Servicios
Descargas
Buscar
Idiomas
P. Completa
Feminismo Estratégico: Análise das Publicações das Católicas pelo Direito de Decidir
Clara Faulhaber Duarte Vale; Paulo Mesquita D’Ávila; Debora Castanheira Pires
Clara Faulhaber Duarte Vale; Paulo Mesquita D’Ávila; Debora Castanheira Pires
Feminismo Estratégico: Análise das Publicações das Católicas pelo Direito de Decidir
Strategic Feminism: Analysis of Publications by Catholics for the Right to Decide
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 29, no. 2, e49125, 2024
Universidade Estadual de Londrina
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: Católicas pelo Direito de Decidir (CDD) é uma ONG formada predominan-temente por mulheres e constitui objeto deste artigo. O objetivo é mostrar, por meio das análises dos conteúdos das suas publicações, como tem sido formado um contradiscurso que confronta a Igreja Católica em diferentes níveis, sobretudo no que diz respeito aos temas dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. O argumento desenvolvido parte da perspectiva de que o ativismo religioso conservador se constitui em uma resposta ao avanço dos movimentos feministas e dos movimentos pela diversidade sexual que, além da sexualidade e da moralidade, disputam o eixo central de poder das religiões. Atuando ora como ator religioso, ora como ator político, conectando constantemente estas duas dimensões, a instituição católica vem possibilitando o surgimento de novos discursos no seu interior, cujas vozes se fazem audíveis no mundo público, para além dos muros institucionais, como as Católicas pelo Direito de Decidir.

Palavras-chave: Católicas pelo Direito de Decidir, Igreja Católica, direitos sexuais e reprodutivos.

Abstract: Catholics for the Right to Decide (CDD) is an NGO formed predominantly by women and is the subject of this article. The aim is to show, by analyzing the content of its publications, how a counter-discourse has been formed that confronts the Catholic Church at different levels, especially with regard to women’s sexual and reproductive rights. The argument developed is based on the perspective that conservative religious activism is a response to the advance of feminist movements and movements for sexual diversity which, in addition to sexuality and morality, are disputing the central axis of power of religions. Acting sometimes as a religious actor and sometimes as a political actor, constantly connecting these two dimensions, the Catholic institution has made it possible for new discourses to emerge within it, the voices of which are audible in the public world, beyond the institutional walls, such as Catholics for the Right to Decide.

Keywords: Catholics for the Right do Decide, Catholic Church, sexual and reproductive rights.

Carátula del artículo

ARTIGOS

Feminismo Estratégico: Análise das Publicações das Católicas pelo Direito de Decidir

Strategic Feminism: Analysis of Publications by Catholics for the Right to Decide

Clara Faulhaber Duarte Vale
Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Brasil
Paulo Mesquita D’Ávila
Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Brasil
Debora Castanheira Pires
Fundação Oswaldo Cruz, Brasil
Mediações - Revista de Ciências Sociais, vol. 29, no. 2, e49125, 2024
Universidade Estadual de Londrina

Received: 13 October 2023

Accepted: 28 February 2024

Published: 30 May 2024

Introdução

O entrelaçamento entre política e religião – seja no sentido da secularização dos significados religiosos nas construções conceituais do entendimento da política, seja na politização do aspecto religioso – não é uma novidade e constitui um fenômeno bem documentado pelas Ciências Socais4 (Habermas, 2013). A forma como certa politização de conteúdos religiosos vem ocorrendo dentro do contexto democrático recente tem despertado, no entanto, um interesse renovado no tema. O uso do chamado “secularismo estratégico” (Vaggione, 2009) se apresenta como essencial para o tipo de ativismo religioso que a Igreja Católica está propondo e ultrapassa as fronteiras dicotômicas secular/religioso, público/privado, Estado/religião. A intensificação deste ativismo religioso conservador foi chamada de “politização reativa” (Vaggione, 2009), uma vez que se trata de resposta dada ao avanço dos movimentos feministas e dos movimentos pela diversidade sexual que, além da sexualidade e da moralidade, disputam o eixo central de poder das religiões (Biroli, 2018). Atuando ora como ator religioso, ora como ator político, conectando constantemente estas duas esferas, no entanto, a instituição católica vem possibilitando o surgimento de novos discursos no seu interior, cujas vozes se fazem audíveis no mundo público, para além dos muros institucionais. É exatamente nesse espaço que as Católicas pelo Direito de Decidir se inserem. Esta ONG formada predominantemente por mulheres é o objeto em análise neste artigo. O objetivo é mostrar, por meio das análises dos conteúdos das publicações da organização Católicas pelo Direito de Decidir (CDD), como tem sido formado um contradiscurso que confronta a Igreja Católica em diferentes níveis.

O referido “secularismo estratégico” é considerado a mistura de argumentos religiosos e seculares, adaptando as narrativas e discursividades para defender uma ordem tradicional de família. Trata-se do uso de discursos secularizados, como o direito natural, enquanto um princípio fundador do direito positivo, para sustentar valores e normas conservadoras. A universalidade e a imutabilidade, características atribuídas ao direito natural, vêm servindo como sustentação para defender o conceito de família tradicional e lutar contra qualquer desnaturalização da família. Segundo Vaggione (2009, p. 44), “[...] el concepto de naturaleza/naturalización es básico en este desplazamiento estratégico de lo religioso a lo secular”5. Com isso, a utilização da estratégia secular tem sido uma forma de um ativismo religioso que não faz parte da secularização, isto é, não é um diálogo aberto a mudanças, e sim conserva o dogmatismo da Igreja Católica. Conforme aponta Vaggione (2009, p. 45), o “activismo religioso ha aprendido a utilizar ‘estratégias seculares’ sin necesariamente secularizarse”6.

A atuação da Igreja Católica é nomeada como uma máquina político-religiosa, (Vaggione, 2009) que pretende ao mesmo tempo conservar os privilégios tanto como instituição religiosa quanto como pertencente à sociedade civil, podendo assim intervir nos debates públicos e legais. Com essa característica dual da instituição, tendo a laicidade como regra do jogo democrático, a Igreja e os setores da sociedade civil, como as organizações intituladas pró-vida ou pró-famíla, além de juízes e legisladores, pressionam os poderes do Estado em defesa da sua doutrina, dada como referência para uma ordem moral contrária a direitos sexuais e reprodutivos. Nessa perspectiva, a atuação político-religiosa da Igreja Católica, somada às estratégias que a instituição vem utilizando em meio a um cenário democrático, constitui, ao mesmo tempo, sua grande influência e, também, sua vulnerabilidade (Vaggione, 2017). Como ambas as esferas estão conectadas, abrem-se espaços para o surgimento de novos e outros discursos no interior da instituição, que se espalham para o mundo público. Ocorre um processo de “desprivatização”7 (Vaggione, 2017) do religioso. Ao operar como ator político, demandando uma agenda político-institucional, a Igreja acaba se envolvendo em disputas com outras demandas e críticas por meio desses novos canais democráticos. É importante destacar que a Igreja Católica nunca deixou de participar da esfera pública. Recorre, contudo, ao secularismo estratégico no discurso, a fim de ser aceita na esfera pública, contribuindo, assim, para uma desprivatização do religioso.

