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ESCRAVOS BRANCOS NO BRASIL OITOCENTISTA: TRÁFICO INTERNO, DISTINÇÕES RACIAIS E SIGNIFICADOS DE SER BRANCO DURANTE A ESCRAVIDÃO
Marcus Vinícius de Freitas Rosa
Marcus Vinícius de Freitas Rosa
ESCRAVOS BRANCOS NO BRASIL OITOCENTISTA: TRÁFICO INTERNO, DISTINÇÕES RACIAIS E SIGNIFICADOS DE SER BRANCO DURANTE A ESCRAVIDÃO
WHITE SLAVES IN 19TH CENTURY BRAZIL: DOMESTIC TRADE, RACIAL DISTINCTIONS AND “BEING WHITE” DURING SLAVERY
Afro-Ásia, núm. 64, pp. 51-94, 2021
Universidade Federal da Bahia
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Resumo: As reflexões aqui presentes fazem parte de uma pesquisa mais ampla sobre os significados de ser branco no Brasil escravista. Neste artigo, o objetivo é analisar os sentidos e as práticas envolvidos no aparecimento de escravos brancos que, no contexto das consequências geradas pelo fim do tráfico atlântico, foram vendidos no mercado interno brasileiro e se tornaram conhecidos na imprensa durante a segunda metade do século XIX. São casos que se prestam à investigação acerca dos complexos vínculos estabelecidos entre cor, escravidão e liberdade. De forma mais específica, buscamos analisar os aspectos raciais da linha que estabelecia a separação entre escravos e livres, bem como situar o branco no centro da análise racial, procedimento ainda pouco usual entre historiadores brasileiros.

Palavras chave: Escravos brancosEscravos brancos,Tráfico internoTráfico interno,Raças brancasRaças brancas,BranquitudeBranquitude.

Abstract: The reflections presented here are part of an ongoing broader research on the concept of whiteness in Brazil during the time of slavery. The article seeks to analyze the meanings and practices involved in the emergence of captives described as white sold in Brazil after the end of the Atlantic slave trade in 1850, attracting the attention of the press. Such cases lend themselves to research on the complex links between color, enslavement, and freedom. More broadly, the paper analyzes the racial aspects that defined the boundary between the enslaved and free population, placing the concept of whiteness at the center of racial analysis, an unusual approach among Brazilian historians.

Keywords: White slaves, Internal slave trade, White races, Whiteness.

Carátula del artículo

ARTIGOS

ESCRAVOS BRANCOS NO BRASIL OITOCENTISTA: TRÁFICO INTERNO, DISTINÇÕES RACIAIS E SIGNIFICADOS DE SER BRANCO DURANTE A ESCRAVIDÃO

WHITE SLAVES IN 19TH CENTURY BRAZIL: DOMESTIC TRADE, RACIAL DISTINCTIONS AND “BEING WHITE” DURING SLAVERY

Marcus Vinícius de Freitas Rosa
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Afro-Ásia, núm. 64, pp. 51-94, 2021
Universidade Federal da Bahia

Recepção: 19 Novembro 2020

Aprovação: 29 Junho 2021

Décadas após o surgimento dos estudos sobre as relações raciais, datados de meados do século XX, permanece hegemônica entre as ciências sociais (e particularmente entre as análises históricas) a tradição epistemológica que toma os negros como objeto de investigação. A partir do início dos anos 2000, contudo, isso começou a mudar, visto que, com a emergência dos estudos da branquitude, a identidade branca passou a ser tomada como objeto e como problema central do debate racial, enfatizando a sua construção histórica como um lugar de vantagem nas relações de poder.1 Análises como as de Maria Aparecida Bento, Lourenço Cardoso, Lia Vainer Schucman, Liv Sovik e Richard Miskolci têm demonstrado que, em terras brasileiras, a identidade branca quase nunca é demarcada como racial, dificilmente recebe significados depre- ciativos e é frequentemente tomada como um modelo normativo para as outras identidades. As investigações apontam a existência de hierarquias entre os brancos e que, ainda que nem todas as classificações raciais sejam inequívocas, no Brasil, branco é quem aparenta ser branco.2

Esses estudos têm demonstrado que a brancura epidérmica está vinculada a valores positivos, como poder, superioridade, riqueza, prestígio, beleza, inteligência, eficiência, produtividade e sucesso. Tais significados acarretam distinções simbólicas e sociais profundas entre brancos e não brancos, pois funcionam como critérios orientadores das relações sociais, conduzindo à formação de desigualdades raciais. Há, portanto, um forte vínculo entre epiderme branca e lugar social de privilégio, benefício e vantagem. No Brasil, o campo de estudos sobre a branquitude é bastante recente, está em pleno processo de consolidação e aprofundamento, permanecendo em debate as formas como as identidades brancas foram construídas na sociedade brasileira, marcada pela escra- vidão, pela miscigenação e pelos projetos de branqueamento.3

Seguindo os caminhos abertos por tais estudos, as reflexões desen- volvidas neste artigo fazem parte de uma pesquisa mais ampla acerca dos significados de ser branco no Brasil escravista e sobre as práticas de favorecimento racial orientadas por esses significados durante a primeira metade do século XIX. Ao desenvolver a busca por fontes com foco em trabalhadores brancos – procedimento ainda pouco usual entre historia- dores brasileiros –, foram identificados também vários escravos brancos, conforme os critérios raciais vigentes naquele período, surgindo nos momentos finais do tráfico atlântico de africanos, mais particularmente a partir da intensificação do tráfico interprovincial, com prolongamento dessas evidências até a década de 1880. Eles se tornaram conhecidos na imprensa de diversas cidades brasileiras, e alguns estavam sendo vendidos no mercado interno; outros, em vias de conquistar a alforria.4 Neste artigo, o objetivo principal é identificar os significados atribuídos à cor branca daqueles escravos, bem como investigar as atitudes e reações que eles despertavam. São situações que se prestam à análise dos nexos estabe- lecidos entre pele clara e liberdade. Em linhas mais gerais, buscamos analisar os aspectos raciais da linha jurídica que estabelecia a separação entre escravos e livres. Ao longo da análise, foi compreendida a cor como uma das principais características – porém, não a única – levada em consi- deração naquele período enquanto critério de classificação racial.

Escravidão branca: um tema raro

Ao longo da primeira metade do século XIX, o debate sobre o fim do tráfico de africanos e a suposta crise de mão de obra acarretaram, entre outras consequências, uma preocupação com a importação de trabalhadores brancos e suas condições de recepção e trabalho no Brasil. Em artigos publicados na imprensa e em debates parlamentares, eram feitos alertas, por exemplo, de que o colono proveniente da Suábia, Saxônia, Silésia e Vestfália (regiões que viriam a ser parte da Alemanha após a unificação) “já não teria que recear de ser vendido por escravo branco”.5 Em outros casos, surgiram denúncias e reclamações a respeito da escravização de cristãos brancos por navios piratas que partiam dos estados islamizados do norte da África, principalmente da Argélia, Marrocos, Tunísia e Líbia, chegando ao ponto de criticar a Inglaterra por centrar a repressão ao tráfico de escravos africanos e não fazer o mesmo esforço para reprimir o tráfico muçulmano de cristãos brancos.6 Além disso, foram elaboradas críticas à existência de escravos brancos na Rússia e na Turquia.7 Ao mesmo tempo, tornou-se cada vez mais recorrente o hábito de classificar de “escravos” os colonos brancos importados de Portugal mediante contrato de trabalho, submetidos à exploração agrícola e doméstica no Brasil, assim como chamar tal condição de “escravidão”.8 Como bem apontou Flávia Souza em seu estudo sobre os trabalhadores domésticos no Rio de Janeiro, as expressões “tráfico de brancos” e “escravidão branca” surgiram com frequência na imprensa carioca durante as décadas de 1850 e 1860.9

O receio manifestado em muitos periódicos da imprensa brasileira diante da possibilidade de um europeu “ser vendido por escravo” precisa ser compreendido em um quadro mais amplo. Na verdade, do século XVIII ao XIX, em diferentes regiões do mundo Atlântico, trabalhadores irlandeses, portugueses, italianos e franceses foram exportados de seus países de origem para atuar como “colonos brancos” em unidades de produção agrícola localizadas nas Américas. Recebendo diferentes nomes nas várias colônias europeias para as quais eram destinados – “engaja- mento”, “engagé”, “indentured servants” – tratava-se de uma modalidade de trabalho em que as despesas de transporte eram pagas pelo empre- gador, que deveria ser indenizado pelo trabalhador por meio da prestação de serviços por períodos estabelecidos em contrato. Endividados, esses trabalhadores não recebiam remuneração, estavam sujeitos às penalidades criminais caso descumprissem o acordo e podiam ter seus contratos transferidos para outros contratantes.10 “Ladeados por cativos no labor dos campos”, como aponta Luiz Felipe de Alencastro ao analisar o caso brasileiro, muitos engajados conviveram “com escravos nas senzalas” e por vezes eram “controlados por escravos-feitores”.11 Ainda assim, os engajados não eram escravos, tratava-se de uma modalidade de trabalho que oscilava entre formas voluntárias e compulsórias, próximas da servidão e intermediárias entre o trabalho escravo e o livre.12

Na imprensa brasileira, o debate sobre “escravos brancos” emergiu ao longo da primeira metade do século XIX, particularmente a partir da década de 1830, como um efeito da repressão inglesa ao comércio de almas africanas e como expressão dos descontentamentos senhoriais em relação à Inglaterra, e alcançou os anos que se seguiram ao fim do tráfico atlântico. Num período em que as atividades produtivas eram associadas à escravidão e o branco era vinculado à liberdade e ao ócio, as circuns- tâncias de vida e trabalho dos africanos forneciam as referências com as quais eram avaliadas as formas de importação e recepção de trabalhadores europeus. As referências oitocentistas aos “escravos brancos” indicam uma perspectiva global a respeito das várias modalidades de trabalho compulsório e de escravidão utilizadas havia bastante tempo em outras partes do mundo, decorrendo disso certa repulsa à ideia de que, no Brasil, trabalhadores de pele clara, cabelos lisos, lábios finos e delicados narizes, como este artigo buscará demonstrar, pudessem vir a ser submetidos às mesmas condições de trabalho que os cativos negros. Isso ficou evidente quando certos “escravos brancos” – que não eram colonos engajados viraram notícia em diferentes cidades, gerando preocupações com a imagem do Brasil no exterior e revelando temores diante da incerteza de lugares raciais bem definidos.

Alberto da Costa e Silva situa no século XVII a consolidação do vínculo entre ser “negro” e ser “escravo”. Mesmo nos séculos XV e XVI, já havia se tornado raro na Europa encontrar um escravo branco cristão. Em Portugal, naquele período, ainda existiam cativos árabes, berberes, turcos e, em quantidades inferiores, indianos, malaios e chineses. Contudo, ano após ano, os escravos africanos se tornaram cada vez mais presentes nas cidades portuguesas a ponto de, no século XVII, negro tornar-se escravo por excelência, tanto na Europa quanto nas Américas. A possibilidade de haver escravos de pele tão clara que pudessem ser considerados brancos apagaria, conforme Costa e Silva, a nitidez de uma hierarquia escravista cujo cume deveria ser ocupado por senhores brancos e sua base por escravos negros.13 Posteriormente, no século XVIII, esse vínculo entre ser negro e ser escravo ganhou um novo reforço.

