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AS DESVENTURAS DO DOUTOR JACARANDÁ: PRÁTICA JURÍDICA, RACISMO E LUTA POR DIREITOS NA PRIMEIRA REPÚBLICA
Leonardo Affonso de Miranda Pereira
Leonardo Affonso de Miranda Pereira
AS DESVENTURAS DO DOUTOR JACARANDÁ: PRÁTICA JURÍDICA, RACISMO E LUTA POR DIREITOS NA PRIMEIRA REPÚBLICA
THE MISADVENTURES OF DR. JACARANDA: LAW PRACTICE, RACISM AND THE STRUGGLE FOR RIGHTS DURING THE FIRST REPUBLIC
Afro-Ásia, núm. 64, pp. 284-319, 2021
Universidade Federal da Bahia
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Resumo: Este artigo acompanha a trajetória de Manoel Vicente Alves, homem negro que ficaria conhecido como Doutor Jacarandá. Nascido em 1869 no estado de Alagoas, onde se escolarizou, mudou-se para o Rio de Janeiro, em 1894. Nos primeiros anos na capital federal, exerceu diferentes ofícios braçais até valer-se de seu letramento para atuar como solicitador em pequenos casos judiciais. Em um período no qual o diploma de bacharel em direito não era um pré-requisito para o exercício da advocacia, ele começou uma carreira como advogado que, ao mesmo tempo em que o projetou como um tipo popular da cidade, fez dele o alvo constante das ironias e ataques da imprensa da cidade. Por isso, analisar os desafios e obstáculos colocados à atuação de afrodescendentes como ele ao longo da Primeira República se mostra uma forma de refletir sobre a força singular assumida pelo racismo nas décadas imediatamente posteriores à abolição.

Palavras chave: Pós-aboliçãoPós-abolição,LetramentoLetramento,RacismoRacismo,AdvocaciaAdvocacia,Primeira RepúblicaPrimeira República.

Abstract: This article follows the path of Manoel Vicente Alves, a black man known as Dr. Jacarandá. Born in 1869 in the state of Alagoas, Brazil, where he was educated, he moved to Rio de Janeiro in 1894. During his first years in the nation’s capital, he worked in several low-paying jobs, until he took advantage of his literacy to act as a solicitor in small court cases. At a time when a bachelor’s degree in law was not a prerequisite for practicing law in Brazil, he began a career as a lawyer. While giving him popular visibility in the city, his professional activity made him a constant target of irony and personal attacks in the press. Analyzing the challenges and obstacles he faced during the First Republic thus provides insights into the singular strength that racism attained in the decades immediately after the abolition of slavery.

Keywords: Post-abolition, Racism, Literacy, Legal advocacy, First Republic (Brazil).

Carátula del artículo

ARTIGOS

AS DESVENTURAS DO DOUTOR JACARANDÁ: PRÁTICA JURÍDICA, RACISMO E LUTA POR DIREITOS NA PRIMEIRA REPÚBLICA

THE MISADVENTURES OF DR. JACARANDA: LAW PRACTICE, RACISM AND THE STRUGGLE FOR RIGHTS DURING THE FIRST REPUBLIC

Leonardo Affonso de Miranda Pereira
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil
Afro-Ásia, núm. 64, pp. 284-319, 2021
Universidade Federal da Bahia

Recepção: 21 Janeiro 2021

Aprovação: 8 Abril 2021

No dia 16 de fevereiro de 1916, a capa do jornal A Noite trazia, como de costume, reportagens fartamente ilustradas para atrair a atenção de possíveis leitores. Em meio a manchetes que tratavam dos principais eventos do período (como a grande guerra que se desenvolvia na Europa), a folha apresentava, na parte de baixo da página, uma matéria original: uma entrevista em duas colunas com o “advogado” Manoel Vicente Alves. Já era comum, naquele tempo, a publicação de entrevistas com personalidades do mundo político ou jurídico, cujas palavras serviam para informar os leitores sobre as últimas novidades do tempo. Não era este, no entanto, o caso da repor- tagem em questão. Ainda que mimetizasse a forma destas entrevistas sérias, a matéria tinha um viés claramente irônico, destinando-se a entreter o leitor através da exposição de fatos curiosos. Com forte tom sensacionalista e sarcástico, a entrevista servia assim para apresentar ao público a pernóstica figura do “Doutor Jacarandá”.1

Àquela altura, poucos seriam capazes de reconhecer o perso- nagem. A matéria tratava, por isso, de apresentá-lo, tendo por mote uma carta entregue por ele algumas semanas antes à redação do jornal. Nela, Manoel Vicente Alves se descrevia como morador do número 137 da rua Menezes Vieira, no Engenho Novo, onde havia uma casa de cômodos, e dizia exercer a advocacia. Queixava-se ao jornal que, ao passar pela rua do Lavradio, na freguesia central de Sacramento, costumava ser ofendido e atacado pelos moradores de um dos sobrados ali existentes. Mais do que o conteúdo da sua queixa, interessava ao redator da notícia a exposição dos erros gramaticais da carta, transcritos de maneira provavelmente exagerada. A matéria se abria com um título tirado de uma frase atribuída ao entrevistado: “trabaio com os mestre e com o dereto”, teria dito ele – em afirmação que o jornal fez questão de transcrever na forma mais oralizada possível, de modo a ressaltar a dificuldade do entrevistado com a língua portuguesa.2 Junto a este título, uma grande foto do personagem ajudava a constituir o sentido cômico da matéria:


Figura 1
: A Noite , 16 de fevereiro de 1916

Tirada pelo fotógrafo do jornal especialmente para a reportagem, a foto trazia Manoel Vicente Alves em pose solene, depois de pedir um tempo para se arrumar por estar em trajes informais durante a entre- vista. Como descrito na matéria, ele vestia “o mesmo fraque russo” com o qual havia comparecido à redação do jornal semanas antes, apresen- tando-se “bem penteado, escovado, fisionomia serena e circunspecta”. Ele escolheu posar em frente à sua pequena mesa de trabalho, entre suas estantes de livros, que o repórter testemunhava serem “quase todos em francês e inglês, sobre direito”. Fez questão, por fim, de registrar sua imagem com a mão no bigode, como notava curiosamente o autor da matéria. De modo explícito, o fotografado tentava mostrar na imagem todos os símbolos de distinção que, a seu ver, demarcariam o lugar social da profissão que exercia – assim como fizera na adoção do vocabulário empolado com que escrevera, semanas antes, sua mensagem ao jornal.

A própria aparência do personagem retratado, quando associada ao título da matéria, explicitava, porém, a pretensão cômica da repor- tagem do ponto de vista de seus idealizadores: para o espanto destes, era negro o homem que tentava se associar a tal distinção, e modestas eram as instalações que apresentava como escritório. Apesar da vesti- menta formal e dos muitos livros que aparecem na fotografia, a simples exposição de sua “espessa carapinha” e do tom escuro de sua pele tinha na matéria o propósito de apontar para o estranhamento com o fato de que uma figura como aquela, cuja imagem se mostrava muito distante daquela dos bacharéis que frequentavam as Academias de Direito de São Paulo e Pernambuco, pudesse se apresentar como advogado. Por mais que esta fosse então uma possibilidade legal – dado que a Constituição de 1891, em seu artigo 72, parágrafo 24, determinasse que era “garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial”, inexistindo para isso a exigência de um diploma – o tema era, naqueles anos, objeto de muitas discussões e polêmicas,que visavam evitar situações como aquela.3 A matéria usava o caso para colocar em questão, em chave irônica, “a revisão constitucional e outros assuntos em foco”, ridicularizando a pretensão de elevação de Manoel Vicente Alves. Não era casual, nesse sentido, a alcunha de “Dr. Jacarandá” com que ele era apresentado pelo jornal, pois a madeira de tom escuro era então frequentemente utilizada para se referir, pejorati- vamente, a pessoas negras.4

A graça que o redator da notícia e muitos de seus leitores enxergavam no episódio apontava para uma mudança significativa na percepção social das possibilidades colocadas a homens negros como Manoel Vicente Alves. Pouco mais de três décadas antes, a atuação jurídica de Luiz Gama, outro homem negro que exercia a advocacia nos tribunais de São Paulo, sem um diploma de bacharel em direito, era saudada e celebrada por boa parte da imprensa local.5 Se nos dois casos o acesso ao letramento foi a chave que lhes possibilitou ocupar tal espaço, a distância entre o prestígio alcançado pelo rábula paulista e o sarcasmo com o qual era então tratado o “Dr. Jacarandá” sugeria que algo havia mudado ao longo dos pouco mais de trinta anos que separavam o período de atuação jurídica do líder abolicionista de São Paulo daquela de Manoel Vicente. Se nos dois casos a afirmação profissional havia se dado nas brechas de um sistema forjado para excluí-los, a publicação em 1916 daquela entrevista irônica apontava para o incômodo crescente, ao menos entre as elites nacionais, com o fato de que um homem negro pudesse atuar em uma ambiência tão distinta quanto o mundo jurídico, evidenciando os novos padrões de tratamento da questão que haviam se definido nas últimas décadas do Império.

