de Fato (Pajolla, 2022), Mongabay (Bispo, 2023) e a InfoAmazônia. Essas entidades estão associadas diretamente à figura da Comunicação, especialmente àquelas mediadas por mídias sociais e plataformas de conteúdo denunciatório, como outras plataformas digitais de comunicação de conteúdo socioambiental e/ou climático.
O sexto grupo está ancorado na utopia positivista, em especial a utopia tecnológica digital. Este tipo de utopia sintética, quando associada à questão climática, torna-se um vetor agregado à pauta tecnoeconômica (Salmi, 2022b). Neste grupo a entidade identificada é a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP). Quando um fazer saber (científico) de uma entidade reconhecida, como o caso da USP, é colocado a favor da pauta ideológica tecnoeconômica que tem como horizonte a ilusão da salvação de uma ontologia (no caso, dos povos indígenas brasileiros) sem a realização de qualquer criticidade (Figura 5), esse se torna mais um elemento legitimador do tecnoextrativismo ontológico.

O sétimo e último grupo se refere aos artistas e designers, como o ilustrador de uma das coleções de NFT da Nemus (Figura 6), Ben Kwok, e a Concept Art House. Esse grupo está ancorado em um tipo de utopia artística e mobiliza figuras como Estética e Arte e outras vinculadas à dimensão do abstrato e do sensível.

As 78 artes dos tokens da Nemus Genesis Collection (NEGEN) são exemplos da agregação da camada estética como elemento que se configura nessa narrativa com máscara de utopia, mas com pele tecnoliberal ontoextrativista. Nota-se que a estética é um elemento estruturador, uma vez que esse pode ser encontrado nos demais grupos (cluster) garantidamente.
Esses sete grupos de agentes se configuram como uma utopia coletiva que passa a produzir figuras ideológicas ou utópicas. As figuras ideotópicas são entendidas como tijolos de uma narrativa que organizam uma macroentidade. Esta última possui uma máscara de utopia, mas pele neoliberal tecnoextrativista.
Figuras que Habitam as Ciberentranhas do Leviatã Ciberclimático
A resposta para a segunda questão (Quem são as figuras ideológicas ou utópicas mobilizadas para construir a narrativa em movimento e como elas se configuram?) pode ser sintetizada pela configuração/hibridização de figuras ideológico-utópicas, algumas mais centrais: o Ancestral (identificado no estudo do caso como o “Guardião da Floresta”), a Tecnologia (como o “NFT” e plataformas tecnológicas de blockchain) e o Capital (como os filantropos climáticos e os processos de venda dos NFTs produzidos).
O fenômeno socioclimático “Amazônia NFT” pode ser enquadrado por uma composição oriunda de um arranjo estável dinamicamente. Esse é composto por uma série de figuras ideológico-utópicas em confluência híbrida, as quais são mobilizadas pelos diferentes agentes humanos e não humanos (citados na seção anterior). Essa configuração pode ser entendida como uma constelação ideológica neoliberal extrativista. Uma constelação orientada por práticas de blindagem epistêmica (falta de conhecimento do aparato tecnológico – nos termos de Lafuente e Parra13 – pelos povos indígenas) e cultural (falta de reciprocidade e troca de saberes – nos termos da multiculturalidade crítica, no sentido de Svampa14 e Žižek15). Essa constelação realiza uma eficaz nova dominação ontoepistêmica.
Vejamos como se dá tal configuração constelar. Por um lado, há figuras nitidamente de pauta ideológica, ou seja, figuras que, quando acionadas, tendem a aumentar a desigualdade social, econômica, ecológica e climática (e. g., plataformas NFT, máquina cartorária, conexão usuário-consumidor – web 3.0). Cabe ressaltar que algumas figuras podem transitar entre um lastro ideológico e outro utópico16, a depender de como estas figuras estão configuradas em determinados espaços e redes. Neste sentido, a tecnologia blockchain pode ser enquadrada como significante vazio, ou seja, se, em um primeiro momento, a figura está ancorada em uma falsa figura utópica (como o caso do projeto “Amazônia NFT”), a tecnologia blockchain em si pode ser enquadrada como uma estrutura utópica, uma vez que esta tecnologia opera de forma descentralizada e, em princípio, autônoma por parte dos usuários. Todavia, esta mesma tecnologia, quando configurada em uma lógica capitalista, dinamiza-se em um processo ideológico, ou, nos termos da utopia crítica, em um processo distópico.