O parágrafo 10º do Diretório dos Índios, redigido pelo Marquês de Pombal, proibiu “que pessoa alguma chame Negros aos Índios” e explicou que o emprego inadequado daquela classificação fazia crer que “a natureza os tinha destinado para escravos dos brancos, como regular- mente se imagina a respeito dos Pretos da Costa da África”. “Negro” era termo abominável, indecoroso, desonroso, vil, infame e diretamente associado ao cativeiro,14 ao mesmo tempo, conforme o vocabulário de Rapahel Bluteau, “branco” aplicava-se ao “homem [...] bem-nascido e que até na cor se diferencia dos escravos, que de ordinário são pretos ou mulatos”. O bem-nascer e a pele alva eram apenas dois entre outros fatores possíveis de definição do termo, já que homens brancos se afastavam da escravidão, conforme Bluteau, até mesmo na cor .15

A chamada “escravidão branca” não é desconhecida pela historio- grafia, já que o tema foi tratado (quase sempre pontualmente) em diversos estudos que abordaram diferentes tempos e lugares. Robert Davis, por exemplo, analisou o tráfico de cristãos brancos sequestrados no Atlântico Norte e no Mediterrâneo por navios piratas provenientes dos reinos islami- zados da África do Norte.16 Já entre as interpretações que buscam explicar como era possível a existência de escravos brancos no Brasil oitocentista, uma resposta é recorrente: as escravas negras eram alvos frequentes do abuso sexual senhorial, dando origem a crianças que herdavam a condição escrava materna, mesmo quando nasciam brancas, como sugerem Robert Conrad, Luis Beneduzi e Hendrik Kraay.17 Este último, um dos poucos historiadores a analisar mais atentamente os casos de pessoas brancas em cativeiro no Brasil, pontua que a expressão “escravidão branca” era frequente no século XIX, ainda que problemática por conta da natura- lização da escravidão negra, e empregada para desaprovar a coerção de pessoas consideradas inelegíveis para a escravidão. De acordo com Kraay, seu uso poderia abarcar imigrantes portugueses importados mediante contrato de trabalho, cujas dívidas foram vendidas para fazendeiros brasi- leiros, e mulheres europeias forçadas à prostituição fora de seus países de origem.18 Análises como as de Maria Helena Silva, Beatriz Kushnir, Emma Goldman e Suzana Lopes Faria indicam que o fim do tráfico de africanos em meados do século XIX deu impulso ao tráfico internacional de mulheres brancas para fins sexuais, sobretudo provenientes do Leste Europeu.19 Nesse caso, os estudos se voltam para as relações entre tráfico e prostituição, enfatizado profundas desigualdades de gênero e caracte- rizando tais mulheres como “escravas brancas”, mesmo em períodos e lugares nos quais já não havia leis sancionando a existência da escravidão.20

Se esse tema raras vezes foi alvo de abordagens sistemáticas pela historiografia, o mesmo não se pode dizer da literatura. Pessoas brancas escravizadas receberam atenção frequente de vários escritores românticos oitocentistas. Alberto da Costa e Silva sugere que a comoção e a clemência despertadas pela escravidão branca encontraram os seus maiores desdobramentos literários por meio da obra A escrava Isaura , de Bernardo Guimarães, publicada em 1875. Trata-se de um romance a respeito de uma cativa branca e que, um século depois, veio a ser a novela brasileira com maior fama internacional, tendo a atriz Lucélia Santos desempenhado o papel de Isaura.21 Ilídio de Carvalho Vianna, por sua vez, escreveu o drama abolicionista intitulado O escravo branco , em 1881, peça produzida com finalidade de arrecadar fundos para a emancipação do cativeiro.22 Em dezembro de 1884, o Clube Dramático Gonçalves Leite exibiu no Rio de Janeiro, pela primeira vez, “o drama de propaganda abolicionista” intitulado A escrava branca .23 As análises dessas narrativas literárias oitocentistas, mais especificamente acerca das escravas brancas, destacam significados morais ausentes na escravização de africanas e crioulas: a honra, a beleza, a pureza e a inocência atribuídas ou exigidas de mulheres brancas contrastavam com a degradação moral do cativeiro e a perversão sexual dos senhores.24

Convém alertar desde já que os escravos e escravas brancos aqui analisados eram bastante raros se comparados ao volume de africanos e crioulos em cativeiro; não eram imigrantes mediante contrato para trabalhar na plantation escravista; não eram mulheres europeias forçadas a se prostituir e muito menos eram o resultado da captura de europeus nos litorais da Europa. Seguindo interpretações já realizadas, tais escravos haviam nascido na escravidão e herdaram tal condição jurídica por via materna, eram o resultado de costumes locais e bem brasileiros de repro- dução da mão de obra cativa. Em tese, seria de se esperar que fossem reconhecidos como pardos ou mulatos, considerando seus prováveis antepassados mistos e seu nascimento na escravidão. Isto, entretanto, não aconteceu na maioria dos casos encontrados, pois sua pele e demais traços físicos eram percebidos pelos contemporâneos de modos muito diferentes daqueles atribuídos aos africanos. Assim sendo, a maioria dos escravos brancos identificados nas fontes aqui analisadas não foram considerados mestiços, mesmo que a origem dos antepassados ainda fosse relevante em meados do século XIX, enquanto critério de classificação étnica ou racial. Em grande medida, os escravos brancos foram possíveis devido aos conflitantes e complexos processos de miscigenação vigentes na sociedade escravista. Ao mesmo tempo, é inegável que havia outras formas de as pessoas brancas estarem bem próximas do cativeiro.

Brancos e negros sentenciados às galés

O emprego de punições corporais e o uso de trabalhadores compulsórios enquanto práticas previstas em lei estiveram presentes em diversos países, caracterizando uma longa duração desde a Roma antiga e suas colônias no Mediterrâneo ao Império Português e suas conquistas no Atlântico. No Brasil das primeiras décadas do século XIX, conforme Paloma Fonseca, tais práticas continuavam presentes e estavam bastante próximas da escravidão.25 A respeito dos criminosos condenados à prestação de trabalhos forçados, tais como a abertura de vias e o fornecimento de água para palácios, hospitais e prédios públicos, o desenhista e militar inglês Henry Chamberlain empregou a expressão “escravos das galés” (“galley slaves”) e produziu narrativas e gravuras bastante sugestivas. Visitando o Rio de Janeiro entre os anos de 1819 e 1820, a tonalidade epidérmica dos galés não passou despercebida.

A Figura 1 , gravura de Chamberlain, denuncia a atenção do inglês para um prisioneiro que destoava dos demais integrantes do grupo, não apenas na fisionomia, mas também nos trajes, ligeiramente mais bem preservados do que as vestimentas dos seus companheiros. Ao mesmo tempo, todos eles compartilhavam os pés descalços, símbolo da condição escrava naquele contexto. Chamberlain explica que os “escravos das galés” eram, na verdade, “bandos de criminosos condenados” que trabalhavam sob a supervisão policial.26 Originalmente, o termo “galés” referia-se a uma embarcação típica do Mediterrâneo, empregada desde a antiguidade, em que homens condenados pela prática de crimes eram utilizados como remadores ou trabalhadores compulsórios nos navios. Em Portugal, as galés foram utilizadas entre os séculos XIII e XVII. Com a obsolescência daquelas embarcações, ser condenado às galés passou a significar cumpri- mento de pena em trabalhos públicos, isto é, para o Estado. Durante o Antigo Regime português, tal condenação era aplicada aos crimes graves e, conforme as Ordenações Filipinas, compiladas em 1603, aqueles que a recebiam eram legalmente degredados e ficavam obrigados a usar ferros, correntes, calcetas ou grilhetas (como se vê na Figura 1 ).27


Figura 1
: Prisioneiros das Galés na gravura de Henry Chamberlain
Fonte: Chamberlain, Views and Costumes of the City , p. 88.

Na ocasião em que Chamberlain passou pelo Rio de Janeiro, as sentenças de morte, degredo e galés perpétuas permaneciam sendo punições severas para crimes considerados graves; mais especificamente, as galés continuavam acompanhadas pela imposição de trabalhos forçados em obras públicas, sendo os detentos aproveitados como mão de obra pelo Estado. Dando continuidade às concepções vigentes desde as Ordenações Filipinas, a prisão com trabalho compulsório e a escravidão estavam bastante próximas no início do século XIX.28 Antônio de Moraes Silva explicava, ainda em 1789, que “açoites e galés”, bem como o “degredo por toda a vida”, equivaliam à “morte civil”.29 Posteriormente, o Código Penal de 1830 colocou as galés entre aquelas penalidades, tais como o degredo e o desterro, cujos sentenciados ficavam “privados do exercício dos direitos políticos de cidadão brasileiro”.30 A distância jurídica entre a escravidão e aquela modalidade de condenação era bem demarcada, mas bastante curta, motivo pelo qual havia uma evidente proximidade entre escravos e galés na gravura feita pelo viajante inglês.

No segundo plano da Figura 2 , logo atrás dos “escravos das galés”, entre os quais novamente havia um homem de pele clara, estava uma “negra branca”, conforme registro de Chamberlain, semelhante às “albinas da Europa”. Como elas, afirmou o desenhista, “existem várias no Rio [de Janeiro]”.31


Figura 2
: Prisioneiros das Galés na gravura de Henry Chamberlain
Fonte: Chamberlain, Views and Costumes of the City, p. 58.

A “negra branca” desenhada e descrita por Chamberlain não deixava de ser negra e escrava, ainda que tivesse pele branca, sinal de que, para ser mesmo branca, seriam necessários outros critérios além da cor. Seus cabelos crespos, seus lábios grossos e seu nariz largo não eram diferentes daqueles identificáveis nos homens negros presentes na gravura. Ainda que os “escravos das galés” caracterizassem uma forma de conde- nação, e não de escravidão, já que tal condição resultava da punição por algum crime, convém observar que, nas duas gravuras de Chamberlain, entre os homens que desempenhavam essa forma de trabalho compul- sório, a maioria era formada por negros retintos e apenas dois tinham a pele clara. Parecia haver ali uma regra e uma exceção, que atraía a atenção do estrangeiro.

Ressalvando-se as mulheres, que não podiam ser destinadas às galés, o Código Criminal de 1830 previa que essa punição podia ser aplicada tanto aos cidadãos quanto aos cativos. Convém, então, investigar se negros e brancos eram condenados às galés com a mesma frequência ou proporção. Ainda que muitos homens livres acabassem sendo senten- ciados às galés, Liliam Brighente aponta que, entre as autoridades judiciais e parlamentares, era frequente a interpretação de que esta penalidade era reservada aos escravos.32 Andrei Koerner, por sua vez, argumentou que os destinatários das punições eram diferenciados em função de seus estatutos jurídicos e qualidades. Muitos juristas e parlamentares pensavam que certas penas não eram suficientes para impor ordem a uma população atrasada e incivilizada. Para essa parcela, eram necessárias penas com maior poder de intimidação, tais como a condenação à morte e às galés. “A proposta mais comum”, observou Koerner, “era que a pena de galés deveria ser exclusiva aos escravos”. Assim, buscava-se evitar a degradação de cidadãos livres que, mesmo condenados, não deveriam ser equiparados aos cativos.33

A preservação das distinções jurídicas, contudo, não era o único motivo das preocupações acerca de quem poderia ou deveria ser enqua- drado naquela penalidade. Um panfleto apócrifo afirmava que os brancos, mesmo “o homem mais baixo do povo”, indignavam-se ao não serem considerados “muito superior[es] a um africano” e, quando condenados, até mesmo os carrascos eram sensíveis nas ocasiões em que um branco reclamava que “isso é tratar-me como um negro”.34 O reconhecimento das distinções de cor se expressava na opinião de que pessoas brancas não deveriam ser punidas com galés, fosse no Brasil ou em outras partes do mundo. Em 1837, Domingos Barreto defendia a continuidade do tráfico de africanos e criticava duramente a Inglaterra por vender “escravos brancos” aos fazendeiros norte-americanos: “réus de crimes, que eram condenados ao serviço de galés perpétuas”.35 Por fim, Von Martius registrou que, entre os galés, além dos negros, havia “homens brancos [...] vistos durante o dia, carregados de correntes, em trabalhos públicos nas ruas”, contudo, o serviço nessas condições – quando executado por brancos – era censurado pelos senhores “de escravos pretos”, porque faziam questão que se reconhecesse “também moralmente, a diferença física das raças”.36 Havia uma evidente desaprovação incidindo sobre as situações em que homens brancos eram sentenciados às galés, uma degradação moral que se tornava aceitável quando recaía sobre homens negros. Eis aí provavelmente o motivo pelo qual os retintos eram maioria naqueles dois registros visuais dos galés. Aquela punição era menos aplicada aos livres, e, considerando o vínculo entre brancura e liberdade, é possível supor que recaísse menos sobre os homens brancos. Se a condenação às galés já sugere certa incom- patibilidade com a pele clara, resta refletir sobre como se dava a relação entre ser branco e ser escravo.