Além das transformações na própria cultura jurídica, que havia possibilitado décadas antes o aparecimento de um advogado como Luiz Gama, os dois momentos se diferenciavam pelas profundas mudanças políticas e sociais operadas no país ao longo daquele período – que teve na abolição da escravidão e na instauração da República seus aspectos mais visíveis, e no ideário cientificista, que se fortalecera no Brasil a partir da década de 1870, sua principal base ideológica.6 São bem conhecidos os preconceitos e exclusões experimentados pelos afrodes- cendentes nas décadas que se seguiram a tais mudanças. Ao deixarem de ser escravizados, os negros e pardos, que segundo o censo de 1890 constituíam 37,2% da população do Distrito Federal, se tornavam potenciais cidadãos, o que ameaçaria a ordem social instaurada ao longo dos séculos anteriores.7 Era como resposta a esta possibilidade que, no pós-abolição, as elites políticas brasileiras forjaram um sistema que, ao excluir os analfabetos do processo eleitoral, negava-lhes cidadania plena.8 Parte importante deste projeto era, portanto, a negação do letra- mento a esses grupos. Ainda que a Lei de 28 de setembro de 1871, ao instituir o ventre livre, apontasse para certo esforço de prover a educação dos chamados ingênuos, quase nada foi feito para garantir o acesso desses homens e mulheres afrodescendentes à educação. Como resultado, apesar de alguns esforços de educadores, quase metade da população do Distrito Federal declarava, no censo de 1890, não saber ler nem escrever.9

Atentos ao fenômeno, muitos analistas viram nesta falta de letramento dos ex-escravizados e seus descendentes o principal fator de sua exclusão ao longo da Primeira República. Em livro originalmente publicado em 1964, o sociólogo Florestan Fernandes defendia que, após a abolição da escravidão, “os senhores foram eximidos da responsabi- lidade pela manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho”. Como consequência deste descaso, “o liberto se viu convertido, sumária e abruptamente, em senhor de si mesmo, tornan- do-se responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora não dispusesse de meios materiais e morais para realizar esta proeza nos quadros de uma economia competitiva”.10 Nesta concepção, o acesso à educação é caracterizado como a chave que teria garantido aos negros a inclusão que lhes foi negada ao longo da Primeira República – em um tipo de ideia já defendida, nos primeiros anos do século XX, por muitos contemporâneos. É o que sugeria, em 1904, o escritor Lima Barreto, em pensamento registrado em seu Diário Íntimo : incomodado com o fato de que um soldado do Ministério da Guerra, onde trabalhava, o tivesse tratado como simples contínuo, quando ele mesmo já se via como homem de letras, Lima Barreto via no episódio “um formal desmentido” à suposição corrente de que “a educação embeleza”, dando “outro ar à fisionomia” – o que supostamente garantiria às pessoas bem-educadas certa respeitabilidade social.11 O próprio fato de que esta premissa não tenha gerado o efeito esperado por Lima Barreto apontava para a complexidade das relações entre o letramento e a experiência do racismo, indicando os limites da suposição de que o acesso à educação seria o meio de mitigar os efeitos da discriminação racial.

A trajetória de Manoel Vicente Alves se apresenta, dessa forma,como um meio de analisarmos com mais cuidado a questão colocada por contemporâneos como Lima Barreto ou por analistas como Florestan Fernandes. Ainda que a maior parte dos negros e pardos tenha perma- necido afastada de qualquer possibilidade de letramento, casos como o do advogado negro ironizado em 1916 nas páginas do jornal A Noite nos ajudam a compreender os efeitos gerados pelo acesso à educação na experiência de sujeitos como ele. Se muito já sabemos sobre as bem-su- cedidas experiências de alguns poucos negros ilustres que conseguiram ultrapassar a barreira do acesso à educação, como o deputado Monteiro Lopes ou o jornalista Francisco Guimarães,12 o caso do chamado “Doutor Jacarandá” nos permite voltar à questão sob outro prisma: aquele dos que, apesar da escolarização, nunca conseguiram alcançar a respeitabilidade e o reconhecimento. Cabe assim compreender tanto o processo de afirmação profissional, que permitiu que Manoel Vicente Alves se apresentasse como advogado naquele ano de 1916, quanto os desafios e as possibilidades apresentados a ele ao longo dos anos e décadas seguintes, de modo a fazer de sua trajetória uma maneira de entendermos em que medida o acesso às letras poderia constituir um meio de ascensão para homens e mulheres afrodescendentes ao longo da Primeira República.

O letramento e seus desafios

Manoel Vicente Alves nasceu em 25 de abril de 1869, em Palmeira dos Índios, no agreste alagoano, fruto da relação entre Antônio Vieira Alves e Maria Rita da Costa, dos quais pouco se sabe. Como ele lembraria décadas depois em algumas das entrevistas que deu aos jornais do Rio de Janeiro, foi nesta cidade que ele viveu até os 22 anos, tendo lá frequentado a escola primária em que aprendeu a ler e a escrever – aproveitando-se assim das possibilidades abertas por um contexto de maior preocupação com a escolarização dos trabalhadores de baixa renda.13 Apesar da instrução básica, sua condição social o levou a trabalhar durante a juventude como caixeiro em casas de pasto da cidade, especializando-se “em cantar o menu aos fregueses”. Na busca por horizontes mais amplos, no início da década de 1890 embarcou em um navio do Lloyd que o levou primeiro a Manaus, depois a Recife, onde trabalhou por alguns meses. “Eu já me sentia sufocado em minha terra”, explicou em uma de suas últimas entre- vistas, justificando a mudança para uma “cidade grande”.14

Não durou muito tempo sua estadia na capital pernambucana. Manoel Vicente decidiu, em 1894, mudar-se para o Rio de Janeiro,15 movido pelo “pressentimento de que meu futuro estava na capital da República”, como explicou em 1930 a um repórter interessado em sua história. Ao chegar na cidade em um momento de forte turbulência econômica e social, marcado por crises do governo Floriano Peixoto, que mostravam a dificuldade enfrentada pelo regime republicano para se estabilizar, não eram muitas as alternativas de sobrevivência colocadas a homens de sua condição. Como resultado, conforme contou ao repórter, trabalhou em ofícios diversos, como os de “quitan- deiro, peixeiro, apanhador de papéis velhos, estivador”, dentre outros trabalhos braçais.16 Significativamente, um dos primeiros registros de sua presença na cidade foi uma nota sobre o “auto de flagrante” contra ele lavrado pelo delegado do 7º distrito policial por vender publicamente “o denominado jogo dos bichos ”.17 Era assim, de forma semelhante àquela de muitos outros trabalhadores negros e pardos já estabelecidos no Rio de Janeiro, igualmente necessitados de buscar a cada dia os meios de sobrevivência em trabalhos que não exigiam maiores qualificações, que Manoel Vicente viveu seus primeiros tempos na capital federal.

Até aquele momento, Manoel Vicente dizia se sentir “ignorado” na cidade.18 Dentre os empregos que conseguiu ao longo desse período, no entanto, um se mostraria mais decisivo para os novos rumos que sua vida tomaria a partir de então: o de empregado doméstico. Lembrando-se de ter sido “criado de uma porção de gente”, contou a vários jornalistas que o início de sua formação jurídica se deu em contato com os moradores das “repúblicas de estudantes” nas quais trabalhou, e que o levaram a se entusiasmar pela “profissão de advogado”. De fato, se ao longo do Império as cidades de Recife e São Paulo concentravam as únicas faculdades de direito existentes no Brasil, um decreto do governo provisório em 1891 regulamentava a possibilidade de abertura de novos cursos jurídicos, fossem públicos ou privados. Como consequência, naquele mesmo ano foram criadas na capital federal duas novas instituições: a Faculdade Livre de Direito da Cidade do Rio de Janeiro e a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro.19 Segundo uma das primeiras reportagens que trataram do Doutor Jacarandá, nessas faculdades estudavam “várias gerações de moços” que “se utilizaram dos prestimosos serviços de Manoel Vicente”. Foi na convivência diária com tais estudantes que ele teve a chance de aprender “várias línguas e várias gramáticas”, aprimorando sua formação de maneira informal.20

Foi como fruto desta convivência e das redes de proteção tecidas com os jovens estudantes, que, em 1905, Manoel Vicente iniciaria sua trajetória nos tribunais. Contou, para isso, com o empurrão inicial dado por “um jovem e inteligente advogado” para o qual trabalhou. Envolvido em um conflito com um colega que o processou, ele tratou a ação com sarcasmo, convidando Manoel Vicente para “bancar o seu defensor” em uma “audiência do Juiz Criminal” – o que levou o oponente, temeroso do ridículo da situação, a retirar a ação.21 Frente ao sucesso do caso, que provavelmente fez Manoel Vicente perceber que poderia atuar nos tribunais mesmo sem ter diploma em curso superior, ele tomou gosto pelo direito, passando a atuar como solicitador judicial em vários casos de pequeno porte. Beneficiou-se, para isso, das “duas dúzias de livros” e das “trouxas de roupas herdadas” dos estudantes, que garantiam as condições mínimas para que começasse a atuar nos tribunais.22

Pouco mais de dez anos após chegar ao Rio de Janeiro, Manoel Vicente dava início a uma carreira jurídica que, ao longo dos anos seguintes, passaria a garantir sua sobrevivência. Como reconhecia um repórter do Correio da Manhã em matéria publicada poucos dias após aquela do jornal A Noite , ao longo da década de 1910, ele conseguiu formar uma “larga” clientela composta por trabalhadores de baixa renda, à qual prestava “serviços de procurador judicial particular” – o que lhe permitia desfrutar de uma vida digna em uma casa de cômodos da Rua dos Inválidos.23 Por mais que a falta de recursos o obrigasse por vezes a receber seus clientes em um botequim em frente ao fórum, ou a exercer outros ofícios em paralelo (como a venda de cartões postais), conseguiu, em pouco mais de dez anos, consolidar sua carreira jurídica.24 Assim como havia acontecido com Luiz Gama em São Paulo décadas antes, ele experimentava uma ascensão social que, embora modesta, garantia-lhe condição melhor do que aquela geralmente destinada aos homens de sua condição.

