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O Pacto pelo Fortalecimento do Ensino Médio como política de formação continuada de professores
The Pact for Strengthening High School Education as a policy for the continuing education of teachers
El Pacto por el Fortalecimiento de la Enseñanza Media como política de formación continua de profesores
Práxis Educativa, vol. 13, núm. 3, pp. 805-820, 2018
Universidade Estadual de Ponta Grossa

Artigos


Recepção: 25 Maio 2018

Revised document received: 24 Julho 2018

Aprovação: 27 Julho 2018

DOI: https://doi.org/10.5212/PraxEduc.v.13i3.0010

Resumo: Este artigo refere-se a uma pesquisa sobre o programa Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio (PNEM), realizado por uma instituição de Ensino Superior do sul do Brasil. O texto visa analisar a formação em documentos oficiais e como o PNEM é reconhecido pelos participantes. A pesquisa, de cunho qualitativo, investiga documentos oficiais e analisa relatos dos participantes publicados em livros sobre ações realizadas, assim como os relatos registrados durante um curso de extensão organizado pela instituição em 2015. Os resultados mostram o PNEM, nos documentos, como política de valorização dos professores. Para os professores, as temáticas discutidas no curso são necessárias para ampliar suas competências, mas não representa valorização da profissão.

Palavras-chave: Política pública em Educação, Valorização docente, Profissionalização docente.

Abstract: This paper refers to a research about the program known as the National Pact for Strengthening High School Education (PNEM), conducted by an institution of Higher Education in Southern Brazil. The text analyzes the education presented in official documents and how PNEM is recognized by the participants. The research, of a qualitative nature, investigates official documents and analyzes reports of the participants published in books about the actions performed as well as the reports registered during an extension course organized by the institution in 2015. The results of the documents show PNEM as a policy that valorizes teachers. For the teachers, the themes discussed during the course are necessary for expanding their competencies, but they do not represent valorization of the profession.

Keywords: Public education policy, Valorization of teachers, Professionalization of teachers.

Resumen: Este artículo se refiere a una investigación sobre el programa Pacto Nacional por el Fortalecimiento de la Enseñanza Media (PNEM), realizado por una Institución de Enseñanza Superior del sur de Brasil. Se pretende analizar la formación en documentos oficiales y cómo el PNEM es reconocido por los participantes. La investigación, de cuño cualitativo, examina documentos oficiales y analiza relatos de los participantes, publicados en libros sobre acciones realizadas, así como los relatos registrados durante un curso de extensión organizado por la institución en 2015. Los resultados muestran el PNEM, en los documentos, como política de valorización de los profesores. Para los profesores, las temáticas discutidas en el curso son necesarias para ampliar sus competencias, pero no representa valorización de la profesión.

Palabras clave: Política pública en Educación, Valorización docente, Profesionalización docente.

Introdução

Ao procurar atender às políticas públicas em educação, a formação continuada de professores da Educação Básica vem sendo, recorrentemente, destacada como forma de promover mudanças nas práticas pedagógicas. Em meio à emergência das políticas de currículo, a formação de professores e o papel da docência têm sido referidos como fundamentais para que as mudanças propostas ocorram.

No que se refere ao Ensino Médio público não profissionalizante, muitas vezes ele é alvo de críticas pelo baixo desempenho dos estudantes e por não conseguir mantê-los na escola. Dados do Ministério da Educação, Censo 2013 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), indicam que a rede estadual responde por 87% das matrículas do Ensino Médio, mostrando a responsabilidade dos estados com educação de qualidade (BRASIL, 2014a). Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (DCNEM), essa etapa da educação escolar, nas diversas formas de oferta, visa à formação humana integral do estudante baseada em propostas curriculares integradoras entre as áreas do conhecimento (BRASIL, 2012).

Nesse contexto, em 2013, foi instituído o Programa Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio (PNEM) (BRASIL, 2013a), o qual visa: o aperfeiçoamento da formação dos professores e dos coordenadores pedagógicos do Ensino Médio não profissionalizante nas áreas rurais e urbanas; a valorização dos professores pela formação; e a atualização de práticas docentes de acordo com orientações das DCNEM. O público estimado pelo Programa foi de 495.697 docentes, atendendo mais de sete milhões de alunos no Ensino Médio, em 20.317 escolas, nos 26 estados brasileiros e Distrito Federal (BRASIL, 2013a).