Por outro lado, há figuras utópicas como os Guardiões da Floresta (APIB, 2023) — figura cooptada pela Nemus, embalada como ‘Guardião da Terra Indígena’ em uma máscara tecnológica (“Non-Fungible Territory”) (NFT, 2023). O ponto de inflexão está no fato de que a figura do guardião – à qual pode-se atribuir um significado associado à proteção, em especial da vida – é capturada por uma distopia tecno-neoliberal extrativista. No caso em análise, pode-se observar pelas lentes da utopia crítica que essa figura é, em um primeiro momento, “projetada para conservar e proteger a Floresta Amazônica” (Nemus, 2023a). Quando essa figura é configurada em um arranjo utópico, a figura do Guardião da Floresta possui uma força política que tem como vetor a emancipação de sistemas dominantes de caráter opressor – como no caso observado do evento Ato pela Terra (Salmi, 2022a). Todavia, como a figura do guardião é um significante vazio, o Leviatã Climático (Wainwright; Mann, 2018) passa a ser entendido aqui como Leviatã Ciberclimático, pois realiza um tipo de apropriação tecnológica, ou seja, apodera-se desse signo (o protetor), reordena-o como um guardião tecnológico da floresta. No caso estudado, como consequência, há uma apropriação tecnológica e ontológica. Assim, mobiliza sua expertise tecnológica (mobilização da tecnologia de NFT) não para salvar os povos indígenas e seus territórios ancestrais (salvar e proteger a ancestralidade local), mas para produzir conteúdo que se torne comercializável para lucro próprio.
A configuração da figura do expert tecnológico (Tecnologia) – no sentido stengeriano-latouriano (Latour, 2004; Stengers, 2018) – identificado nas narrativas sobre o uso da tecnologia blockchain e das criptomoedas, em particular no arranjo de um NFT da Nemus, é outra dinâmica essencial dessa constelação distópica tecnoextrativista. Esta configuração é entendida a partir do argumento de que “[...] a ciência como ideologia legitima muitas outras atividades em um meta-sentido, tornando-se assim uma autoridade complexa e incorporada para racionalização, sexismo, racismo, competitividade econômica, classificação e quantificação” (Star, 1991, p. 32).
Como demonstra nosso estudo de caso, além da ciência, a tecnologia como ideologia também legitima novas autoridades, e mais, produz novas metaestruturas ideológicas com máscaras utópicas. A articulação da Nemus com uma organização científica legitimada em seu espaço epistêmico, a ESALQ/USP (a Ciência), torna o projeto “Amazônia NFT” não só legítimo, como também digno de confiança para todos os que desconhecem as múltiplas camadas tecnológicas, assim como para os potenciais consumidores de arte e/ou filantropos individuais que desejam, em princípio, ajudar a proteger a Floresta Amazônica e os povos indígenas que habitam esses territórios nativos.
Nesse sentido, a Ciência torna-se uma distopia tecnológica ao se associar – sem uma investigação adequada ou à luz das ciências sociais – às operações da Nemus. Damonte et al. (2022, p. 6) argumentam que “o conhecimento expert ou técnico é utilizado como base ideológica para impor seu controle sobre a água”. No plano da tecnologia digital, os experts, seja das Big Tech ou de corporações como a Nemus, mobilizam esse conhecimento tecnológico como base ideológica, ou distópica nos termos da utopia crítica, para impor seu controle sobre os corpos e os territórios ancestrais e, de modo mais profundo, sobre a ontologia dos povos Apurinã do Território Indígena (TI) Baixo Seruini/Baixo Tumiã.