Acabam aqui, porém, as semelhanças entre os dois casos. Distante do reconhecimento social conquistado por Luiz Gama, Manoel Vicente Alves se viu obrigado a lidar com uma ordem republicana que, por causa de seus traços negros, insistia em enquadrá-lo na lógica da suspeição.25 Por esse motivo, mesmo que tivesse atividade profissional estável em um ramo de grande reconhecimento social, não deixava de ser alvo constante da polícia. Foi o que aconteceu no início da madrugada do dia 15 de abril de 1912, quando caminhava pela rua do Lavradio. Sem motivo aparente, foi abordado por um fiscal da Guarda Civil, que o interpelou sobre “o que fazia àquelas horas”. Mesmo tendo respondido que se recolhia à sua residência, o guarda resolveu “dar uma busca”, sendo ajudado por outro guarda. Ciente de seus direitos, Manoel Alves declarou que “só se deixaria revistar na delegacia e em presença do delegado”, mas ainda assim teve de se submeter à revista.26 De tão frequentes, casos como esse o fizeram enviar ao Chefe de Polícia um requerimento no qual pedia uma certidão sobre “o que a seu respeito” constava naquela Inspetoria, de modo a tentar se precaver de futuros constrangimentos.27 Sem conseguir resultados pela via legal, no entanto, tratou de fazer dos jornais um meio de denunciar o arbítrio ao qual era frequentemente submetido – procurando as redações das grandes folhas da cidade para expor a situação, o que era comum no período.28

Casos como esses mostravam que o letramento e a atuação jurídica, por mais que garantissem seu sustento, não bastavam para afastar Manoel Vicente da discriminação que vitimava homens negros como ele. Em direção contrária, o fato de que se apresentasse como advogado, exercendo ofício distante daquele esperado para homens de sua cor, tornava ainda mais intensa a perseguição e o preconceito dos quais ele era vítima. À medida que consolidava sua posição profis- sional, foi se tornando objeto de um incômodo expresso em sucessivos casos de constrangimento e agressão. Em agosto de 1913, quando passava defronte de um botequim da Avenida Mem de Sá, ouviu “vários rapazes” lhe lançarem uma vaia, que logo se transformaram em troca de agressões. Ao apresentá-lo como “um preto de óculos, que traja decentemente, dizendo-se entendido em matéria constitucional”, a nota que noticiava o episódio mostrava que o motivo da agressão era justa- mente o fato de que a “canalha miúda” não se conformava com sua atuação destacada, ironizando sua suposta pretensão em ser “doutor”.29 Dada a frequência de ocorrências como essas, Manoel Vicente chegou a procurar os jornais para se queixar de que todas as vezes em que saía de sua casa era “vaiado por um grupo de vagabundos que por ali moirejam cotidianamente”. Episódios assim se tornaram comuns ao longo de toda a vida adulta de Manoel Vicente, evidenciando que sua experiência continuava marcada por preconceitos que extrapolavam em muito a ação da força policial, alimentados pelo incômodo social mais amplo com o lugar social que ele tentava definir para si mesmo.

Foi neste contexto que se deu, em 1916, a publicação da matéria do jornal A Noite . O incômodo demonstrado pelo redator com o fato de que um homem negro como Manoel Vicente se apresentasse como advogado era o mesmo que alimentava a postura dos que, pelas ruas, dirigiam a ele diversas agressões e insultos. Não era de se admirar, por isso, que ele tenha recebido a reportagem com indignação. Dois dias após a publicação, ele procurou a redação do jornal Correio da Manhã para se queixar dos redatores da folha concorrente, que teriam “atrapa- lhado” seu trabalho como advogado com as ironias lançadas sobre ele. Apresentando-se como “procurador judicial particular”, contou que foi procurado pelo repórter d’ A Noite após ter levado à redação do jornal uma carta de reclamação contra seus vizinhos, dizendo-se surpreendido com o tom da matéria publicada. “O repórter enganou-me, tratando-me adocicadamente, para depois me denominar dr. Jacarandá”, reclamava Manoel Vicente. “É uma perfídia que não admito. Não sou madeira”, exclamava Manoel Vicente, atento para o sentido racializado do apelido que lhe foi atribuído, que de “tão ofensivo” que era o faria entrar com “um processo de indenização por perdas e danos” contra o jornal. Afastando-se daquela caricatura, tentava usar mais uma vez as páginas da imprensa para se apresentar como um “profissional” que ganhava a vida “honestamente”.30

Para seu desgosto, no entanto, a nova matéria repetiria o tom sarcástico da anterior. Apresentado novamente, já no cabeçalho da reportagem, como o “Dr. Jacarandá”, ele era mais uma vez ironizado pelo repórter, que também demonstrava incômodo com o fato de que um “descendente brasileiro dos antigos soberanos do alto Congo”, que vivia “num dos muitos aposentos sórdidos do prédio n. 137 da Rua dos Inválidos”, pudesse se apresentar como advogado. Ao perceber que seu novo entrevistador o tratava da mesma forma pejorativa, Manoel Vicente ainda tentou argumentar: “o senhor não me suponha também Jacarandá. Trabalhei com os mestres eminentes do dereto e das tribunações ”, respondia a ele, afirmando ainda ter “uma bibrioteca onde figuram os maiores advogados nacioná e estrangeiro ”.31 Embora registrasse sua queixa, o jornalista fazia questão de transcrevê-la mais uma vez na forma oralizada, como meio de reforçar a suposta ignorância do personagem.

Apesar de seus protestos, Manoel Vicente tornava-se conhecido na cidade pelo novo apelido, que a partir daquele momento seria usado por grupos que lhe lançavam sucessivas ironias e agressões verbais nas ruas –frequentemente respondidas por ele com insultos e benga- ladas, como ele lembraria em um depoimento dado anos depois.32 Ao tirá-lo do anonimato, aquelas reportagens o transformaram em um tipo popular, que passava a ser ironizado e importunado pelas ruas com uma frequência muito maior do que antes. Foi o que aconteceu já em janeiro de 1917, quando três carpinteiros, um deles português, o encon- traram de noite pelas ruas. Como atestavam diferentes folhas, “depois de lhe haverem dito meia dúzia de chalaças pesadas”, os três “agrediram-no a pau, produzindo-lhe pequenas escoriações na cabeça”. As próprias matérias que noticiavam a agressão tratavam, porém, de reforçar o preconceito que lhe serviu de base. Além de apresentá-lo em seus títulos como o Doutor Jacarandá, elas caracterizavam Manoel Vicente como “um crioulo pernóstico que por aí anda se dizendo advogado”.33 Outros jornais iam ainda mais longe, atribuindo sua ambição de atuar como advogado a uma suposta perda da razão, que faria dele um caso psiquiátrico – em uma medicalização da diferença que se tornava cada vez mais frequente no regime republicano.34

Reportagens como essa ajudavam assim a reproduzir e reforçar o preconceito a ele associado, gerando novos insultos e agressões. Por mais que Manoel Vicente respondesse como um homem da lei, procurando junto à polícia e à justiça dar um fim àqueles ataques,35 cada nova notícia sobre sua atuação vinha reforçar os estereótipos e preconceitos que as alimentavam. O jovem que saiu de Palmeiras dos Índios em busca de sonhos de grandeza na capital federal passava, assim, a conhecer melhor os limites colocados à sua ascensão. Por mais que tenha tentado se afirmar profissionalmente a partir de seu saber, esforçando-se para ultrapassar as barreiras impostas a homens e mulheres como ele, a exposição pública da contradição entre seu perfil racial e o ofício que exercia parecia o suficiente para desqualificá-lo. Se décadas antes o direito havia servido como caminho de ascensão e expressão para Luiz Gama, o processo de transformação de Manoel Vicente em um tipo pernóstico apontava para o estreitamento das possibilidades de atuação de homens negros nos primeiros tempos da República. Era dentro desta realidade permeada pelo racismo científico que se desenrolaria, ao longo dos anos seguintes, sua trajetória profissional no Rio de Janeiro.

O defensor dos desprotegidos

Mesmo após experimentar os obstáculos e limites impostos ao seu desenvolvimento profissional, Manoel Vicente Alves insistia em fazer do direito seu principal meio de expressão pública e de defesa de direitos. Por mais que visse questionada a posição de elevação profissional na qual tentava se colocar pelo seu domínio das letras e do direito, ele fez de seu saber jurídico um meio não apenas de garantir o próprio sustento, mas também de lutar pelas causas nas quais acreditava. Para isso teve que se adaptar às circunstâncias, reformulando seus caminhos e estratégias de acordo com os obstáculos que se apresentavam à sua frente. Era assim, no diálogo com os preconceitos e exclusões que sobre ele recaíam, que Manoel Vicente daria um novo rumo à sua trajetória.

Esta mudança de postura teve como um de seus primeiros efeitos a tentativa de ressignificação positiva do apelido dado a ele pelos jornais. Por mais racializada que fosse a alusão ao “Doutor Jacarandá”, Manoel Vicente passou, em pouco tempo, a assumir o apelido, confe- rindo a ele um sentido positivo. Foi o que fez em uma nota que publicou em junho de 1920, no Correio da Manhã , para corrigir a informação equivocada de uma de suas matérias. Depois de um ano sendo referido pela imprensa por aquele apelido preconceituoso, ele mesmo fez questão de explicitá-lo entre parênteses após o seu nome, para que os leitores pudessem reconhecer de quem se tratava.36 Outro episódio indicaria, no ano seguinte, que essa não se tratava de uma opção tranquila: a estreia de uma peça chamada “Dr. Jacarandá”, que se valia da popularidade alcançada pelo advogado negro a partir das notícias jocosas publicadas pela imprensa para fazer dela o eixo de uma revista teatral. Segundo Luiz Palmerin, autor da peça, Manoel Vicente teria ficado “mais ou menos” incomodado com a alusão, tendo advertido seus autores de que “protestaria pela imprensa” contra o título da peça. Aparentemente convencido por eles, que o chamaram para assistir à primeira sessão, e talvez também pelo sucesso alcançado pela representação, acabou desistindo da ideia.37 Daquele momento em diante, seria cada vez mais comum que ele, como advogado, passasse a incorporar o apelido ao seu nome, o que o levou, em 1923, a assinar suas peças jurídicas como “Manoel Vicente Alves Jacarandá”.38 Superado o descontentamento inicial com o apelido, acabou assim por assumi-lo como parte de um novo esforço de busca por espaço.