Em nada se parecem com as da raça africana: mulheres brancas na escravidão

Em sua passagem pelo Rio de Janeiro na década de 1840, o viajante inglês Thomas Ewbank produziu um relato detalhado a respeito de uma casa de leilões. Entre móveis, quadros, relógios, utensílios de cozinha, cerâmicas, livros e sapatos, Ewbank vislumbrou a exposição de um lote contendo 89 pessoas: eram 53 homens, com idades entre 18 e 30 anos; e 36 mulheres, com idades entre 7 e 26 anos. Tratava-se de uma “lista variada de merca- dorias de cor”, dispostas em bancos atrás de grades. Conforme a narrativa do estrangeiro, “eram de todas as tonalidades, desde o azeviche profundo de Angola ao branco ou quase branco”. A respeito de uma cativa “quase branca” exposta ao público naquele mesmo lote, Ewbank sugeriu que “ela certamente era superior em organização mental a alguns dos comprado- res”.37 O olhar do estrangeiro atribuiu condição mentalmente superior justamente a uma escrava cuja cor se aproximava da brancura. A cativa “quase branca” de Ewbank, assim como a “negra branca” de Chamberlain, carregavam no corpo as marcas que indicavam a dupla ascendência, branca e negra; logo, não possuíam uma aparência que permitisse ocultar total- mente a parcela africana de seus antepassados. Diferente delas, contudo, havia várias cativas cuja alvura destoava bastante da condição escrava e africana no Brasil do século XIX.

Em São Paulo, no ano de 1853, podia-se ficar sabendo a respeito do escândalo gerado pela “exposição de uma escrava branca em leilão”, ocasião em que O Observador , diário de orientação liberal, lamentou o fato de que nem o anunciado leilão nem uma subscrição puseram fim ao cativeiro daquela mulher. Ao mesmo tempo, advertia aos leitores que faltava pouco para a conquista da liberdade, buscando incentivá-los a contribuir, pois já se havia arrecadado o valor de 523$ réis, sendo que “o senhor consente em alforriá-la por 600$”. Enquanto não se obtinha a quantia necessária, a escrava branca permanecia “alugada, a servir em uma casa boa”.38 Anos depois, em setembro de 1883, andava pelas ruas de São Paulo um “cidadão acompanhado de uma mulher branca”, reali- zando uma subscrição em favor dela, já que sendo “escrava” e “branca”, dizia a nota, “seu senhor outorgava-lhe a liberdade por módica quantia”. Ao que parece, a referência à “módica quantia” sugere que, no caso dela, sair da escravidão custaria poucos réis. Compadeceu-se da situação um tal Abílio Soares, que se encarregou de “completar” a verba necessária para a libertação.39 Ainda em 1883, mas na cidade de Recife, por decisão de um desembargador daquela comarca, “foi passada a carta de liberdade à escrava branca” de nome Andrea Córa, propriedade do Dr. Bandeira de Mello. A nota informa que os “árbitros protegeram os interesses do senhor”, cujo objetivo era vendê-la por 1:200$ réis.40

Entre os registros até agora encontrados a respeito desses casos, os mais longos e dramáticos foram aqueles dedicados às escravas brancas, narrados com exageros comoventes, descrição obsessivamente detalhada dos traços físicos e forte apelo emocional direcionado ao público leitor com finalidade de convencê-lo a contribuir financeiramente para a compra da alforria. A intersecção entre idade, cor e gênero parecia mobilizar a atenção pública e comover mais quando se tratava da escravização de jovens brancas do que quando se tratava de homens brancos. Em sua maioria, esses casos foram publicados na imprensa do Rio de Janeiro; ao mesmo tempo, tais registros fornecem informações a respeito de escravas brancas em várias outras províncias, sugerindo que sua circulação pelo país e a publicidade conferida a elas estava, de alguma forma, associada à ampliação do tráfico interprovincial. O destino de quase todas as escravas e escravos brancos foi o Sudeste.

Hendrik Kraay observou que os casos de pessoas brancas na escra- vidão apresentavam algumas características comuns: os cativos estavam afastados de seu contexto social; ocorreram manifestações de choque e estranhamento diante da descoberta; eles se tornaram alvos de intervenções de espectadores em locais públicos e de financiamentos coletivos para a compra da alforria;41 e os jornalistas que condenaram a escravidão branca estavam preocupados com a opinião dos estrangeiros, ainda que não seja evidente o quanto essa preocupação se estendia na sociedade brasileira do período. Além disso, os debates jornalísticos e as próprias intervenções dos espectadores expressaram, segundo Kraay, respeito pela escravidão enquanto instituição. O direito dos senhores à propriedade privada preva- lecia sobre o direito à liberdade. Por mais que os cativos brancos tenham chocado os espectadores, ninguém questionou a escravidão: pessoas que desconheciam aqueles escravos abriram as carteiras e contribuíram para a compra da manumissão. Na maioria dos casos, as pessoas brancas escravi- zadas que receberam a liberdade eram meninas e mulheres jovens.42

Na cidade de São Paulo, em setembro de 1852, o porteiro das audiências do juizado de órfãos anunciou o leilão de Felicidade, jovem com idade entre 15 e 16 anos, pertencente à herança de Joaquim Nunes Ribeiro. Na sala em que ocorreria a venda, os compradores teriam sido “surpreendidos” e “repassados de dor”, conforme a notícia carregada de sentimentalismo a respeito do episódio. O leilão acabou sendo suspenso, pois, por iniciativa do próprio juiz de órfãos, Doutor Carvalhaes, formou-se uma comissão encarregada de mobilizar a “caridade dos habitantes da capital” paulista e de organizar uma subscrição com finalidade de promover a alforria da “infeliz”. A mobilização devia-se ao fato de Felicidade ser “menina perfeitamente branca” e “de bela aparência”, mas escrava.

Ao que parece, outras colaborações para alforriar meninas brancas haviam acontecido por aqueles dias, já que, conforme o mesmo registro, “mais de uma ação destas se tem dado nestes últimos tempos”. Diante de situação nem tão incomum, o redator resolveu advertir aos leitores que, no Brasil, “o nosso escravizar não se estende tão irracionalmente como creem os estrangeiros”. Assim, buscava-se convencer (falando para brasi- leiros, mas mirando nos europeus) que a insensatez nacional não chegava a ponto de escravizar brancos. O limite da racionalidade era o costume de manter na escravidão os filhos pretos e pardos das africanas e crioulas, afinal, “num país de livres instituições”, concluiu o registro, “é assim que se pensa, é assim que se faz”.43 Uma das maiores nações escravistas das Américas deveria ser livre para pessoas da cor de Felicidade.

Analisando a obra romântica A escrava Isaura , de Bernardo Guimarães, em 1875, José Carlos Silvério chamou atenção para a incom- patibilidade entre a aparência da personagem e sua condição cativa: a brancura de Isaura era tal que seus observadores jamais desconfiavam de que em suas veias corria sangue africano.44 Sua aparência não denunciava a parte negra de seus antepassados, além disso, em diferentes períodos, como sugere Luciana Gebrin, as escravas brancas – reais como Felicidade, ou imaginárias como Isaura – geraram pânico moral, pois a sua escravização era vista como uma afronta à beleza e à inocência atribuídas às mulheres brancas, sobretudo às mais jovens.45 No mesmo sentido, conforme Hendrik Kraay, as ficções literárias e teatrais a respeito das escravas brancas eram profundamente semelhantes aos relatos jornalísticos acerca das inter- venções dos espectadores sobre as escravas brancas reais. As evidências narrativas atribuem àquelas cativas certas características físicas, tais como a beleza dos traços, a brancura da pele, a lisura dos cabelos e valores morais, como inteligência, honestidade, castidade, virgindade, “coração nobre”, “mentalidade incomum” e “serenidade angelical”.46 Diferente dos significados morais conferidos às africanas e às crioulas, como observei anteriormente, a honra e a pureza das brancas entravam em contradição com a degradação moral do cativeiro e a brutalidade dos seus donos.47

No dia 3 de março de 1856, O Grito Nacional informou aos leitores cariocas que “foi apresentada à secretaria de polícia, a fim de obter passa- porte, uma moça branca, com os cabelos lisos, soltos, cobrindo-lhe o colo e costas”. A desgraça, do ponto de vista do jornal, consistia no fato de que a “cativa branca” – mencionada no documento em letras maiúsculas, para ressaltar sua cor – deveria ser “vendida para fora da corte”. Tratava-se, então, de um acontecimento que, por conta da brancura da mercadoria, abalava a normalidade do tráfico interno: aquela prática era admissível para negros, mas inaceitável para pessoas daquela coloração.

No primeiro momento, a ira dos presentes voltou-se contra o funcionário da repartição. O responsável pela emissão do passaporte (documento exigido a qualquer cativo para poder viajar) defendeu-se dizendo que aquilo era “uma infâmia; não estamos na Rússia, onde se vende gente branca”; entretanto, advertiu que “ali não fazia mais do que exercer o seu ofício”. Sua única responsabilidade era emitir o passaporte. Tal alegação indicativa de que o funcionário conhecia as formas que a escravidão assumia em outras partes do mundo parece não ter surtido efeito, sobretudo diante da constatação de que os outros burocratas haviam-se recusado a realizar os procedimentos de despacho.48 As vociferações, então, se voltaram contra um outro alvo: o proprietário da escrava, Manoel Carlos da Silva Araújo, português, fazendeiro,49 morador da freguesia de Sant’Ana, Rio de Janeiro, membro do Partido Liberal50 e que viria a candidatar-se a juiz de paz em 1860.51 A reação ao intento do proprietário, certamente um membro da elite política do Rio de Janeiro, sugere a intensidade da reprovação motivada pela venda de uma mulher branca.

