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Políticas de avaliação em larga escala: o ENADE interfere na gestão dos cursos?

Evaluation policies on a large scale: does ENADE interfere in the management of the courses?

Políticas de evaluación a gran escala: ¿el ENADE interfiere en la gestión de los cursos?

Silvia Regina Canan
Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Brazil
Vanessa Taís Eloy
Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Brazil

Políticas de avaliação em larga escala: o ENADE interfere na gestão dos cursos?

Práxis Educativa, vol. 11, núm. 3, pp. 621-640, 2016

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 21 Dezembro 2015

Revised document received: 18 Junho 2016

Aprovação: 25 Junho 2016

Resumo: O presente trabalho analisa como os gestores (coordenadores) dos cursos de graduação avaliam o ENADE enquanto política de avaliação em larga escala e de que estratégias de gestão lançam mão para melhorar a avaliação dos cursos. Os sujeitos da pesquisa foram os coordenadores de curso da URI - Campus de Frederico Westphalen/RS. No processo de investigação utilizou-se a abordagem qualitativa. A partir dos referenciais teóricos e da coleta e análise dos dados, chegou-se a algumas conclusões provisórias: a. grande parcela dos coordenadores entrevistados está buscando novas possibilidades para qualificar os cursos, contudo, ainda são tentativas isoladas e muito subjetivas; b. a preocupação com resultados quantitativos é muito forte, sobrepondo-se aos processos qualitativos; c. o ENADE, como avaliação em larga escala, não está conseguindo desencadear um processo profundo de discussão teórica, pois é trabalhado pela grande maioria dos cursos um semestre antes de realizarem o exame.

Palavras-chave: Universidade e avaliação, Avaliação em larga escala, ENADE.

Abstract: This paper analyzes how managers (coordinators) of graduation courses evaluate ENADE as a large-scale evaluation policy and which management strategies they employ to improve course evaluations. The research participants were course coordinators at URI - Frederico Westphalen/RS Campus. The investigation process was carried out through a qualitative approach. From the theoretical background and data collection and analysis, some interim findings are presented: a. great part of the coordinators interviewed is seeking new possibilities to qualify the courses, however, these are isolated and very subjective attempts; b. the concern with quantitative results is very strong, overcoming qualitative processes; c. ENADE, as a large-scale evaluation, has not been able to trigger a deep process of theoretical discussion, since it is worked in most courses only one semester before the exam is taken.

Keywords: University and evaluation, Large-scale evaluation, ENADE.

Resumen: El presente trabajo analiza cómo los gestores (coordinadores) de los cursos de grado evalúan el ENADE como política de evaluación a gran escala y qué estrategias de gestión son utilizadas para mejorar la evaluación de los cursos. Los sujetos de la pesquisa fueron los coordinadores del curso de la URI - Campus de Frederico Westphalen/RS. En el proceso de investigación se utilizó el abordaje cualitativo. A partir de referenciales teóricos y de la coleta y análisis de los datos, se llegó a algunas conclusiones provisorias: a. gran parcela de los coordinadores entrevistados está buscando nuevas posibilidades para calificar los cursos, entretanto, aun son intentos aislados y muy subjetivos; b. la preocupación con resultados cuantitativos es muy fuerte, sobreponiéndose a los procesos cualitativos; c. el ENADE, como evaluación en gran escala, no consigue desarrollar un proceso profundo de discusiones teóricas, pues es trabajado por la gran mayoría de los cursos un semestre antes de que se realice el examen.

Palabras clave: Universidad y evaluación, Evaluación en gran escala, ENADE.

Considerações iniciais

Tanto em nível nacional, quanto local, o ENADE1 tem se configurado como um importante espaço de avaliação em larga escala dos cursos superiores do Brasil, utilizado como um dos instrumentos para aferir conceitos para a Educação Superior Brasileira, sendo um dos três componentes de uma política mais ampla de avaliação.

Criado pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES é formado por três componentes principais: a avaliação das Instituições, dos cursos e do desempenho dos estudantes. O SINAES avalia todos os aspectos que giram em torno do ensino, pesquisa, extensão, dentre os quais estão a responsabilidade social, o desempenho dos alunos, a gestão da Instituição, o corpo docente, as instalações físicas, entre outros aspectos.

Ele possui uma série de processos complementares: autoavaliação, avaliação externa, ENADE, avaliação dos cursos de graduação e instrumentos de informações (censo e cadastro). Os resultados das avaliações possibilitam traçar um panorama da qualidade dos cursos e Instituições de Educação Superior no país, para tanto, os processos avaliativos são coordenados e supervisionados pela Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior - CONAES, sendo a operacionalização de responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira - INEP. A avaliação dos estudantes, por meio do ENADE, é aplicada, periodicamente, aos alunos de todos os cursos de graduação no último ano de curso, sendo expressa por meio de conceitos, tomando por base padrões mínimos estabelecidos por especialistas das diferentes áreas do conhecimento, com o objetivo de expressarem com maior fidedignidade o desempenho dos alunos.

Os dirigentes das Instituições de Educação Superior são responsáveis pela inscrição de todos os estudantes habilitados ao ENADE e a ausência da inscrição dos estudantes selecionados para a participação no exame poderá ensejar a suspensão de processo seletivo para os cursos que constam na relação daquele ciclo avaliativo.

Esse cenário motivou a pesquisa, financiada pela FAPERGS2, cujo problema questionou: "Como os gestores (coordenadores) dos cursos de graduação da universidade avaliam o ENADE enquanto política de avaliação em larga escala e de quais estratégias de gestão lançam mão para melhorar a avaliação dos cursos superiores?".

A pesquisa em questão tem como tema as políticas de avaliação em larga escala e sua relação com os Organismos Internacionais, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes. O estudo foi realizado com os coordenadores de curso dos Departamentos de Ciências Humanas, Ciências Exatas e da Terra, Ciências da Saúde, Linguística, Letras e Artes, Engenharias e Ciência da Computação da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - URI - Campus de Frederico Westphalen.

O estudo permitiu compreender que o ENADE tem se configurado não somente como um parâmetro avaliativo, mas também como promotor de um ranqueamento entre os cursos e as universidades. O exame, enquanto uma política mais ampla de avaliação em larga escala, passa a ser uma prova que vem sendo importante elemento de construção curricular na universidade e, igualmente, tem impactado na gestão dos cursos que, em busca de resultados positivos, acaba gerando estratégias de gestão que contemplem as atividades vinculadas ao preparo dos alunos para a prova.

Ao trazermos os resultados e as principais discussões que eles proporcionaram, pretendemos abordar esses aspectos e nossas principais conclusões alicerçados nas discussões e produções no campo da avaliação em larga escala. Corroborando Afonso (2009), não podemos ignorar o contexto neoconservador e neoliberal em que as políticas de avaliação foram forjadas e ganharam especial atenção, já que os governos precisam de resultados para a instituição de políticas, além do fato de o produto ter se sobreposto ao processo, deixando clara a concepção da alcunha 'Estado Avaliador'.