Em relação à arte digital contemporânea – em particular à arte digital ancorada na tecnologia blockchain e NFT, sendo esta entendida nos termos da estética da indústria cultural (Adorno, 2023) –, lançamos mão do argumento complementar de que “a arte [...] por ser uma manifestação complexa (semiótica, material, biótica), [...] agencia redes de materialidades e sociabilidades, e constrói maneiras singulares de narrar, posicionar-se, recortar e constituir a realidade” (Guzzo; Taddei, 2019, p. 84). Nessa linha, uma narrativa ancorada no Guardião da Floresta (Ancestral), quanto associada à estética digital do Tecnoceno-Capitaloceno17 (NFT como figura da Tecnologia e Etherium como figura do Capital), não só passa a agenciar a rede de sociabilidade dos povos originários, como também é facilmente cooptada e mobilizada pela ideologia tecnoliberal extrativista.
E mais, essa ideologia tecnoliberal extrativista passa a ter trânsito livre no espaço digital, em especial, a web 3.0 (e. g., plataformas blockchain, espaços de compra-venda de NFTs). Esse tipo de ciberespaço não é de interesse de regulação por parte dos agentes estatais, muito menos dos grupos tecnoliberais. Há no máximo proposições de projetos de lei superficiais e uma lenta tramitação18 que é, ao fim e ao cabo, uma ilusão moduladora dessa ideologia político-tecnoliberal. A Nemus, ao se autodeclarar uma empresa filantrópica (Filantropo climático), visa fomentar uma subjetividade ancorada em uma utopia da dádiva – no sentido de uma Utopia coletiva com intenções democráticas (Martins, 2023). Porém, no plano tecnológico, oriundo da mobilização da figura do expert tecnológico em plataformas blockchain e criptomoedas (Tecnologia), centraliza essa epistemologia de caráter tecnológico para si. Esse ponto pode ser notado também pela prática do não compartilhamento desse tipo de conhecimento com os povos indígenas originários, ou seja, o Ancestral torna-se agente passivo neste arranjo tecnológico, apesar do contato físico entre agentes da Nemus e do povo indígena. A assimetria é tanto ontológica como epistemológica.
Quanto ao sequestro epistêmico, este ocorre em relação aos povos indígenas, pois essas mesmas tecnologias e os processos econômicos (Capital) se configuram para que as vendas aconteçam no espaço digital sem nenhum contato (pelos consumidores-usuários do espaço digital) ou troca de saberes ancestrais diretamente com os povos originários, nos quais o “Non-Fungible Territory” (Amazônia NFT) foi construído. Nessa linha, até então os processos de apropriação tecnológica foram entendidos como um conjunto de práticas realizadas pelas comunidades mais vulneráveis para reduzir as assimetrias/iniquidades sociais (Rivoir; Morales, 2019); todavia, o presente estudo de caso demonstra que tal apropriação tecnológica também ocorre por grupos dominantes da própria tecnologia – como a apropriação da estrutura de blockchain e criação de novos NFTs para exploração ontológica dos povos originários. Ou seja, há não só uma apropriação tecnológica, como também ontológica.
E, no plano tecnopolítico, se “[a] dataficação e o dataísmo, como tecnologias de conhecimento e poder, prosperam através da ontoepistemologia informacional tecnoliberal” (Parra, 2022, p. 363), a tecnologia não só impulsiona para uma mudança social (Sancho-Garcia; Ivorra-Alemañy, 2022), mas no presente caso argumentamos haver um processo de dataficação das ontologias dos povos originários, e este produz o extrativismo ontológico mediado tecnologicamente – além do sequestro epistemológico desses povos ancestrais. Neste caso, as plataformas blockchain e criptomoedas moduladas pela Nemus (dataficação da ontologia indígena) fomentam um espaço ideológico ideal aos consumidores-guardiões que desejam “proteger a Floresta Amazônica”, porém consumindo criptomoedas.