O PNEM, objeto deste estudo, envolve a formação em cascata de professores, em um curso de aperfeiçoamento realizado em 2014, por uma Instituição Pública de Ensino Superior (IPES) do sul do Brasil, para cerca de 2.000 professores da rede pública estadual, lotados em quatro Coordenadorias Regionais da Educação (CREs): 10ª CRE, 13ª CRE, 19ª CRE e 35ª CRE, pertencentes à região da Campanha e Fronteira Oeste Gaúcha.

O objetivo da pesquisa foi, assim, compreender, considerando o contexto de criação do PNEM, a forma como o programa é apresentado pelos documentos e como é reconhecido pelos participantes da formação. Quanto aos procedimentos técnicos, utilizou-se de pesquisa documental e de campo (GIL, 2008), sendo de natureza qualitativa com abordagem hermenêutica-fenomenológica (BICUDO, 2011) e com estratégia de Estudo de Caso (YIN, 2004), levando em conta o PNEM/Unipampa como formação continuada.

A análise buscou apontar o que “é isso que se mostra” sobre a formação continuada para professores realizada pelo PNEM, considerando, como método, a Análise Textual Discursiva (ATD), segundo Moraes e Galiazzi (2014).

O PNEM como política para a formação continuada para professores

O investimento em políticas públicas educacionais para o Ensino Médio público não profissionalizante foi articulado a um movimento de mudanças anunciadas pelo Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI), cuja proposição seria manter o jovem na escola, com bom desempenho e uma educação de qualidade (BRASIL, 2009). Nesse contexto, a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica foi apresentada, em seu Art. 2º, inciso IX, com o propósito de promover “[...] políticas permanentes de estímulo à profissionalização, à progressão na carreira, à melhoria das condições de remuneração e à garantia de condições dignas de trabalho” (BRASIL, 2016, n.p.), considerados princípios para a valorização dos profissionais da educação

Como iniciativa dessa política, foi prevista a profissionalização dos professores no Planejamento Estratégico Nacional, por meio de programas de formação continuada no contexto dos pactos nacionais de desenvolvimento da Educação Básica (BRASIL, 2016). Nessa perspectiva, o Ministério da Educação subsidiou programas e ações de formação com apoio técnico e financeiro, como foi o caso do PNEM (BRASIL, 2013a), visando promover a valorização da profissão docente pela formação continuada.

No âmbito desse Programa, foi anunciado um curso de aperfeiçoamento com carga horária de 200 horas, visando articular o redesenho curricular do ProEMI com a formação continuada, considerando o diálogo entre conhecimentos teóricos, experiências docentes e de gestão pedagógica. A iniciativa contou com a “hora-atividade” dos professores nas escolas, para compor a carga horária total do curso. Inicialmente, a formação previa três etapas a serem desenvolvidas em 2014 e 2015, mas apenas as duas etapas previstas para 2014 foram realizadas. O apoio técnico e financeiro do MEC para o desenvolvimento dos projetos de formação, pelas universidades, deu-se pelo fornecimento dos cadernos do Pacto e pela distribuição de bolsas de estudos para os participantes. Além disso, durante o ano de 2013, por meio do Proinfo (Programa Nacional de Tecnologia Educacional - programa de formação voltado ao uso didático-pedagógico das Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC), os professores efetivos da rede estadual do Rio Grande do Sul receberam um tablet, que poderia ser utilizado para acesso aos cadernos.

O modelo de formação adotado pelo PNEM previa uma formação em cascata, sendo os docentes das IPES responsáveis pela formação dos formadores regionais que, em suas respectivas coordenadorias estaduais de educação, promoveriam a formação dos orientadores de estudo que, por sua vez, formariam os professores da respectiva escola, utilizando três horas semanais para estudos individuais e mais três para os encontros coletivos. Em uma iniciativa diferenciada da proposta original, a IPES formadora ofertou o curso de aperfeiçoamento aos formadores regionais e, também, aos orientadores de estudo, mediante apoio da Secretaria Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (Seduc/RS).

As ações propostas pelo PNEM contemplaram atividades de acompanhamento aos professores das áreas do conhecimento: Linguagens, Matemática, Ciências Humanas e Ciências da Natureza, objetivando a integração curricular e a melhoria na qualidade da educação. Essas ações deveriam ser incorporadas gradativamente ao currículo para a realização de práticas pedagógicas diversificadas, ampliando o tempo dos alunos na escola, na perspectiva da educação integral, pois conforme anunciado pelas DCNEM, “[...] o Ensino Médio regular diurno, quando adequado aos seus estudantes, pode se organizar em regime de tempo integral com, no mínimo, sete horas diárias” (BRASIL, 2012, n.p.).