A perspectiva aqui explicitada tem uma relação muito estreita com a intervenção dos Organismos Internacionais que acaba repercutindo nas políticas e nos resultados que a Universidade precisa apresentar. A cobrança que a universidade tem recebido está muito relacionada às diretrizes estabelecidas pelo Banco Mundial "[...] que dissemina a perspectiva neoliberal e exerce um papel central no processo de globalização e na expansão do capitalismo" (ARAGÃO; BERTAGNA, 2012, p. 242). Essa cobrança implica em resultados numéricos e prioriza a busca pela eficiência e pela qualidade diante das demandas sociais. Desse modo, a avaliação externa, instituída pelo Ministério da Educação, utiliza-se de testes padronizados para medir o nível de conhecimentos dos acadêmicos no final dos cursos, deixando, muitas vezes, de valorizar o processo de ensino-aprendizagem e a produção cultural, científica, tecnológica e de formação cidadã (ARAGÃO; BERTAGNA, 2012).

Para a constituição desse artigo, abordaremos quatro itens que entendemos como centrais na pesquisa, que são: 1) Avaliação em larga escala e estratégias de gestão; 2) O ENADE como instrumento para avaliação; 3) ENADE e formação de alunos críticos e Os parâmetros do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes instituídos pelo MEC e 4) a repercussão dos dados do exame na universidade.

Resultados e discussões: as leituras que a pesquisa possibilitou

As discussões aqui propostas inscrevem-se no campo da avaliação em larga escala que tem se apresentado como um campo complexo e contraditório em que convivem a necessidade de avaliar para qualificar e a regulação de cunho instrumental que possibilita ou estimula o ranking e não, necessariamente, a qualificação dos processos avaliados. Nesse particular, Dias Sobrinho contribui:

O campo da avaliação, ao crescer em complexidade e se inserir mais declaradamente no âmbito político e social, incorporou as contradições, que não são meramente epistemológicas, mas, sobretudo, resultam de distintas concepções de mundo. A avaliação se assume, então, como política e de grande sentido ético. (DIAS SOBRINHO, 2003, p. 27).

Nesse olhar, da avaliação que se assume como política, na perspectiva da ética, foi construído esse artigo. Os achados do presente estudo contribuíram para uma melhor aproximação e compreensão da realidade vivenciada pelos coordenadores dos cursos pesquisados. Os conhecimentos prévios sobre sua atuação foram ampliados, visto que a investigação permitiu problematizações, análises e interpretações dos dados coletados.

A análise teve por objetivo responder ao questionamento: "Como os gestores (coordenadores) dos cursos de graduação da universidade avaliam o ENADE enquanto política de avaliação em larga escala e de que estratégias de gestão lançam mão para melhorar a avaliação dos cursos"?

Para realização do estudo foi escolhida a URI - Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Campus de Frederico Westphalen. Todos os coordenadores de curso foram convidados a participar, como respondentes de questionário após serem devidamente esclarecidos a respeito das questões éticas da pesquisa.

A pesquisa teve enfoque qualitativo envolvendo a análise dos dados. Dos 21 questionários respondidos por coordenadores de curso foram selecionados 10 para o corpus da pesquisa, os quais são dos departamentos de: Ciências Humanas; Ciências Exatas e da Terra; Ciências da Saúde; Linguística, Letras e Artes; Engenharias e Ciência da Computação. Respeitando a ética em pesquisa, os sujeitos participantes foram denominados: C1; C2; C3; C4; C5; C6; C7; C8; C9 e C103.

Avaliação em larga escala x estratégias de gestão

Buscando conhecer o entendimento dos Coordenadores de Curso sobre o assunto pesquisado, foram formuladas as seguintes questões: "Na condição de coordenador de curso de graduação da universidade, como você avalia o ENADE enquanto política de avaliação em larga escala?" "Você lança mão de estratégias de gestão para melhorar a avaliação dos cursos? Tais questões permitiram conhecer a compreensão dos Coordenadores de Curso sobre o tema:

C1: Avalio como sendo uma política que ajuda a verificar o nível de aprendizagem dos alunos do ensino superior. Como gestor, busco revisar os conhecimentos gerais dos acadêmicos que realizam o ENADE, refletindo, principalmente a Realidade Brasileira. Também, coloco para os alunos a importância de verificar as provas anteriores, bem como responsabilizo os acadêmicos da imprescindível função que possuem ao realizar as referidas, na interpretação e compreensão das questões.

C4: Hoje temos uma preocupação que no curso o aluno tenha contato anteriormente com as provas do ENADE, com a organização das questões que nas disciplinas sejam desenvolvidas a relação conceitual e contextualizada, que ocorram encontros de revisão e discussão acerca das questões norteadoras da avaliação. Acredito que também desenvolver a "cultura" do ENADE e a responsabilidade no educando seja aspecto prioritário.

Ao lermos as afirmações dos coordenadores, compreendemos que o ENADE, de certa forma, induz os currículos, já que os professores passam a trabalhar as questões do exame nas disciplinas, forçando uma mudança metodológica e nas formas de avaliação. Neste sentido, determina um modo de regulação que induz a busca de resultados, ainda que esses não representem, necessariamente, a realidade dos cursos.

Quando Dias Sobrinho (2003) nos alerta a respeito da instrumentalidade como ideia que tem prevalecido sobre a Universidade, podemos ter uma clara noção de que sua função demanda "cumprir mais efetivamente as exigências de instrumentar o mundo do trabalho e então há um controle rigoroso sobre os perfis profissionais, as competências e habilidades demandadas pelo mercado" (DIAS SOBRINHO, 2003, p. 75).

Nesse viés, o ENADE é considerado como importante para todos os entrevistados, embora, em algumas falas, os coordenadores apresentem algumas críticas mais severas a tal instrumento de avaliação, como pode ser exemplificado pelo trecho transcrito a seguir:

C3: Prova única, incapaz de aferir inúmeras competências e habilidades que julgo imprescindíveis na sociedade atual, tais como criticidade, capacidade investigativa e o relacionamento humano. Um questionário cuja veracidade das respostas não é totalmente confiável, o aluno pode ser induzido a responder determinadas alternativas. Um comparativo do corpo docente dos cursos sem fazer qualquer tipo de distinção quanto à realidade social/local- privilegiando cursos estabelecidos em grandes concentrações urbanas e Instituições Federais.

Os coordenadores explanam que o ENADE é um sistema de avaliação, uma política que busca verificar a qualidade dos Cursos de Graduação. Desta forma, avaliam esse processo como ainda deficitário frente a um cabedal de conhecimentos que o acadêmico constrói em torno de um curso de graduação, ainda que o entendem como uma prova ampla, consideram que não tem o mérito/poder de avaliar a qualidade de um curso.

Essa ideia corrobora o que nos aponta Afonso (2009), de que a partir da década de 1980, a avaliação passou a ser traduzida pela expressão 'Estado Avaliador'. Conforme o autor,

Essa expressão quer significar, em sentido amplo, que o Estado vem adoptando um ethos competitivo, neodarwinista, passando a admitir a lógica do mercado, através da importação para o domínio público de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados ou produtos dos sistemas educacionais. (AFONSO, 2009, p. 49).

Essa perspectiva acaba colocando na Universidade a responsabilidade pelos resultados, já que a obtenção de bons conceitos no ENADE é fundamental para a manutenção dos cursos e para a visibilidade da Universidade. Por meio da pesquisa podemos dizer que o ENADE não cumpre totalmente com o seu objetivo (aferir o rendimento dos alunos dos cursos de graduação em relação aos conteúdos programáticos, suas habilidades e competências), na medida em que apenas estabelece padrões comparativos entre cursos, não tendo a real preocupação de mensurar a aprendizagem dos discentes. Também é entendimento de Dias Sobrinho (2003, p. 59) que, "[...] como 'avaliador' ou 'interventor' a avaliação que o Estado desenvolve é predominantemente controladora e organizadora de suas políticas de distribuição de recursos - diretamente, sob a forma de orçamentos, indiretamente, por meio de premiações e incentivos [...]".