Entre as narrativas construídas pela Nemus opera uma lógica que explicita sua construção discursiva nos dois planos, físico e digital. A Nemus cita que atua com equipes “on the ground” e “in the ether” (Nemus, 2023a). Esse tipo de atuação multiespacial (no plano físico e digital) remete à construção de narrativas ideológicas pulverizadas em vários espaços — independentemente do público. Este tipo de distopia compreende que os espaços devem ser ocupados com estratégias diferentes em diferentes planos. Os públicos são diferentes, todavia são condensados em uma estratégia maior que conecta os diferentes espaços e as diferentes figuras, as quais são configuradas em um horizonte ideológico comum de pauta tecnoliberal neoextrativista. Por tecnoliberal entende-se que o principal personagem (o Capital) está em movimento nessa dinâmica. Nesse movimento o plano digital, em especial as plataformas de blockchain e as criptomoedas, opera em linha com a narrativa de proteção da floresta amazônica. Já por neoextrativista entende-se que esse mesmo personagem (o Capital) se apropria da ontologia dos povos originários, monetizando-a e comercializando-a nas plataformas de blockchain via criptomoedas.
Em suma, é o tecnoextrativismo ontológico. Esta constelação distópica é tanto tecnológica como ontológica. Trata-se, ao fim e ao cabo, da apropriação dos significados da Ancestralidade, e esta é mobilizada por meio e através da Tecnologia. Empiricamente são as plataformas blockchain e as criptomoedas criadas pela Nemus associadas à Arte, em especial da estética gráfica, que se configuram e dinamizam o monstro denominado Leviatã 5.0.
Diante da Revolução Digital e da Emergência Climática, o Leviatã Realiza o Upgrade
Você consegue pescar com anzol o Leviatã ou prender sua língua com uma corda?
(Jó, 41:1).Para encaminhar a terceira questão do presente trabalho – Qual dinâmica está em operação a partir dos agentes humanos e não humanos e das figuras ideológicas e utópicas identificadas nas seções anteriores? –, ancoramo-nos nas configurações ideológico-utópicas já identificadas nos termos da Sociologia da Utopia Crítica e das Mudanças Climáticas na interface dos ESCT. E na sequência encaminhamos a quarta e última questão: Qual nova configuração ideológico-utópica emerge do presente estudo de caso?
Desde 1651, quando Hobbes mobilizou a metaestrutura do Leviatã, o desafio dos cientistas sociais (e. g., antropólogos, sociólogos, cientistas políticas) em desconstruí-lo ou abordá-lo – ou mesmo refutá-lo – sob outras perspectivas está presente em diferentes abordagens teóricas, metodológicas e epistêmicas. Na presente abordagem, o Leviatã é entendido como uma metaestrutura forjada por humanos e estável nos planos objetivos (e. g., megaprojetos de infraestrutura, instituições, mega-infraestruturas como a internet) e subjetivos (regras sociais ordenadas pela dimensão jurídica e geopolítica) como uma força sociopolítica que opera modulando e mediando ações humanas e além de humanas.
Callon e Latour (2015) buscam desmontá-lo e argumentam que as dimensões ontológica e epistemológica, assim como política e técnica (tecnológica), são indissociáveis, e, entre outras considerações, argumentam que alguns arranjos sociais são mais estáveis do que outros. O neoliberalismo – e todos os termos associados a esse conceito, como capitalismo tardio e neoextrativismo – pode ser enquadrado como Leviatã em uma perspectiva crítica sociopolítica econômica (Collier, 2012; Faucher, 2018), e o Leviatã ainda é uma imagem poderosa no sentido de nomear esta metaestrutura que abarca a todos.
Ressaltamos que, mesmo sob os tentáculos globais desse monstro, há horizontes utópicos; todavia, as práticas de novas tecnologias (e.g. NFT, criptomoedas) se tornam se tornam distópicas nas entranhas de um sistema dominante. Na prática sociológica é preciso deslocar algumas categorias cristalizadas nas análises, como o conceito de Estado-nação, para compreender uma metaestrutura que opera além deste entendimento. Nesse aspecto, a questão das rígidas fronteiras geopolíticas não faz mais sentido em um sistema globalizado como o capitalismo e suas práticas, que atualmente operam em “redes transnacionais que se consolidam no ventre [do Leviatã]” (Suvin, 2012, p. 217). Na era digital e com a revolução da tecnologia blockchain e das criptomoedas, o Leviatã Ciberclimático realiza um upgrade. Criam-se redes transdigitais – redes digitais em redes digitais como uma matrioska digital (Salmi, 2023a) –, o que torna a questão da transparência e rastreabilidade um desafio além das capacidades humanas.