Em discurso de abertura do PNEM, em novembro de 2013, o então Ministro da Educação, Aloizio Mercadante, afirmou que a valorização dos professores estaria vinculada à oferta de formação continuada e que, mediante incentivo financeiro, material pedagógico e discussão sobre o currículo para articulação entre as áreas do conhecimento, o professor estaria melhorando sua formação, resultando em melhoria na qualidade no Ensino Médio, com esperado reflexo nos resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Além desse exame, deveria haver melhoria dos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), dos indicadores de proficiência em Português, Matemática e Ciências (Prova Brasil), do fluxo no Ensino Médio (para garantir a oferta de vagas para todos) e da avaliação censitária do Ensino Médio (sendo esse mais um instrumento de avaliação adicional) (OLIVA, 2013).

A Análise Textual Discursiva (ATD) como opção metodológica de análise

Este estudo trata de uma pesquisa qualitativa com pressupostos da hermenêutica/fenomenológica, sendo hermenêutica no sentido da interpretação e fenomenológica referindo a “o que é isto?”, ao fenômeno, à questão que move a investigação (BICUDO, 2011). Inicialmente, em uma atitude de pesquisa fenomenológica, interrogamos: O que é isso que se mostra sobre a formação continuada pelo PNEM/Unipampa?

O corpus selecionado para a pesquisa foi constituído por documentos oficiais relacionados ao PNEM; livros de uma coletânea publicada pela universidade formadora, contendo relatos de formadores regionais, orientadores de estudo e professores, durante o desenvolvimento do PNEM no ano de 2014 (MARTINS et al., 2015a, 2015b, 2015c, 2015d); e diário de campo da pesquisadora com registros realizados durante o curso de extensão Tertúlias Pedagógicas, pensado diante da finalização do PNEM.

Os documentos oficiais relacionados ao PNEM foram os seguintes: Política Nacional de Valorização dos Trabalhadores da Educação (BRASIL, 2005); Lei do Piso Salarial Profissional Nacional (BRASIL, 2008); Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (DCNEM) (BRASIL, 2012); Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCNEB) (BRASIL, 2013b); Documento Orientador do PNEM (BRASIL, 2014b); Documento Orientador do Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI) (BRASIL, 2013c); Documento de apresentação do PNEM (OLIVA, 2013); Plano Nacional da Educação (PNE - 2014/2024) (BRASIL, 2014c); Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de Professores (DCNFP) (BRASIL, 2015); e três dos cadernos do Pacto, da primeira etapa (I - Ensino Médio e formação humana integral; II - O Jovem como sujeito do Ensino Médio; IV - Áreas de conhecimento e integração curricular) (BRASIL, 2013d, 2013e, 2013f).

Como forma de acompanhar os resultados do PNEM, a equipe da universidade formadora organizou, no final de 2015, o curso de extensão intitulado Tertúlias Pedagógicas (40 horas), visando promover um espaço de aprofundamento, reflexão e avaliação das ações realizadas nas escolas, em função do PNEM. O curso foi organizado em dois encontros presenciais na instituição, contando com a participação dos formadores regionais, orientadores de estudo e alguns professores, responsáveis pela articulação e pela formação dos docentes nas respectivas escolas.

Os sujeitos da pesquisa são professores e coordenadores pedagógicos participantes com relatos publicados em dois dos quatro livros da coletânea e participantes do curso Tertúlias Pedagógicas, presentes na sala de formação coordenada pela pesquisadora. Do universo de quatro formadores regionais, dos 111 orientadores de estudo e dos 2.000 professores, temos um formador regional, doze orientadores de estudo e vinte e dois professores de escolas como sujeitos de pesquisa, codificados, respectivamente, por FR1, OE1 a OE12, e P1 a P22, com adição de número da CRE correspondente, ou seja, OE1/10CRE, significa orientador de estudo 1 da 10ª CRE.

Foi utilizada a ATD (MORAES; GALIAZZI, 2014) como metodologia de análise, considerado um trabalho analítico que envolve: unitarização do corpus, sistema de categorias e produção de metatexto. A análise relacionada à pesquisa optou por utilizar a pesquisa do fenômeno situado, que se dedica ao estudo disso que se mostra quando perguntamos “o que é isso que se mostra?” em um dado ato de percepção (BICUDO, 2011, p. 55).