Não é demais afirmarmos que a realização da prova é responsabilidade exclusiva do aluno. A ele basta estar presente no local da prova no dia e hora marcados, podendo, se quiser, somente assinar a presença e, após o tempo mínimo exigido, entregá-la. Ao fazer isso, ele garante a possibilidade de se formar, pois compareceu à prova, mas prejudica o desempenho do curso que poderá sofrer punições como cortes no PROUNI4 e FIES5. Sob essa ótica, o ENADE, de fato, pode não estar verificando a qualidade dos cursos e sim, ao aferir resultado para o curso, coloca-o na condição de curso bom ou ruim, conforme o resultado dos demais cursos. Ao expor os resultados publicamente, o ranking fica estabelecido e as cobranças recaem, exclusivamente sobre os cursos e a Instituição.

Destaca-se que as ações desenvolvidas pelos gestores dos cursos em relação ao Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, basicamente compreendem a discussão do conceito obtido pelos alunos e como estes poderiam se sentir mais "qualificados" para realizar o exame. Para tal, aulas preparatórias para a prova ganharam expressão na gestão curricular de vários dos cursos investigados.

Nessa ótica, o ótimo resultado obtido no ENADE pode ser fruto de um conjunto de práticas implantadas no curso, em que o aluno, desde o primeiro semestre, é motivado a aprender e conduzir-se de acordo com as linhas gerais da profissão e incentivado a refletir na lógica da questão da prova. Além da formação específica e necessária, exigida pela profissão, há a exigência do Exame de Suficiência. Assim, o resultado no ENADE é consequência de um projeto maior, visando a formar o melhor profissional ou conquistar o melhor resultado.

Quando os coordenadores foram indagados se a prova do ENADE pode gerar estratégias de gestão, com a finalidade de melhorar os resultados dos cursos, salientaram que:

C6: Pode. Motivar os alunos e professores a manter a qualidade em caso de tirar uma nota boa, buscando sempre um crescimento maior. Caso for regular a nota, merece retomar o todo do curso e/ou da Universidade para dar uma boa "injeção" de qualidade. Por isso, reforço dizendo que é preciso manter a qualidade sempre. O ENADE é periódico, mas pode indicar estratégias de gestão, "acordar' para a superação de algumas deficiências pontuais.

De acordo com o Coordenador citado, o ENADE pode ser considerado um mecanismo de avaliação dos cursos na atualidade que merece atenção. A melhor estratégia é manter o nível de qualidade no ensino de modo que o resultado virá sem que haja necessidade de induzir o currículo com o intuito de responder a uma prova. Ainda assim, Feldmann; Souza e Heinzle (2016, p. 12) alertam que "[...] o sentido da regulação que o ENADE traz faz com que as IES e, consequentemente, coordenadores de cursos, sintam-se sob constante fiscalização do Estado, que institui a maneira como se deve agir".

As falas dos coordenadores participantes da pesquisa permitem constatar que, enquanto política de avaliação, o ENADE, apesar de suas especificidades, é uma importante ferramenta para o controle de qualidade dos cursos superiores. Constatamos que todos os coordenadores, de alguma forma, lançam mão de estratégias de gestão para melhorar os resultados do curso. Estratégias de gestão são de grande relevância para o sistema de avaliação. Desta forma, percebe-se que os gestores não abrem mão de utilizá-las no processo. Para complementar a ideia, Tumolo (2010, p. 13) salienta a importância de algumas estratégias de gestão que vão muito além de preparar para uma prova:

Planejamento e execução de disciplinas de forma integrada;

Desenvolvimento de projetos integradores e de atividades interdisciplinares;

Aplicação da metodologia de Resolução de Problemas e Estudo de Caso como estratégias de ensino e avaliação;

Realização de semanas temáticas acadêmicas e eventos com profissionais envolvidos com o mercado de trabalho;

Incremento de bibliografia complementar e atualização constante dos conteúdos e competências vinculadas às disciplinas;

Utilização de metodologias ativas de ensino, principalmente, por meio da pesquisa e da extensão;

Manutenção da monitoria como atividade de apoio pedagógico permanente;

Realização de investimentos na titulação e na formação dos docentes, assim como na vinculação dos mesmos ao curso; e

Qualificação das salas de aula e dos laboratórios e investimentos em recursos materiais e equipamentos que favoreçam a aprendizagem.

Nesse ínterim, é possível constatar que o ENADE vem perdendo sua real intenção à medida que não consegue estabelecer parâmetros para atender à realidade de cada curso e de cada universidade, ao invés disso, acaba gerando estratégias muito mais para melhorar a nota do que para promover conhecimentos.

É de relevância destacar que os coordenadores não repudiam o processo de avaliação, mas que existe uma grande preocupação em melhorá-la para melhorar o processo de conhecimento, a estrutura da Universidade, dentre outros.

Ao receber os resultados, as Instituições deveriam analisar o desempenho dos seus alunos (e cursos) com uma postura, eminentemente pedagógica e acadêmica, tendo em vista a qualificação de ambos. Todavia, isso deve ocorrer sem perder de vista que a avaliação institucional não está centrada somente no ENADE, existindo outros componentes e indicadores a serem levados em conta.

Há de se considerar também, na visão dos gestores, que os resultados são instrumentos importantes de aferição da qualidade educacional e também servem para suprir a necessidade de informação à sociedade. Os resultados podem ser trabalhados nos cursos de forma a refletir sobre as questões em que os alunos estão errando e acertando.

Ainda, cabe ressaltar que o envolvimento dos coordenadores com a avaliação institucional é importante, pois possibilita que toda a Instituição, bem como os alunos, possam ampliar a cultura avaliativa. Com isso, um olhar sobre como a Instituição trabalha esse conceito com os acadêmicos poderá resultar em formas mais elaboradas sobre o modo como esses alunos realizam o ENADE, podendo esse servir como importante instrumento de avaliação dos cursos.

Algumas Universidades brasileiras fizeram experiências importantes que foram desenvolvidas desde os anos de 1980 na perspectiva de fortalecer a avaliação como instrumento de democratização e consolidação institucional, dentre elas podemos citar a Universidade de Brasília - UNB, a Universidade Federal do Paraná - UFPR e a Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, contrariando o caráter produtivista e controlador e permitindo à Universidade assumir a titularidade tanto do currículo quanto da formação (DIAS SOBRINHO, 2003).

O ENADE como instrumento de avaliação

Olhando o ENADE como possível instrumento de avaliação, pressupõe concordar, novamente, com Dias Sobrinho acerca do fato de que "A avaliação institucional visa compreender, isto é, entender em conjunto, estabelecer as significações e as direções, não de segmentos ou de indivíduos isolados, mas de totalidades concretas que constituem a universidade como um todo" (DIAS SOBRINHO, 2003, p. 81-82).

Dessa forma, o ENADE, precisa ser olhado e analisado como um dos aspectos a ser considerado no contexto da avaliação no âmbito da instituição. Isso não significa diminuir sua importância para a instituição refletir processos e ressignificar práticas.

