Editorial
O Que Faz um Artigo ser Mais Citado?
What Makes an Article be More Cited?
Conforme discuti em editorial anterior (Mendes-Da-Silva, 2020), a rejeição de artigos é algo com o qual devemos aprender, e inevitavelmente conviver, faz parte da rotina profissional do pesquisador. Mas isto precede um objetivo suposto comum a todos nós indivíduos pesquisadores da área de negócios: a publicação de nossas pesquisas, e que estas sejam julgadas relevantes para a sociedade. A esse respeito, uma das principais maneiras de aquilatarmos o nível de interesse nos nossos trabalhos é a citação que esses recebem (Garfield, 1955; Lee, Law, & Ladkin, 2014), ou mesmo menções na mídia (Pulido, Redondo-Sama, Sordé-Marti, & Flecha, 2018). Mas, afinal, o que faz um artigo ser mais citado (Hall & Page, 2015)?
Na maioria dos casos, os cientistas dependem de literatura anterior relevante nos seus campos de pesquisa para o desenvolvimento de novas ideias. No entanto, não é sensato, tampouco viável, rastrear todas as publicações existentes, tendo em vista que o volume de trabalhos na literatura cresce extremamente rápido. Portanto, os pesquisadores geralmente seguem, ou citam, apenas uma pequena proporção de publicações pelas quais estão interessados (Bethard & Jurafsky, 2010; Yan, Tang, Liu, Shan, & Li, 2011).
Uzzi, Mukherjee, Stringer e Jones (2013) analisaram 17,9 milhões de artigos, abrangendo todos os campos científicos. Esses defendem que a ciência segue um padrão quase universal, i.e., a ciência de maior impacto baseia-se principalmente em combinações excepcionalmente convencionais de trabalhos anteriores, mas apresenta simultaneamente uma intrusão de combinações incomuns. Artigos assim caracterizados alcançam duas vezes mais probabilidade de serem obras altamente citadas, segundo Uzzi et al. (2013).
Conforme realçam Lee, Law e Ladkin (2014), há espaço para pesquisas que examinem o que constitui uma alta contagem de citações, seja em periódicos científicos, seja em canais alternativos externos ao meio acadêmico; a RAC tem interesse em publicar pesquisas robustas nesse campo. Identificar e examinar características quantificáveis em publicações (Gargouri et al., 2010) e investigar suas associações com o número de citações parece algo que pode ser relevante para autores e editores na área de pesquisa em negócios. Em editorial específico, Garcia, Gattaz e Gattaz (2019) trataram da relevância que títulos, resumo e palavras-chave podem ter para a atratividade que um trabalho pode acabar por deter, ceteris paribus.
Isto é, a despeito da qualidade do trabalho de pesquisa realizado, um mesmo conteúdo informacional pode acabar por alcançar menor audiência essencialmente por questões de comunicação do resultado da pesquisa (Jacques & Sebire, 2010). Assim, existem questões relativas ao artigo em si, e questões relativas ao periódico no qual se encontra publicado o trabalho de pesquisa. A esse respeito, por exemplo, Gargouri et al. (2010) defendem resultados empíricos em favor da relação causal positiva entre acesso aberto e número de citações, o que não é compartilhado por Kurtz e Henneken (2007). Um exame preliminar da literatura dedicada a estimar a quantidade de citações, condicional a atributos do artigo, permite listar, de maneira não exaustiva, variáveis como:
Estar publicado na língua inglesa;
Diversidade da audiência-alvo do tema abordado no paper;
Idade do artigo - os mais antigos devem ser os mais citados;
Índice H dos autores - quanto maior o índice H, mais citado tende a ser o paper;
Estar em acesso aberto;
Se utiliza dados, que estes sejam abertos, juntamente com o código utilizado;
O título deve ser sugestivo do principal resultado da pesquisa;
Os autores são oriundos de instituições sediadas em países diferentes;
Fama - autor proeminente participando da autoria;
Conexões do autor - autores socialmente mais conectados tendem a trazer mais citações;
Autoridade - proeminência social no meio científico;
Produtividade do autor;
Uso de palavras provocadoras no título e no resumo, e.g.: inédito, revelador, robusto;
O título do artigo deve ser amigável a máquinas de busca, contendo palavras-chave;
O resumo deve trazer palavras-chave e reportar o principal resultado;
Uso de palavras-chave ao longo do artigo;
Trabalho no artigo após a sua publicação, compartilhando-o nas mídias sociais;
O artigo atende a requisitos demandados para SEO (search engine optimization);
Qualidade do processo editorial adotado pelo periódico onde foi publicado.