As Católicas pelo Direito de Decidir, uma ONG criada em 8 de março de 1993, surge exatamente nesse espaço (Brites, 2014). A organização vem se destacando com algumas metas e objetivos. Dentre eles, a) a meta de redução de incidência de casos de aborto visando diminuir casos de mortalidade materna; b) a organização de eventos para promover a equidade de gênero e a autonomia das mulheres no campo dos direitos reprodutivos e sexuais; c) a promoção de diálogos e conversas públicas tendo como finalidade articular reflexões religiosas com a sexualidade e reprodução humana; d) e formas de elaborar e trabalhar pela aprovação de políticas públicas, leis e serviços tanto nas áreas de saúde quanto de educação interpelando o Estado e a sociedade para garantir uma cidadania plena a todas as mulheres.

Para promover os objetivos acima, as atividades da organização são divididas em três eixos, de acordo com Brites (2014): o primeiro de formação, o segundo de comunicação e o terceiro de advocacy. O primeiro foi iniciado formalmente em 2002 com as chamadas multiplicadoras, que são um grupo de mulheres que oferecem oficinas, cursos que têm o objetivo de abordar argumentos éticos religiosos favoráveis aos direitos das mulheres no Brasil inteiro.

O segundo eixo se desenvolveu principalmente na inserção da CDD no debate relacionado à temática do aborto. Foi criado o site8 da organização com a finalidade de dar uma maior visibilidade aos argumentos através de diversos tipos de publicações, como cartilhas, artigos, livros, peças publicitárias, intervenções artísticas, entre outros. O site também foi uma estratégia de maior inserção nos espaços virtuais, buscando construir uma rede ampliada de discussão e de trocas. Atualmente, a organização consta com perfil nas redes sociais para a divulgação de trabalhos realizados, atividades, ações, participação em eventos, manifestações, compartilhamento de reportagens relacionadas com os argumentos defendidos pelas Católicas, entre outros.

Por último, o eixo advocacy tem como objetivo construir um diálogo mais intenso com os parlamentares, setores do Executivo, organismos internacionais e outros para vocalizar demandas relacionadas a políticas públicas destinadas à promoção dos direitos da mulher, direitos sexuais e reprodutivos de segmentos da sociedade.

Dado esses três eixos de atuação citados, a CDD tem buscado fazer frente a esse projeto da máquina político-religiosa católica através do debate do significado do que é ser católica. Busca politizar essa identidade a partir de releituras da tradição, adentrando o mundo de disputas das agendas políticas institucionais. A ideia é publicizar o quanto o catolicismo é plural, e indicar que cada indivíduo deve ser autônomo nas suas escolhas, principalmente com relação aos direitos sexuais e reprodutivos. Pretendem ainda desconstruir a doutrina defendida pela hierarquia católica de uma moral universal.

O que se propõe aqui é analisar os conteúdos publicados pela CDD, artigos na revista Carta Capital, cartilhas e publicações nas redes sociais, para compreender os meios por intermédio dos quais a CDD vem organizando sua estratégia de publicização e de antagonismo frente à máquina político-religiosa da Igreja Católica.

Igreja Católica versus Católicas pelo Direito de Decidir

O período inaugurado pelo papado de João Paulo II (1978-2005) foi marcado pela intensificação dos movimentos mais conservadores dentro da Igreja. Representou uma continuidade da atuação política da Igreja na direção de reprimir e frear mudanças nos arranjos familiares, bem como na legislação relacionada aos direitos sexuais e reprodutivos e à criminalização do aborto (Biroli, 2018). Com efeito, no período posterior à década de 1960, a sexualidade e os direitos reprodutivos assumiram um papel fundamental no debate político, alterando a percepção do público sobre a dicotomia entre as esferas pública e privada e, inclusive, causando mudanças cruciais na maneira como democracia e justiça serão compreendidas (Biroli, 2018; Machado, 2012; Vaggione, 2012). É possível argumentar, nesse sentido, que a sexualidade se tornou um objeto de controle social crucial nas arenas democráticas, suscitando inclusive, por parte da instituição religiosa, estratégias diferentes para resistir aos avanços nas conquistas de direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e lgbtqiapn+.

O efeito deste movimento na Igreja Católica é mais bem compreendido quando consideramos a forma pela qual a instituição estrutura cultural e moralmente as sociedades e as discussões legais acerca da implementação de políticas públicas. De acordo com Vaggione (2009), a Igreja Católica criou um duplo discurso. No plano público, legitima uma postura crítica à diversidade sexual, reafirmando assim a doutrina católica tradicional. No plano privado, tolera determinadas atitudes de seus fiéis com relação a medidas contraceptivas.

Apesar das expressões ocidentais da religião cristã terem como característica marcante o posicionamento público contrário às definições plurais e à diversidade sexual, elas também conseguem combinar, no âmbito privado, de forma integrada e emancipatória, um projeto envolvendo uma determinada relação entre religião e sexualidade. É possível que o discurso religioso coexista com uma concepção ampla e plural de sexualidade. A construção desse discurso de forma heterogênea permite que exista uma diversidade sobre a sexualidade. Segundo Vaggione (2009, p. 42) “[...] la religión, en su complejidad, heterogeneidad y dinamismo, puede ser una influencia favorable para el cambio social y legal sobre la sexualidad”9.

É neste contexto que o movimento chamado “Católicas pelo Direito de Decidir” (CDD) e a Igreja Católica travam uma disputa argumentativa no espaço público sobre os significados da sexualidade e direitos reprodutivos. Dessa forma, as Católicas se apresentam como representantes de demandas que combinam sua identidade religiosa com posicionamentos favoráveis às demandas feministas, tais como o reconhecimento dos direitos reprodutivos e sexuais e da diversidade sexual. A organização se mobiliza para alavancar mudanças tanto por dentro da comunidade religiosa quanto para a sociedade como um todo.

A atuação do movimento CDD é facilitada porque a Igreja Católica tem buscado atuar de forma dual: como ator religioso e como ator político. Ao operar como ator político, acontece um processo de desprivatização do religioso. De acordo com Vaggione (2017), é exatamente nessa dualidade que reside a grande influência da Igreja Católica e sua vulnerabilidade. Por um lado, como ator religioso, o tema dos direitos sexuais e reprodutivos é exclusivamente do âmbito privado, podendo ser caracterizado como dogmático e, por conseguinte, blindado de discussão. Por outro, como ator político, demanda uma agenda político-institucional retrógrada. Dessa forma, a instituição acaba submetendo suas visões às regras do debate público e, assim, a outras demandas e críticas por meio de canais democráticos. Isso ocorre porque ambas as esferas estão correlacionadas e abrem espaço para uma porosidade que possibilita o surgimento de outros discursos no interior da instituição, que terminam por transbordar para o mundo público.

Em reação a estes movimentos, a Igreja Católica politiza seu discurso público, concentrando seus esforços em propagar o conteúdo conservador oficial da sua doutrina, a chamada “politização reativa”, já mencionada. Dos diversos meios utilizados para se expressar publicamente, a Igreja Católica, ao longo dos anos, tem utilizado o chamado “secularismo estratégico”, isto é, o uso de argumentos legais e científicos para justificar sua posição contrária à pauta dos direitos reprodutivos e sexuais. O discurso oficial é propagado e ampliado em um processo denominado por Vaggione (2017) de “ONGnización”, no qual diversos movimentos da sociedade civil (dentre os quais alguns já citados, como os Movimentos Pró-Vida, Pró-Família, Con Mis Hijos no te Metas, entre outros) reafirmam valores da família tradicional patriarcal e heterossexual. São contrários à educação sexual nas escolas, resistentes ao reconhecimento dos direitos reprodutivos e sexuais e favoráveis à criminalização do aborto.