A leitura nos documentos oficiais relativos ao PNEM e relatos dos professores participantes do PNEM/Unipampa mostrou de forma recorrente a palavra “valorização” ou algo interpretado como valorização ou desvalorização docente, em uma relação com a melhoria da qualidade do ensino. A partir daí, a questão central foi apresentada como: O que é isso que se mostra sobre o PNEM/Unipampa e a relação entre a valorização pela formação e as práticas pedagógicas dos professores?

Na ATD, a realização da unitarização envolve três fases:

Fase 1: Desmontagem ou fragmentação do texto, que consiste em extrair as unidades de significado, atribuindo, a cada uma, seu respectivo código, de modo a ser agregado ao código inicial do documento, sempre na intenção de facilitar a recorrência ao documento original.

Fase 2: Reescrita de uma unidade, que tem o propósito de tornar mais precisa a sua compreensão, pois quando são levadas à categorização, estarão isoladas do texto original e “[...] é importante que seu sentido seja claro e fiel às vozes dos sujeitos da pesquisa” (MORAES; GALIAZZI, 2014, p. 20).

Fase 3: Para cada unidade de significado, selecionamos três palavras-chave, que nos orientaram para a construção de um título/enunciado descritivo, fase que nos leva à categorização inicial. No total, foram selecionadas e reescritas 71 unidades de significado, que deveriam responder à questão central da pesquisa, sendo essas respostas constituídas em categorias iniciais reagrupadas em dez categorias intermediárias: 1) A necessidade de organização curricular; 2) Ambiente coletivo e reflexivo com trabalho integrado entre as áreas; 3) Reflexões sobre a melhoria da qualidade do Ensino Médio; 4) Fortalecimento das práticas pedagógicas; 5) Os grupos de formação na escola; 6) A formação como valorização dos saberes docentes; 7) As dificuldades enfrentadas pelos professores com relação aos salários e às condições de trabalho; 8) A resistência à formação; 9) As condições de trabalho na contramão da integração curricular; 10) A falta de publicação do trabalho dos professores. Essas categorias foram novamente agrupadas em duas categorias finais: Valorização docente pela formação: entre o dito e o efetivado; A qualidade do Ensino Médio: relações entre a formação continuada e as práticas pedagógicas.

Os metatextos, utilizando como títulos as categorias finais, foram organizados em torno de análises com suporte teórico para compreensão do que foi anunciado pelo Programa e o que foi percebido pelos professores.

Valorização docente pela formação: entre o dito e o efetivado

Na discussão dessa categoria, apresentamos, de um lado, a formação continuada nos documentos oficiais, como um discurso de valorização e de profissionalização dos professores; e, de outro lado, a realidade vivenciada pelos professores durante a formação.

Na origem da palavra1, “valorização” vem do Latim valor que significa “riqueza e valor”, de mesma origem de valere, que significa “apresentar boa saúde, ser forte”. Valorizar significa dar valor a, aumentar o valor de, reconhecer as qualidades e os méritos. A valorização docente pela formação é recorrente em políticas de formação de professores e, nos documentos oficiais relativos ao PNEM, é referida como sendo um dos objetivos do programa (BRASIL, 2013a).

No que se refere à formação continuada dos professores como profissionalização e desenvolvimento profissional, Imbernón (2009) e também Formosinho (2009) apontam que ela deveria ser permanente. Já Formosinho (2009) complementa dizendo que a formação contínua é um processo de ensino/formação, enquanto o desenvolvimento profissional seria um processo de aprendizagem/crescimento. Para esse autor, quanto maior o tempo de ensino/formação, maior a possibilidade de resultar em aprendizagem/crescimento dos professores.

Para Imbernón (2016, p. 213), “[...] esta não é uma boa época para educação”, pois, em vez de cortar benefícios do setor econômico, a crise tem implicado em decisões de cortes na educação. Para esse autor, uma formação que promova o desenvolvimento profissional docente se caracteriza como desenvolvimento pedagógico, conhecimento de si mesmo e desenvolvimento cognitivo ou teórico, mas também envolve a “[...] situação trabalhista (salário, clima de trabalho, profissionalização, etc.)” com reflexos na realização da carreira docente (IMBERNÓN, 2009, p. 77). Ainda, em qualquer transformação educativa, os professores não devem visar somente o aperfeiçoamento de seus alunos e do sistema educativo, mas também a sua formação e seu desenvolvimento profissional. O autor complementa que mesmo uma excelente política de formação não garante que seja alcançada se os demais fatores não forem assegurados.