Comportamentos inadequados na autoria e/ou na promoção de citações são uma realidade a ser apropriadamente endereçada, de modo a inibir epidemias de autoria honorária e citações artificiais (Jacso, 2006; Kovacs, 2013). A ocorrência da busca por citações, de maneira a negligenciar regras éticas, não é impossível de se constatar entre autores, editores e periódicos científicos. A RAC compartilha a visão de que a irrestrita observância a ditames éticos e respeitosos para a sociedade é algo que não está sob discussão.
O processo editorial de um periódico deve ser tal que assegure a qualidade das publicações daí decorrentes. Não há dúvidas de que níveis mais elevados de padrão editorial tendem a demandar eficiência do processo em termos de uso de recursos, desde tempo até recursos financeiros. Um dos elementos particulares mais importantes para profissionalizar a gestão do processo editorial é a comunicação com o público interessado no periódico, que no caso da RAC temos buscado conduzir especialmente por meio dos editoriais componentes de cada edição. Conforme McGrail, Rickard e Jones (2006), um dos aspectos mais frequentemente considerados na caracterização de distinção de um periódico científico é a sua taxa típica de aceitação, ou de rejeição, de submissões recebidas.
Assim, em linha com práticas de gestão editorial contemporâneas, orientadas à transparência (Duflo, 2019), e de modo a permitir maior transparência acerca do processo editorial praticado nesta Revista de Administração Contemporânea (RAC), e ainda fornecer informações relevantes ao público interessado nesta revista (Hargens, 1988), neste editorial apresento uma visão resumida da evolução de indicadores do processo editorial da RAC (Mendes-Da-Silva, 2020) nos últimos cinco anos.
A Tabela 1 apresenta a evolução de números principais acerca do processo editorial da RAC. No painel A verifica-se que em 2015 foram recebidos quase 300 manuscritos entre artigos de pesquisa, casos para ensino e artigos tecnológicos. A quantidade de manuscritos recebidos pela RAC continuou crescendo desde então, chegando a 425 manuscritos em 2019 (Δ% = 42,14). Ao menos em parte, o crescimento da taxa de rejeição pode ser devido à decisão editorial pela redução do número de trabalhos publicados, que ocorreu gradativamente de quase 60, em 2015, para 40, em 2019, tendo em vista o aumento da seletividade dos trabalhos publicados pelo periódico.
O painel B da Tabela 1 permite avaliar que, das 425 submissões recebidas em 2019 (ver painel A da Tabela 1), apenas 120 foram encaminhadas à peer review, o que sugere uma quantidade significativa de submissões que não passaram da fase de desk review. O motivo básico para a decisão de desk reject é a falta de clareza acerca da contribuição efetiva do manuscrito para o campo de conhecimento, assim como déficits de robustez característicos do procedimento metodológico adotado. Outros motivos menos expressivos estão detalhados no editorial da RAC anterior a este (Mendes-Da-Silva, 2020).
Ainda no painel B da Tabela 1 verifica-se que o ciclo editorial médio tem estado ao redor de 100 dias, sendo que aproximadamente 50% das submissões têm uma decisão final antes dos 90 dias. Ressalto que a RAC mantém seu processo de avaliação apoiado no princípio da reciprocidade acadêmica, conforme o qual solicitamos que os autores que submetem manuscritos aceitem avaliar trabalhos, em retribuição à avaliação minuciosa que seu trabalho deve receber por parte de outros colegas (Mendes-Da-Silva, 2018a). Nesse sentido, invariavelmente, há a necessidade de convidar ao menos cinco pessoas, até que tenhamos ao menos dois pareceres. Esse esforço editorial induz à inevitável elevação dos prazos típicos de avaliação no processo editorial. Esperamos que, à medida que haja maior disposição dos membros da comunidade para avaliar trabalhos, o ciclo de uma submissão seja sensivelmente menor.