A notícia de que uma escrava como aquela seria traficada para fora do Rio de Janeiro rapidamente se espalhou. A rapariga foi acudida por funcionários e empregados da repartição de polícia; transeuntes entraram no recinto para saber se aquilo era mesmo verdade. A situação teria gerado múltiplas reações: admiração, pasmo e indignação nos curiosos, entre os quais estava o próprio redator da notícia, que se sentia “repassado de dor”. A escrava branca, por sua vez, estaria “debulhada em pranto”, “aflitíssima” entre gemidos e soluços, imersa na “angústia que a dilacerava”. A narrativa caracteriza o acontecimento como um drama, carregado de sentimentalismos exagerados, com a nítida intenção de comover o leitor diante da desumanidade de vender uma “escrava branca nascida no livre Brasil”. Uma combinação de critérios – a pele clara, o país de nascimento e a nação livre – orientava o julgamento condena- tório da venda e gerava preocupações ufanistas a respeito do que, afinal, pensaria o “mundo civilizado”, caso tomasse conhecimento de que a escravidão alcançava pessoas brancas nascidas no Brasil. É certo que, em parte, o vexame se devia à manutenção da escravidão negra após o fim do tráfico atlântico; contudo, o fato de a cativa não ter a mesma cor das pessoas tradicionalmente sujeitadas à escravidão era um agravante. Submetê-la ao comércio escravista era, conforme a narrativa, um “ato de tanto horror” que, além de causar “vergonha” e “ignomínia”, equivalia a “canibalismo”. Não se podia, finalizou o redator, “permitir que um fato destes se dê em meados do século XIX”, buscando fazer crer que escravidão era uma atitude primitiva e atrasada, especialmente naquele caso e naquele momento.52

Entre 1830 e 1850, período em que já havia no Brasil uma noção de opinião pública, a imprensa foi (apesar do baixo índice de letramento da população) um palco privilegiado dos debates sobre tráfico e escravidão. Os periódicos costumavam se alinhar às orientações políticas partidárias ou mesmo serem órgãos de expressão de luzias e saquaremas, revelando posicionamentos complexos e nem sempre divergentes. Entre os setores mais resistentes às mudanças, a pressão inglesa para dar fim à introdução de africanos costumava ser interpretada como afronta à soberania do Brasil e gerava reações nacionalistas favoráveis à manutenção do tráfico e do cativeiro. Os jornais liberais, por sua vez, mais alinhados aos interesses ingleses (e, por vezes, financiados por eles), tendiam a ser favoráveis ao fim do tráfico de escravos, prática responsável pela indesejável ampliação da presença africana no Brasil, motivo pelo qual requisitavam mão de obra livre por meio da importação de colonos europeus. A partir de 1850, a interrupção do comércio de “carne humana” com manutenção da escra- vidão e anistia aos proprietários de escravos ilegais, solução saquarema com adesão dos luzias, ensejou nas páginas dos jornais a continuidade dos debates, das críticas e das preocupações com a imagem externa do Brasil como um país arcaico, primitivo e atrasado diante das nações livres, modernas e civilizadas.53 Assim, a reprovação do comércio de pessoas brancas, evidente nas fontes, estava inserida no quadro de um debate anterior e bem mais amplo sobre os rumos do tráfico e os significados da escravidão no Brasil.

Retomando o relato de 1856 sobre a venda da “cativa branca”, é preciso ressaltar que o autor da narrativa passou o tempo todo medindo o índice de brancura dos envolvidos. Primeiro, observou que a cativa era “mais clara que o despachante” da secretaria de polícia; depois, enfatizou que a “moça [era] mais clara que seu senhor” e, por fim, sugeriu que talvez o proprietário luso Manoel Carlos da Silva Araújo descendesse de escravas “mais claras que seus senhores”, que haviam recebido a liberdade em Portugal pelo Alvará de 16 de janeiro de 1773, determinado pelo Marquês de Pombal.54 Ao insistir que a cativa era mais alva do que o despachante e o proprietário, ambos responsáveis pela sua venda, o autor da notícia chamava atenção para o absurdo presente no fato de se tomar uma mulher daquela cor como mercadoria e, ao que parece, não era o único a pensar assim. Considerando-se que a escrava já estava vendida, que não foi despachada para fora da Côrte e que seu comprador a aguardava, estava-se diante de um impasse. Eis, então, a solução encontrada: uma “pardinha escura” foi apresentada ao despachante para ser enviada no lugar da “cativa branca”.55 Duas cores, dois procedimentos: a diferença de tonalidade epidérmica entre aquelas escravas tornava aceitável que uma delas, a de pele mais escura, fosse vendida.

Analisando a colaboração entre as marinhas brasileira e britânica para a apreensão de navios negreiros após a Lei Feijó, Beatriz Mamigonian identificou que, entre as várias embarcações interceptadas no ano de 1835, constava o Patacho Continente, um dos responsáveis por colocar em terra centenas de africanos.56 Coincidência ou não, duas décadas mais tarde, uma embarcação com o mesmo nome estava em atividade, atuando tanto no transporte comercial de passageiros livres, quanto na execução do tráfico interprovincial. Em setembro de 1857, o Patacho Continente partiu do Rio Grande do Sul rumo ao Rio de Janeiro, transportando viajantes mediante pagamento de bilhete, incluindo os escravos endereçados a Félix Antunes Moreira. Entre as mercadorias humanas, destinadas a serem vendidas por consignação, constava “uma escrava branca de 13 a 14 anos” que, conforme registro do Correio Mercantil , “tem cabelos corridos, pele alva e feições delicadas, que em nada se parecem com as da raça africana ” (grifo nosso).57 A nota, assim, marcava o contraste entre as características físicas dos cativos convencionais e a aparência daquela jovem escrava branca, tida por exceção.

Foi em nome da justiça e da moralidade pública que os leitores do Correio Mercantil foram chamados a promover uma subscrição para alforriar a escrava branca transportada pelo Patacho Continente em 1857. Não é difícil perceber que, conforme o autor do registro, o lugar da menina não era na escravidão, além disso, aquela não era a única jovem branca cujo cativeiro foi capaz de mobilizar o altruísmo negado às escravizadas de pele escura. O Correio Mercantil reclamou das autoridades baianas, que estavam demorando para fornecer as informações solicitadas pelo chefe de Polícia do Rio de Janeiro a respeito de “uma menor que se achava nas mesmas circunstâncias quanto à cor às da escrava branca que acaba de ser importada do Rio Grande [do Sul]”. Diante do elevado volume de cativos pretos e pardos que transitavam de província em província – mas não despertavam o interesse das autoridades nem suscitavam pedidos de escla- recimentos aos administradores públicos – eram os raros escravizados de pele clara que motivavam preocupações como as do autor da notícia, que finalizou assim: “abstemo-nos das considerações sinistras que despertam os amiudados exemplos que vão aparecendo de escravos brancos vindos do interior”.58 Ao que parece, tratava-se de algo que acontecia com certa frequência em meados da década de 1850.

Richard Graham e Luiz Carlos Soares explicam que o tráfico interno ou interprovincial diz respeito às transferências comerciais de escravos a partir das províncias do Sul, Norte e Nordeste para as plantações de café do Sudeste – São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais – a partir de 1850. Graham e Soares apontam que o tráfico interno já era realizado em níveis baixos durante o período colonial e mesmo no século XIX, antes das leis de 1831 e de 1850. Contudo, foi a partir da Lei Eusébio de Queiroz que o comércio interprovincial atingiu amplas proporções, estruturando-se quando a Coroa finalmente tomou medidas mais efetivas para coibir o tráfico atlântico, até então principal fonte de fornecimento e reposição de escravos. Além disso, Graham e Soares apontam que o mercado nacional de cativos foi condicionado pelas desigualdades econô- micas regionais. Diretamente associado ao desenvolvimento da economia cafeeira do Sudeste, tratava-se de um circuito que transferiu cativos das áreas menos lucrativas para as mais rentáveis. A maioria das vendas era realizada por consignação, mediante procuração concedida pelos proprie- tários aos intermediários, responsáveis pela negociação com os vendedores finais. Havia, então, uma ampla e complexa rede de traficantes internos. Os escravos nascidos no Brasil (crioulos) foram muito mais comercia- lizados do que os africanos, e o deslocamento dos cativos, tarefa dos traficantes intermediários, era feito tanto por terra quanto por navios comerciais (como o Patacho Continente), sobretudo para os portos do Rio de Janeiro e Santos.59

“Então, também eu podia ser escravo?” Homens brancos na escravidão

A solenidade de instalação da Sociedade Libertadora Sul-Rio-Grandense foi realizada no Rio de Janeiro, perante numeroso auditório, na sala do Lyceu de Artes e Ofícios, em outubro de 1883. O presidente interino daquela associação era José Tavares Bastos, bacharel em Direito,ex-deputado provincial e ex-governador de Alagoas (na década de 1830) e de São Paulo (na década de 1860).60 Coube a ele, integrante da elite política imperial, entregar a carta de liberdade ao “escravo branco, de 22 anos”, nascido no Rio Grande do Sul e vendido na corte.61 Alberto da Costa e Silva argumentou que, no Brasil oitocentista, o cativo cujo tom de pele fosse claro a ponto de ser considerado branco era objeto de uma compaixão raramente estendida aos seus correlatos pretos, assim, não faltaria quem se dispusesse a alforriá-lo. O que havia sido comum na Roma Antiga e na Europa Medieval era, conforme Costa e Silva, impen- sável nas Américas: escravizar pessoas brancas.62

Infelizmente, não foi possível localizar o discurso pronunciado por Tavares Bastos na cerimônia de libertação do escravo branco nascido no Rio Grande do Sul, contudo, desde a década de 1860, uma pessoa bastante próxima a Bastos fornecia o que pensar a respeito dos signifi- cados atribuídos à pele clara. Foi em 1862 que Aureliano Cândido – filho de Tavares Bastos – estabeleceu uma oposição entre, de um lado, a Bahia escravista, cujo “atraso” se devia ao “maior número de negros”; e, de outro, o “desenvolvimento” do Rio Grande do Sul, propiciado pelos “núcleos de colonos europeus” e seus descendentes.63 Mais do que estabelecer uma relação entre imigração e progresso, Aureliano Cândido vinculava o “africano” e o “negro” à escravidão, enquanto “branco” era associado ao “homem livre”.64 Tratava-se de uma vinculação costumeira e bastante disseminada. O médico sanitarista e demógrafo Aureliano Portugal reconhecia que, apesar de ter “crescido o número dos pretos livres” entre 1868 e 1871 em todo o império, os termos “branco e livre” deviam “se tomar como sinônimos” para “os efeitos estatísticos”. Convém ressaltar que tal raciocínio foi elaborado em 1891, já em pleno período pós-abo- lição, ocasião em que todos os negros faziam parte da sociedade livre.65

A construção de um nexo entre epiderme clara e estatuto livre revela a persistente recusa em reconhecer que muitos negros haviam conquistado a liberdade ainda durante o escravismo. Por ocasião do censo de 1872, período ao qual se refere o sanitarista Aureliano Portugal, a cada 4 negros no Brasil, 3 eram livres.66 Ao mesmo tempo, o referido nexo entre brancura e liberdade parecia orientar a seleção de quem deveria receber a emancipação. Ao analisar o caso de um “escravo branco” portador de “olhos azuis e cabelos louros” em meados do século XIX, Luiz Felipe de Alencastro destacou a comoção e o esforço de pessoas que não o conheciam para tirá-lo da servidão; além disso, de acordo com Alencastro, os recenseadores de 1872 decidiram que escravos brancos não existiam no império. Para o autor, o escra- vismo brasileiro reforçou o cativeiro por meio da discriminação racial: “escravo só podia ser preto ou mulato, nunca branco”.67 De fato, eles existiram, contrariando os recenseadores; entretanto, para manter o vínculo entre brancura e liberdade, não faltava quem se dispusesse a contribuir para a conquista da emancipação dos escravos brancos. Para Hendrik Kraay, os escravos brancos foram libertados não como parte dos esforços antiescravistas, mas para preservar as hierarquias raciais e, assim, manter a moralidade, a ordem e a legitimidade da escravidão.

Os esforços para libertar os escravos brancos foram tentativas de estabelecer uma convergência entre categoria racial e status jurídico.