Na perspectiva de abordar o discurso dos documentos oficiais sobre valorização docente, na análise empreendida, partimos da Política Nacional de Valorização dos Trabalhadores da Educação, criada em 2005, cujo slogan era “Recursos, Competência e Democracia: o Tripé que pode começar a salvar a dignidade dos profissionais da Educação deste País”. O documento ressalta, ainda, que “[...] a Valorização dos Trabalhadores da Educação, bandeira histórica de luta dessa categoria, perpassa três eixos interligados entre si: gestão, formação e carreira” (BRASIL, 2005, p. 4).

O documento orientador do PNEM (BRASIL, 2013b) assim como o documento com manifestações do ex-Ministro de Educação, Aloízio Mercadante Oliva, na ocasião do lançamento do programa, tratam a oferta do curso como uma forma de valorização docente, com direito a utilizar a hora-atividade para os encontros de formação na escola, além da concessão de bolsas de estudo e materiais didáticos (OLIVA, 2013). Na análise dos cadernos do PNEM (II e IV da primeira etapa), a valorização dos professores está sinalizada como sendo um dos princípios da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), a partir dos quais, as políticas públicas educacionais deveriam promover a melhoria das condições de trabalho e a valorização dos professores (BRASIL, 2013d, 2013e).

Em diferentes documentos, a valorização profissional é referida, sendo também apontada pela política de currículo prevista no ProEMI, sendo indicado, para implantação do Projeto de Redesenho Curricular (PRC), que o professor responsável tivesse carga horária integral na escola (BRASIL, 2013c), considerando ser essa uma forma de prever instrumentos de incentivo e de valorização dos profissionais da educação.

Também as DCNFP (BRASIL, 2015) ressaltam a importância da valorização do magistério e dos demais profissionais da educação, assegurando que devem estar garantidos

[...] planos de carreira e salário, com condições que assegurem jornada de trabalho com dedicação exclusiva ou tempo integral a ser cumprida em um único estabelecimento de ensino e destinação de 1/3 (um terço) da carga horária de trabalho a outras atividades pedagógicas inerentes ao exercício do magistério, a exemplo de preparação de aula, estudos, pesquisa e demais atividades formativas. (BRASIL, 2015, p. 15).

Segundo as DCNFP, os sistemas de ensino devem garantir “[...] políticas de valorização dos profissionais do magistério da educação básica, devendo ser assegurada sua formação, além de plano de carreira, de acordo com a legislação vigente” (BRASIL, 2015, p. 15).

No que se refere à valorização pela formação, ainda é afirmado que esta se daria pela formação inicial e continuada, porém, sem haver valorização da carreira, ficaria “[...] comprometida a construção de parâmetros de qualidade na educação” (BRASIL, 2005, p. 7, grifo do autor). Além do discurso da valorização pela formação, os documentos são claros ao vincularem a valorização pela formação dos professores à qualidade da educação.

As DCNEB apontam a valorização dos profissionais da educação como base do projeto nacional de educação (BRASIL, 2013b), destacando que a melhoria dos resultados de aprendizagem e da qualidade da educação implica no incremento de dispositivos na carreira do professor para melhorar a sua atuação. Esses documentos apontam que a qualidade da educação requer compromisso com a permanência e o sucesso dos estudantes na escola, sendo esse compromisso diretamente relacionado à permanência dos professores na profissão que, por sua vez, está associada à valorização da carreira docente. Para isso, considera-se, no documento, a importância de ingresso na carreira por concurso público e remuneração compatível com a jornada de trabalho, bem como a oferta de programas de formação continuada, com apoio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Professores da Educação (FUNDEB), cujo principal objetivo é promover a redistribuição dos recursos vinculados a todas as etapas da Educação Básica (BRASIL, 2013b).

Libâneo (2011) concorda com a premissa explicitada nos documentos, no que se refere à associação entre valorização pela formação e pela qualidade da educação. No entanto, o autor considera que a formação aliada a baixos salários inviabiliza o ensino de qualidade, “[...] pois dificilmente irá desenvolver o profissionalismo, que significa basicamente, compromisso e dedicação ao trabalho de ensinar a todos” (LIBÂNEO, 2011, p. 90). O autor relaciona formação docente com profissionalidade, ou seja, com o desenvolvimento de competências para o exercício da docência, mas diz que é necessário fortalecê-la com lutas sindicais por salários dignos para que “[...] a profissão ganhe mais credibilidade e dignidade profissional”, condição necessária para o desenvolvimento do profissionalismo (LIBÂNEO, 2011, p. 50).