Tal opção parecia se ligar ao reconhecimento da grande projeção social alcançada por ele através daquele epíteto. Por mais que fosse fruto direto do racismo que estruturava a sociedade brasileira, o apelido definido pela imprensa para Manoel Vicente Alves acabou por transfor- má-lo em uma figura popular, conferindo a ele uma projeção inusual para um homem de sua origem. O fato de que aquele apelido tenha sido usado como título de uma peça de teatro de revista mostrava que, àquela altura, tratava-se de uma referência bem conhecida, cuja simples menção ajudaria a atrair o público – garantindo à peça o “recorde dos êxitos”, como afirmado por uma propaganda da companhia teatral publicada na Gazeta de Notícias .39 Como resultado, um redator do jornal O Paiz atestava, em 1920, que “esse pobre homem tornou-se um dos nossos tipos mais populares”, e dizia que o fato dele ser “conhecido em todos os cantos da capital” seria então seu “maior orgulho”.40

Nem por isso, entretanto, Manoel Vicente deixaria de se mostrar consciente do caráter singular de sua posição. Em reportagem que celebrava justamente o fato de que ele estivesse “no auge da popula- ridade”, um redator do jornal A Rua afirmava, naquele mesmo ano, em tom condescendente, que “afora a cor, na qual difere da maioria de seus colegas”, ele seria “um cavalheiro amável, de palestra agradável”. Contava que, “modesto, o Dr. Jacarandá não se aproxima da gente de outa cor , senão quando a isso é chamado”41 – explicitando os cuidados tomados por ele para fugir ao preconceito do qual costumava ser vítima. As notas publicadas pela imprensa do período evidenciavam as razões dessa postura cuidadosa. No dia seguinte à publicação dessa reportagem, Manoel Vicente foi preso enquanto dormia “em seu próprio domicílio”, um quarto em uma casa de cômodos da Rua dos Inválidos que servia a ele tanto como residência quanto como escritório. Por mais que os jornais justificassem tal prisão pela acusação de que ele costumava andar pela casa sem roupa, o próprio advogado negro fez questão de procurar as redações para desmenti-la. Classificando a acusação como “uma calúnia gratuita” que visava justificar seu despejo, mostrava se tratar de artifício utilizado por sua senhoria, com quem já vinha se desentendendo, para expulsá-lo de seu cômodo.42 Depois de semanas de conflito, no entanto, a senhoria acabou conseguindo despejá-lo mesmo sem comprovar as acusações, contando com o apoio da polícia – naquilo que o próprio Manoel Vicente definia como “uma arbitrariedade, uma injustiça inqua- lificável”.43 Ficava claro, através de casos como estes, que a fama não o livraria de experimentar o preconceito cotidiano que, por causa do tom de sua pele, fazia de figuras como ele os alvos prediletos da vigilância e repressão policial44 – o que explicava sua postura cuidadosa na relação com os advogados brancos que encontrava no Fórum.

Mais do que a simples vaidade pela fama, a adoção do apelido preconceituoso por parte de Manoel Vicente ligava-se, assim, a uma estratégia de inserção e visibilidade necessárias para garantir a legiti- midade de um advogado negro como ele. Mesmo que fosse através das ironias que lançava sobre sua prática jurídica, a imprensa ajudava a divulgar seu nome entre possíveis interessados por seus serviços, colaborando indiretamente para a consolidação de sua carreira jurídica. “Não há quem frequente as repartições de justiça e de polícia que não conheça Manoel Vicente Alves – o Dr. Jacarandá”, testemunhava, em 1920, um cronista do jornal O Paiz . Como resultado, as notícias publi- cadas a partir de 1919 mostravam que ele conquistava uma clientela cada vez maior, formada por trabalhadores de baixa renda de diferentes origens e nacionalidades. Ao mesmo tempo, tal projeção permitia que ele tentasse afirmar seu próprio saber jurídico, anunciando que publi- caria um livro no campo do direito.45

Foi essa popularidade que lhe garantiu, a partir de 1922, a proteção do Marechal Carneiro de Fontoura, que assumiu naquele ano a chefia da polícia do Distrito Federal. Procurado por Manoel Vicente pouco após tomar posse, ele passou a abrir com frequência seu gabinete ao advogado negro, que, segundo alguns jornalistas, era recebido por ele “com maior presteza do que muito político da moda”. Como resultado dessa proteção, passou a ser procurado por “um grande número de pessoas que tinham questões com a polícia”, conseguindo em geral deixar “tudo resolvido satisfatoriamente”. Para surpresa de muitos dos que lançavam sobre ele suas ironias, ele passava a ser visto como “um verdadeiro porrete para solucionar questões complicadas, principalmente em se tratando de questões políticas” – como as prisões e perseguições arbitrárias por parte da força policial.46

Não eram quaisquer clientes, no entanto, que procuravam Manoel Vicente Jacarandá. Se o crescimento de sua popularidade se traduzia em aumento de clientela, esta mantinha o perfil inicial, sendo trabalhadores de baixa renda a maior parte daqueles que o procuravam – como o carregador português José da Costa Leite, defendido por ele em 1921 após ser acusado de roubo. Vistos muitas vezes como alheios à ordem jurídica republicana, tais sujeitos fizeram da justiça, ao longo da Primeira República, um meio constante de luta por direitos – assim como haviam feito, durante o Império, os escravizados que buscavam na justiça sua liberdade.47 Com isso, criaram uma demanda por repre- sentação judicial que não podia ser atendida somente pelos bacharéis em direito, cujo desinteresse por esse tipo de caso se expressava em custos inacessíveis à maior parte dos trabalhadores da cidade.

Foi nessa brecha que se inseriu Manoel Vicente, cuja atuação jurídica se voltava exatamente para os setores sociais não atendidos pelos advogados com curso superior. “Sua clientela é própria, diferente, incon- fundível”, reconheceria anos depois um contemporâneo. Ao defender a causa de “pobres mulheres, saídas dos catres mais sombrios, arran- cadas do mais miserável dos comércios para as trevas de um cubículo”, de “rapazes sem nome, sem parentes, sem defesa”, e de “centenas de infelizes” que fariam dele um “intermediário junto aos cartórios, aos juízos e aos tribunais” do período, Manoel Vicente Jacarandá consagra- va-se como defensor daqueles que eram “muito pobres para encontrar quem lhes patrocine, de bom agrado, os mais respeitáveis interesses”. Em um momento no qual “milhares de réus” jáeramcotidianamente“conde- nados, em todo o país, sem uma sombra de defesa”, o memorialista Nelson Carneiro reconhecia como a “principal característica” do advogado negro o esforço de “espalhar, entre os desesperados, o milagre da esperança”, o que o levou a defini-lo como um “criador de esperança”.48

O próprio Manoel Vicente justificaria tal opção em entrevista dada em 1941, ao jornal A Noite , na qual fazia um balanço de sua carreira jurídica. “Eu também já fui pobre. Compreendo perfeitamente as coisas da vida”, dizia ele para explicar por que sua clientela era “constituída de gente sem recursos, que nada pode pagar”, para a qual chegava a emprestar dinheiro para as custas processuais.49 Era o caso de figuras como o confeiteiro negro João Zeferino Soares, acusado em 1927 de matar um ex-patrão durante uma briga que resultara das “perseguições que sofrera”.50 Em longa e bem escrita petição ao juiz da 6ª Vara Criminal, na qual não se nota nem sinal dos erros grama- ticais grosseiros que a imprensa costumava lhe atribuir, Manoel Vicente Jacarandá tomava a defesa do acusado. Por mais que fosse difícil negar a autoria do crime, ele tratava de evitar que recaísse sobre o acusado uma pena de rigor excessivo – esforçando-se por afastar supostos agravantes levantados pela Promotoria, de modo a conseguir o melhor resultado possível para o seu cliente.51 Casos como estes mostravam como sua atuação nos tribunais era pautada pelo esforço de garantir a representação jurídica de sujeitos que não teriam uma alternativa de defesa. Não é de se admirar, por isso, que ao fim de sua vida ele fosse celebrado por muitos contemporâneos como um verdadeiro “defensor dos desprotegidos”.52

Além de constituir um meio de sobrevivência e ascensão social, o mundo jurídico era pensado por Manoel Vicente como um campo de luta por direitos por parte daqueles que eram os alvos privilegiados da justiça republicana. Se ele conhecia por experiência própria os limites da liberdade afirmada pela República – como indicava sua prisão em julho de 1915, durante um comício de apoio à greve dos padeiros53 – era nos tribunais que desenvolveria uma luta mais clara contra este arbítrio, em especial a partir da década de 1920. Por acreditar que no Brasil o direito seria “uma bola de cera nas mãos dos poderosos”,54 ele tratava de se apropriar das armas do mundo jurídico para lutar por um ideal diverso de República. Foi o que fez em 1927, ao protestar contra a decisão de um juiz que tentava impedi-lo de advogar em sua vara. “Não há quem não saiba que na República ninguém é mais do que outro, todos somos iguais”, defendia o advogado negro, para o qual a decisão do juiz faria com que o Tribunal do Júri se afastasse da imagem de “um tribunal popular”. Por isso, fazia questão de ressaltar em suas petições ao juízo que “sem provas ninguém poderá ser condenado”.55 Colocando-se como um homem da lei, se apropriava dos alicerces jurídicos da ordem republicana, de modo a colocá-los a serviço da defesa daqueles que costumavam ser seus alvos principais.