É importante notar que, considerando a heterogeneidade inerente a grandes grupos religiosos, a verdadeira novidade neste processo não está na discordância entre a prática e o dogma proclamado pela Igreja, e sim que estas disputas tenham ido a público para buscar legitimação. Como afirma Vaggione (2017, p. 88), “O que é novo, no entanto, é que essas negociações e adaptações tenham saído à arena pública em busca de legitimação; é a existência de setores que discordam da moral sexual oficial e se mobilizam para expressar publicamente suas diferenças”.

Nesse sentido, as Católicas pelo Direito de Decidir representam um desses setores e assumem uma postura dissidente tanto religiosa quanto política, ao contestar a um só tempo o dogma oficial e dar visibilidade à agenda política institucional (Vaggione, 2017). O movimento se inscreve no cenário dissidente, buscando reafirmação do pertencimento religioso e, ao mesmo tempo, rompendo com um consenso existente. Ou seja, a base de formação da identidade da organização (pluralidade religiosa, experiência das mulheres, teologia da libertação e feminista) serve como sustentação para o combate ao patriarcado e/ou à heteronormatividade, e às restrições impostas aos direitos sexuais e reprodutivos. Em outras palavras, as formas que a CDD utilizou para compreender o universo religioso, refletido nas novas interpretações do dogma religioso, apoiam e incentivam as mobilizações do grupo. Assim, o movimento não representa um distanciamento da religião, mas uma busca mudança por intermédio de novos aspectos igualitários e inclusivos inscritos nessa mesma tradição (Vaggione, 2017).

O fato de o CDD não se afastar da religião lhe concede uma vantagem na arena política, pois permite que adentre um mundo de disputas das agendas políticas institucionais onde a Igreja Católica também se encontra. De acordo com Vaggione (2017, p. 92), “Esse pertencimento a duas comunidades permite à CDD antagonizar com a Igreja Católica a partir de diferentes registros”.

O movimento dissidente busca publicizar e politizar os comportamentos aceitos no âmbito privado na Igreja Católica e, assim, legitimá-los. Ao antagonizar a Igreja, uma das principais estratégias por parte do CDD é publicizar o quanto o catolicismo é plural e cada indivíduo tem uma posição autônoma no que concerne às questões relacionadas aos direitos sexuais e reprodutivos. Com isso, desconstrói a ideia defendida pela hierarquia católica de uma suposta moral universal tanto no seio da comunidade religiosa quanto da sociedade no geral. Desconstruir a universalidade da moral tem como resultado fazer transparecer as fraturas existentes entre o discurso público – com ênfase no status quo no que se refere à sexualidade e aos direitos reprodutivos – e as atitudes privadas, que são muitas vezes invisibilizadas em nome desse status.

Politizar esse duplo discurso é a forma que as correntes dissidentes têm de mostrar os desacordos e dissensos do dogma oficial católico, mostrando que este não é uma verdade absoluta entre os fiéis (Vaggione, 2017). As comunidades religiosas são também comunidades de interpretação, abrindo brechas para outros tipos de discursos e construções emergirem (Vaggione, 2009).

Antes de passar àa análise das publicações, cabe pontuar ainda elementos do cenário recente. Provocado, entre outros aspectos, pela discussão em torno da chamada “ideologia de gênero” (Corrêa, 2021), o debate sobre direitos sexuais e reprodutivos cresceu no Brasil no contexto político dos últimos anos (2018-2022). A tendência é retrógrada com relação às políticas de direitos sexuais e reprodutivos, sobretudo no que se refere à legalização do aborto. O contexto afeta a organização das Católicas pelo Direito de Decidir. Em 2018, a Associação Centro Dom Bosco de Fé ou Centro Dom Bosco, criada em 2016, entrou com uma ação contra o grupo alegando que não poderiam mais utilizar o nome “católicas” na organização, pois defendem os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e defendem o homicídio de bebês, uma vez que são favoráveis ao aborto. Em um primeiro julgamento, a CDD foi proibida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) a utilizar o nome sob pena diária de multa. Após recorrer, a CDD pode continuar utilizando o nome. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Dom Bosco não pode atuar em nome da Igreja Católica e decidir quem pode ou não utilizar o termo “católicas”10. Uma das suas criadoras, Gisele Pereira (2017), afirma que o conceito de católicas é amplo, não abarcando somente aquele definido na Igreja Católica Romana. É importante também enfatizar que o presidente da Dom Bosco também foi contra o fechamento temporário das igrejas durante o período da pandemia de Covid-19, no qual as medidas de isolamento social eram essenciais para se evitar que o vírus se espalhasse e contaminasse mais pessoas. 

O movimento CDD tem, assim, uma posição singular dentro do debate sobre direitos sexuais e reprodutivos. Ao mesmo tempo que apresenta uma posição substancialmente antagônica ao dogma oficial da Igreja Católica, continua sendo parte da comunidade religiosa e, desta forma, falando por ela no espaço público. Para ilustrar como têm sido realizadas as estratégias das CDD, a análise de algumas publicações é essencial.

Publicizando a Subjetividade Moral da Igreja Católica: as Publicações das Católicas pelo Direito de Decidir

Uma das publicações da CDD é o caderno “Uma história não contada: a história das ideias sobre o aborto na Igreja Católica”, da teóloga norte-americana Jane Hurst. Esta obra é uma boa forma de ilustrar o uso estratégico de sua posição ambígua (ao mesmo tempo dentro da Igreja Católica, porém defendendo conteúdo antagônico) no debate.

Jane Hurst (2006) busca desconstruir a ideia de que a posição pela condenação do aborto seja homogênea no contexto religioso. Partindo de uma reconstrução histórica do tema do aborto dentro da dogmática católica, a autora busca mostrar a inexistência de consenso sobre o tema e a persistência de contracorrentes de pensamento ao longo dos séculos. De acordo com ela, no cristianismo a interrupção da gravidez sempre foi um assunto complexo e com muitas controvérsias. A declaração do Papa Pio IX em 1869 na Apostolicae sedis de que a interrupção da gravidez era um pecado grave e motivo de excomunhão não significou o encerramento das discussões. Pelo contrário, os debates sobre direitos reprodutivos persistiram, tendo em vista que não eram um consenso dentro da Igreja. O castigo de excomunhão para quem pratica o aborto, de acordo com Jane Hurst (2006), ainda é recente na história da Igreja. Além disso, a decisão baseou-se no quadro jurídico existente, que tratava o aborto como uma forma de homicídio, ao invés de se basear num princípio dogmático. Aqui é importante uma pequena digressão sobre a organização institucional da Igreja Católica.

Dentro da estrutura do Catolicismo Romano existe uma divisão entre uma função legisladora e a função do magistério. A primeira é responsável por criar regras – e as respectivas punições para quem as transgredir – as quais as pessoas que se declaram católicas devem seguir. A segunda se refere à capacidade de ensinar questões relacionadas à fé e à moral. A autoridade máxima da Igreja, o Papa, tem prerrogativa exclusiva sobre certos pontos oficiais de doutrina. Somente as segundas questões passam por uma discussão teológica sobre o tema, ou seja, têm seus pontos oficialmente debatidos pela comunidade eclesiástica. A proibição do aborto nunca fez parte do magistério, apenas da legislação eclesiástica sobre penitência. Com isso, carece ainda hoje de base teológica para ser elaborada como parte do ensino religioso.