Dentre os objetivos da pesquisa, questionamos os coordenadores de curso sobre sua concordância com o ENADE e se este pode ser considerado um instrumento de avaliação que contribui com a qualificação dos cursos superiores. De acordo com os coordenadores:

C2: De um modo geral sim, quando observamos que uma nota pontual dos nossos alunos não é satisfatória, temos a necessidade de revermos o que pode estar falhando ao longo do processo. Porém, é importante salientar que a maior dificuldade na avaliação está na interpretação e esta é uma questão mais ampla que deve ser discutida ao nível do Ensino Fundamental e Médio.

C4: Entendemos que sim, o ENADE cumpre sua função de avaliação do Ensino Superior. A partir da avaliação, verificamos que a qualificação é reflexo do direcionamento dado pelos seus gestores. Se a energia for canalizada de forma positiva, ela se soma aos elementos construtivos do curso.

Segundo eles, apesar de entenderem que o ENADE não avalia o rendimento dos alunos de modo satisfatório, acreditam que o exame é uma ferramenta que contribui para a qualificação dos cursos à medida que instiga preocupações com aspectos relacionados à qualidade do corpo docente, infraestrutura, organização didático-pedagógica e ao conhecimento adquirido pelos discentes. Assim, sob esse ponto de vista, pode-se aferir que o ENADE apresenta elementos que são contraditórios, ou seja, se por um lado ele permite que se pense na qualificação dos cursos sob vários aspectos, como a infraestrutura, corpo docente e a organização que deve atender a padrões mínimos de qualidade, por outro, não revela, profundamente o nível de conhecimento profissional, pois há certo 'mascaramento' nos resultados frente aos momentos preparatórios que antecedem às provas e até mesmo há possibilidade de boicote por parte dos alunos.

Presume-se que os dados devem colaborar para o desenvolvimento da qualidade dos cursos de graduação nas Instituições de Ensino Superior no Brasil, porém, a forma regulatória como são aplicados e divulgados os resultados pode ser altamente prejudicial tanto à formação pela quebra de confiança na Instituição se o resultado for negativo, quanto à proposta do curso, conforme exigências da prova e não da profissão. No dizer de Becker (2010), "Uma avaliação feita das avaliações educacionais na América Latina, ao longo da década de 90, concluiu que os docentes perceberam os mecanismos de avaliação como uma forma de pressão mais do que como um insumo para a melhora da qualidade da educação" (BECKER, 2010, p. 4).

Em algumas entrevistas, pôde-se perceber que os resultados obtidos por meio do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes são atribuídos na forma de ranqueamento em que os melhores desempenhos são divulgados para chamar a atenção dos futuros alunos, contribuindo para que o Ensino Superior seja visto como um mero produto a ser adquirido.

Como uma das ferramentas do SINAES, o ENADE traz em si o princípio da não punição dos resultados, o que de fato não ocorre. Todavia, entende-se que, embora não tenha intenção, a forma como o governo disponibiliza os resultados contribui para o ranqueamento das IES pela mídia. No ranking são apresentadas as universidades que obtêm os melhores desempenhos, bem como aquelas que não obtiveram uma avaliação satisfatória, como alerta o Coordenador:

C7: Em termos. É um tipo de avaliação que pode não revelar a verdadeira qualidade e o crescimento do aluno. Toda avaliação pode não revelar os critérios de um bom diagnóstico. Por isso, não deveria ser o único instrumento.

Segundo os coordenadores, os resultados do ENADE podem servir para realizar comparações entre os cursos de uma mesma IES, ou entre elas, para se ter acesso ao grau de conhecimento adquirido na trajetória acadêmica dos alunos.

O ENADE é uma prova de avaliação qualificatória dos alunos do Ensino Superior, sendo uma oportunidade da universidade avaliar o nível dos estudantes e uma avaliação na qual os alunos conseguem entender o seu nível de compreensão da matéria que está sendo proposta no seu curso.

Nesse ínterim, a partir das falas dos coordenadores, constata-se que avaliar é sempre um modo de exposição e de julgamento. Avaliar sempre denota que algo precisa ser refletido, atualizado e qualificado. De acordo com Dias Sobrinho (2003, p. 212), "Avaliar a qualidade implica, necessariamente, uma tomada de posição que pressupõe uma escolha de um sistema valorativo, dentre vários outros possíveis, num determinado meio social".

A avaliação pode promover o comprometimento do curso e da Instituição. O ENADE compromete o Curso, o colegiado a se aperfeiçoar, a buscar desenvolver aulas e procedimentos mais competentes. Ainda, o ENADE compromete o aluno ao estudo, à pesquisa e à investigação, por isso acredita-se que o processo contribui para qualificar os cursos superiores, apesar de suas contradições.

No campo das contradições, Cunha (2005) nos alertava que a avaliação classificatória, como tem sido o ENADE, por exemplo, tem permeado a lógica do Ministério da Educação e tem impactado no sentido da profissionalidade docente que, por força das circunstâncias, insere-se, cada vez mais na perspectiva da racionalidade técnica baseada na produtividade e competição. Assim, "Em que pese o fato de existirem manifestações de resistência, tanto individuais como grupais, elas não têm sido suficientes e acabam sendo engolidas pela ordem dominante" (CUNHA, 2005, p. 23).

É de suma relevância mencionar que o ENADE é importante por várias razões. Como as Universidades recebem os relatórios de rendimento do grupo de alunos, com as médias nacionais e estaduais, o exame serve para saber como está a formação desses alunos em relação a egressos e outros cursos. E é muito importante porque a nota do ENADE integra o Conceito Preliminar do Curso, o CPC, que o MEC usa para determinar a qualidade do curso. Um curso com CPC baixo não pode ter acesso a programas importantes de bolsas e financiamentos como o PROUNI e o FIES.

Apesar de o Conceito Preliminar de Curso considerar o corpo docente e a nota dos cursos de graduação, o foco maior é no aluno. O Conceito Preliminar de Curso leva em conta, então, o rendimento dos alunos na prova do ENADE e as respostas ao questionário do estudante, que precisa ser preenchido cuidadosamente por eles antes de fazerem a prova do ENADE. As respostas dadas no questionário do estudante são usadas para avaliar os componentes pedagógicos do curso e a estrutura física da universidade. As perguntas variam, ano a ano, mas representam uma porcentagem da nota final do curso. De acordo com Verhine e Dantas (2010, p. 20), "Em vez de encarar o exame como uma punição (individual e coletiva) o aluno deveria entender sua participação como uma contribuição social, como uma das responsabilidades que compõem a cidadania."

A grande vantagem do exame é permitir que os estudantes possam demonstrar que as qualidades necessárias aos bons exercícios profissionais também ocorrem porque o ENADE avalia habilidades e competências e não a mera capacidade de decorar a matéria como se fosse uma escola tradicional. Desta forma, o ENADE fornece resultados que apontam fragilidades do curso avaliado; a partir dessas fragilidades, a coordenação e equipe podem tomar medidas e estratégias de gestão, a fim de melhorar o desempenho na avaliação, na perspectiva da formação crítica dos alunos.