Fundamental, nesse esforço, foi um instrumento jurídico insti- tuído pela constituição de 1891: o habeas corpus . Apresentado no texto constitucional como um meio de garantir a “inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade”, ele poderia ser usado por qualquer pessoa (e não apenas por advogados) como meio de combater o arbítrio dos primeiros governos republicanos – constituindo, segundo Tavares Bastos (um dos juristas que escreveram no período manuais para facilitar sua utilização), uma “eficaz garantia contra os abusos de poder” que marcavam o novo regime.56 Não por acaso, ao longo da década de 1920, boa parte dos casos apresentados por Manoel Vicente Alves à justiça se referiam a tal instituto, aplicado em defesa dos trabalhadores da cidade – como a jovem Mercedes Maria da Silva, acusada de vadiagem.57 Em entrevista concedida em 1928, a um homem de letras de seu conhecimento, o próprio Jacarandá teste- munhava que sua atuação se concentrava então em “duas manutenções de posse e alguns habeas corpus ”, dizendo que era nestes que se fazia um “especialista”. “Rendem-me pouco porque, fora as custas, cobro 15 mil réis pelo meu trabalho em cada um”, explicava ao repórter. Ainda assim, defendia a importância daquelas ações, na defesa de que “o pensamento da liberalidade, faça chuva, sol ou tempestade, encontram ainda no habeas corpus a sua suprema expressão”. Por isso, definia o habeas corpus , no qual baseava sua atuação jurídica, como “o amparo dos desprotegidos”.58

Ao atuar nas brechas e contradições da ordem republicana que se afirmava, Manoel Vicente Alves terminava a década de 1920 com uma carreira jurídica consolidada. Embora muito distante da respeitabilidade e do prestígio alcançados no mesmo período por outros advogados que também não tinham diploma universitário – caso de Evaristo de Moraes, um atuante advogado de trabalhadores que, por não ser negro, estava a salvo de ironias e preconceitos como aqueles lançados sobre Manoel Vicente59 –, ele alcançava sucesso em sua tentativa de viver da advocacia. A reboque da popularidade ocasionada pelas ironias lançadas sobre ele pelos jornais, conseguiu garantir tanto sua sobrevivência quanto a possibilidade de acesso à justiça para muitos homens e mulheres de baixa renda da cidade. Na mesma entrevista de 1928, em que defendera o habeas corpus , tratava da continuidade das “várias violências” de que costumava ser alvo, mas afirmava que elas “não conseguiram” afastá-lo do exercício de sua profissão. “Vivo da advocacia e para a advocacia”, testemunhava, dizendo ter nascido “talhado para ser doutô ”.60 Como resultado, podia em 1930 posar orgulhoso para uma reportagem da revista O Malho , que voltava a tematizar sua figura:


Figura 2
: O Malho, 19 de julho de 1930

De terno e pince-nez , Manoel Vicente aparecia em uma mesa de trabalho de seu escritório, que, bem mais estruturado do que aquele de 1914, ocupava então uma sala da sede do Centro Alagoano, na esquina entre as ruas da Constituição e do Núncio. Mais uma vez, a imagem dos livros sobre a mesa se apresentava como expressão do saber sobre o qual baseava sua atuação em favor dos trabalhadores da cidade. Frente ao estranhamento do repórter, que lhe perguntou se ele “estudou em alguma escola superior”, ele respondeu com outra pergunta: “– Ué!… Então para ser doutor é preciso estudar alguma cousa?”61 Na distância entre a perspectiva sarcástica do repórter e as afirmações orgulhosas de Manoel Vicente evidenciava-se a singularidade que garantiria a este um vasto espaço profissional de atuação. Era assim tanto em sua própria capacidade intelectual quanto na experiência de exclusão, a partir da qual podia compreender a perspectiva e os interesses dos trabalhadores que compunham sua clientela, que se baseava a confiança do advogado negro, que conseguiu com isso se afirmar em um campo profissional em geral avesso a pessoas de sua classe e sua cor.

Dos tribunais às urnas

Apesar da exposição de seu saber jurídico em dezenas de processos judiciais e do sucesso de sua carreira como advogado dos trabalhadores de baixa renda, Manoel Vicente Jacarandá continuava a experimentar os prejuízos causados pelo racismo à sua afirmação pessoal e profissional. Por mais que o trabalho nos tribunais garantisse sua sobrevivência, ele se viu obrigado a lidar, por toda a vida, com os limites colocados à sua ascensão por sua cor. Se para aqueles que compunham sua clientela habitual esta não parecia ser uma questão relevante, sempre que tentou se projetar para além desses círculos, o advogado negro teve que lidar com ironias, críticas e preconceitos que tinham no pensamento racial a sua base. Dos enfrentamentos com tal discriminação resultaria a explicitação dos ideais igualitários defendidos por ele, assim como das dificuldades em afirmá-los em uma sociedade tão profundamente marcada pelo pensa- mento racial.

Experimentadas em seu cotidiano, essas barreiras se mostravam de maneira especialmente intensa nos momentos em que Manoel Vicente tentava se colocar em ambientes de diálogo mais amplos, como aqueles da imprensa ou da política – pela qual começou a se interessar à medida que tomou consciência da popularidade que alcançou através das frequentes ironias lançadas sobre ele pela imprensa. Uma primeira indicação a este respeito se deu nas eleições legislativas realizadas em fevereiro de 1921, momento no qual as contradições da ordem política republicana começavam a ficar mais evidentes.62 Ainda que não tivesse se apresentado como candidato, para surpresa dos jornais da capital, o nome de Manoel Vicente Alves apareceu dentre os votados na 6ª seção eleitoral, do distrito da Glória. Por mais que se tratasse de apenas um voto, contra os 120 recebidos por Paulo de Frontin na mesma seção, foi o que bastou para que jornais, como A Noite , lançassem luzes sobre o caso.63

Se para o jornalista que assinava a matéria este voto era motivo de riso, o próprio Manoel Vicente parece ter visto nele um testemunho de sua popularidade, que o estimulava a se lançar em disputas eleitorais futuras. Foi o que ele fez por ocasião das eleições legislativas que se realizariam em 1924. No dia 1 de fevereiro, pouco mais de duas semanas antes do pleito, ele publicou em alguns jornais da cidade uma pequena nota paga colocando-se como candidato a deputado pelo Distrito Federal, e anunciando para o dia seguinte um discurso público no largo de São Francisco para lançar sua plataforma. Dias depois, usou o mesmo artifício para anunciar novos discursos, desta vez na Praça da Bandeira e no Largo do Catumbi.64 Segundo alguns relatos da imprensa, tais eventos foram um grande sucesso, pois ao seu fim ele “era acompanhado pela multidão que o vitoriava”.65 Habituado a repre- sentar os trabalhadores da cidade nos tribunais, Manoel Vicente, que naquele mesmo ano declararia não ter partido político,66 se colocava como alternativa de representação para sujeitos geralmente colocados à margem do processo eleitoral.

O simples lançamento de sua candidatura foi o suficiente para fazer dela um dos temas mais comentados daquelas eleições. Sempre através de ironias e preconceitos, a imprensa tratava com surpresa e sarcasmo o fato de que alguém de sua condição pudesse se apresentar no pleito – como mostravam os versos satíricos atribuídos pelo jornal O Brasil ao Doutor Jacarandá, nos quais ele supostamente se apresentava para as “inleições” enquanto afirmava que iria “bebê” até cair na rua, e se igualava pela cor à “viúva de luto preto” ou à “chaminé da fábrica”.67 Tratado por muitos jornalistas como um “pobre preto obcecado pela ideia de ser parlamentar”, ele era alvo de uma discri- minação reconhecida por um colunista do jornal Correio da Manhã , para o qual ele seria um candidato “em nada inferior a muitos outros”. “Será a cor, que não o ajuda?”, perguntava o colunista, criticando a “campanha injusta e clamorosa contra o popularíssimo e autêntico republicano”. “Ele, o cidadão Manoel Vicente Alves, pode dizer que tem as mãos pretas, mas limpas, rudes, mas honradas; não sabe falar gramaticalmente certo, porque não teve a mesma sorte de encontrar quem lhe desse os meios necessários para estudar, nem usou dos seus processos para subir. Então por que ridicularizá-lo?”, perguntava o redator, para o qual Manoel Vicente poderia representar a “esperança do povo”.68 Era assim a cor de sua pele o que mais chamava a atenção dos articulistas da imprensa quando ele se apresentou para a disputa eleitoral, em perspectiva que evidenciava as dificuldades que o advogado negro enfrentaria em sua tentativa de se colocar para além de seu círculo de relações habitual.

Como resultado desta campanha de descrédito, o sucesso alcançado nos tribunais não se repetiria nas urnas. Candidato pelo 1º distrito, ele conseguiu apenas 129 votos, contra os mais de 6 mil conquistados pelo menos votado dos candidatos eleitos.69 Atento à complexidade do processo eleitoral da Primeira República, Manoel Vicente ainda tentou contestar o resultado, apontando para supostas fraudes que lhe teriam tirado votos na seção da Candelária e defendendo o direito a ser reconhecido como eleito.70 Em petição apresentada ao Congresso Nacional, usava argumentos jurídicos para mostrar que um dos candidatos diplomados seria legalmente inelegível por estar entre os “funcionários administrativos e federais demissíveis”. Ao mesmo tempo, afirmava não haver quem não soubesse que ele próprio havia sido “bastantemente votado e gozava das melhores simpatias do povo desta Capital”, e voltava a se definir como um “candidato do povo e defensor do nosso sagrado país que adora tanto”. Colocando-se como partidário das ideias de políticos como Patrocínio e Silva Jardim, terminava clamando “pela liberdade e igualdade do povo do nosso país”.71 Por mais que os redatores dos grandes jornais afirmassem que tais contestações aumentavam “o ridículo que já havia em torno de sua pessoa”, através delas, o advogado negro mostrava-se atento às nuances e contradições das regras eleitorais da Primeira República.72

Apesar do insucesso dessa primeira tentativa de se eleger, Manoel Vicente não desistiria de se lançar na política, apresentando-se em 1925 como candidato a uma eleição para a Intendência Municipal que seria realizada no ano seguinte. Sua plataforma, reproduzida com finalidades humorísticas por um cronista do Correio da Manhã que usava o pseudônimo de Macaco Velho (que afirmava que daria a ele seu voto se fosse eleitor), contemplava novamente muitos elementos que diziam respeito à experiência cotidiana dos trabalhadores da cidade – como a tentativa de controle dos gêneros alimentícios, a conservação das ruas (em especial da zona suburbana e do centro) e os direitos dos trabalhadores frente aos patrões.73 Como ele faria questão de deixar claro perto do dia da votação, tratava-se de um esforço de lutar “pelo povo, estabelecendo nesta terra a democracia, a liberdade, o amor, o direito e a união”.74 Configurava-se, com isso, a proposta de levar para a política o tipo de postura de defesa dos trabalhadores de baixa renda que já desenvolvia nos tribunais.