Na lógica escravista brasileira, escravos brancos não deveriam existir.68 No Brasil da década de 1880, havia integrantes das elites políticas que se comoviam seletivamente por ocasião das cerimônias de emanci- pação. Com finalidades cívicas, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro comemorou o aniversário da independência, em 7 de setembro de 1886, concedendo alforrias. Por seu caráter corriqueiro, a ocasião talvez passasse despercebida, entretanto, um detalhe que a diferenciou das dezenas de outras cerimônias semelhantes registradas no Livro de Ouro fez com que aquele evento se tornasse alvo de comentários na imprensa carioca. De acordo com o periódico A Semana , entre os libertandos presentes na solenidade, havia “dois de cor branca”, “decentemente trajados”. Conforme a nota, o caráter inusitado da cena “encheu de dó” os espectadores, além disso, “fez pasmar” e “consternou” a princesa Isabel, figura maior da cerimônia. Nas palavras do redator, a herdeira do trono “se recusava a crer no que viam seus olhos”.69 Ao que parece, escravos brancos e bem trajados a ponto de parecer gente livre era coisa difícil de acreditar.

A coluna Macaquinhos no Sótão, assinada por José Telha e publicada pela Gazeta de Notícias , também tratou da cerimônia de liber- tação dos dois escravos brancos, com atenção especial às reações da princesa. “Houve quem reparasse que a herdeira do trono”, segundo a nota, “acompanhou com olhar de profunda pena os dois homens brancos, corretamente vestidos”, mas que “eram escravos”. Estabelecendo relações entre cor, roupas e estatuto jurídico, José Telha – pseudônimo usado por Ferreira de Araújo, um dos proprietários da Gazeta de Notícias70 – assim analisava a forma como as reações dos espectadores estavam associadas aos distintos tratamentos conferidos a pessoas de cores diferentes. Mais particularmente, a comiseração expressada pela princesa diante dos dois cativos de pele alva contrastava com a costumeira indiferença de quem “olha para um preto como se olha para um burro de bonde”, registrou o observador do evento. Diferente do costume e da banalidade que carac- terizava a escravização das gentes de pele escura (repare-se: havia outros cativos na mesma cerimônia, que não geraram comoção alguma), olhar para dois raros escravos brancos mobilizou – entre brancos – a capacidade de colocar-se no lugar do desigual. “Quando se vê um escravo branco”, continuava o redator, “sente-se um arrepio de frio” e conclui rapidamente: “coitadinho!”. “Então, também eu [...] podia ser escravo?”, teriam pensado as “almas caridosas” presentes na cerimônia.71 Em seu registro, José Telha denunciou a empatia sentida por pessoas brancas diante de cativos que, por não terem pele escura, eram vistos como semelhantes por quem tinha a pele alva. Ao que parece, a cor podia estabelecer uma identificação entre livres brancos e escravos brancos.

Analisando outros períodos da história brasileira, com foco na cidade de São Paulo, Lia Vainer Schucman observou que a superioridade estética atribuída aos corpos brancos está associada a um conjunto de características físicas: coloração epidérmica, textura dos cabelos, largura dos lábios e do nariz. Tais atributos visuais são lidos como expressão da superioridade moral e intelectual dessas pessoas; sobretudo, são compreendidas como inerências positivas. Esses significados orientam práticas bastante evidentes, por exemplo, direcionadas aos indivíduos brancos em situação de rua: eles percebem que não recebem da polícia o mesmo tratamento conferido aos negros, assim como têm consciência de que obtêm dos transeuntes desconhecidos um tratamento que não é conferido àqueles de pele escura. Vistos como brancos “fora do lugar”, os indivíduos em situação de rua agraciados pela brancura são objeto de compaixão e solidariedade, como se a miséria, para um branco, fosse uma situação inadequada, enquanto é vista com normalidade quando incide sobre os negros.72

Como pessoas brancas ingressavam na escravidão?

Os anúncios aqui analisados, veiculados na imprensa de diferentes cidades brasileiras, cumpriram a função de levar ao conhecimento público os casos de mulheres e homens brancos escravizados que já estavam bastante próximos de conquistar a alforria. Ainda que sejam evidências importantes, aqueles anúncios tratavam apenas dos momentos finais de um processo mais longo e complexo, afinal, como era possível haver pessoas brancas em cativeiro? Para responder a essa e outras questões, recorreremos ao diálogo com estudos sobre escravidão em diferentes cidades brasileiras, pois os escravos brancos estavam inseridos em um trânsito nacional de cativos comprados e vendidos nos circuitos do tráfico interno a partir de 1850. Além disso, tomaremos as interpretações fornecidas por tais estudos com finalidade de compor um campo de possibilidades no interior de um vasto e variado cenário nacional. Assim, busco não reproduzir o hábito interpretativo de tomar apenas os processos históricos ocorridos no Sudeste como representativos da história nacional, enquanto os ocorridos em outras partes do Brasil seriam meramente regionais.

Uma resposta possível para a existência de escravos brancos pode ser buscada no Sul do Brasil. Ao investigar as listas nominativas de habitantes e recenseamentos entre 1798 e 1830 no Paraná, Horácio Gutierrez identificou um pequeno crescimento do percentual de pardos e mulatos entre a população escrava. Em 1798, os pardos constituíam 31% dos cativos; em 1804, chegaram a 37%. Até 1830, o índice de crescimento da população parda ou mulata sujeita ao cativeiro superou o índice de ampliação dos pretos igualmente cativos. Diante da ampliação demográfica dos mestiços, gente que embaraçava as fronteiras raciais visíveis entre cativos e livres, não chega a surpreender que Gutierrez tenha encontrado 16 escravos brancos entre os anos de 1804 e 1824 no Paraná.73 Considerando o vasto vocabulário racial do período, cujos termos estabe- leciam uma relação entre cor e lugar social na hierarquia escravista, as classificações como “pardo” e “mulato” seriam as mais adequadas para designar cativos que fossem filhos de negros e brancos. Contudo, os registros de pessoas brancas em cativeiro indicam a existência de escravos cuja cor não era classificada nos moldes costumeiros. Provavelmente, eram claros o suficiente para serem reconhecidos como brancos por outras pessoas igualmente brancas. Especificamente nesses casos, a condição cativa não era correspondida pelas classificações consagradas pelo vocabu- lário escravista – tais como pardo, mulato, preto e crioulo – capazes de indicar ou sugerir nascimento na escravidão, proximidade com o cativeiro ou mesmo antepassados africanos. Ao serem reconhecidos como brancos , a cor entrava em contraste com a condição escrava.

Analisando os estudos a respeito dos chamados “casamentos mistos” – por definição, uniões reconhecidas pela Igreja e em que um dos cônjuges é livre e o outro é escravo –, Maísa Faleiros Cunha observa que eles foram quantitativamente insignificantes no Brasil do século XIX, mas tiveram impacto social importante, pois a mãe transmitia sua condição escrava à criança. Ao mesmo tempo, a Igreja respaldava que este sacramento não guardava relação com a alforria. O casamento misto, então, se mostrava vantajoso ao senhor, pois permitia arregimentar mão de obra adicional.74 Ainda de acordo com Maísa Cunha, a disposição de se casar com alguém de outro estatuto jurídico e de formar famílias mistas era maior entre as mulheres livres (brancas ou de cor) do que entre os homens livres (brancos ou de cor), ou seja, as mulheres livres estavam mais dispostas a se casar com escravos do que os homens livres, que tendiam a não se casar com mulheres escravizadas, ainda que pudessem viver amasiados com elas. A recusa masculina a se unir às cativas pode ser explicada, entre outras razões, pelo fato de que a criança herdava a condição escrava da mãe.75

Os estudos sobre demografia histórica e história da família produ- zidos desde a década de 1980 têm apontado os padrões que caracterizaram as uniões matrimoniais no Brasil dos séculos XVIII e XIX. Sempre foi escassa a ocorrência dos casamentos formais, sobretudo entre as camadas subalternas, em que eram elevados os índices de ilegitimidade matri- monial. A maior parte da população jamais teve sua união abençoada pelos ritos sagrados da Igreja Católica. Ainda que os estudos sobre família com foco nas mulheres e nas crianças, incluindo as investigações sobre as famílias escravas, tenham revelado a importância das uniões consen- suais, prevaleceram uniões e descendentes ilegítimos para a Igreja. Os homens livres que recusavam o reconhecimento religioso do vínculo com as escravas podiam viver amasiados com elas sem qualquer legiti- midade sacramentada. Ao mesmo tempo, predominaram os casamentos “entre iguais”, ou seja, entre pessoas com o mesmo estatuto jurídico, origem social e cor.76 Tal modalidade de união conjugal, contudo, não explica o cativeiro branco.

Luis Beneduzi atribuiu a existência de escravos brancos a dois fatores: primeiro, o elevado índice de relações inter-raciais, ainda que diversas vezes marcadas pela violência; segundo, o fato de que somente ventres escravos geravam escravos. Para Beneduzi, “não é possível pensar que não existissem também pessoas fenotipicamente brancas nas senzalas das fazendas dos Barões do Café do período imperial”.77 Robert Conrad, por sua vez, observou que a condição jurídica dos recém-nascidos era determinada pelo status materno, “e isso [aliado aos abusos dos senhores] resultou na existência de escravos brancos”.78 As misturas que produziam pardos e mulatos originavam também brancos. Diante das possibilidades sugeridas por esses estudos, não deixa de ser útil verificar quais eram as explicações elaboradas já no século XIX para a existência de escravos brancos em diferentes províncias do império.

Foi em maio de 1851 que O Almotacé , periódico literário de orien- tação nacionalista e liberal, sediado em Cachoeira, no recôncavo baiano,79 publicou uma carta assinada sob o pseudônimo de Echsemin, endereçada ao “Ilmo. Sr. Juiz do Povo”. Tratava-se, na verdade, de um conto recheado de alegorias, por meio das quais pretendia-se reprovar o comportamento de um vendedor ambulante, o dito Garôpa, que, além de maltratar o próprio ajudante, o menino Bodinho, acusava-o de roubo. Levado à delegacia, o garoto convenceu a autoridade de que não era culpado, deixando Garôpa “com cara de porco”. Não era, todavia, a primeira vez que aquele vendedor de rua acusava inocentes, pois, além de mentiroso, Garôpa era “mau e ruim”, qualidades que o haviam tornado “bastante conhecido por todo o mundo”. A história termina solicitando ao Sr. Juiz do Povo que emitisse ordens capazes de evitar a “asneira de fazer geração”, “coisa essa contrária às leis da criação e da natureza”, exigindo “proibir que se cruzem para o futuro as raças, como aí estamos vendo”. Afinal, misturar “camarão com paposa”, “cavalo com burro”, “Garôpa com porco” era procedimento que não dava certo. Taxado de “credor dos ódios do mundo terrestre”, Garôpa era um “escravo branco”80 e, através de metáforas zoomórficas (“garoupa”, por exemplo, é uma espécie de peixe), a narrativa condena a miscigenação não apenas por “cruzar” seres de natureza radicalmente diversas, mas também por ser contrária tanto às leis divinas quanto às naturais, das quais poderia surgir gente de pele clara, mas de comportamento reprovável. A condenação não era temporária; o narrador solicitou que também “para o futuro” ficasse proibido o cruzamento das raças. Moral da história: a miscigenação não era lá muito desejável.