ENADE e formação de alunos críticos

A constatação dos coordenadores é que todo o processo de avaliação gera resultados que podem ser analisados e propõe a tomada de decisão. Se a preparação para o ENADE for constante, seus resultados expressarão uma realidade local que permitirá a manutenção da estratégia adotada ou possíveis melhoramentos, ou seja, uma tomada de decisão. No entanto, podemos questionar: se o curso tem qualidade ele precisa se preparar para o ENADE? De acordo com Ristoff e Limana:

Extremamente importante é perceber que a nota do ENADE não será a nota do curso, mas, como prevê a legislação, parte do conjunto das dimensões da nota da avaliação do curso. Portanto, nenhuma decisão regulatória (reconhecimento, renovação de reconhecimento, fechamento de curso), será tomada em função apenas do desempenho dos estudantes no exame. A nota do curso no ENADE será somada à nota do curso obtida durante a avaliação in loco, a ser feita periodicamente por comissões de especialistas nas diversas áreas do conhecimento. Como a nota do ENADE não será considerada igual à quantidade do curso, ela também não será, por consequência, usada para fazer ranqueamentos. (RISTOFF; LIMANA, 2015, p. 1).

Através da avaliação interna, a Instituição como um todo pode se preparar para lançar estratégias que ajudem a melhorar diversos aspectos, sendo necessário planejar antes de agir.

Nesse viés, com o objetivo de coordenar e articular o processo interno de avaliação, bem como sistematizar e disponibilizar informações e dados, a CPA - Comissão Própria de Avaliação é uma importante ferramenta da Instituição.

A CPA é o melhor veículo disponível para identificar e propor soluções para nossos problemas. Há uma grande importância da participação do acadêmico, pois a percepção dele irá fazer a Instituição ir à busca de melhorias contínuas, pois são avaliados a didática do Professor, como ele trabalha em sala de aula, os materiais e métodos utilizados e, caso sejam encontradas fragilidades, isto é atacado com capacitação e formação do corpo docente. (UESB, S/D, p. 1).

Condizente com essa ideia, pode-se concluir que a avaliação interna permite obter uma melhor visualização do "todo" da Universidade, permitindo que novas propostas de melhorias possam ser implementadas para que se construa uma Instituição cada vez mais sólida, com qualidade e que traga entre suas marcas a formação de alunos críticos.

Falar em qualidade é um desafio. Qualidade no Ensino Superior é algo complexo de ser definido, é verificar as potencialidades e fragilidades e, percebe-se que não é qualquer processo sistêmico que possibilitará função tão importante. Dias Sobrinho (2000, p. 85), ao definir a qualidade no ensino superior destaca que:

A noção de qualidade em educação é inseparável da noção de cidadania. Qualidade, atributo essencial a ser construído no conjunto do trabalho universitário, tem, como se sabe, do ponto de vista da universidade, uma semântica dispersiva. Por isso, intervêm do exterior aqueles conceitos normalmente referenciados à produtividade rentabilidade do mercado e da tecnocracia. A avaliação participativa pode ser um instrumento poderoso para a consolidação e articulação de redes interuniversidades que procurem reafirmar a multidimensionalidade institucional, a complexidade dos processos e dos produtos acadêmicos e científicos e operem em espécie de "resistência à tecnologização da epistemologia" (Morin) e à racionalização da vida pelo economismo. O conceito de qualidade do trabalho educativo, essencialmente científico e inseparavelmente técnico, político e pedagógico deve brotar da livre comunicação, sobretudo no intercâmbio das comunidades universitárias organizadas.

Nesse quesito, os coordenadores foram questionados se acreditam que devemos nos preocupar somente com o ENADE na trajetória do curso ou com a preparação de alunos críticos. Em resposta, os gestores consideram que:

C5: A formação do aluno perpassa a avaliação do ENADE. Exige uma formação integral para o mundo profissional, ou seja, com certeza devemos nos preocupar com a formação de alunos críticos, não somente para a realização do ENADE, mas sim para a vida profissional e pessoal.

C7: Aluno Crítico sem dúvida. Isto passa por um processo permanente de atualização dos professores e dos projetos pedagógicos dos cursos e envolvimento dos alunos no ensino, na pesquisa e na extensão.

Para os coordenadores, a formação do aluno crítico deve ser o foco, o ponto de chegada de todos os cursos. No entanto, muitos alunos vêm desqualificados do Ensino Médio. Nem sempre possuem conhecimentos suficientes para conquistarem bons resultados em sua aprendizagem. A preocupação com a formação superior, não raro, fica comprometida quando não se transpõem essas barreiras. Essa realidade parece que está estabelecida. Assim, é necessário trabalhar com constantes nivelamentos para desenvolvimento dos alunos e assim superar o déficit existente. O fruto desse trabalho será evidenciado a longo prazo. Todavia, o cuidado com esses aspectos na formação do acadêmico pode permitir uma formação crítica.

Embora o espaço da universidade não seja o único onde ocorre a educação e a transmissão cultural, é nesse espaço que parte dos indivíduos e grupos com diferentes interesses e culturas, crenças, valores e percepções, entram em contato com o saber sistematizado e por meio dele elaboram processos de negociação de argumentação de construção de novos conhecimentos, de reflexão, de pensar criticamente. Por conseguinte, a universidade precisa adotar posturas críticas e criadoras que favoreçam a reflexão sobre o momento histórico e sobre os fatos que permeiam a sociedade com o todo. (BAPTISTA, 2009, p. 25).

O processo de reflexão crítica tem como base a pedagogia crítica de Freire (2005) e parte da premissa que uma formação crítica deve conduzir ao desenvolvimento de cidadãos que sejam capazes de analisar suas realidades social, histórica e cultural, criando possibilidades para transformá-la, conduzindo alunos e professores a uma maior autonomia e emancipação. Isso fica explícito na fala do coordenador:

C4: Certamente, na sociedade atual, além do conhecimento são imprescindíveis inúmeras habilidades, competências e valores, entre eles, saber se posicionar criticamente, saber agir, e, acima de tudo, ter atitude diante de problemas e/ou situações não só de ordem profissional mas também social.

A formação do profissional do século XXI exige novas competências, habilidades, saberes, além daqueles que são trabalhados, socializados no curso que o estudante escolher. Não se afirma, com isso, que as especificidades de cada curso não devam ser mantidas; ao contrário, um Engenheiro, um Arquiteto, etc. têm que saber muito sobre a sua área, enfim, todas as áreas têm suas especificidades que devem ser mantidas. Ocorre que, no mundo contemporâneo, a repetição de conteúdo/conhecimentos não é a tônica, ou seja, não dá 'cabo' à formação do profissional que este século exige.

O século XXI exige conhecimentos básicos de literatura, de história, comunicação, antropologia, etc., sendo que a integração de diferentes conteúdos, durante a formação acadêmica, dará a formação integral do aluno, preparando para novos desafios, formar sujeitos mais críticos, bem como interpretar exames como o ENADE. Baptista (2009) complementa,

Para o desenvolvimento das competências do pensar criticamente, é necessário os professores ensinarem os alunos a argumentarem, dialogarem, trazendo para a realidade da sala de aula sua realidade vivida. Desta forma, o aluno terá condições de se tornar um sujeito pensante, capaz de utilizar seu potencial de pensamento para a construção e reconstrução de conceitos, habilidades, atitudes e valores, que serão fundamentais para desenvolver seu potencial e adquirir competências desejáveis para a sua realização pessoal e profissional. (BAPTISTA, 2009, p. 36).