A autora aponta que a própria posição da instituição foi mudando o enfoque sobre o tema do aborto ao longo dos anos, distanciando-se de sua concepção como pecado sexual para a da proteção da vida humana. Essa mudança de perspectiva sobre o aborto está relacionada à própria história do catolicismo, pois a partir da centralização das penitências e o surgimento das teorias de hominização imediata (isto é, da concepção de que a alma se une ao corpo no momento da fecundação e não posteriormente) foi ganhando força.

Nesse contexto, a declaração de Pio IX foi decisiva. Segunda a autora, foi o primeiro apoio explícito dado pela Igreja a essa teoria. Além disso, recebeu um respaldo implícito no novo Código do Direito Canônico, tornando-se o ponto de vista majoritário dentro da instituição. Os ensinamentos do Papa com o Código estavam alinhados, e o aumento da centralização silenciava as divergências. A condenação do aborto como homicídio por parte da Igreja passou a ser justificada também pelo desenvolvimento da doutrina da infalibilidade. A forma como foi interpretada teria levado à posição sobre a condenação do aborto como algo infalível.

A condenação do aborto, compreendido pela ótica do pecado sexual, é justificada pela separação entre união sexual e procriação. Ou seja, o aborto realizado de forma voluntária refletiria o desejo de união dos companheiros não com o devido fim de procriação (Hurst, 2006). A contracepção, juntamente com o aborto, também é condenada pela Igreja, pois “ambos têm a intenção de separar a união sexual da procriação” (Hurst, 2006, p. 42). 

Quando a doutrina católica começa a aproximar a proibição do aborto da proteção da vida humana, Hurst (2006) argumenta que, ao tentar equiparar o aborto ao homicídio, os teólogos se deparam com um problema complicado. A doutrina católica utiliza a teoria do hilemorfismo, que entende o ser humano como composto por dois elementos: corpo e alma. Estes só se unem quando o corpo está pronto para receber a alma. Logo, a grande questão é em que momento essa união ocorre, em que instante o corpo humano está pronto para receber essa alma. Segundo a posição conservadora, isso ocorreria já no momento da concepção.

A CDD utiliza este tipo de texto que problematiza a questão do aborto para pôr em xeque o discurso adotado por parte da Igreja nas arenas políticas, principalmente legislativas. Essa pauta é frequentemente utilizada para justificar a criminalização do aborto, por meio do “secularismo estratégico”. Pesquisas realizadas no Brasil (Miguel; Biroli; Mariano, 2017) e Uruguai (Rostagnol, 2008) mostram que o argumento da “defesa da vida” é o mais evocado por parlamentares e políticos na pauta do aborto. Segundo os legisladores contrários à legalização do aborto, é no momento de concepção que ocorreria a união entre corpo e alma que daria início à vida.

Ainda de acordo com Rostagnol (2008), os legisladores contrários à legalização do aborto se apoiam no discurso do Vaticano, unindo os argumentos da biomedicina com a religião, resultando no cerne dessa questão, que reside na discussão sobre o direito à vida baseado na definição de pessoa. O ponto é qual a noção de vida humana empregada e se é possível considerar uma pessoa como dotada de direitos já desde o zigoto, nos códigos civis que cada Estado determina. Esse debate parte de desacordos em relação à etapa na qual a forma humana é considerada dotada de direitos, os quais a comunidade a que pertence assegura aos seus membros. Com isso, a ideia de defesa da vida a partir da definição de “pessoa” depende de uma determinação normativa, ou seja, é estabelecida por um critério universalmente dado e transcendente e não ao longo de processos e contextualização históricos.

Rostagnol (2008) relata ainda alguns outros aspectos sobre o embrião-pessoa levados em conta na discussão parlamentar. Por exemplo: as mulheres grávidas que decidiram abortar não consideram o zigoto como pessoa porque não estaria inserido dentro do chamado “mapa relacional”. Isso significa que o embrião não está inserido nos espaços das interações sociais e, portanto, ao realizarem um aborto, não estariam matando nada. Por outro lado, aquelas que decidem continuar com a gravidez, baseadas na ideia da existência da “pessoa” desde o embrião, afirmam que este se encontra inserido em uma rede de relações sociais, sendo a primeira a relação mãe-filho.

No caso brasileiro, Aldana (2008) analisa discursos no Congresso Nacional no período da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 25/95 do deputado Severino Cavalcante (PPB/GO). De acordo com a autora, desde 1987 já existia um conflito em torno do tema, tendo como atores centrais a Igreja Católica e os Movimentos Feministas. O discurso a respeito do nascituro se relaciona à questão relativa ao processo reprodutivo humano (biológico), desembocando numa discussão pertencente ao Direito Positivo. Com isso, mais uma vez a Igreja utiliza o secularismo estratégico como meio de se dissociar das críticas relacionadas à não separação Igreja/Estado (Aldana, 2008). Esta não foi a única PEC contra o aborto. Em 2019, foi desarquivada no Senado Federal, depois de 32 anos, a PEC 29/201511 de iniciativa, principalmente, do então senador Magno Malta (PL/ES). Também foram apresentadas: PEC 181/201512; Estatuto do Nascituro de 201713; Estatuto da Gestante e da Criança por Nascer de 201914, entre outras.

O interessante para as posições defendidas pelas CDD nas publicações de textos como o de Jane Hurst (2006) é o conteúdo argumentativo que a Igreja Católica utiliza sobre a proibição do aborto, ainda que recorrendo ao secularismo. O discurso da defesa da vida como algo imutável, universal e absoluto une mais uma vez argumentos religiosos, morais e éticos. Por estarem inscritos em documentos oficiais da Igreja, Aldana (2008) afirma que estes não precisam ser contextualizados espacial e nem temporalmente. Logo, segundo a autora, eles assumem um caráter de “discursos fundantes”. Estes são considerados como verdade, principalmente pela legitimidade do discurso de autoridade. Partindo de uma revisão histórica da dogmática, o movimento que a CDD faz é tentar informar o discurso público a partir dos pontos de vista dissidentes da Igreja Católica.

O papel das Católicas nesse contexto é elaborar e publicizar um contradiscurso, baseado nas brechas deixadas pelo discurso oficial. É interessante que a construção dessa nova discursividade está baseada em outras formas de interpretação e leitura dos textos bíblicos (a chamada teologia feminista). Nesse sentido, historicizar e contextualizar esses discursos tanto hegemônicos como não hegemônicos, demonstrando uma pluralidade, é uma das tarefas das Católicas pelo Direito de Decidir.

Assim, as teólogas feministas são essenciais para a CDD, pois fazem parte da construção da sua identidade, servem para se contrapor à hierarquia patriarcal e como meio de empoderar as mulheres. Vaggione (2017) lista três maneiras em que esses conhecimentos auxiliam na missão do grupo. O primeiro, já citado, como forma de empoderamento das mulheres católicas. Para a aquisição e garantia de direitos sexuais e reprodutivos não basta sua dimensão formal; sua continuidade e validade exigem outras transformações que a circundam, como as de questões materiais e desconstruções de estereótipos. Assim, segundo Vaggione (2017, p. 97),

Estes discursos alternativos geram um marco interpretativo onde o prazer, o corpo ou a maternidade eletiva (entre outros) são direitos que podem ser defendidos e substanciados a partir da própria identidade católica, gerando assim uma maior liberdade no momento de optar e exercer sua sexualidade.