Com o avanço da indústria 5.0 (Echman, 2021), os avanços e apropriações também alcançam outras dimensões – como a epistêmica (Costa; Coelho; Salmi, 2023), mas não a ontológica –, além da socioeconômica e da tecnológica já em movimento. Todavia, o avanço de ideologias tecnocentradas em direção à dimensão ontológica é algo novo. Nesse sentido, as Big Tech (e. g., Alibaba, Alphabet, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia), grupos tecnoeconômicos e outras organizações neoliberais são exemplos empíricos dessa configuração denominada aqui de Leviatã 5.0. Uma metaestrutura que opera em todos os espaços digitais de modo simultâneo e integrado, uma vez que essas entidades têm o domínio tecnológico dessas redes interligadas tecnoeconomicamente. Diante dos atuais avanços dos efeitos das novas tecnologias e da mudança climática, entendemos essa metaestrutura não como Leviatã Climático (Wainwright; Mann, 2018) , mas como Leviatã Ciberclimático, e como consequência este produz o tecnoextrativismo ontológico.
Lembrando que, se a web 1.0 é um espaço passivo no que tange à criação descentralizada, a web 2.0 avança para conteúdo interativos, mas o avanço ocorre de fato com a web 3.0,19 ou seja, com a total “liberdade” de ação – liberdade de ação somente para aqueles com domínio do saber fazer tecnológico e econômico.
Avançando em relação ao argumento de que o “Leviatã Climático” produz “futuros utópicos ilusórios” (Wainwright; Mann, 2018, p. 197), a versão atualizada, identificada na presente análise, leva-nos ao Leviatã Ciberclimático, ou, em outros termos, ao Leviatã 5.0– em alusão à Revolução 5.0.Um sistema-monstro que produz futuros utópicos ilusórios, mas que, com sua máscara tecnológica, realiza configurações entre a Ancestralidade (dos povos indígenas), a Arte Digital (dos artistas gráficos), o Agente Artificial/a Tecnologia (com as plataformas blockchain e as criptomoedas negociadas nestes ciberespaços) e o Filantropo Climático/o Capital –, sem se limitar a essas figuras. À luz da Sociologia da Utopia Crítica, não se trata de um futuro utópico ilusório, mas de uma distopia climática inscrita no presente, ou seja, uma distopia realista – parafraseando Wright20.
Se, por um lado, existe uma “urgência de uma virada ontoepistemopolítica capaz de cartografar novas conflitualidades e alternativas sociotécnicas” (Parra, 2022, p. 383), por outro lado, a revolução digital tensiona essa não virada, com diferentes graus de agenciamento por meio de redes sociotécnicas a favor da ideologia neoliberal neoextrativista e não em prol de uma utopia climática realista. E mais, se “a concretização de outros futuros tecnológicos é indissociável do reconhecimento e fundação de outras coletividades e instituições políticas” (Parra, 2022, p. 383), podemos acrescentar que a materialização de outros presentes tecnopolíticos já está em movimento, ao menos aqueles concretizados pelos grupos que dominam a Tecnologia (e. g., Big Tech, Big Asset), mesmo que no plano ideológico essas interconexões possam ser maquiadas (e são) por máscaras neoliberais neoextrativistas.
Com restrições, alinhamo-nos ao argumento de que “a Web 3.0 expande a compreensão do social de Durkheim e Weber para Tönnies e Marx, e é um sistema de colaboração on-line que permite a formação de comunidades virtuais, conhecimento cooperativo e trabalho cooperativo” (Fuchs et al., 2010, p. 57).