A formação do aluno perpassa a avaliação do ENADE. Exige uma formação integral para o mundo profissional. Essa formação deverá estar alicerçada nos princípios da ética, da cultura, do conhecimento e da ação-reflexão, aliada ao tripé da Universidade, ensino, pesquisa e extensão por isso,

Na universidade, a aula deve favorecer momentos que muitas vezes são construídos de improviso, em razão das intervenções dos alunos, que apresentam dados a respeito do assunto trabalhado. Em um trabalho que vise à construção do pensamento crítico, esse momento é crucial, pois os tipos de interferências e colocações são muitos e podem variar de acordo com o contexto de cada aluno. Caberá ao professor trabalhar com as diferentes ideias, sistematizá-las e fundamentá-las teoricamente, com vistas à construção de conhecimentos. (BAPTISTA, 2009, p. 40).

A universidade exerce um papel importante na formação de sujeitos críticos, que tenham discussão e iniciativa, ou seja, sujeitos autônomos, tendo como função aprender, produzir e disseminar o saber, capazes de trazer soluções aos mais diversos problemas e desafios da vida.

Nessa ótica, a avaliação também assume espaço importante, uma vez que ela não pode transitar unicamente na quantificação de resultados, na leitura superficial de dados. A avaliação poderá ser um elemento essencial no processo de formação dos acadêmicos e de qualificação das universidades desde que assuma a função de contribuir para melhorar a aprendizagem (no caso dos alunos) e de qualificar os processos (no caos das instituições). Daí o cuidado que precisamos ter ao trabalharmos a questão da avaliação, notadamente quando falamos na perspectiva da regulação. Freitas (2005) chama atenção nesse sentido, alertando que ao falarmos sobre regulação devemos ter claro de que política pública estamos falando. Lembra o autor:

É importante notar que o termo 'regulação' está relacionado à ação de privatização do Estado no âmbito das políticas neoliberais. Ao privatizar, o Estado desresponsabiliza-se por uma gama de serviços e transfere o controle para mecanismos de 'regulação do mercado'. Porém, esse controle visa a retirar do Estado uma eventual capacidade de intervenção sobre tais serviços, deixando que sejam afetados apenas pelas leis de mercado. (FREITAS, 2005, p. 913).

Ao relacionar o tema regulação com a ação de privatização, o autor chama a atenção para as consequências que ocorrem devido ao fato de o Estado buscar se desresponsabilizar por questões que lhe competem, ficando a cargo dos mecanismos de mercado, o que leva a um engessamento das ações do próprio Estado perante as leis de mercado.

Os parâmetros do Exame Nacional de desempenho dos Estudantes instituídos pelo MEC e a repercussão dos dados do exame na Universidade

A perspectiva da avaliação que se constrói somente a partir das leis do mercado é perigosa e devemos ter isso claro. Assim, a regulação no processo de avaliação é importante para garantir a formação de um profissional de qualidade, uma vez que o resultado das avaliações serve para os professores refletirem sobre seus métodos pedagógicos e sobre a sua própria imagem profissional, identificando as fragilidades para, posteriormente, corrigi-las junto ao grupo de docentes.

Deste modo, é possível afirmar que a avaliação influencia na gestão da aula, na aprendizagem e na motivação do aluno. Mas essa deve ser uma influência positiva, que resulte em uma educação de qualidade, já que o objetivo principal dos cursos de graduação deve ser formar profissionais de qualidade e não apenas conquistar um bom resultado nas avaliações externas, aliás, o bom resultado deve vir em consequência da boa formação que o curso oferece.

O próprio Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES propõe que:

A avaliação é essencialmente educativa, portanto formativa, sem que para isso deixe de utilizar também instrumentos e procedimentos de controle. É um projeto, pois se trata de movimento que examinando e julgando o passado e o presente, visa a promover transformações, ou seja, tem futuro em perspectiva. É uma construção social, pois não é um já dado de propriedade exclusiva, de algum ente em particular e para benefícios de setores restritos, e sim um processo a ser concebido e executado coletivamente, buscando atender interesses coletivos. (SINAES, 2009, p. 96-97).

De acordo com o que preconiza o SINAES, ficam explícitos alguns instrumentos essenciais para o processo avaliativo, sendo que estes instrumentos de controle podem ser compreendidos como modelos 'chave' para que a análise estatística e pedagógica garanta sua validade para averiguar um fenômeno ou uma realidade em curso.

E prioritariamente expressa a principal função da avaliação, que é de funcionar como um diagnóstico de uma situação da realidade social para que ações com vistas à qualificação dos processos e procedimentos nela envolvidos possam ser planejadas. Enfatiza que, como projeto coletivo deve ser pensada de maneira a proporcionar estratégias de superação do presente para um futuro, que em perspectiva, beneficie a todos, por meio da conquista de um desempenho mais efetivo. (TUMOLO, 2010, p. 4).

É nesse ínterim que surge a possiblidade de utilizar os resultados diagnosticados por meio do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes - ENADE para repensar o processo de ensino-aprendizagem dos acadêmicos, bem como da oferta de cursos das instituições de Ensino Superior. Essa análise pode ser feita a partir de cada um de seus instrumentos.

Partindo desse pressuposto, foi questionado aos coordenadores: "Qual a sua avaliação sobre o ENADE, tomando como parâmetro os padrões de qualidade instituídos pelo MEC/INEP para o Ensino Superior?"

C2: Avaliamos o ENADE de forma positiva e construtiva. Sabemos que talvez não seja a melhor forma de avaliação, mas qual seria melhor? Alguns cursos possuem prova para o ingresso no conselho profissional, o que reforça ainda mais a necessidade dos padrões do MEC/INEP para a nossa nação de forma vertical. Sendo assim, o instrumento cumpre sua função.

Condizente com a fala do coordenador, pudemos constatar que se o ENADE não fosse uma prova padronizada para o Brasil inteiro, talvez ela cumprisse o seu verdadeiro papel.

Segundo os entrevistados, a forma como o ENADE é organizado "não os representa", primeiro porque ele ranqueia as universidades a partir de critérios que não levam em consideração os conteúdos dos cursos, aquilo que definem como sendo essencial para a sua formação. O ENADE vai ranquear as Universidades e vai instalar competições entre os cursos ao invés de estimular a produção com qualidade e a defesa da produção de conhecimento que defenda a autonomia e a pesquisa para o nosso país.

Desta forma, os coordenadores consideram fundamental a avaliação para o Ensino Superior, mas não essa, que ao invés de levar em consideração as características dos cursos, aquilo que é definido pela própria categoria, o que é importante para a formação apresenta uma estatística dos cursos que estão melhor colocados do ponto de vista apenas de infraestrutura socioeconômica; ainda, uma avaliação que não leva em consideração algumas particularidades, como: se o curso tem estágio, se o curso apresenta pesquisa, qual a condição do trabalho que os professores enfrentam, etc. Resumindo: o fato de ser uma prova única, para estudantes de diferentes localidades e instituições, pode trazer prejuízos, porque acaba escondendo, de certa forma, as particularidades que cada curso possui.

Diante da realidade de um mercado competitivo, o resultado do ENADE deve ser considerado, mas deve-se ser ciente de que se trata apenas de um conceito obtido mediante o cálculo do desvio de relação ao desempenho médio dos mesmos cursos no país. Logo, não pode ser tomado como único parâmetro para uma avaliação interna, afinal, nesse modelo, nem um conceito ruim, necessariamente, é sinônimo de fracasso e nem um conceito bom é sinônimo de êxito.