Conforme a Tabela 2, as decisões de Revisão e Ressubmissão (R&R) têm se tornado menos frequentes desde 2015, quando mais de 30% das submissões recebiam esse parecer, sendo aceito naquele ano pouco mais de 15% das 299 submissões recebidas. Assim, em 2018, das 303 submissões recebidas, pouco mais de 20% recebeu R&R, sendo aceitas 14,5%. Já em 2019 o quadro geral continua a mudar: recebemos 425 submissões, com 56 delas ainda pendentes; destas, 40,2% receberam desk reject, contra 27,8% em 2015. A situação líquida desse movimento é basicamente a seguinte: ao enrijecer os critérios de desk review estamos preservando um recurso escasso e valioso, e este é o revisor anônimo que realiza julgamentos cuidadosos e contributivos para os autores. Além disso, com uma resposta potencialmente mais célere aos indivíduos autores, promovemos a maior autonomia para que estes possam encontrar caminhos alternativos para publicar seus trabalhos.
Tendo em vista o escopo atual da RAC, i.e., funcionar a partir de uma perspectiva regional e espírito interdisciplinar, buscando estar posicionada na vanguarda da inovação teórica e metodológica, dando boas-vindas a contribuições substantivas e empíricas, que investiguem e problematizem questões significativas de preocupação econômica, social e política, a revista recebe contribuições oriundas de pesquisas desenvolvidas em diversos campos de conhecimento na área de negócios. Entre as áreas de interesse especial da RAC encontram-se: gestão ambiental; produção, distribuição e consumo de recursos; política urbana; tecnologia, informação e conhecimento; mercados financeiros, de capitais, e finanças corporativas; cadeia de suprimentos; empreendedorismo; mercados de trabalho; e comportamento organizacional e individual. Essas áreas de pesquisa têm se apresentado à RAC, e vêm sendo publicadas nos últimos anos conforme ilustra a Figura 1.
Ao observar a Figura 1 verificamos que as áreas de gestão internacional, gestão de agronegócios e gestão de operações e logística compõem um subconjunto com menor presença na RAC nos últimos anos. Em paralelo, as áreas de estudos organizacionais, finanças e controle gerencial, e estratégia em organizações, juntamente com a área de marketing, aparecem entre as que mais têm contribuído para compor edições da RAC nos últimos cinco anos. Entre as áreas mais estáveis em termos de número de trabalhos publicados na RAC destaca-se administração da informação.
Assim como os temas de pesquisa e os métodos empregados, o processo editorial evolui e sofre inovações. Nesse sentido, a RAC, nos últimos 24 meses, passou a publicar informações adicionais a respeito do processo relativo a cada trabalho publicado, mediante a adoção de um novo layout para os documentos publicados em um novo website. Assim, em cada artigo, desde então pode ser encontrado, em adição ao que já historicamente era reportado:
Essas iniciativas recentes da RAC, somadas a outras que virão, têm como principal motivação a promoção do impacto dos trabalhos publicados por este periódico, no sentido mais amplo dessa palavra ‘impacto’, não se restringindo ao número de citações na comunidade acadêmica. Nos últimos anos vimos o surgimento de métricas que intencionam mensurar esse tal impacto. Como proxy que vem ganhando espaço e reconhecimento, pode-se citar as mídias sociais (Mendes-Da-Silva, 2018b; Pulido et al., 2018).