A restrição ao argumento de Fuchs et al. (2010) é que a web 3.0 pode até permitir a formação de práticas de coprodução, porém, também permite práticas de apropriação tecnológica não pelas comunidades mais vulneráveis (Rivoir; Morales, 2019), mas pelos grupos que dominam a dimensão tecnológica, como os especialistasem construção da NFT da Nemus. O caso estudado demonstra que a configuração identificada (tecno-extrativismo ontológico) produz práticas distantes de trabalhos cooperativos, pois não há cooperação entre os grupos tecnodominantes e os povos originários da região amazônica. Ou seja, são práticas que ocorrem sem o envolvimento genuíno do outro, neste caso, dos povos originários Apurinã do Território Indígena (TI) Baixo Seruini/Baixo Tumiã. O que há são apropriações ontológicas e epistemológicas pelos grupos oligárquicos que dominam a tecnologia por meio de narrativas climáticas de horizonte salvacionista.
Diante do aumento das iniquidades sociais e ecológicas da mudança climática, cabe ressaltar que, ao argumentar sobre tipos de revolução na era digital na fronteira híbrida da tecnociência e da socioeconomia, algumas práticas de desconstrução de modelos imaginários – estáveis até então – associados aos novos processos de desterritorialização, em particular nos espaços digitais, podem levar à questão identitária pós-humana e, no limite, pós-identitária (Nhemachena; Dhakwa, 2023). Nesse futurismo tecnocientífico, a figura mítica do Leviatã, seus processos e práticas tecnocientíficos fundidos às práticas socioeconômicas do neoliberalismo digital podem, e talvez já o façam, levar a um upgrade que escape das mãos sociais da própria ideologia tecnoliberal – diluídas nos novos espaços tecnocientíficos como a nova caixa preta da web 3.0. Nessa linha, passado e presente podem ser analisados à luz da crítica da (pós-)modernidade e nos interstícios “entre as utopias de criação autônoma na cultura e a industrialização dos mercados simbólicos” (Canclini, 2008, p. 29). Canclini (2004, p. 184) lança luz na discussão ao argumentar que “o fácil acesso ao conhecimento científico graças à mídia de massa e às tecnologias de informação em escala transnacional tira da competência dos Estados a gestão de muitas formas de conhecimento, formas de representação e imaginários sociais”.
Todavia, ao contrário do que afirma Canclini (2004), os Estados-nação (seja como categoria explicativo-interpretativa seja como agente ordenador do agir social nos ambientes digitais) se alinham cada vez mais aos grupos neoliberais21 (seja pela não regulação da garantia do acesso às informações produzidas pela ciência, seja pelo não controle dos espaços digitais descentralizados como web 3.0 ou a deep web). Nesse cenário, questionamo-nos: como novas configurações, estruturas, práticas e imaginários sociais podem emergir diante do aumento dos efeitos da mudança climática? A questão climática impõe mais uma atualização na imagem dessa figura sociopolítica emblemática, o Leviatã, de um mundo de mundos cada vez mais interconectado e globalizado22. Entre as possibilidades dessa macroentidade se transformar ou se adaptar, a partir da proposição do Leviatã Climático (Wainwright; Mann, 2018) e da premissa de que a humanidade está sob uma governança planetária liderada por poucas oligarquias (como as Big Tech, Big Oil e Big Asset), entendemos que esse Leviatã evolui para o Leviatã 5.0 – em uma alusão à indústria 5.0 e todas as novas tecnologias oriundas dessa nova onda civilizatória – e, a partir do presente estudo de caso, é entendido como o Leviatã Ciberclimático que produz o atual tecnoextrativismo ontológico.
Ressaltamos o argumento do pesquisador De Vries (2007, p. 32-33) de que a atual globalização capitalista pautada por uma macroestrutura composta por “sistemas, conjuntos de instituições, agências e ideologias que estruturam o pensamento e as práticas deste, como um tipo de entidade semelhante a uma máquina”, produz e reproduz “efeitos colaterais não intencionais, não planejados, mas sistemáticos”. Entretanto, discordamos de que os “efeitos colaterais [são] não intencionais, não planejados” (De Vries (2007, p. 32-33). Este trabalho demonstra que alguns efeitos colaterais são intencionais, planejados esistemáticos, como o tecnoextrativismo ontológico realizado pelo grupo Nemus em relação aos povos originários Apurinã do Território Indígena (TI) Baixo Seruini/Baixo Tumiã.