Também, por consistir em ferramenta incapaz de avaliar determinadas competências e habilidades, bem como valores necessários para o convívio em sociedade e/ou para o desenvolvimento profissional, a metodologia utilizada pelo ENADE é insuficiente para avaliar se o acadêmico obteve uma formação que está alinhada ao projeto ético-político profissional, a ser um sujeito crítico, questionador. Por isso, a necessidade de existir um sistema de avaliação que, de fato, faça com que o aluno participante da avaliação se perceba nesse processo de formação.

Aproveitando a oportunidade, foi questionado aos coordenadores de curso como os resultados do ENADE repercutem na universidade.

C4: A obtenção de um conceito ruim, especialmente, implica em reflexão e uma avaliação interna do curso, bem como reflete no engajamento de estratégias para melhorá-lo.

C7: Os resultados são esperados ansiosamente, por definirem os rumos do próprio Curso, de receberem ou não uma visita in loco, o que preocupa a Instituição como um todo. Quando divulgado, cada Curso busca verificar a nota e reflete. Se for uma nota 4 ou 5 há comemorações e divulgação na mídia com a maior brevidade. Se for 2 ou 3, há maiores preocupações, do motivo, bem como reflexões de situações que o Curso necessita aprimorar, qualificar no processo acadêmico.

Diante das falas dos coordenadores, pode-se constatar que, falar em ENADE é atuar no campo das contradições. Apesar das inúmeras críticas, o ENADE pode ser considerado uma política de avaliação que exerce forte influência na Universidade, isso pode ser visto por meio da concessão de bolsas e financiamentos do PROUNI e do FIES para os cursos que obtiverem uma avaliação satisfatória, bem como o corte ou a redução quando a avaliação for insatisfatória. Exemplo disso, é a CAPES que tem premiado os primeiros lugares com bolsas para mestrados e doutorados. Condizente com a ideia, o coordenador de curso C6, menciona que:

C6: Dependendo do conceito, o curso poderá receber visita in loco, cortes no FIES; caso o conceito seja favorável, positivo, o curso tem a garantia de continuidade e repercussões na mídia como um curso de qualidade e excelência. E a universidade também será reconhecida pelo conceito como séria, confiável. Afirmo que dependemos de um bom resultado na prova do ENADE para provarmos nossa grandeza e nome e garantir a inserção na comunidade regional.

Uma boa pontuação no ENADE pode alavancar a procura pela Universidade pelos alunos que estão iniciando o Ensino Superior, sendo que isto leva a um prestígio acadêmico, podendo ser um diferencial na disputa de vagas no mercado de trabalho. Por ser uma avaliação permanente, o ENADE não avalia somente a Instituição de ensino, mas principalmente o aluno que está sendo formado, oferecendo, desta forma, um parâmetro para que ambos (Universidade e aluno) possam melhorar a qualidade da relação ensino-aprendizagem, fazendo com que ambos sejam responsáveis pelos resultados obtidos por meio do exame.

Participar da prova faz diferença para as instituições de ensino e, também, para os alunos, uma vez que o desempenho no exame pode influenciar no futuro profissional. Com as inúmeras Universidades que vêm surgindo, aumenta, ainda mais, a preocupação em obter um bom conceito no ENADE para melhorar a credibilidade tanto do aluno quanto da Instituição junto à sociedade, pois como mencionado, anteriormente, um bom conceito, aumenta a concessão de benefício de bolsas e o respaldo no mercado de trabalho que o aluno vai ter quando apresentar o seu currículo e a Instituição onde realizou a sua graduação.

As Universidades têm utilizado os resultados do ENADE como instrumento de melhoria contínua. Verificou-se que todos os cursos que obtêm bom desempenho, empregam a política de divulgação em mídias como forma de maior incentivo aos alunos de seu curso, assim como uma autopropaganda, acima de tudo gratuita, do resultado conquistado, isso fica explícito na fala dos coordenadores abaixo,

C8: Se for bom há grandes comemorações, se for ao contrário é motivo de grandes preocupações por parte do curso e da Instituição.

C9: Fizemos cartazes, apresentamos fôlderes para os alunos caso o curso obtenha um bom resultado.

Diferente do antigo Exame Nacional de Curso - ENC, que antecedeu ao ENADE, mais conhecido como Provão, aplicado aos estudantes concluintes de cursos superiores no Brasil de 1996 a 2003 que, de forma reducionista, permitiu a classificação ou ranking entre cursos de diferentes universidades, um ponto positivo do ENADE que pode ser destacado é que as Universidades podem utilizar-se dos dados gerados como ingredientes de um processo avaliativo mais amplo, contribuindo para a criação de novos instrumentos para o aperfeiçoamento e gestão do projeto pedagógico, podendo, desta forma, avaliar a formação específica e geral do graduando.

Do outro lado, estão os pontos negativos, pontos de críticas constantes. Pode ser destacado, primeiramente, o número de questões composto no teste, sendo insuficiente para avaliar o conhecimento atribuído ao exercício de uma profissão de nível superior. Esse período não é suficiente para permitir um acompanhamento às turmas em todas as etapas do aprendizado, desde seu ingresso até a colação de grau.

Além das críticas da academia, essas medidas ressaltam outros fatores quando se trata do setor privado da educação superior: o ranking, o marketing institucional, a concorrência, o conceito da IES no mercado de trabalho, o que gera mais pressão sobre os profissionais mais próximos aos estudantes: gestores de cursos e professores e o principal instrumento de trabalho deles é o currículo. (MARTINS; ALONSO, 2012, p. 193).

No desenvolvimento da pesquisa, pudemos constatar que a importância do ENADE para a Universidade gira em torno de melhorar sua posição no ranking das instituições, bem como alavancar a avaliação do curso perante o MEC. O preocupante é que se gera uma competição entre cursos dentro da própria Instituição de ensino, sendo que o ideal seria que todos os gestores pudessem juntar forças para melhorar as estratégias de gestão não somente com a finalidade de gerar uma boa nota, mas sim de expor diferentes ideias, formas de ensino, realizar um estudo aprofundado das propostas do curso, bem como do MEC com a finalidade de melhorar a qualidade da Universidade e da aprendizagem do estudante.

Nesse contexto, cabe à Universidade ser responsável pela formação dos sujeitos, oferecendo um ensino de boa qualidade de modo que a nota seja consequência do que os alunos obtiveram durante sua formação. Os acadêmicos precisam saber que, ao obter um bom conceito no ENADE, eles estarão:

Trabalhar a proposta do ENADE desde o início da graduação é uma grande possibilidade de melhorar não somente os resultados no exame, mas fazer com que os alunos compreendam sua importância para a avaliação em larga escala do Ensino Superior no Brasil.

Desta forma, os resultados da prova deveriam ajudar a Instituição a melhorar o seu projeto pedagógico, analisar sua estrutura e intervir em prol de melhorias ao invés de apenas lançar uma nota e ranquear as Universidades. Nesse ínterim, são notáveis os defeitos no método, sendo que a luta deve ser constante por uma melhor qualidade na avaliação que possa melhorar as necessidades no Ensino Superior.

Se existem formas de avaliação como o ENADE, então vamos utilizá-las a nosso favor para desenvolvimento de nossos cursos e nossa Instituição.