Cabe não somente ao periódico o esforço por alcançar seu público, mas também aos demais players envolvidos no processo, e.g., autores que podem desenvolver suas habilidades de comunicação no nível individual, instituições de pesquisa que podem alocar recursos e construir estratégias e procedimentos dirigidos à comunicação ampla da pesquisa desenvolvida e publicada pelos seus colaboradores. Como nossos artigos têm sido recebidos pela sociedade? Essa é uma pergunta ao redor da qual todos nós devemos refletir e agir, sobretudo em momentos como o atual, quando as demandas da sociedade sobre a comunidade científica estão sensivelmente realçadas.
A RAC detém os direitos autorais deste conteúdo.
O autor informou que não há conflito de interesses.
Conselho Editorial
Anielson Barbosa da Silva (UFPB, João Pessoa, Brasil)
Antonio Carlos Gastaud Maçada (UFRGS, Porto Alegre, Brasil)
Ely Laureano Paiva (FGV, São Paulo, Brasil)
Fabio Vizeu Ferreira (UP, Curitiba, Brasil)
Maria José Tonelli (FGV, São Paulo, Brasil)
Rogério Hermida Quintella (NPGA/UFBA, Salvador, Brasil)
Valmir Emil Hoffmann (UnB, Brasília, Brasil)
Wesley Mendes-da-Silva (EAESP/FGV, São Paulo, Brasil)
Editor-chefe
Wesley Mendes-da-Silva (EAESP/FGV, São Paulo, Brasil)
Editores Associados
Fabio Caldieraro (EBAPE/FGV, São Paulo, Brasil)
Gilnei Luiz de Moura (UFSM, Santa Maria, Brasil)
Henrique Castro Martins (IAG PUC-Rio, Rio de Janeiro, Brasil)
Ismael Ali Ali (Kent State University, Ohio, EUA)
Marcus Cunha Junior (University of Georgia, EUA)
Paula Castro Pires de Souza Chimenti (UFRJ/Coppead, Rio de Janeiro, Brasil)
Paulo César Matui (UniGranRio, Rio de Janeiro, Brasil)
Samy Dana (FGV/EAESP, São Paulo, Brasil)
Corpo Editorial Científico
André Luiz Maranhão de Souza-Leão (UFPE, Recife, Brasil)
Aureliano Angel Bressan (CEPEAD/UFMG, Belo Horizonte, Brasil)
Bryan Husted (York University, Canadá)
Carlos M. Rodriguez (Delaware State University, EUA)
Cristiana Cerqueira Leal (Universidade do Minho, Portugal)
Diógenes de Souza Bido (Mackenzie, São Paulo, Brasil)
Erica Piros Kovacs (Kelley School of Business/Indiana University, EUA)
Elin Merethe Oftedal (University of Tromsø, Noruega)
Emilio Jose Monteiro Arruda Filho (Unama, Belém, Brasil)
Fábio Frezatti (FEA/USP, São Paulo, Brasil)
Felipe Monteiro (Wharton/University of Pennsylvania, EUA)
Howard J. Rush (University of Brighton, Reino Unido)
James Robert Moon Junior (Georgia Institute of Technology, EUA)
John L. Campbell (University of Georgia, EUA)
José Antônio Puppim de Oliveira (United Nations University, Yokohama, Japão)
Julián Cárdenas (Freie Universität, Berlin, Alemanha)
Lucas Barros (FEA/USP, São Paulo, Brasil)
Luciano Rossoni (UniGranRio, Rio de Janeiro, Brasil)
M. Philippe Protin (Université Grenoble Alpes, França)
Paulo Estevão Cruvinel (Embrapa Instrumentação, São Carlos, Brasil)
Rodrigo Bandeira de Mello (Merrimack College, EUA)
Rodrigo Verdi (MIT Massachusetts Institute of Technology, Cambridge, EUA)
Valter Afonso Vieira, (UEM, Maringá, Brasil)
Wagner Kamakura (Jones Graduate School of Business, Rice University, Houston, EUA)
Editoração
Diagramação e normas da APA: Kler Godoy (ANPAD, Maringá, Brasil); Simone L. L. Rafael (ANPAD, Maringá, Brasil).
*Autor Correspondente