Tecnoconsiderações Finais: Leviatã Ciberclimático como Tecnoextrativismo Ontológico
A partir desse monstro, entendemos tecnoextrativismo ontológico tanto como um conceito sociológico-político quanto como uma prática socioeconômica. No plano conceitual, pode ser entendido como uma categoria-horizonte capaz de compreender melhor as relações entre humanos e não humanos e as mega/infra/super/estruturas sociais que são construídas e envolvem a todos física e digitalmente. No plano empírico, pode ser mobilizado para capturar as práticas de apropriação ontológica por meio da instalação de arranjos tecnológicos sobre as comunidades e sociedades que não detêm nem o saber científico nem o saber fazer tecnológico e muito menos os meios econômicos para compreender e enfrentar esse sistema e suas práticas de expropriação epistêmicas e ontológicas.
Grosso modo, essa máquina-monstro – entendida como um macrossistema ou uma meta/macro/superestrutura – pode ser denominada o Leviatã 5.0 ou Ciberclimático. Essa máquina-monstro também pode ser entendida como o tecnoextrativismo ontológico. Um tipo particular de novo extrativismo que pode alcançar outros territórios ancestrais. Uma estrutura em constante atualização que atualmente opera, entre outras frentes, com processos ciberclimáticos.
Talvez ela possa ser entendida como uma entidade-máquina global, globalizada e globalizante devoradora de ontologias e epistemologias-outras, mas essa hipótese precisa de outros estudos e pesquisas. Uma entidade comandada por oligarquias de atuação global e pautadas por uma ideologia distópica e hegemônica que insiste em se manter ativa até que o último imaginário não capitalista extrativista tenha sido extinto.
Em um mundo de mundos em disputa onde, em princípio, abrem-se possibilidades para se discutir outras ontologias climáticas (Salmi et al., 2023), o presente caso analisado explicita que ainda há um longo caminho para que esse tipo de extrativismo, em particular o tecnoextrativismo ontológico, pare de ser planejado e executado por aqueles em posição de poder econômico, tecnológico, midiático e epistêmico, entre outros.
Ao fim e ao cabo, o argumento de Latour, Stengers, Tsing e Bubandt de que a ciência sequestrou a epistemologia (Latour et al., 2018) é extrapolado; e mais, a tecnociência nas mãos de poucos não só sequestrou a epistemologia, como as ontologias-outras, neste caso, ontologias indígenas. Talvez esse novo tecnoextrativismo ontológico seja reproduzido até que a “última tonelada de combustível fóssil” (Weber, 2013) tenha sido extraída deste planeta. No contexto contemporâneo, a humanidade passa de uma forma de organização por um extrativismo fóssil para um digitalismo climático, mas a questão ontológica ganha novos relevos diante das catástrofes climáticas e avanços tecnológicos. Nesse sentido, essa nova configuração identificada como tecnoextrativismo ontológico extrapola as atuais definições do extrativismo informacional, avança em direção a uma nova dimensão e produz uma nova- corrida neoliberal – além do dado, o saber ancestral é o novo petróleo.
Em última análise, a humanidade nem conseguiu pescar o Leviatã nem desparafusá-lo. E, diante da revolução digital e da emergência climática, é ele – Leviatã 5.0 – que se atualiza em uma versão digital globalizante. É esta metaestrutura que pescou técnica e economicamente a ancestralidade. Talvez seja necessária a insurgência de um Tupã Ciberclimático para enfrentar esse novo tipo de tecnoextrativismo ontológico. Em outros termos, a humanidade em sua grande maioria está à mercê de megaoligarquias de poder tecnológico, financeiro e midiático: as Big Whatever, também conhecidas como Leviatã 5.0. Enfim, na era digital e em tempos de catástrofes climáticas, há uma nova narrativa ideológico-utópica no ar sintetizada pelo mote: “Compre NFT [non-fungible token] para salvar NFT [non-fungible territory]”.
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Notes
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