O segundo ponto se refere ao resgate das experiências concretas das mulheres. Estas experiências auxiliam a deixar de pensar em aborto de forma abstrata, mas sim dentro de um contexto histórico de opressão e exclusão das mulheres. Nesse sentido, a ideia de Scott (1999) de historicizar a experiência é essencial para reconstruir discursos e conceitos que foram aceitos como universais e imutáveis. Por último, a releitura e a nova interpretação dos documentos sagrados por parte dessas teologias feministas oferecem argumentos para a construção desses contradiscursos e evidenciam o pluralismo da instituição católica.

Em outras duas publicações fica evidente mais uma estratégia utilizada pelas CDD. Trata-se do chamado “Manifesto por uma Convenção Interamericana dos Direitos Sexuais e Reprodutivos” de 2007 e um caderno chamado “A Igreja Católica e a Conferência do Cairo: Uma linguagem em comum” de 2004.

Segundo Brites (2014), a escolha desses textos tem várias razões. O encarte de 2007 foi selecionado por ter uma divulgação na esfera acadêmica e ser de cunho feminista. A revista Estudos Feministas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde o encarte foi divulgado, é reconhecida como um propagador de pesquisas e tem alcance não só no Brasil, como também na América Latina. (Brites, 2014). O caderno, por sua vez, teve sua segunda edição publicada em 2004, dez anos após a “Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD)” realizada no Cairo. A Conferência foi um evento importante no contexto de consolidação das Católicas pelo Direito de Decidir no Brasil, pois teve importantes discussões relacionadas aos direitos sexuais e reprodutivos, além de diálogos com a Igreja Católica, a sociedade civil e organismos internacionais.

Esses textos apontam para outro aspecto das ações das Católicas pelo Direito de Decidir: o constante diálogo que a organização procura estabelecer com organismos internacionais, organizações não governamentais, diferentes esferas do governo, instituições políticas, como partidos, e outros agentes sociais.

O documento de 2007 é lido por Brites (2014) como resultado de diversas ações realizadas nos anos 90, a partir da Convenção Interamericana dos Direitos Sexuais e Reprodutivos. O objetivo do texto é trazer legitimidade e suporte aos discursos de garantia de direitos e mudanças na área de saúde coletiva. Buscou-se também incorporar esses debates em toda uma agenda de Direitos Humanos.

Já o segundo caderno de 2004 é dividido, de acordo com Brites (2014), entre momentos de aproximação e momentos de intenso debate entre as posições do Vaticano, os integrantes da Conferência e os valores compartilhados da CDD. Durante a Conferência foi elaborada uma Carta de Princípios com 15 pontos, e diversos deles são abordados na perspectiva dos atores citados. A área de maior conflito diz respeito à saúde da mulher, questões relacionadas à família, empoderamento feminino, direitos sexuais e reprodutivos. Na área de debate sobre Direitos Humanos, sua universalização, sobre a erradicação da pobreza, direito à Educação e desenvolvimento sustentável ocorreram, no entanto, convergências entre os atores.

É interessante chamar a atenção para o fato de que dentro da ideia de universalização dos Direitos Humanos não são levados em conta os direitos das mulheres. Assim, de acordo com Brites (2014), a oficialidade católica continua marcando uma posição conservadora frente a esses tópicos. Com isso, os argumentos usados pela CDD nesse contradiscurso são baseados na experiência das fiéis católicas, cujas práticas e ações no cotidiano não condizem com a postura defendida pela Igreja Católica. Por outro lado, Brites (2014, p. 123) afirma que

[...] a delegação da Santa Sé manifestou apoio à demanda do empoderamento das mulheres proposto pelo Cairo quando compreendido em um viés mais econômico, enfatizando a importância da igualdade de direitos da mulher enquanto trabalhadora e incentivando sua participação na esfera pública. Em contraponto, acaba por reforçar papéis de gênero, que reiteraram e reafirmam uma figura preconcebida da mulher como “mãe-trabalhadora”, as colocando em espaços restritos no exercício de seus direitos.

Mais uma vez, a ideia de pluralização e de divulgação de pensamentos, reflexões e ações da Igreja tem sido utilizada como peça-chave para as Católicas pelo Direito de Decidir. Ou seja, para a organização tem sido importante esclarecer que dentro da própria instituição os argumentos não são absolutos e que cada esfera de poder eclesiástico tem certo nível de diversidade. Com isso, o apelo das Católicas à consciência individual reforça para as mulheres que elas têm total capacidade de escolha ética e moral sobre os assuntos relacionados ao seu próprio corpo (Brites, 2014; Gómes, Orozco, 2014).

Uma das principais ações e que, ao mesmo tempo, possibilitou a existência da CDD é a ideia de pluralidade da religião católica. Conforme dito, as Católicas pelo Direito de Decidir têm nessa ideia uma das bases para a construção de seus contradiscursos, afirmando que não existe um único argumento do dogma católico. Este foi construído historicamente. Colocando-se em uma posição de dissidentes, como são caracterizadas por Vaggione (2017), a estratégia utilizada por elas é publicizar, dar visibilidade a toda uma gama de reflexões que sublinham a importância de uma visão positiva da sexualidade e a necessidade de se rejeitar o quadro moral sexual que nega os corpos e atribui culpas, indo ao encontro das demandas tanto dos movimentos feministas quanto de diversidade sexual. A questão para a CDD é não abandonar a filiação religiosa por conta dessas reivindicações dos movimentos, mas conseguir coexistir com elas, trazendo certo equilíbrio e harmonia dentro da contradição: religião e feminismo.

Para atingir seus objetivos, a CDD procura difundir suas publicações, inclusive através de redes sociais, e conta com uma equipe de mídia que busca divulgar as visões da organização nas principais questões concernentes ao debate público sobre direitos sexuais e reprodutivos, principalmente por meio de entrevistas. A organização também conta com uma coluna na revista Carta Capital chamada “Diálogos da Fé”. De acordo com o periódico, o objetivo da coluna é criar um espaço de debate inter-religioso buscando respeitar os direitos humanos e refletir sobre determinados posicionamentos por parte das religiões que geram preconceitos. A coluna é escrita por diversas pessoas de diferentes vertentes religiosas, e uma delas é Gisele Pereira, integrante das Católicas pelo Direito de Decidir. De 2019 para cá, Ivone Gebara se reveza com Gisele para escrever a coluna.

Para aprofundar o papel de publicização dos argumentos da organização selecionamos os artigos da revista publicados pelas autoras e, em seguida, analisaremos o conteúdo deles. Foram coletados, ao todo, 45 artigos no período de 09 de agosto de 2017 até 28 de março de 2019, tendo em vista que a coluna estreou no dia 08 de agosto de 2017. A partir dos dados coletados foi construído um banco de dados com as seguintes informações: data de publicação do artigo, a autora do artigo, o link e cinco colunas com os principais assuntos tratados.

Os artigos, em sua maioria, tratam de assuntos como legalização/criminalização do aborto, autonomia das mulheres, patriarcado, diversidade sexual (homoafetividade, movimento lgbtqiapn+), violência de gênero, democracia, eleições e fundamentalismo religioso. É comum que os artigos promovam atividades políticas coletivas, sejam eventos realizados pela CDD ou chamadas para eventuais manifestações e passeatas que estejam de acordo com os ideais defendidos pela organização. Por exemplo, na coluna do dia 29 de novembro de 2017, “Para além da ponta do iceberg: enfrentando as raízes da violência contra as mulheres”, as Católicas convocam para participar da campanha de 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres, compartilhando eventos que ocorreram em diversas capitais e cidades do país.