Um observador brasileiro da escravidão nos Estados Unidos registrou, em 1846, que tanto lá quanto no Brasil haviam sido amplas as investidas sexuais dos escravocratas brancos sobre suas cativas africanas. “Grandíssimo número de escravos da União Americana”, relatou o viajante, eram “tão próximos da raça branca, que a distinção é difícil”.81 No Rio de Janeiro, ao comentar o caso dos dois escravos brancos e bem trajados, alforriados pela Princesa Isabel em 1886, a Gazeta de Notícias forneceu explicação semelhante sobre as origens dos cativos de epiderme alva. A “honraria” e a “sensação” geradas na festa municipal por conta da alforria de “escravos brancos” somente era possível “à custa de três ou quatro gerações de escravas que deram aos senhores tudo quanto podiam dar, até filhos para vender”. As “almas caridosas”, então, que se “tranquilizem”, advertia o narrador,82 afinal, pessoas brancas não estavam sendo capturadas e submetidas à escravidão, elas haviam nascido na escravidão . De acordo com o jornal Monitor Campista , que circulava em Campos dos Goytacazes, a Companhia Brasileira de Teatro planejava realizar atividades beneficentes por lá em favor da liberdade da escrava Maria Machado. “O nosso público não lhe negará de certo o seu favor”, dizia o anúncio, “sabendo que essa escrava é branca e tem um filhinho também branco”.83 As crianças escravas, de pele clara a ponto de serem consideradas brancas, estavam em cativeiro por terem herdado a condição jurídica materna.

Sabemos muito pouco a respeito das ações, reações e expectativas de negros livres e brancos pobres acerca dos relacionamentos afetivos e sexuais entre pessoas de cores distintas, bem como pouco sabemos a respeito das visões desses mesmos subalternos acerca do processo de misci- genação e suas consequências durante a primeira metade do século XIX. Uma análise das misturas raciais como foco nas múltiplas e complexas relações vigentes entre subalternos brancos e negros – e não apenas com foco na violência sexual dos senhores brancos sobre escravas negras – pode produzir novas interpretações sobre miscigenação no Brasil. As explicações que reproduzi acima, elaboradas ainda em meados do século XIX, sobre a origem das cativas e cativos brancos, já expressavam um olhar circunscrito às interações estabelecidas entre senhores e escravas, sendo a miscigenação e a clareza epidérmica um resultado do estupro senhorial – uma interpre- tação que posteriormente se tornou bastante cara aos movimentos sociais negros, à análise das relações étnico-raciais e aos estudos sobre as famílias escravas. Ressalto que essa leitura baseada na violência sexual senhorial foi bastante criticada, por exemplo, por Robert Slenes, que buscou enfatizar o protagonismo escravo nos processos de negociação e conflito que possibili- tavam a formação das famílias entre cativos.84

Outro aspecto que deve ser levado em consideração é o elevado índice de incerteza e descontrole sobre o resultado da miscigenação, posto que a criança poderia ser tão clara quanto o pai branco ou tão escura quanto a mãe escrava. A miscigenação que produzia pardos e mulatos era a mesma que produzia escravos brancos, ainda que nem todo descendente de pais mistos pudesse ser visto e tratado como branco. A interpretação a respeito da miscigenação como um processo instituído à força e a partir “de cima” certamente revela grande desatenção para as complexas possibilidades de interação autônoma e de relacionamentos espontâneos e horizontais entre as classes subalternas por meio de coexistências, proximidades e relações experimentadas por pessoas de diferentes estatutos jurídicos, de várias cores e diversas origens étnicas. Ao mesmo tempo, com finalidade de evidenciar a força das relações estabelecidas entre desiguais na sociedade escravista brasileira, convém jamais esquecer o inegável caráter autoritário, violento e atrevido do poder senhorial sobre as cativas, aspectos que não podem ser negligenciados como uma das várias possibilidades explicativas para a existência de cativos de pele clara.

Cor, origem, costume e escravidão branca

As fontes jornalísticas a respeito das escravas brancas e escravos brancos ilustram os momentos finais do processo em que saíam da escravidão. Para compreender as práticas e os significados atribuídos àqueles casos, é preciso considerar o persistente costume senhorial de escravizar africanos e manter em cativeiro, por via materna, seus descendentes pretos e pardos nascidos no Brasil. Isso revela, por contraste, a incoerência do cativeiro de pessoas brancas. Escravos com epiderme alva confundiam os marcadores estéticos que orientavam as fronteiras entre a escravidão e a liberdade, era preciso corrigir essa indistinção quando ela acontecia. Submeter pessoas brancas à escravidão e à comercialização equivalia a tratá-las como africanos, e não havia costume no Brasil que legitimasse esse tipo de prática escravista.

Em sua análise a respeito do costume senhorial de escravizar ilegal- mente, predominante entre as décadas de 1830 e 1840, Sidney Chalhoub observou que, no início da década de 1850, entraria em vigor um decreto imperial instituindo o registro obrigatório de nascimentos e óbitos em todo o império, no mesmo período, foi determinada também a realização de um censo.85 Diversas rebeliões populares aconteceram naquele momento, pois, conforme Chalhoub, as camadas sociais mais baixas da população acreditavam que a coleta de informações tinha por finalidade “escravizar a gente de cor”.86 De forma geral, eram pessoas livres com medo de serem reduzidas à escravidão, o “povo rude”, conforme expressão usada pelas autoridades civis e eclesiásticas do período; contudo, conforme Chalhoub, “eram negros os que tinham a sua vida pautada pela ameaça do cativeiro”.87 Os amotinados estabeleciam uma relação entre o fim do tráfico atlântico, o registro civil e a escravização ilegal de pretos e pardos livres.88

Gabriela Barreto de Sá, em seu estudo acerca da redução de pessoas livres à escravidão no Rio Grande do Sul, entre 1835 e 1874, desenvolve reflexões a respeito das distinções visuais entre cativos e não cativos.89 A existência de negros livres e de escravos brancos colocavam em dúvida as distinções visuais que demarcavam as fronteiras jurídicas entre a escravidão e a liberdade.90 Contudo, conforme Barreto de Sá, ainda que a mera declaração de propriedade pudesse bastar para o reconhecimento da propriedade, pessoas brancas, mesmo quando eram pobres, tinham a seu favor as características corporais que lhes davam a possibilidade de contestar uma eventual acusação de que pudessem ser escravas.91 A autora sugere que a disposição de garantir liberdade a cativos de pele clara ou mesmo brancos, bem como a elevada dose de “filantropia” atribuída a essa disposição, podia ser identificada também nos discursos políticos daqueles que defendiam a emancipação gradual dos escravos, particularmente nas intenções de alforriar mais os crioulos do que os africanos, mais os pardos do que os pretos.92

Vai ao encontro dessas interpretações a investigação de Mariana Assunção a respeito da cor dos alforriados em Fortaleza, entre 1838 e 1884. Assunção constatou que os cativos que mais receberam cartas de liberdade foram aqueles classificados como pardos e mulatos: juntos, eles totalizaram 54,5% das alforrias em um total de 866 casos identifi- cados.93 De acordo com a autora, os tabeliães registraram alguns desses mestiços como “claros” ou mesmo como “brancos” e, no que diz respeito à concessão da liberdade, os senhores pareciam preferir beneficiar justa- mente esses escravos. Os registros indicam ainda várias outras formas de classificação, incluindo combinações como “mulato claro”, “mulato escuro”, “parda clara”, “mulato pardo” e até “mulata alvarenta”. As inter- pretações de Mariana Assunção apontam que as possibilidades de alforria eram maiores para pardos e mulatos do que para os pretos.94

Ainda que a América portuguesa e o Império do Brasil tenham em comum a escravidão africana legitimada por leis e costumes, há uma distinção entre os critérios de classificação raciais predominantes no século XVIII e aqueles que se tornaram hegemônicos ao longo do século XIX. Durante o período colonial, prevalecia uma noção de raça compreendida como impureza sanguínea e espiritual, e que estava associada a outros critérios, tais como origem, ancestralidade, etnia, honra, religiosidade e qualidades. Certamente, a noção de origem era uma das mais complexas e envolvia nascer nobre ou plebeu; nascer no Brasil, na África ou na Europa; nascer escravo ou livre; possuir ancestrais brancos ou pretos, cristãos, judeus, mouros ou pagãos. A inovação histórica do final do século XVIII foi a necessidade de evitar confusão entre, de um lado, os brancos e, de outro, os pretos e os mulatos. Ao mesmo tempo, naquela sociedade já havia a compreensão de que, quanto mais escura a epiderme, maior a tendência a ser vinculado ao cativeiro, então, critérios raciais de origem e de marca coexistiam naquele período.95

Na década de 1820, José Bonifácio de Andrada e Silva ofereceu indícios de que aqueles critérios continuavam coexistindo. O Patriarca da Independência recomendava aos senhores e parlamentares que “nas manumissões” fossem “preferidos os mulatos aos outros escravos”, assim como “os crioulos” (escravos nascidos no Brasil) “aos da Costa” (cativos africanos).96 Nessa lógica, acabavam preteridos os nascidos na África e os que, mesmo tendo nascido em solo brasileiro, fossem classificados como pretos ou crioulos, já que a preferência incidia sobre os mulatos. A combinação entre cor e origem (compreendida como local de nasci- mento) poderia ampliar ou restringir o acesso à emancipação, revelando uma hierarquia das preferências senhoriais de libertação.

Certamente, os traços físicos dos escravos brancos estavam em contradição com sua condição escrava; ainda assim, eles nasceram em cativeiro e permaneceram cativos durante uma parte de suas vidas. As pessoas que se indignaram, se comoveram diante da sua situação e contribuíram para a sua emancipação também respeitaram o direito de propriedade: comprar a liberdade mediante indenização senhorial era uma forma de reconhecer a legitimidade da posse. Ao mesmo tempo, fora do ambiente social onde eles nasceram e viveram, a incompatibilidade entre brancura e escravidão despertava reações e atitudes que ampliavam as possibilidades de os escravos brancos conquistarem a emancipação ainda muito jovens. Entre desconhecidos, ninguém diria que eram escravos; em liberdade, ninguém diria que um dia haviam sido.

Por outro lado, os atributos visíveis – tais como a “pele alva” e “perfeitamente branca”; os “cabelos lisos” e “corridos”; as “feições delicadas” e a “bela aparência”, que “em nada se parecem com as da raça africana” – prevaleceram sobre o reconhecimento da origem dos antepassados, uma ascendência que certamente incluía ancestrais pagãos, africanos cristianizados ou escravos nascidos e batizados no Brasil, fossem eles distantes ou recentes em termos geracionais. A maioria dos escravos brancos aqui analisados eram reconhecidos como brancos , e não como mulatos, pardos ou qualquer outro termo indicativo de mestiçagem. Eles eram assim classificados, pois a sua ascendência africana tendia a ser desconsiderada. Em 1837, Frederico Burlamaque já havia chamado atenção para certos escravos “tão brancos como seus mesmos senhores”, observando que, “em muitas combinações de sangues diversos, a origem africana tem desaparecido ” (grifo nosso).97 As narrativas presentes na imprensa ressaltaram a distância visual em relação aos africanos, assim como Isaura, de Bernardo Guimarães, que ninguém diria ter antepassados negros. Em meados do século XIX, no que diz respeito aos escravos brancos, a cor – um critério racial – tendia a prevalecer sobre a origem dos antepassados – um critério étnico. Na década de 1950, um século depois, Oracy Nogueira finalmente constatou que, no Brasil, o parâmetro racial predominante era “de marca” (cor), e não “de origem” (ascendência).98

Considerações finais

Não há razões para acreditar que cativos brancos, ainda que raros ou minori- tários em relação aos pretos e pardos, não existissem havia muito tempo no Brasil, já que a miscigenação entre senhores brancos e escravas negras remontava ao período colonial. Então, por quais razões eles se tornaram conhecidos na imprensa somente a partir do fim do tráfico de africanos?