Mais uma vez, no entanto, Manoel Vicente testemunharia a dificuldade imposta por sua cor à tentativa de entrar para a política. Aproveitando-se da fama alcançada junto ao público teatral, ele iniciou sua campanha aceitando o convite de empresários do teatro ligeiro para apresentar sua plataforma em meio à representação de uma das peças de apelo popular que faziam então sucesso nos palcos cariocas. Do ponto de vista do próprio advogado negro, aquela era uma chance de expor suas propostas para um público mais amplo. Para os empresários que o convidaram, assim como para os jornalistas que escreviam sobre o evento, tratava-se, porém, de simples artifício cômico. Embora reconhecessem que aquela apresentação despertava o “maior interesse” entre o público, eles faziam questão de tratá-la como um meio de divertir a assistência, dado o ridículo que atribuíam àquela candidatura.75 Significativamente, em meio à sua exposição, para a qual se apresentara em roupa de gala, a polícia entrou em cena para apreender o anel que ele usava, cujo uso seria privativo dos bacharéis em direito. Por mais que o próprio Manoel Vicente afastasse a suposição de que se tratasse de um anel de doutor, afirmando que aquele era um adereço barato, ele teve que ir à polícia nos dias seguintes para tentar reavê-lo.76 Não era de se estranhar, por isso, que mais uma vez Manoel Vicente tenha recebido poucos votos.77

O novo insucesso não desanimaria Manoel Vicente Jacarandá, que continuaria pelos anos seguintes se apresentando como candidato a diferentes cargos eletivos – inclusive nas eleições presidenciais reali- zadas naquele mesmo ano de 1926, vencida com larga margem por Washington Luiz. Longe de se mostrar competitivo, Manoel Vicente teve novamente uma votação inexpressiva, embora superior à de alguns candidatos mais tradicionais.78 Àquela altura, no entanto, parecia claro que os objetivos de suas sucessivas candidaturas não se ligavam apenas à tentativa de se eleger. Elas pareciam ser o resultado de uma neces- sidade de se expressar, aproveitando a popularidade para difundir suas ideias. Mesmo caracterizada sua debilidade eleitoral, ele fazia destas candidaturas um meio de dar repercussão às suas opiniões e posiciona- mentos – como voltou a acontecer em 1928, em uma nova eleição para a Intendência Municipal na qual se apresentava mais uma vez como um “candidato do povo”, que “está com o povo, porque sem o povo nada se faz”. De modo ainda mais explícito do que nas primeiras tentativas, ele aproveitava-se do espaço dedicado pelos jornais à sua candidatura para defender posições que não costumavam constar das páginas dos grandes jornais. Ao citar em seu manifesto eleitoral os “grandes libera- listas” que lhe serviam de guia, alinhava-se ao republicanismo mais radical de figuras como Silva Jardim e Lopes Trovão. Ao mesmo tempo, fazia questão de citar, dentre suas influências, alguns importantes perso- nagens afrodescendentes da história brasileira, como o abolicionista José do Patrocínio e “o negro Henrique Dias”, um dos heróis da batalha dos Guararapes.79

Por mais que já acreditasse a esta altura que “ninguém ouve quem diz a verdade”, e reclamasse das “mentiras caluniosas” que eram contra ele lançadas pela imprensa, ficava claro que ele usava o espaço conquistado na imprensa pelas suas sucessivas candidaturas para denunciar o sentido da exclusão à qual homens e mulheres como ele eram submetidos. Foi o que explicou em outubro de 1928 a um jorna- lista que o entrevistou:

Veja o senhor quanto vexame se infringe a um cidadão que deseja cumprir os seus deveres! Não sei por que me fazem tanta desconside- ração, quando há por aí figurões que possuindo a mesma capacidade que eu tenho vivem magnificamente instalados e considerados. Se eu sou ridículo, eles ainda o são mais.80

Apresentando-se como um “cidadão” que teria tantos direitos quanto quaisquer outros, Manoel Vicente Jacarandá fazia de seu republicanismo um meio de contestação das hierarquias raciais e sociais que definiam de antemão a suposta inferioridade dele e de outros de sua cor. Mostrava com isso que, na contramão do discurso dos republi- canos liberais, o estudo e o saber não bastavam para garantir-lhe algum prestígio – denunciando que mesmo “cavalheiros que têm o diploma em casa e não sabem coisa nenhuma” mereciam muito mais consideração do que ele, que teria nascido “talhado para ser doutô”. Frequentemente caracterizado como uma figura pernóstica e ridícula, tratava de desnudar os preconceitos que estavam por trás de tais definições, devolvendo o ridículo para aqueles que o atacavam.

Era assim, como uma voz crítica em relação às hierarquias e discriminações que marcavam a República brasileira em suas primeiras décadas, que se afirmava a figura do Doutor Jacarandá. Apesar de seus insucessos eleitorais, ele passou com o tempo a ser reconhecido por alguns contemporâneos como uma voz dissonante dentro da ordem republicana, já que apontava para seus vícios e exclusões. “Tivesse o Doutor Jacarandá disciplinado seu espírito na subserviência e no engrossamento, tivesse adotado, desde logo, a religião dos poderes do dia, não haveria nenhum motivo para que o jurista negro não se tivesse multiplicado no político e administrador, galgando todos os cargos municipais e estaduais com brilho e proveito para si e para os negócios público”, reconhecia em 1930 o jurista Macedo Soares, também crítico em relação às práticas políticas dos primeiros governos republicanos.81 Não é um acaso que Manoel Vicente tenha se colocado como um apoiador de primeira hora dos revolucionários de 1930, com suas propostas de refundação desta ordem. Dizendo acreditar na “since- ridade da voz da Revolução”, ele passava a elogiar o presidente Vargas, que definia como um “grande estadista” – mantendo em seu escritório uma foto do novo presidente, ao lado de outra de Leônidas da Silva, o primeiro grande ídolo negro do esporte brasileiro.82

Testemunhos como o de Macedo Soares mostravam que, passados cerca de 15 anos desde a publicação da primeira matéria sarcástica da grande imprensa sobre ele, Manoel Vicente Jacarandá alcançava (ainda que dentre grupos restritos) projeção e respeita- bilidade de todo distante do tratamento geralmente reservado pelos círculos letrados do período aos negros. Ao longo da década de 1930, era associado por vários jornalistas a adjetivos como “generoso”, “honesto” e “respeitador”, chegando a ser caracterizado por um redator do Jornal do Brasil como “um criador de esperanças”.83 Ainda que seu letramento não tenha bastado para afastá-lo do preconceito e da discriminação que continuou a experimentar por toda a vida – como continuariam a demonstrar pequenos episódios como aquele de que foi vítima em 1946, quando um casal de transeuntes “atirou sobre ele água suja com creolina dizendo que o fazia para tirar a catinga de urubu”84 –, ele o ajudou a elaborar suas críticas em relação a tais mecanismos de exclusão, fazendo dele um porta-voz das causas e interesses de sujeitos como aqueles que costumavam procurar seu escritório de advocacia.

Quando o novo governo mostrou também sua face excludente, dificultando o exercício de sua profissão por questões corporativas e deixando “morrer à fome e à sede por falta de auxílio” todo indivíduo que não fosse “engenheiro, médico, advogado, senhor de um diploma ou sindicalizado”, continuou a lutar pelas mesmas causas. “O direito de viver é para todos, estou do lado dos humildes, dos fracos e dos pobres”, voltava a afirmar, em 1933, o advogado negro ao lançar mais uma candi- datura eleitoral, desta vez para a assembleia constituinte.85 Na mesma campanha, declarava ainda que esta defesa dos direitos dos cidadãos se faria “sem distinção de cor nem de profissão” – na explicitação da força do racismo como obstáculo a ser superado para se alcançar uma verdadeira república.86 Por mais que tais posições tenham novamente o colocado à margem daquela ordem, chegando a resultar em sua prisão por estar “excedendo-se em críticas severas” ao novo regime,87 eram elas que o advogado negro continuaria a defender até sua morte, em julho de 1948.

Para além da projeção e respeitabilidade alcançada no período por alguns dos homens negros que tiveram acesso à educação superior, como o médico Juliano Moreira,88 o caso de Manoel Vicente Jacarandá evidenciava o quanto o racismo passava a limitar de forma ainda mais intensa as possibilidades colocadas a homens e mulheres como ele nos primeiros tempos da República. Rompida a ordem escravocrata e imperial, era através do fortalecimento de preconceitos e regras não escritas que se passava a afirmar e garantir a exclusão de indivíduos como ele nas primeiras décadas do novo regime. No entanto, por mais que isso fosse a realidade do período, mesmo para aqueles que conseguiram superar a barreira do letramento e da educação formal, como o próprio Manoel Vicente, sua trajetória mostra que nem por isso estes sujeitos ficariam inertes frente a estes esforços de exclusão. Ao fazer do domínio da palavra sua arma, seja nos tribunais ou na política, o Doutor Jacarandá experimentou as contradições de uma ordem que se esforçou por transformar, fazendo do acesso à educação um meio para defender sua cidadania e reivindicar seus direitos – o que talvez ajude a explicar o descaso das autoridades republicanas em relação à educação pública, que fez com que o Brasil demorasse ainda algumas décadas para oferecê-la à maior parte de sua população.89