O tema do aborto é um dos mais abordados nos artigos. Geralmente vem associado com questões relativas ao imbricamento entre Estado e Religião, sendo visto como sistematicamente desumanizando as mulheres. Ou seja, as colunas apresentam ao público a interpretação de que a ausência de políticas públicas destinadas às mulheres acaba por afetar primordialmente as pobres e as negras, uma vez que acabam recorrendo a procedimentos clandestinos e inseguros. É sabido que aquelas mulheres que possuem mais recursos financeiros realizam o mesmo procedimento de maneira rápida e segura.

Os artigos se debruçam sobre como o Estado não respeita o princípio de separação entre as instituições públicas e as instituições religiosas e se relacionam aos fundamentalismos religiosos referentes à ideia de “defesa da vida”. Como exemplo, diversos artigos tratam da já citada PEC 181/2015 e da influência religiosa sobre alguns parlamentares que “absolutizam” a vida do embrião em detrimento da saúde e da escolha da mulher sobre a maternidade. Ao longo dos escritos, e partindo de outras interpretações advindas da religião, as autoras procuram desconstruir a proibição da legalização do aborto. Isso ocorre, por exemplo, no artigo que compara o caso de Rebbeca Mendes15 com o episódio bíblico de Jesus e a crítica aos fariseus. Estes são criticados principalmente porque acreditavam possuir o conhecimento último e verdadeiro e a mais pura prática religiosa. A partir disso, desfrutavam de grande influência junto à classe política à época. Dessa forma, Jesus critica os fariseus porque estão perdendo de vista o componente da solidariedade e justiça que a religião cristã prega. Portanto, negar a decisão do aborto de Rebbeca parte de uma hipocrisia e um fundamentalismo moral cristão que não condiz com esses ensinamentos.

Cabe enfatizar, no que tange ao ponto central do aborto, que todo o tempo as autoras procuram explicitar que é possível ser católica ou religiosa e lutar pela legalização do aborto, pelos direitos sexuais e reprodutivos, pelo respeito a outras religiões, entre outras questões. Assim, o artigo “Irlanda Católica: sim à vida das mulheres, não ao retrocesso!” (Pereira, 2018a) merece destaque, pois faz uma comparação entre dois países majoritariamente católicos que seguem em sentidos contrários no que se refere à legalização do aborto. Os irlandeses foram às urnas no dia 25 de maio de 2018 votar a revogação da 8ª Emenda Constitucional Irlandesa que igualava o direito à vida do feto ao da mulher e previa 14 anos de prisão para a mulher que realizasse o aborto. Com 64% dos votos, a emenda foi revogada. A partir disso, ficou aceita a interrupção até a 12ª semana de gestação e até a 23ª semana em casos de riscos à saúde da mulher. Segundo o artigo, com a legalização abriram-se caminhos para uma discussão sobre meios de implementar projetos de educação sexual nas escolas.

De acordo com a autora do artigo, Gisele Pereira (2018a), esse resultado representa mais do que o avanço na garantia de direitos. Ao afirmar que “o descompasso existente entre as determinações dogmáticas da hierarquia e a experiência ética-religiosa de seus fiéis” serve para refletir sobre um país como o Brasil, cuja população também é majoritariamente cristã e tem caminhado em termos normativos no sentido contrário à aprovação desses direitos. Com isso, a reflexão da autora remete a uma série de questões sobre as quais nos debruçamos neste trabalho: a) evidencia a relação entre feminismo, sexualidade, direitos reprodutivos e religião; b) chama a atenção para a forma dual com que a instituição lida com as ações de seus fiéis; c) argumenta que a fala da Igreja é a da proibição do aborto como algo universal, mas tolera certas atitudes no âmbito privado de seus seguidores; d) deixa em destaque a porosidade do catolicismo que permite o surgimento de outros discursos no interior da instituição e das práticas dos seus fiéis.

O debate acerca da laicidade do Estado não se esgota com o tema do aborto, direitos sexuais e reprodutivos. Gisele Pereira traz para discussão a presença do Ensino Religioso na educação pública, o projeto de lei da “Escola sem Partido” (PL nº. 193 de 2016)16 e a revisão realizada na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que retirarou todas as menções a gênero das Diretrizes e Bases da Educação Nacional. De acordo com a autora, todos os casos perpassam questões sobre o nível de influência da moral religiosa católica, que adota um discurso secular e assim adentra a arena pública. Além disso, não há nos artigos a negação da presença da religião no espaço público. Pelo contrário, eles vão ao encontro dos argumentos de Vaggione (2009) sobre o desafio de propor novos marcos teóricos, analíticos e estratégias políticas baseadas na ideia do religioso como uma parte legítima do político.

Em todas essas discussões até agora realizadas, a crítica ao patriarcado não é excluída e, de alguma forma, acaba perpassando todos esses temas. De acordo com Delphy (2009), o patriarcado é um sistema que controla e está inscrito no conjunto de atividades humanas. Está nas redes de relações sociais estabelecendo hierarquias entre os sexos. Delphy (2009) corrobora o argumento de Ruether (1996), segundo o qual o patriarcado é um sistema legal, social, econômico e político que valida e impõe relações de sujeição das mulheres aos homens. Indo além, a autora afirma o quanto o cristianismo reforçou e desenvolveu ainda mais a ordem patriarcal na sociedade, apresentando a relação entre patriarcado e, combinado com ele, um moralismo religioso.

Com isso, o texto “Para ser pilar é preciso não se mover. Assim nos quer a Igreja”, publicado no dia 18 de abril de 2018, pode ser usado como exemplo porque explora de forma clara a estrutura patriarcal presente na instituição católica (Pereira, 2018b). O texto relata a reunião, convocada pelo Papa Francisco, da Pontifícia Comissão para a América Latina, ocorrida nos dias 6 a 9 de março de 2018 no Vaticano, com o objetivo de discorrer sobre a relação entre a mulher e a Igreja Católica. Em um primeiro momento, a autora do artigo começa a questionar o uso singular do termo “mulher”, e, em um segundo momento, a crítica se volta para o documento final produzido no encontro, que reafirma a mulher como o “pilar” para a construção e consolidação da Igreja e da sociedade latino-americana. A designação da mulher como “pilar” é compreendida em uma perspectiva de naturalização do papel feminino desde a preservação da família, passando por maternidade, os trabalhos de cuidado, estendendo-se até a orientação dos fiéis. A figura de Maria também foi constantemente evocada para reforçar os papéis de mãe e de esposa.

Com isso, Gisele Pereira (2018) afirma que a Igreja estuda a possibilidade de realizar um sínodo sobre “a mulher na vida e na missão da Igreja” a partir do resultado do documento da reunião de março, indicando mais uma vez a ausência de mudanças das posturas sexistas da instituição católica. Mesmo com a chegada do Papa Francisco, tratado na imprensa como um ator progressista – apresentado como um Papa que retornou às origens de uma Igreja voltada para os pobres –, a postura do Pontífice com relação às mulheres, direitos reprodutivos e sexuais permanece conservadora (Rosado, 2013; Vaggione, 2017).

O tema da violência de gênero também é assunto recorrente nos artigos, associado pelas autoras com feminicídio, patriarcado, cultura do estupro e fundamentalismo religioso. Os textos seguem com uma pauta na qual, advindos da tradição católica, os setores conservadores e fundamentalistas cristãos reforçam o patriarcado silenciando as desigualdades de gênero e, assim, a violência. Eles também apontam para o desmantelamento e para as descontinuidades de políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade de gênero em áreas como educação e saúde.