Trata-se de um problema complexo, cuja resposta requer a consideração de diversos fatores. Entre os processos históricos simultâneos explicativos dos motivos pelos quais os escravos brancos se tornaram conhecidos, Hendrik Kraay elenca a expansão da imprensa nacional a partir de meados do século XIX, que deu ampla publicidade aos casos, e a intensificação do tráfico interno, que os fez transitar por diferentes províncias. O fato de que os escravos brancos foram removidos de seu contexto social, onde a sua ascendência africana e a sua condição jurídica eram conhecidas e não eram contestadas , e inseridos em locais onde eram estranhos, os levou a serem vistos e tratados de forma diferente por pessoas que não tinham qualquer vínculo com eles ou com seus senhores.99

Ao mesmo tempo, a emergência de uma opinião pública no Brasil em meados do século XIX estava criando consensos condenatórios do tráfico e da escravidão. As expectativas de que o país pudesse figurar entre as nações civilizadas ajudam a entender a preocupação com as opiniões estrangeiras, diante das quais seria um grande sinal de atraso e incivilidade escravizar pessoas brancas. Ao mesmo tempo, interna- mente estava em construção um sentimento de identidade nacional, e os escravos brancos eram a prova de que o Brasil escravizava não só os pretos da África, mas também os próprios filhos da pátria. Enquanto a escravização dos crioulos – cativos igualmente nascidos no país – era legitimada pelos costumes, a escravização de pessoas brancas nascidas no Brasil não tinha esse respaldo, especialmente por conta do forte vínculo estabelecido entre pele escura e cativeiro. O incre- mento do tráfico interno e o fluxo de cativos para o Sudeste, a partir de 1850, é outro fator a ser considerado. Convém lembrar das palavras publicadas por um redator da imprensa carioca, estarrecido diante dos “amiudados exemplos que vão aparecendo de escravos brancos vindos do interior”. 100 Era nas capitais, sobretudo nas do Sudeste – e não no interior rural, onde eles haviam nascido e vivido – que os escravos brancos geravam comoção entre os redatores dos jornais, a ponto de se tornarem notícia.

Os documentos referentes aos escravos brancos sugerem que os parâmetros visuais, isto é, as características corporais observáveis, funda- mentais para a classificação racial, funcionavam naquele momento como marcadores das fronteiras entre a escravidão e a liberdade, coexistindo e reforçando os estatutos jurídicos que estabeleciam as diferenças e as hierarquias entre cidadãos e não cidadãos. A pele branca era associada à liberdade, e os cativos cuja cor se aproximava desse tom tinham mais chances de obter alforria. Não é difícil perceber que, durante a segunda metade do século XIX, o imaginário em torno da escravidão de pessoas brancas despertava amplo interesse e, justamente por isso, acabava recebendo um uso político: narrativas literárias e representações teatrais foram largamente produzidas e utilizadas pelo movimento abolicionista como forma de atrair público, comover espectadores, arrecadar fundos e atrair eleitores para a causa da emancipação.101


Figura 3
: Arrecadação de fundos para a emancipação de uma escrava branca
Fonte: Correio Mercantil , 24 jul. 1865, p. 4.

Enquanto o cativeiro de pretos e pardos ainda era norma costu- meira vigente, havia escritores e dramaturgos que preferiam produzir obras chamando a atenção para o que era exceção na sociedade brasileira. Diante dos milhares de anúncios de compra e venda de mulheres e homens negros, bem como das denúncias de fugas, publicados diariamente nos jornais ao longo de todo o século XIX, as escravas e escravos brancos não passavam de raríssimas exceções e, talvez por isso, despertassem a curiosidade pública. Apesar de sua expressão numérica irrelevante, elas e eles integravam um imaginário que aterrorizava as mentes escravistas, oferecendo à análise racial uma temática inexplorada pela historiografia, ainda que não seja totalmente desconhecida dos historiadores.

Sua importância reside na capacidade de desordenar visões de mundo com lugares sociais bem definidos, embaralhar distinções entre negros e brancos e confundir as fronteiras jurídicas entre a escravidão e a liberdade. Sua relevância reside também nas reações que a escravidão branca despertava: retirar jovens brancos do cativeiro servia para manter as distinções raciais entre escravos e livres, as brutalidades da escra- vidão eram aceitáveis, quando incidiam sobre os negros; e tornavam-se inadmissíveis e intoleráveis se recaíssem sobre pessoas de cabelos lisos, lábios finos e pele alva. A linha que separava brancos livres e negros escravos não era apenas jurídica, mas também racial. A liberdade não estava diretamente associada à cor branca, já que o estatuto jurídico dos livres e libertos abarcava pretos e pardos, contudo, o branco estava diretamente associado à liberdade.