A relação econômica com questões da educação é explicada por Libâneo (2011), quando considera que a política educacional, vinculada às Diretrizes do Banco Mundial, provoca situações ambivalentes: “Por um lado, acentua-se a necessidade de uma nova qualidade educativa implicando mudanças nos currículos [...]. Por outro, impõem-se medidas restritivas a investimentos públicos” (LIBÂNEO, 2011, p. 91), inclusive pagamento de salários.

Ainda com relação às questões econômicas, no PNE (2014-2024), a valorização dos profissionais da educação é enfatizada como Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica, sendo associada à profissionalização e às condições dignas para o exercício profissional (BRASIL, 2014c). O Plano tem, entre suas metas, a valorização dos professores e a melhoria da qualidade da educação, assumindo que seu alcance está articulado às “[...] condições objetivas, econômicas e políticas [...], bem como ao efetivo esforço da ampliação dos recursos da educação” (DOURADO, 2016, p. 20). A meta 17 do PNE prevê a valorização “[...] dos profissionais do magistério das redes públicas da educação básica de modo a equiparar até o final do sexto ano de vigência do PNE, o rendimento médio aos demais profissionais com escolaridade semelhante” (BRASIL, 2014c), sendo previsto, na meta 18, o prazo de dois anos para implementação do plano de carreira, relacionando-o à atualização do piso salarial, conforme Lei do Piso Salarial Profissional Nacional (BRASIL, 2008).

Nossa análise aponta, em muitas das percepções dos professores participantes do PNEM, a aceitação da formação como um significado de profissionalismo por parte deles e, por isso, haveria melhor receptividade pela proposta de formação do PNEM. No entanto, entendemos que a carreira, a remuneração e as condições de trabalho são questões que vão além da formação e repercutem na permanência do profissional na carreira docente. Nesse sentido, Gatti (2012) ressalta que a questão da remuneração está diretamente associada à atratividade da carreira e à permanência nela, refletindo na qualidade da educação. Concordamos com a autora quando refere que, devido às precárias condições de trabalho e aos baixos salários, os professores investem muito de seu tempo em preocupações com a sobrevivência material, deixando, em segundo plano, a sua preparação intelectual (cursos, livros, cinema, teatro). Assim sendo, esse desequilíbrio entre prioridades interfere tanto na profissionalidade quanto no profissionalismo.

A partir do dito nos documentos oficiais e nos relatos dos professores participantes do PNEM e, em meio às manifestações que ressaltaram aspectos positivos com relação ao programa, com potencialidade para melhoria da qualidade do Ensino Médio, também foi apontada a dificuldade da escola em motivar os professores para a realização da formação, sendo citado, por exemplo, o desinteresse dos professores em participar do curso de extensão Tertúlias Pedagógicas (aberto à participação dos professores das escolas). Mesmo o orientador de estudo (OE12/19CRE) tendo se esforçado para convencer os colegas a participar e “evoluir nas discussões dos temas interdisciplinaridade, avaliação e pesquisa”, não conseguiu motivá-los, provavelmente por estarem com salários atrasados2, o que demonstra a interferência negativa da remuneração sobre o senso de profissionalismo, gerando nos professores insegurança, insatisfação e desmotivação para o exercício profissional.

Embora o PNEM tenha sido anunciado como política de valorização dos professores fundamentada em princípios legais, cujas ações possibilitariam melhores resultados nas avaliações externas, não houve preocupação com a promoção de alterações efetivas nas condições reais de trabalho docente. Assim, o indicativo de valorização profissional pela utilização da hora-atividade, para encontros de formação na escola, não foi considerado suficiente por alguns participantes do PNEM, visto que “as dificuldades encontradas durante a formação se referem, principalmente, ao pouco tempo disponível para dedicação aos estudos do Pacto” (OE1/10CRE). Essa dificuldade também aparece indicada nas falas que seguem:

Deparamos com colegas cuja carga horária extensa não lhes permite um maior aproveitamento do conhecimento adquirido e sobrecarregados em seus afazeres, sem tempo para refletir sobre seu trabalho, tanto quanto gostariam. (P20/35CRE).