Os textos remontam ao momento pré-eleitoral anterior a 2018, alegando a descrença generalizada da população nas instituições políticas e como os discursos foram moldados e esvaziados de significados. Buscam exemplificar o modo como isso repercutiu na ascensão de discursos conservadores, contendo “verdades absolutas” que buscam apreender e representar todo um coletivo. Acerca do esvaziamento do conteúdo dos discursos proclamados pelos candidatos, por exemplo, Ivone Gebara (2018) remete à noção foucaultiana de que as relações entre as palavras e as coisas, entre o significante e o significado são construídas e ressignificadas, atravessadas por relações de poder.

Nessa linha, na publicação “O que quer dizer Deus acima de todos?” Gebara (2018) analisa um mote de campanha utilizado por um dos candidatos à Presidência da República, Jair Bolsonaro. Procura mostrar como o slogan é interpretado e expresso como forma de submissão que atravessa uma ordem ética exigida em todas as relações sociais. De outra forma, a autora mostra que isso é uma das interpretações possíveis para o termo, pois no mundo cristão dos Evangelhos e nas cartas de João, o significado desta ideia passa pelo respeito à dignidade de todos, conjugado com relações sociais horizontalizadas e não excludentes e verticalizadas.

Nos demais artigos, algumas pautas são trazidas, como a seletividade da Justiça no caso da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; o avanço de projetos neoliberais na área de segurança pública, justificado pela intervenção militar no Estado do Rio de Janeiro; e uma reflexão sobre individualismo e coletivo e a relação com o mercado.

A coleta dos artigos e sua respectiva classificação de acordo com os temas abordados tiveram o objetivo de mostrar e ilustrar um dos meios pelos quais a organização CDD busca publicizar seus argumentos. É importante destacar, em primeiro lugar, que a coluna “Diálogos da Fé” é uma coluna no site da revista Carta Capital e não na versão impressa da revista. Em segundo lugar, o acesso é gratuito, não sendo restrito a assinantes, o que aumenta o alcance das publicações. Por último, como em qualquer outro periódico, tem um nicho de leitores.

Outros meios de publicização dos argumentos das Católicas são as redes sociais, como o Facebook. Em sua dissertação de mestrado, Silva (2015) analisou oito publicações na página da organização, entre os dias 01 de outubro e 30 de outubro de 2014. De acordo com a autora, seis abordavam a temática do aborto e duas dois a laicidade do Estado. Detalhando sua análise, a autora afirma que das seis publicações com a temática do aborto três utilizam dados estatísticos para embasar suas argumentações, realocando o problema ao tema da saúde pública e da mulher. Além disso, as imagens elaboradas pela organização acerca da temática buscariam uma aproximação e uma solidariedade entre as mulheres, já que qualquer uma pode ter realizado um aborto.

A ideia de uma maior aproximação entre as mulheres pode ser compreendida do ponto de vista da experiência das diversas mulheres, que serviu como base fundamental para a construção da identidade da CDD. Além disso, a experiência das mulheres tornou-se parte integrante do método teológico e serve como critério hermenêutico da teologia feminista. Ao retomar os textos sagrados e ao recuperar o papel das mulheres, é necessário questionar como essa construção está sendo feita, isto é, historicizar esse sujeito, como seus discursos são construídos, elaborados e ressignificados.

Nesse sentido, o post selecionado por Silva (2015), do dia 30 de setembro de 2014, é um bom exemplo da utilização de uma referência bíblica para a defesa da legalização do aborto, na qual o anjo Gabriel anuncia a Maria que ela vai ser mãe. Como afirma a autora, esse tema é recorrente nas publicações da organização e, o livre arbítrio, o direito consciente de escolha, são os pontos principais na linha de argumentação.

Considerações Finais

O período analisado por Vaggione (2009) e Biroli (2018) referente ao papado de João Paulo II assinala de forma intensificada o desmonte de movimentos progressistas, como as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), e reforça a atuação da Igreja com o objetivo de frear e reprimir novos arranjos familiares, reforçar a criminalização do aborto e impedir novas legislações direcionadas aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e da população lgbtqiapn+.

Dado esse cenário, a forma de atuação da Igreja Católica, interpretada a partir do conceito de Vaggione (2009) como uma “máquina político-religiosa”, influencia ativamente as temáticas citadas acima. A atuação da instituição religiosa como ator político transcende as esferas dicotômicas público/privado e secular/religioso. A hierarquia católica determina um tipo de política que ao mesmo tempo conserva os privilégios como instituição religiosa, reclamando seu direito legítimo de pertencimento à sociedade civil e, assim, interfere nas discussões públicas e legais. A partir dessa característica dual, aceitando a laicidade como regra do jogo democrático, a Igreja e setores da sociedade civil que são apoiados por ela pressionam os poderes do Estado em defesa de sua doutrina. Nesse sentido, o chamado “ativismo católico conservador” observado por Vaggione (2012) em fenômenos como a “ONGnización” reforça ainda mais a postura de resistência à expansão dos direitos sexuais e reprodutivos, principalmente com o uso do “secularismo estratégico”.

Diante desse contexto, os movimentos feministas, pela diversidade sexual e em especial as Católicas pelo Direito de Decidir reagem às investidas conservadoras por meio da desconstrução da unidade do discurso oficial. Dentro de um contexto democrático essa disputa ganha outra conotação, pois ambas as instituições (Igreja e a CDD) estão sujeitas às mesmas regras do jogo. A abertura de novos canais democráticos permitiu uma pluralização no debate sobre os temas acerca da sexualidade.

Dessa forma, o caminho encontrado pelo Católicas pelo Direito de Decidir, em que pese o conteúdo dissidente, consiste na reafirmação do pertencimento religioso e, ao mesmo tempo, de rompimento com um consenso existente. Sua ação visa tornar pública a perspectiva de o quanto o catolicismo é plural. Vaggione (2017) afirma que a organização pertence a duas frentes. Em uma delas rediscute o significado de ser católica(s), recorrendo às releituras das tradições, procurando destacar seu lado igualitário e de justiça social, e reforçando que tanto o patriarcado quanto a heteronormatividade não refletem a religião católica. Seriam antes construções históricas. Em sua outra face, conta com o apoio das demandas dos movimentos feministas para legitimar os direitos sexuais e reprodutivos na sociedade e na agenda pública governamental. Para isso, a análise dos artigos publicados na Carta Capital bem como das cartilhas e dos cadernos permite compreender o panorama da atuação da CDD frente a Igreja Católica.

Os temas discutidos exemplificam as duas frentes mencionadas, demonstrando a capacidade de abordar criticamente questões polêmicas sem comprometer a identidade católica. Esses assuntos incluem o contexto das eleições presidenciais brasileiras de 2018, a detenção do ex-presidente Lula, as eleições de 2022 e a legalização do aborto na Irlanda. Também tratam de matérias como legalização/ criminalização do aborto, diversidade sexual (homoafetividade, lgbtqiapn+), autonomia das mulheres, patriarcado, violência de gênero e fundamentalismo religioso.