Material suplementar
Notas
Notas
1 Vron Ware (org.), Branquidade: identidade branca e multiculturalismo , Rio de Janeiro: Garamond, 2004; Peter Kolchin, “Whiteness Studies: The New History Of Race in America”, Journal of American History , v. 89, n. 1 (2002), pp. 154-173 ; David Roediger, Working Toward Whiteness: How America’s Immigrants Became White. The Strange Journey from Ellis Island to the Suburbs , Nova York: Basic Books, 2005; Davodi Roediger, The Wages of Whiteness: Race and Making of the American Working Class , Nova York: Verso, 2007.
2 Maria Aparecida da Silva Bento e Iray Carone (orgs.), Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil , Petrópolis: Vozes, 2002; Lourenço da Conceição Cardoso, “O branco ‘invisível’: um estudo sobre a emergência da branquitude nas pesquisas sobre as relações raciais no Brasil (1957- 2007)”, Dissertação (Mestrado em Sociologia), Universidade de Coimbra, Coimbra, 2008; Lourenço da Conceição Cardoso, “O branco ante a rebeldia do desejo: um estudo sobre a branquitude no Brasil”, Tese (Doutorado em Sociologia), Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2014; Liv Sovik, Aqui ninguém é branco , Rio de Janeiro: Aeroplano, 2009; Richard Miskolci; O desejo da nação: masculinidade e branquitude no Brasil de fins do XIX , São Paulo: Annablume, 2012; Lia Vainer Schucman, Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo , São Paulo: Annablume, 2014.
3 Para um balanço historiográfico sobre a emergência dos estudos da branquitude no Brasil, ver: Priscila Elisabete Silva, “O conceito de branquitude: reflexões para o campo de estudos” in Tânia Müller e Lourenço Cardoso (orgs.), Branquitude: estudos sobre a identidade branca no Brasil (Curitiba: Appris, 2017), pp. 19-32.
4 Todos os jornais analisados neste artigo foram coletados na Biblioteca Nacional do Brasil, na Hemeroteca Digital Brasileira .
5 Correio Brasiliense ou Armazém Literário , Londres, jul. 1818, p. 179.
6 Gazeta do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro, 28 fev. 1816, p. 1; Idade D’Ouro do Brasil , Salvador, 29 abr. 1817; Diário do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro, 14 jan. 1843, p. 2.
7 O Grito Nacional , Rio de Janeiro, 6 mar. 1856, p. 3; Correio Mercantil , Rio de Janeiro, 19 mar. 1858, p. 2.
8 Diário do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro, 6 mai. 1839, p. 1; Francisco Joaquim Bithencourt Silva, Designação de Francisco Joaquim Bitencourt da Silva para Thomaz José Pinto Serqueira examinar o drama: o engajamento na cidade do Porto ou os traficantes de escravos brancos , Rio de Janeiro: Conservatório Dramático Brasileiro, 1861.
9 Flávia Souza, “Criados, escravos e empregados: o serviço doméstico e seus trabalha- dores na construção da modernidade brasileira (cidade do Rio de Janeiro, 1850-1920)”, Tese (Doutorado em História), Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2017, p. 150.
10 Sobre o engajamento de trabalhadores europeus e outras formas de trabalho compul- sório nas Américas, ver: Eric Williams, Capitalismo e escravidão , São Paulo: Companhia das Letras, 2012, particularmente o capítulo intitulado “A origem da escravidão negra” (pp. 29-62). Sobre o trânsito de engajados europeus e africanos nos oceanos Atlântico e Índico, ver: Paulo César Gonçalves, “Na vaga do trabalho escravo: o tráfico de trabalhadores engajados de Moçambique para a Ilha Reunião no pós-abolição da escravidão colonial francesa”, Topoi , v. 20, n. 42 (2019), pp. 578-603 .
11 A respeito dos engajados portugueses no Brasil, ver: Luiz Felipe de Alencastro, “Proletários e escravos: imigrantes portugueses e cativos africanos no Rio de Janeiro, 1850-1872”, Novos Estudos CEBRAP , n. 21 (1988), pp. 30-56.
12 Sobre as distinções entre escravos africanos e engajados europeus, ver: Jerome Handler e Matthew Reilly, “Contesting ‘white slavery’ in Caribbean: enslaved Africans and Europeans indentured servants in seventeenth-century Barbados”, New West Indian Guide , v. 91 (2017), pp. 30-55 .
13 Alberto da Costa e Silva, A manilha e o libambo: a África e a escravidão de 1500 a 1700 , Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011, p. 859.
14 “Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará, e Maranhão, enquanto Sua Majestade não mandar o contrário” apud Rita Heloísa Almeida, O Diretório dos índios: um projeto de “civilização” no Brasil do século XVIII , Brasília: Editora UnB, 1997.
15 Raphael Bluteau, Vocabulário português e latino: Volume I , Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus, 1712, p. 183.
16 Robert Davis, Christian Slaves, Muslim Masters: White Slavery in the Mediterranean, the Barbary Coast and Italy (1500-1800) , Nova York: Palgrave MacMillan, 2004.
17 Robert Conrad, Os últimos anos da escravatura no Brasil , Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p. 14; Luis Fernando Beneduzi, “Alteridade e estranhamento: a figura do ‘novo negro’ na imigração italiana no Brasil”, MÉTIS: História & Cultura ,v. 13, n. 27 (2015), pp. 71-90; Hendrik Kraay, “Bystander Interventions and Literary Portrayals: White Slaves in Brazil, 1850s–1880s”, Slavery & Abolition , v. 41, n. 3 (2020), pp. 599-622 .
18 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, p. 2.
19 Maria Helena Alves da Silva, “A beleza circassiana no século XIX e a apropriação cultural de PT Barnun”, Oficina do Historiador , v. 11, n. 1 (2018), pp. 158-173 ; Beatriz Kushnir, Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição; as polacas e suas associações de ajuda mútua , Rio de Janeiro: Imago, 1996; Esther Largman, Jovens polacas: da miséria na Europa à prostituição no Brasil , Rio de Janeiro: Bestbolso, 2008; Emma Goldman, “Tráfico de mulheres”, Cadernos Pagu , v. 37 (2001), pp. 247-262 ; Fernando Tadeu Marques e Suzana Caldas Lopes Faria, “O tráfico internacional de pessoas para os fins de exploração sexual: uma análise à luz do caso concreto no Brasil”, Revista da Faculdade de Direito , n. 46 (2019), pp. 1-22 .
20 Margareth Rago, “Nos bastidores da imigração: o tráfico de escravas brancas”, Revista Brasileira de História , v. 9, n. 18 (1989), pp. 145-180; Priscila Nottingham e Helena Frota, “O Brasil na rota do tráfico de escravas brancas: entre a prostituição volun- tária e a exploração de mulheres na Belle Époque”, SINAIS – Revista Eletrônica de Ciências Sociais , v. 1, n. 11 (2012), pp. 1-19 ; Wellington do Rosário de Oliveira, “Zwi-Migdal: prostituição e tráfico de escravas brancas pela imprensa carioca (1920- 1930)”, III Colóquio de Gênero e Pesquisa Histórica , Irati, 2020.
21 Costa e Silva, A manilha e o libambo , p. 859.
22 Gazeta de Notícias , Rio de Janeiro, 17 mai. 1881, p. 1 .
23 Gazeta de Notícias , 31 dez. 1884, p. 3.
24 José Guimarães Caminha Neto, “A escrava Isaura: uma visão multidimensional”, Dissertação (Mestrado em Letras), Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2003, pp. 55-80; Luciana Maibashi Gebrin, “A interface entre o subsistema cultural e o tráfico de pessoas”, Revista Direito e Práxis , v. 7, n. 1 (2016), pp. 233-263 .
25 Paloma Fonseca, “A presiganga, uma galé nos trópicos”, Revista Archai , n. 1 (2008), pp. 95-100.
26 Henry Chamberlain, Views and Costumes of the City and Neighbourhood of Rio de Janeiro , Londres: Howlett & Brimmer Press, 1822, p. 88.
27 Fonseca, “A presiganga, uma galé nos trópicos”, p. 96.
28 Fonseca, “A presiganga, uma galé nos trópicos”, pp. 98-99.
29 Antônio de Moraes Silva, Diccionario da Lingua Portugueza: Volume I , Lisboa: Oficina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789, p. 277.
30 Brasil, Lei de 16 de dezembro de 1830 , Manda executar o Código Criminal, art. 53 .
31 Chamberlain, Views and Costumes of the City , p. 58.
32 Liliam Brighente, “A condição jurídica criminal do escravo no Império do Brasil: um estudo a partir de Castro, Província do Paraná (1850-1888)”, Tese (Doutorado em Direito), Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2019, p. 206-208. Sobre as galés, ver especialmente o capítulo intitulado “O problema das penas aplicáveis aos escravos” (pp. 205-236).
33 Andrei Koerner, “Punição, disciplina e pensamento penal no Brasil do século XIX”, Lua Nova , n. 68 (2006), pp. 232-234 .
34 Bosquejo sobre o comércio em escravos e reflexões sobre este tráfico considerado moral, política e cristamente, Londres: Impresso por Ellerton e Henderson, 1821. pp. 54-55.
35 Domingos Alves Branco Barreto, Memória sobre a abolição do commercio da escra- vatura , Rio de janeiro: Typographia Imparcial de F. de Paula Brito, 1837, p. 34.
36 Carl Friedrich Philipp von Martius, Através da Bahia. Excertos da obra Reise in Brasilien. Trabalho apresentado ao 5º Congresso Brasileiro de Geografia e aprovado com louvor , São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1938 [1ª edição de 1819]. pp. 106-107.
37 Thomas Ewbank, Life in Brazil, or A Journal of a Visit to the Land of the Cocoa and the Palm With an Appendix Containing Illustrations of Ancient South American Arts in Recently Discovered Implements and Products of Domestic Industry and Works in Tone, Pottery, Gold, Silver, Bronze , Nova York: Harper & Brothers Publishers, 1856, pp. 281-284.
38 O Observador , São Paulo, 30 nov. 1853, p. 2.
39 Gazeta de Notícias , 18 ago. 1883, p. 1.
40 Jornal do Comércio , Recife, 5 nov. 1883, p. 3.
41 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, p. 601.
42 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, p. 609.
43 Diário do Rio de Janeiro , 5 set. 1852, p. 2.
44 José Carlos Silvério, “Antiescravismo e racialização em Ouro Preto (1871-1888)”, Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2012, pp. 12-20.
45 Gebrin, “A interface entre o subsistema cultural e o tráfico de pessoas”.
46 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, pp. 611-612.
47 José Guimarães Caminha Neto, “A escrava Isaura”, pp. 55-80.
48 O Grito Nacional , 6 mar. 1856, p. 3.
49 Correio Mercantil , 24 ago. 1860, p. 2.
50 Correio Mercantil , 20 jun. 1860, p. 1.
51 Correio Mercantil , 25 jul. 1860, p. 2.
52 O Grito Nacional , 6 mar. 1856, p. 3..
53 Alain Youssef, “Imprensa e escravidão: política e tráfico negreiro no Império do Brasil (1822-1850)”, Dissertação (Mestrado em História), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, pp. 214-265; Beatriz Mamigonian, Africanos livres: a abolição do tráfico de escravos no Brasil , São Paulo: Companhia das Letras, 2007, pp. 209-283; Kaori Kodama, “Os debates pelo fim do tráfico no periódico O Philantropo (1849-1852) e a formação do povo: doenças, raça e escravidão”, Revista Brasileira de História, v. 28, n. 56 (2008), pp. 407-430 .
54 O Grito Nacional , 6 mar. 1856, p. 3.
55 O Grito Nacional , 6 mar. 1856, p. 3.
56 Mamigonian, Africanos livres , pp. 83-84.
57 Correio Mercantil , 12 set. 1857, p. 1; 19 set. 1857, p. 1.
58 Correio Mercantil , 12 set. 1857, p. 1.
59 Luiz Carlos Soares, “Do tráfico africano ao tráfico interno: o comércio retalhista de escravos do Rio de Janeiro e sua organização no século XIX”, IV Congresso Brasileiro de História Econômica , São Paulo, 2001; Richard Graham, “Nos tumbeiros mais uma vez? O comércio interprovincial de escravos no Brasil”, Afro-Ásia , n. 27, 2002, pp. 121-160 .
60 Sobre a biografia de José Tavares Bastos, pai de Aureliano Cândido, ver: Carlos Pontes, Tavares Bastos (Aureliano Cândido) , São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939, pp. 3-72.
61 Gazeta de Notícias , 22 ago. 1883, p. 2.
62 Costa e Silva, A manilha e o libambo , p. 859.
63 Aureliano Cândido de Tavares Bastos, Cartas do solitário , 3ª ed., São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1938, p. 164.
64 Bastos, Cartas do solitário , p. 160.
65 Aureliano Portugal, Annuario de estatística demographo sanitária da cidade do Rio de Janeiro pelo Dr. Aurealiano Portugal, médico demographista, membro da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, com uma Introdução do Professor Rocha Faria, lente cathedrático da cadeira de Hygiene da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891, p. 120.
66 Sidney Chalhoub, “Precariedade estrutural: o problema da liberdade no Brasil escra- vista (século XIX)”, História Social , n. 19 (2010), p. 52.
67 Luiz Felipe de Alencastro, “Vida privada e ordem privada no Império” in Fernando Novais (org.), História da vida privada no Brasil: Império , v. 2 (São Paulo: Companhia das Letras, 1997), p. 88.
68 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, p. 608, p. 616.
69 A Semana , Rio de Janeiro, 11 set. 1886, p. 294.
70 Daniela Magalhães da Silveira, “Escravocratas, doutoras e… queimadas vivas: violência física contra mulheres nos anos 1880”, XXX Simpósio Nacional de História , Recife, 2019, p. 10.
71 Gazeta de Notícias , 9 set. 1886, p. 1.
72 Schucman, Entre o encardido, o branco e o branquíssimo . Ver, especialmente, os capítulos V e VI.
73 Horácio Gutiérrez, “Crioulos e africanos no Paraná, 1798-1830”, Revista Brasileira de História , v. 8, n. 16 (1988), p. 161.
74 Maísa Faleiros Cunha, “Casamentos mistos: entre a escravidão e a liberdade”, Revista Brasileira de Estudos Populacionais , v. 34, n. 2 (2007), p. 227
75 Cunha, “Casamentos mistos”, p. 223, 234, 239.
76 Helena Pimental, “O casamento no Brasil Colonial: um ensaio historiográfico”, Em Tempo de Histórias , Brasília, n. 9 (2011), pp. 20-38; Ana Scott e Dario Scott, “Casamentos entre desiguais no Brasil Meridional (1772-1845)” in Mónica Ghirardi e Ana Silvia Volpi Scott (orgs.), Familias históricas: interpelaciones desde perspec- tivas iberoamericanas a través de los casos de Argentina, Brasil, Costa Rica, España, Paraguay y Uruguay (São Leopoldo: Oikos, 2015), pp. 37-38, 44, 64-65.
77 Luis Fernando Beneduzi, “Alteridade e estranhamento”, p. 78.
78 Conrad, Os últimos anos da escravatura no Brasil , p. 14.
79 José Péricles Diniz Bahia, “Ser baiano na medida do Recôncavo: o jornalismo regional como elemento formador de identidade”, Tese (Doutorado em Cultura e Sociedade), Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009, p. 107.
80 O Almotacé , Cachoeira, 27 maio 1851, pp. 2-3.
81 Jornal do Comércio , 1 maio 1846, p. 1.
82 Gazeta de Notícias , Rio de Janeiro, 9 set. 1886, p. 1.
83 Monitor Campista , Campos dos Goytacazes, 19 abr. 1881, p. 3.
84 Robert Slenes, Na senzala uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava, Brasil, Sudeste, século XIX , Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, pp. 27-68.
85 Sidney Chalhoub, A força da escravidão: ilegalidade e costume no Brasil oitocen- tista , São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 13.
86 Chalhoub, A força da escravidão , p. 18.
87 Chalhoub, A força da escravidão , p. 19.
88 Chalhoub, A força da escravidão , pp. 20-21.
89 Gabriela Barreto de Sá, “O crime de reduzir pessoa livre à escravidão nas casas de morada da justiça no Rio Grande do Sul (1835-1874)”, Dissertação (Mestrado em Direito), Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014, p. 51.
90 Sá, “O crime de reduzir pessoa livre à escravidão”, pp. 57-58.
91 Sá, “O crime de reduzir pessoa livre à escravidão”, p. 53, p. 55.
92 Sá, “O crime de reduzir pessoa livre à escravidão”, p. 58.
93 Mariana Assunção, “Escravidão e liberdade em Fortaleza (Ceará, século XIX)”, Tese (Doutorado em História), Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009, p. 176.
94 Assunção, “Escravidão e liberdade em Fortaleza”, pp. 177-178.
95 Silvia Hunold Lara, Fragmentos setecentistas: escravidão, cultura e poder na América Portuguesa , São Paulo: Companhia das Letras, 2007, pp. 126-172; Larissa Viana, O idioma da mestiçagem: as irmandades de pardos na América Portuguesa , Campinas: Editora da Unicamp, 2007.
96 José Bonifácio Andrada e Silva, Representação à Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil sobre a Escravatura , Paris: Typographia de Firmim Didot, 1825, p. 33.
97 Frederico Leopoldo César Burlamaque, Memória analytica acerca do commercio d’escravos e acerca dos maltes da escravidão doméstica , Rio de Janeiro: Typographia Commercial Fluminense, 1837, pp. 30-31.
98 A respeito das distinções entre critérios raciais de “marca” e “origem”, ver: Oracy Nogueira, “Preconceito racial de marca e preconceito racial de origem: sugestão de um quadro de referência para a interpretação do material sobre relações raciais no Brasil”, Tempo Social , v. 19, n. 1 (2006), pp. 287-308 .
99 Kraay, “Bystander interventions and literary portrayals”, p. 602.
100 Correio Mercantil , 12 set. 1857, p. 1.
101 Ângela Alonso, Flores, votos e balas: o movimento abolicionista brasileiro (1868-1888) , São Paulo: Companhia das Letras, 2015, pp. 23-50.

Figura 1
: Prisioneiros das Galés na gravura de Henry Chamberlain
Fonte: Chamberlain, Views and Costumes of the City , p. 88.

Figura 2
: Prisioneiros das Galés na gravura de Henry Chamberlain
Fonte: Chamberlain, Views and Costumes of the City, p. 58.

Figura 3
: Arrecadação de fundos para a emancipação de uma escrava branca
Fonte: Correio Mercantil , 24 jul. 1865, p. 4.
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