Material suplementar
Notas
Notas
1 “Trabaio com os mestre e com o Dereto”, A Noite , Rio de Janeiro, 16 fev. 1916, p. 1.
2 Sobre a oralização como forma de demarcar o lugar social de inferioridade dos traba- lhadores, em especial dos negros, ver Antonio Candido, “A literatura e a formação do homem” in Vinicius Dantas (org.), Textos de intervenção (São Paulo: Duas Cidades: Editora 34, 2002), pp. 77-92; e Tania Alkmin, “Falas e cores: um estudo sobre o português de negros e escravos no Brasil do século XIX” in Ivana Stolze Lima e Laura do Carmo (orgs.), História social da língua nacional (Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2008), pp. 247-264.
3 Cf. “O que está resolvido na Corte de Apelação”, A Noite , 12 abr. 1912, p. 3; “A questão da liberdade profissional”, O Imparcial , Rio de Janeiro, 18 jul. 1913, p. 4; “O exercício da advocacia entre nós”, O Imparcial , 26 abr. 1914, p. 8; “O autor do projeto de criação da ordem dos advogados concede-nos uma interessante entre- vista”, A Noite , 7 maio 1914, p. 3. Sobre as especificidades e transformações pelas quais passava a carreira de advogado no período, ver Edmundo Campos Coelho, As profissões imperiais: medicina, engenharia e advocacia no Rio de Janeiro , 1822-1930, Rio de Janeiro: Record, 1999.
4 Cf. Raul Pederneiras, Geringonça carioca: verbetes para um dicionário de gírias , Rio de Janeiro: Briguet e cia, 1946, p. 39.
5 Elciene Azevedo, Orfeu de carapinha: a trajetória de Luiz Gama na imperial cidade de São Paulo , Campinas: Editora da UNICAMP, 1999. Lembre-se ainda o caso de Antônio Pereira Rebouças, outro homem negro a alcançar sucesso no mundo jurídico do século XIX, analisado em Keila Grinberg, O fiador dos brasileiros: cidadania, escravidão e direito civil no tempo de Antonio Pereira Rebouças , Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
6 Cf. Lilia Moritz Schwarcz, O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil, 1870-1930 , São Paulo: Companhia das Letras, 1993, pp. 43-66.
7 Cf. Recenseamento Geral da República dos Estados Unidos do Brasil , Rio de Janeiro: Tipografia Leuzinger, 1895, p. XVII; e Flávio Gomes e Olívia Cunha (orgs), Quase-cidadão: histórias e antropologias da pós-emancipação no Brasil , Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2007, pp. 7-15.
8 Cf. José Murilo de Carvalho, “Os três povos da República”, Revista USP , n. 59 (2003), pp. 96-115.
9 De um total de 522.651 habitantes do Distrito Federal, 252.821 eram apresentados no censo de 1890 como analfabetos. Recenseamento Geral da República dos Estados Unidos do Brasil , p. 394. Sobre as possibilidades de acesso à educação aos negros no período, ver Alessandra Schueler e Giselle Teixeira, “Educar os Pobres e os Negros: Representações, Práticas e Propostas de Educação na Imprensa Periódica na Cidade do Rio de Janeiro (1870-1889)”, Revista Eletrônica Documento/Monumento , v. 15 (2015), pp. 135-145; e Flávio Gomes e Maria Helena Machado, “Eles ficaram embatucados, seus escravos sabiam ler: abolicionistas, senhores e cativos leitores no alvorecer da liberdade” in Marcelo Mac Cord, Carlos Eduardo Moreira de Araújo e Flávio dos Santos Gomes (orgs.), Rascunhos cativos: educação, escolas e ensino no Brasil escravista (Rio de Janeiro: 7 Letras, 2017), pp. 77-99.
10 Florestan Fernandes, A integração do negro na sociedade de classes , São Paulo: Globo, 2008, p. 29.
11 Lima Barreto, Diário Íntimo , Rio de Janeiro: Editora Mérito, 1953, p. 25.
12 Cf. Carolina Vianna Dantas, “Monteiro Lopes (1867-1910): um líder da raça negra na capital da República”, Afro-Ásia , n. 41 (2010), pp. 167-209; Leonardo A. M. Pereira, “No ritmo do Vagalume: culturas negras, associativismo dançante e nacionalidade na produção de Francisco Guimarães (1904-1933)”, Revista Brasileira de História , v. 35 (2015), pp. 13-33.
13 Segundo dados oficiais de 1891, existiam no município de Palmeira dos Índios “5 cadeiras públicas de instrução primária”, sendo três nos povoados vizinhos e duas na cidade, “uma para cada sexo”. Almanack do Estado das Alagoas , Maceió: Tipografia Gutemberg, 1891, p. 252 . Sobre as “práticas e propostas de educação e escolarização de ‘pobres’ e negros” do período, ver Schueler e Teixeira, “Educar os pobres e os negros: representações, práticas e propostas de educação na imprensa periódica na cidade do Rio de Janeiro (1870-1889), pp. 135-145.
14 “A vida e as opiniões do Dr. Jacarandá”, O Malho , Rio de Janeiro, 19 jul. 1930, p. 25 e 61; e “Aposto a cabeça!”, A Noite, 26 jul.1940, pp. 1-2; e “Sempre defendeu jamais acusou”, A Manhã , Rio de Janeiro, 25 jul. de 1948, p. 1.
15 “Uma expressão de legítima popularidade”, O Radical , Rio de Janeiro, 29 abr. 1933, p. 1 e 14.
16 “Sempre defendeu jamais acusou”, A Manhã , 25 jul. 1948, p.1 e 6.
17 “A cacete”, O Paiz , Rio de Janeiro, 29 ago. 1900, p. 2.
18 “A vida e as opiniões do Dr. Jacarandá”, O Malho , 19 jul. 1930, p. 61.
19 Em 1920 as duas instituições se fundiriam na criação da Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro, posteriormente transformada na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Cf. André Aparecido Bezerra Chaves, “A revista da Faculdade Livre de Direito da Cidade do Rio de Janeiro: uma proposta para a identidade jurídica nacional brasileira”, Dissertação (Mestrado em Direito), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.
20 “O Dr. Jacarandá perde o fraque”, Correio da Manhã , Rio de Janeiro, 20 abr.1917, p. 5. Ver ainda “Sempre defendeu jamais acusou”, A Manhã , 25 jul. 1948, p. 1 e 6; e Hernani Citahy, “O Dr. Jacarandá”, Gazeta de Notícias , Rio de Janeiro, 24 out. 1940, p. 10.
21 F. G. Castello Branco, “O Dr. Jacarandá”, Correio da Manhã , Rio de Janeiro, 26 fev. 1937, p. 6.
22 “O Dr. Jacarandá perde o fraque”, Correio da Manhã , 20 abr. 1917, p. 5.
23 “O Dr. Jacarandá perde o fraque”, Correio da Manhã , 20 abr. 1917, p. 5.
24 “O Dr. Jacarandá conferenciou com o 2º Delegado Auxiliar”, A Razão , Rio de Janeiro, 5 dez. 1918, p. 4; “À polícia do 12º Distrito”, Correio da Manhã , 3 jan. 1913, p. 3.
25 Sobre a lógica da suspeição generalizada, forjada sobre os trabalhadores negros desde as últimas décadas do século XIX, ver Sidney Chalhoub, Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial , São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
26 “Violência de um fiscal da Guarda Civil”, Correio da Manhã , 16 abr. 1912, p. 6.
27 “A Polícia”, O Paiz , 8 fev. 1912, p. 6.
28 “Queixa contra as autoridades policiais do 12º Distrito”, Correio da Manhã , 5 set. 1912, p. 7.
29 “Olha o doutor!”, O Paiz , 9 ago. 1913, p. 4.
30 “De como se revela a existência de mais um no Rio”, Correio da Manhã, 19 fev. 1916, p. 3.
31 “De como se revela a existência de mais um no Rio”, Correio da Manhã , 19 fev. 1916, p. 3. Grifo do original.
32 “A vida e as opiniões do Dr. Jacarandá”, O Malho , 19 jul. 1930, p. 61.
33 “O Dr. Jacarandá foi agredido por três carpinteiros”, A Época , Rio de Janeiro, 26 jan. 1917, p. 3. Ver ainda “Três contra um – o Dr. Jacarandá é agredido a pau”, Jornal do Brasil , Rio de Janeiro, 26 jan. 1917, p. 11.
34 “O Dr. Jacarandá perde o fraque”, Correio da Manhã , 20 abr. 1917, p. 5. Sobre a força e o sentido social assumido pela psiquiatria no período, ver Magali Engel , Os delírios da razão: médicos, loucos e hospícios (Rio de Janeiro, 1830-1930) , Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2001.
35 “Uma vítima do Dr. Jacarandá”, A Rua , Rio de Janeiro, 15 abr. 1919, p. 2.
36 “Atenção ao público que não se iluda”. Correio da Manhã , 8 jun. 1920, p. 6.
37 “Da platéia”, A Noite , 16 jun. 1921, p. 5.
38 “Relatório de um delegado de polícia”, O Jornal , Rio de Janeiro, 22 maio 1923, p. 6.
39 “Teatro Recreio – O Dr. Jacarandá”, Gazeta de Notícias , 21 jun. 1921, p. 6.
40 “Casos de polícia”, O Paiz , 5 jun. 1920, p. 5.
41 “No auge da popularidade”, A Rua , 31 mar. 1919, p. 1. Grifo do original.
42 “Outro Adão”, A Razão , 3 abr. 1920, p. 4. Um desentendimento anterior de Manoel Vicente com sua senhoria pode ser encontrados em “Mas que gente danada”, A Razão , 12 mar. 1920, p. 4.
43 “O Dr. Jacarandá foi despejado”, Gazeta de Notícias , 6 jun. 1920, p. 3; e “Atenção ao público, que não se iluda”, Correio da manhã , 8 jun. 1920, p. 6.