Por fim, é interessante observar que assim como a Igreja Católica potencializou o uso do secularismo estratégico, atuando tanto como ator religioso quanto como ator político, as Católicas pelo Direito de Decidir também o fizeram. Pode-se dizer que a organização também se utiliza de certo “feminismo estratégico”. Dependendo da posição social e do lugar em que a organização se encontra, mobiliza-se o feminismo de diferentes formas. Na Igreja é interessante reforçar que são feministas, trazendo os argumentos da teologia feminista de releitura e interpretação dos textos sagrados com uma perspectiva de gênero, das demandas dos movimentos feministas e de diversidade sexual. Já no mundo público, nos debates e na agenda institucional a CDD reforça o quanto a religião católica é plural, mostrando que não há um único viés de argumentação e, portanto, a religião poderia abrir caminhos para mudanças reais na vida das mulheres.

Supplementary material
Referências
ALDANA, Myriam. Vozes católicas no Congresso Nacional: aborto e defesa da vida. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 16, p. 639-647, 2008.
BIROLI, Flávia. Gênero e desigualdades: limites da democracia no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018.
BRITES, Francine Magalhães. Católicas pelo direito de decidir: vozes dissonantes e discursos católicos sobre o aborto (1990-2010). 2014. 151 f. Dissertação (Mestrado de História Cultural) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014.
CORRÊA, Sonia. Ideologia de gênero: assim surgiu o espantalho. Outras Palavras, São Paulo, 14 maio 2021. Disponível em: https://outraspalavras.net/direita-assanhada/ideologia-de-genero-assim-surgiu-o-espantalho/. Acesso em: 2 set. 2023.
DELPHY, Cristine. Verbete patriarcado (teorias do). In: HIRATA, Helena et al. (org.). Dicionário crítico do feminismo. São Paulo: Unesp, 2009. p. 173-178.
GEBARA, Ivone. O que quer dizer Deus acima de todos? Carta Capital, São Paulo, 26 out. 2018. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/o-que-quer-dizer-deus-acima-de-todos/. Acesso em: 14 abr. 2019.
GÓMES, Josefa Buendía; OROZCO, Yury Puello. A teologia feminista de Ivone Gebara e Católicas pelo Direito de Decidir. Revista Mandrágora, São Paulo, v. 20, n. 20, p. 101-110, 2014.
HABERMAS, Jurgen. Fé e saber. São Paulo: Editora Unesp, 2013.
HURST, Jane. Uma história não contada:a história das ideias sobre o aborto na Igreja Católica. São Paulo: Católicas pelo Direito de Decidir, 2006.
MACHADO, Maria das Dores Campos. Religião, cultura e política. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, v. 32, n. 2, p. 29-56, 2012.
MIGUEL, Luis Felipe; BIROLI, Flávia; MARIANO, Rayani. O direito ao aborto no debate legislativo brasileiro: a ofensiva conservadora na Câmara dos Deputados. Opinião Pública, São Paulo, v. 23, n. 1, p. 230-260, 2017.
PEREIRA, Gisele. Irlanda Católica: sim à vida das mulheres, não ao retrocesso! Carta Capital, São Paulo, 7 jun. 2018a. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/irlanda-catolica-sim-a-vida-das-mulheres-nao-ao-retrocesso. Acesso em: 2 set. 2023.
PEREIRA, Gisele. Para ser pilar é preciso não se mover: assim nos quer a Igreja. Carta Capital, São Paulo, 18 abr. 2018b. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/para-ser-pilar-e-preciso-nao-se-mover-assim-nos-quer-a-igreja. Acesso em: 2 set. 2023.
PEREIRA, Gisele. Somos umas heréticas. Carta Capital, São Paulo, 11 out. 2017. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/somos-umas-hereticas. Acesso em: 2 set. 2023.
ROSADO, Maria José F. Nunes. As aparências não enganam: Francisco é Bergoglio. [Entrevista cedida a] Fábio Grotz. Observatório de Sexualidade e Política (SPW), Rio de Janeiro, 18 jul. 2013. Disponível em: http://sxpolitics.org/ptbr/recomendamos-25/3433. Acesso em: 2 set. 2023.
ROSTAGNOL, Susana. El conflicto mujer-embrión en debate parlamentario sobre el aborto. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 16, n. 2, p. 667-674, 2008.
RUETHER, Radford Rosemary. Patriarchy. In: RUSSELL, Letty M.; CLARKSON, J. Shannon. Dictionary of feminist theologies. Louisville: Westminster John Knox Press, 1996. p. 205-206.
SCOTT, Joan W. Experiência. In: SILVA, Alcione Leite da; LAGO, Maria Coelho de Souza; RAMOS, Tânia Regina Oliveira (org.). Falas de gênero. Florianópolis: Editora Mulheres, 1999. p. 11-55.
SILVA, Julia do Silva da. Feministas por opção, católicas pelo direito de decidir:vozes feministas na igreja católica. 2015. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, 2015.
VAGGIONE, Juan Marco. A política da dissidência: O papel das Católicas pelo Direito de Decidir. In: JURKEWICZ, Regina S. Entre dogmas e direitos. São Paulo: Católicas, 2017. p. 77-101.
VAGGIONE, Juan Marco. La “cultura de la vida”: desplazamientos estratégicos del activismo católico conservador frente a los derechos sexuales y reproductivos. Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, v. 32, n. 2, p. 57-80, 2012.
VAGGIONE, Juan Marco. Sexualidad, religión y política en América Latina. Diálogos Regionales, Rio de Janeiro, p. 1-64, 2009.
Notes
Notes
4 Em Fé e Saber, Habermas chama a atenção para o que considera ser o processo de “secularização em uma sociedade pós-secular”. Em uma sociedade pós-secular, os limites entre os argumentos seculares e religiosos seriam inevitavelmente fluídos. Assim, a fronteira controversa entre ambos deveria ser compreendida como uma tarefa cooperativa em que se exigiria compreensão mútua da perspectiva do outro (Habermas, 2013, p. 16).
5 Tradução nossa: “[...] o conceito de natureza/naturalização é básico neste deslocamento do religioso para o secular”.
6 Tradução nossa: “ativismo religioso aprendeu a utilizar ‘estratégias seculares’ sem necessariamente secularizar-se”.
7 A expressão “desprivatização do religioso” é usada por Vaggione (2017) a partir da referência do livro do autor José Casanova “Public Religions in the Modern World. Chicago and London: The University of Chicago Press, 1994”, que se propõe a analisar a temática. Segundo Vaggione (2017), a interpretação desse processo de desprivatização vem da submissão da Igreja Católica às regras do jogo democrático e de uma ideia de religião pública na sociedade moderna.
9 Tradução nossa: “[...] a religião, em sua complexidade, heterogeneidade e dinamismo, pode ser uma influência para a mudança social e legal sobre a sexualidade” (Vaggione, 2009, p. 42).
15 Durante o período da discussão sobre a PEC 181/2015, Rebbeca Mendes entrou com uma liminar junto ao STF, por meio da Anis – Instituto Bioética e do PSOL pedindo autorização para que pudesse interromper legalmente sua gravidez. Seu pedido foi negado pela ministra Rosa Weber.
16 O PL nº. 193 de 2016 é de autoria do senador Magno Malta PL/ES. O senador, já citado no corpo do texto, também apresentou projetos contrários à legalização do aborto. Ver: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3410752&disposition=inline.
Author notes
Editoras de Seção: Daniela Tonelli Manica, https://orcid.org/0000-0001-8014-9996;

Martha Celia Ramirez Gálvez, https://orcid.org/0000-0003-3802-393X.

Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Scientific article viewer generated from XML JATS by Redalyc