Considerações finais

O ponto a que chegamos é, com certeza, um novo ponto de partida para novos desafios, para novas possibilidades. Dialeticamente, as possibilidades são infinitas, pois cada vez que retomamos as partes, essas carecem de maior aprofundamento, abrindo possibilidades para novas investigações. É uma tarefa extremamente difícil tentar concluir um tema que não se esgota. Nossas conclusões são sempre provisórias, pois são histórico-culturais e, por isso, estão constantemente sujeitas a mudanças. Talvez pudéssemos usar outro termo ao invés de conclusão, pois este tema não se esgota aqui.

Diante das leituras bibliográficas pode-se obter uma compreensão acerca do histórico da avaliação em larga escala nas Universidades, sendo possível constatar que sofreram inúmeras metamorfoses até chegar ao modelo de Universidade disposto atualmente. A Universidade habilita os graduandos para exercerem determinada profissão, além de formar pessoas críticas e conscientes, pois também enfatiza o desenvolvimento, tanto cultural quanto intelectual. A Universidade, portanto, vai além da preocupação com a formação profissional dos acadêmicos, estendendo-se para o desenvolvimento de uma postura crítica e inovadora com a finalidade de preparar o aluno para a vida.

Com relação à avaliação, bem como os processos avaliativos pode-se constatar que ambos se tornaram grandes aliados das políticas públicas que avaliam as instituições de Ensino Superior na análise individual ou coletiva dos acadêmicos, nas práticas de ensino, nos cursos de graduação, salas de aula, na infraestrutura, entre outros.

Através dos estudos, constatou-se que as políticas de avaliação, seja em larga escala ou não, são condicionadas pelos organismos internacionais, sendo que essas relações podem ser identificadas por meio dos Programas de Governo ou pelas políticas de Estado que visam a melhorar a qualidade da educação. O Banco Mundial e o FMI são órgãos que financiam e seguem um modelo capitalista, que incentivam a produção. Desta forma, percebe-se que há uma dependência desses programas em relação aos órgãos internacionais, estes têm interesse em financiar recursos para melhoria da educação, exercendo, assim, um poder econômico sobre a educação.

Constatou-se, por meio da pesquisa, que os acordos mundiais são feitos pelo viés da lógica capitalista de mercado, visando a resultados massificadores, quantitativos e não qualitativos, que não levam em consideração as peculiaridades dos países e suas realidades. A educação brasileira também segue essa lógica, pois participou dos acordos mundiais e depende do financiamento dos organismos internacionais para a implementação das metas a serem atingidas.

Para que a real finalidade da avaliação não se perca, é preciso que se trabalhe de forma conjunta: instituição, comunidade, governo, docentes, discentes para que o resultado obtido por meio da prova direcione para um caminho positivo, que contribua para a melhora na educação e não apenas a critique. Assim, ficará evidente o papel das avaliações em larga escala como ferramentas para aprimorar e oferecer novas alternativas para as instituições de ensino, possibilitando novos caminhos a serem seguidos em relação aos interesses do sistema de ensino.

Como parte de uma política de avaliação em larga escala, voltada ao diagnóstico de aprendizagem referente ao Ensino Superior, pode-se compreender que o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior, o SINAES, vem se tornando o principal instrumento para averiguar a qualidade do ensino nas Instituições de Ensino Superior, tanto nas públicas quanto nas privadas. Em parceria com os Estados e o Distrito Federal, o SINAES contempla alguns requisitos para o aprimoramento das Universidades, dentre eles podem ser citados: o aumento na qualidade, oferta e ampliação do Ensino Superior para todas as classes sociais e a aquisição do respeito à diversidade e valores democráticos.

Assim, percebe-se a importância do SINAES para verificação da organização, planejamento e gestão das instituições de ensino superior. Nessa perspectiva, um sistema de avaliação pode se tornar uma espécie de banco de dados que organiza informações periódicas que sejam comparáveis e que permitam um estudo mais apurado sobre os diferentes aspectos do sistema educacional. Nesse ínterim, o ENADE, enquanto parte de uma política de avaliação em larga escala, pode ser considerado esse espaço que poderá permitir a pesquisa à luz dos dados que são gerados a partir da inscrição dos acadêmicos nas provas, passando pela realização destas e, posteriormente, pelos resultados que as avaliações ajudam a produzir, como parte da avaliação do ensino superior.

A partir dos dados pesquisados, alicerçados com nossos objetivos, é possível chegar a algumas conclusões provisórias. Com relação ao ENADE, ele propõe uma nova forma avaliativa baseada nas competências e habilidades que os acadêmicos adquiriram durante todo curso de graduação.

De acordo com os dados levantados na pesquisa, grande parcela dos coordenadores entrevistados está buscando novas possibilidades. Contudo, ainda são tentativas isoladas e muito subjetivas. Aparece muito presente, ainda, a preocupação demasiada com dados quantitativos em detrimento dos dados qualitativos, por conta disso, os acadêmicos apenas estão sendo treinados para responderem as questões das provas. O ENADE como avaliação em larga escala, não está conseguindo desencadear um processo profundo, radical de mudança, pois é trabalhado pela grande maioria dos cursos em média seis meses antes de realizarem o exame.

Pesquisa realizada por Feldmann; Souza e Heinzle (2016) também aponta que ocorre um "[...] acatamento diante das ações do Estado e regulação em relação aos professores e acadêmicos dos cursos". Afirmam também que "[...] as relações entre avaliação e currículo presentes nos discursos dos coordenadores analisados tanto para reorganizá-lo a fim de qualificar a formação dos futuros profissionais, quanto para adequá-lo ao ENADE como um fim em si mesmo" (FELDMANN; SOUZA; HEINZLE, 2016, p. 14).

De acordo com os objetivos da pesquisa e as respostas que eles trouxeram, nos permitimos fazer mais algumas considerações em relação ao ENADE:

  1. - Infelizmente o ENADE vem perdendo sua real função, pois, em parte, tem se igualado ao antigo Provão pelo fato de ranquear as instituições de ensino por meio das notas atribuídas aos cursos e das penalizações que os mesmos sofrem se a nota for considerada insatisfatória. As provas são elaboradas de forma igualitária para todos os Estados do país, sem atribuir a elas suas devidas particularidades, salientando, desse modo, as diversidades culturais e econômicas em que cada Instituição de ensino se encontra.

  2. - O ENADE deve ter como um propósito a busca de soluções para os problemas encontrados no processo de formação e não ajudar a propor um novo problema, motivado pelas suas penalizações. Também cabe às instituições de ensino priorizar o aprendizado agregado pelos acadêmicos durante o curso e não apenas reproduzir o conhecimento por meio de 'cursinhos preparatórios' exclusivamente para a realização do exame.

Apesar de suas fragilidades e contradições, o ENADE deve ser refletido nas instituições de ensino durante toda a trajetória percorrida pelos acadêmicos e não apenas no ano em que o curso será avaliado, cabendo aos professores a função de expor para seus alunos a importância de realizar uma boa prova para diagnosticar o que o curso acarretou durante esse ciclo de três anos, bem como, se a Universidade contribuiu para uma boa formação tanto profissional quanto para a vida de cidadão.

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Notas

1 ENADE - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes.
2 FAPERGS - Fundação de Amparo à Pesquisa no Rio Grande do Sul.
3 Dentre as respostas obtidas pela pesquisa, optamos por não trazer a totalidade das falas dos sujeitos, mas uma ou duas que sejam representativas de todos ou da maioria deles (dez coordenadores).
4 PROUNI - Programa Universidade para Todos.
5 FIES - Programa de Financiamento Estudantil.
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