44 Chalhoub, Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial , pp. 20-29.
45 “No auge da popularidade”, A Rua , 31 mar. 1919, p. 1; “Casos de polícia”, O Paiz , 5 jun. 1920, p. 5; e “Uma petição original”, O Jornal , 3 maio 1923, p. 4.
46 “Sempre defendeu, jamais acusou”, A Manhã , 25 jul. 1948, p. 1; “Morreu o Dr. Jacarandá”, Diario da Noite , 19 jul. 1948, p. 1. Embora não sejam claros os motivos da proteção oferecida por Carneiro de Fontoura a Manoel Vicente, é possível que ela tenha relação com as questões raciais – dado que, mesmo sem se apresentar como negro, o Chefe de Polícia era muitas vezes associado à negritude, sendo atacado por seus inimigos como um “Rasputin negro” ou como um “negro burro”. Cf. “Dissipou-se a treva que o sítio lançou sobre o monstruoso assassinato de Niemeyer”, 29 mar. 1927, p. 5; e “Uma visão da polícia fontouresca”, A Manhã , 4 jan. 1927, p. 5; e “Esquecer por que?”, Crítica , Rio de Janeiro, 30 dez. 1928, p. 3.
47 Cf. Gladys Sabina Ribeiro, “Cidadania e luta por direitos na Primeira República: analisando processos da Justiça Federal e do Supremo Tribunal Federal”, Tempo , v. 13, n. 26 (2009), p. 101-117; e Leonardo A. M. Pereira, “Os Anjos da Meia-Noite: trabalhadores, lazer e direitos no Rio de Janeiro da Primeira República”, Tempo , v. 19 (2013), pp. 97-116. Para a relação entre os escravizados e a justiça no século XIX, ver Elciene Azevedo, O direito dos escravos: lutas jurídicas e abolicionismo na província de São Paulo , Campinas: Editora da Unicamp, 2010.
48 Nelson Carneiro, “Um criador de esperança”, Jornal do Brasil , Rio de Janeiro, 2 ago. 1940, p. 5.
49 “Eu também já fui pobre”, A Noite , 2 abr. 1941, p. 2.
50 “Ódio incontido”, O Imparcial , 1 abr. 1927, p. 13.
51 Revista Criminal , Rio de Janeiro, set. 1927, 2ª quinzena, p. 11.
52 “Sempre defendeu, jamais acusou”, A Manhã , 25 jul.1948, p. 1.
53 “Rebenta, afinal o esperado movimento grevista”, A Época , 11 jul. 1915, p. 2.
54 “O Dr. Jacarandá reconhecido oficialmente”, Correio da Manhã , 19 fev. 1924, p. 2.
55 “O Dr. Jacarandá impedido de advogar”, A Noite , 22 set. 1927, p. 8; e “O fôro humorístico”, Gazeta de Notícias , 14 jul. 1927, p. 6.
56 Brasil, Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil , Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891, pp. 25-27; e Tavares Bastos, O habeas corpus na República, apud Cristiana Schettini, Que tenhas teu corpo: uma história social da prostituição no Rio de Janeiro das primeiras décadas da República (Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2006), p. 32. O trabalho de Schettini apresenta, em especial em seu primeiro capítulo, uma análise fundamental a respeito das características do habeas corpus no período. Em uma perspectiva temporalmente mais ampla, ver Andrei Koerner, “O habeas corpus na prática judicial brasileira (1841-1920)”, Tese (Doutorado em Ciência Política), Universidade de São Paulo, São Paulo, 1998.
57 “Corte de apelação”, Jornal do Commercio , Rio de Janeiro, 20 abr. 1928, p. 8. Ver ainda “Corte de apelação”, Gazeta de Notícias , 24 jan. 1924, p. 5; “Corte de apelação”, Gazeta de Notícias , 10 fev. 1924, p. 7; “O Dr. Jacarandá ganhou um habeas-corpus”, O Globo , Rio de Janeiro, 29 dez. 1927, p. 2.
58 Waldemar de Carvalho, “Um símbolo interessante”, Correio da Manhã , 21 out. 1928, p. 7.
59 Joseli Mendonça, Evaristo de Moraes, Tribuno da República , Campinas: Editora UNICAMP, 2007.
60 Waldemar de Carvalho, “Um símbolo interessante”, Correio da Manhã , 21 out. 1928, p. 7.
61 “A vida e as opiniões do Dr. Jacarandá”, O Malho , 19 jul. 1930, p. 61.
62 Cf. Marieta de Moraes Ferreira, “A reação republicana e a crise política dos anos 20”, Estudos Históricos , v. 6, n. 11 (1993), pp. 9-23.
63 “As eleições de ontem. Um voto para senador”, A Noite , Rio de Janeiro, 21 fev. 1921, 2º caderno, p. 2. O resultado geral da votação pode ser visto em Gazeta de Notícias , Rio de Janeiro, 21 fev. 1921, p. 6.
64 “Manoel Vicente Alves Jacarandá”, A Noite , 1 fev. 1924, p. 4; “Atenção ao público”, Correio da Manhã , 10 fev. 1924, p. 6; e “Teatro, música e cinema”, O Jornal , 11 fev. 1926, p. 15.
65 “O Dr. Jacarandá; olalá! Olalá! Pleiteou a eleição; cavação! Cavação!”, A Rua , 4 jun. 1924, p. 1.
66 “O Dr. Jacarandá procura A Rua”, A Rua , 23 maio 1924, p. 4.
67 “O Dr. Jacarandá, as eleições e o futurismo”, O Brasil , Rio de Janeiro, 16 fev.1924,p. 5. Ver ainda, no mesmo sentido, a caricatura da revista O Malho satirizando suas pretensões eleitorais. “A soberania das urnas”, O Malho , 1 mar. 1924, p. 19. Para uma análise das regras eleitorais da Primeira República, ver Claudia Viscardi, “O Federalismo como experiência: Campos Sales e as tentativas de estabilização da República”, Dados , v. 59, n. 4 (2016), pp. 1169-1206.
68 “Tópicos e notícias”, Correio da Manhã , 20 abr. 1924, p. 4; e “O Dr. Jacarandá; Olalá! Olalá! Pleiteou a eleição; cavação! Cavação!”, A Rua , 4 jun. 1924, p. 1.
69 “O memorável pleito de domingo”, Correio da Manhã , 19 fev. 1924, p. 1.
70 “A apuração do pleito federal”, Correio da Manhã , 21 mar. 1924, p. 3; e “Cousas da política”, Jornal do Brasil , 23 maio 1924, p. 6.
71 “O Dr. Jacarandá; Olalá! Olalá! Pleiteou a eleição; cavação! Cavação!”, A Rua , 4 jun. 1924, p. 1.
72 “O Dr. Jacarandá; Olalá! Olalá! Pleiteou a eleição; cavação! Cavação!”, A Rua , 4 jun. 1924, p. 1.
73 Macaco Velho, “A candidatura Jacarandá”, Correio da Manhã , 3 jul. 1925, p. 2.
74 “Política e políticos”, Gazeta de Notícias , 27 fev. 1926, p. 2.
75 “Artes e artistas”, O Paiz , 5 out. 1925, p. 5; “Teatros”, O Imparcial , 7 out. 1925, p. 4; e “Teatrices”, Jornal das Moças , Rio de Janeiro, 8 out. 1925, p. 29.
76 “O anel do Dr. Jacarandá”, O Globo , 14 out. 1925, p. 1.
77 “As eleições de ontem”, Correio da Manhã , 2 mar. 1926, p. 1.
78 “Abaixo de Jacarandá”, A Manhã , 2 jun. 1926, p. 3.
79 “Apelando para o eleitorado e saudando os grandes vultos da história pátria”, Diário Carioca , Rio de Janeiro, 13 out. 1928, p. 9.
80 Waldemar de Carvalho, “Um símbolo interessante”, Correio da Manhã , 21 out. 1928, p. 7.
81 J. C. de Macedo Soares, “A mensagem Jacarandá”, Diário Carioca , 25 jul. 1930, p. 1.
82 “Uma expressão de legítima popularidade”, O Radical , 29 abr. 1933, p. 1 e 14; “Quem será o homem?”, A Noite , 19 nov. 1936, p. 1 e 3; e “Os brasileiros vencerão por 4 X 0”, Diário da Noite , 11 jan. 1939, p. 7. Sobre a importância de Leônidas da Silva como ídolo negro no período, ver, Leonardo A. M. Pereira, “Leônidas da Silva. Um ídolo negro no Brasil de Getúlio Vargas” in Jorge Ferreira e Karla Carloni (orgs.), A República no Brasil: trajetórias de vida na democracia e na ditadura (Niterói: Eduff, 2020), pp. 43-77.
83 “Um criador de esperanças”, Jornal do Brasil , 2 ago. 1940, p. 5.
84 “Deu um banho de criolina no Dr. Jacarandá”, Diario da Noite , 17 out. 1946, p. 5.
85 “Uma expressão de legítima popularidade”, O Radical , 29 abr. 1933, p.14.
86 “Prosseguem os trabalhos de apuração eleitoral do Tribunal Regional”, Diario da Noite , 5 maio 1933, p. 1.
87 “Quando exercia o direito do voto… foi preso o Dr. Jacarandá”, O Radical, 13 out. 1934, p. 1.
88 Ynaê Lopes dos Santos, Juliano Moreira: o médico negro na fundação da psiquiatria brasileira, Niterói: Eduff, 2020.
89 Jong-Wha Lee e Hanol Lee, “Human capital in the long run”, Journal of Development Economics , v. 122 (2016), pp. 147-169. Sobre as possibilidades, disputas e limites do processo de escolarização pública no Rio de Janeiro do pós-abolição, ver Alessandra Schueler, Irma Rizzini e Jucinato de Sequeira Marques, “Felismina e libertina vão à escola: notas sobre a escolarização nas freguesias de Santa Rita e Santana (Rio de Janeiro, 1888-1906)”, História da Educação , v. 19, n. 46 (2015), pp. 145-165; e Alessandra Schueler e Irma Rizzini “Entre becos, morros e trilhos: expansão da escola primária na cidade do Rio de Janeiro (1870-1906)”, Cadernos de História da Educação , v. 18, n. 1 (2019), pp. 160-175.

Figura 1
: A Noite , 16 de fevereiro de 1916

Figura 2
: O Malho, 19 de julho de 1930
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