Os docentes atuam com seriedade e responsabilidade em suas atribuições, mas a maioria dos profissionais tem uma carga horária igual ou superior a 40 horas semanais, pois alguns não são professores efetivos (concursados) do quadro de pessoal e atuam em várias escolas. (FR1/10CRE).

Essas manifestações apontam que, mesmo atuando com profissionalismo, no caso do PNEM, a alternativa de realizar o estudo dos cadernos e o planejamento das atividades usando a hora-atividade implicou aumento da carga horária de trabalho dos professores.

A formação continuada de professores proposta pelo Pacto previa a utilização da hora-atividade para os encontros de formação na escola e realização das atividades. No entanto, a dificuldade dos professores em participar mais ativamente das atividades, com tempo para pensar e planejar mudanças, foi justificada pelos orientadores de estudo, em função de terem uma carga horária semanal de 40 horas, de lecionarem em mais de uma escola, de ocuparem parte do seu tempo para deslocamento, de acumularem funções e atividades inerentes ao trabalho docente (como correção de trabalhos e provas), entre outras razões que inviabilizam a disponibilidade de tempo necessário para os estudos. Considerando, ainda, fatores como os casos em que os salários são parcelados, tem-se um exemplo do que Libâneo (2011) aponta como motivo da não realimentação do profissionalismo, interferindo no interesse em desenvolvimento pessoal e profissional, seja pelo baixo salário, seja pela falta dele.

Assim, ao levar em conta o contexto político e econômico que envolve o reconhecimento e valorização da profissão, é possível que os professores estejam desmotivados em função de decisões políticas que desvalorizam as próprias políticas de valorização dos professores, por exemplo, o descumprimento da Lei do Piso Salarial Profissional Nacional (BRASIL, 2008), aliado às decisões de parcelamento e atraso de salários ou a dificuldade em ter garantida a hora-atividade para a realização de compromissos inerentes ao trabalho docente. Tudo isso, certamente, não invalida, mas dificulta a realização de mudanças para melhoria na educação escolar a partir de políticas de formação continuada de professores, como o PNEM.

Diante do exposto, destacamos nossa intenção, neste trabalho de pesquisa, de analisar as contribuições da formação continuada para a valorização docente, sem deixar de considerar o que é apontado pelos documentos oficiais, mas também referir que a valorização dos professores, no caso do PNEM, precisa levar em conta as condições de trabalho, carreira e salários dignos para que, assim, tenhamos reflexos positivos na melhoria da qualidade do ensino.

A qualidade do Ensino Médio: relações entre a formação continuada e as práticas pedagógicas

Ao longo do curso proporcionado pelo PNEM, em 2014, os formadores regionais, orientadores de estudo e professores participantes trabalharam com as atividades propostas nos cadernos do Pacto. Como já dito, os relatos sobre o trabalho de formação realizado na escola originaram uma coletânea de livros publicada pela universidade formadora. Além desses relatos, consideramos os registros em diário de campo durante o curso de extensão Tertúlias Pedagógicas ao final de 2015, ano seguinte à finalização do PNEM. A responsabilidade pela qualidade da educação é assumida pelos professores, conforme relatos, demonstrando sentimento de profissionalismo que ultrapassa os problemas com baixos salários e precárias condições de trabalho.

O Pacto foi considerado por parte dos participantes como oportunidade de valorização profissional, pela possibilidade de discussão das práticas, pela realização de pesquisas na escola e pela oportunidade de contribuir com a publicação dos livros. Consideram esses elementos, mesmo em um contexto econômico e social de desprestígio e desvalorização da profissão docente, como motivadores para a formação em exercício. Nesse sentido, o PNEM foi reconhecido, por um orientador de estudo, como processo de valorização profissional, que foi acontecendo ao longo do desenvolvimento do curso, uma vez que antes,

[...] parecia haver uma grande resistência com as propostas para serem desenvolvidas na escola e os professores falavam muito em valorização profissional. Percebo que o Pacto trouxe essa valorização, tendo em vista que hoje os professores são protagonistas de suas ações profissionais. (OE1/13CRE).

Conforme apontado pelos documentos relativos à política de formação instituída pelo PNEM, era esperada a compreensão de que a formação continuada promovesse a valorização dos professores, uma vez que oportunizaria um espaço coletivo de reflexão sobre a prática. Nóvoa (2009, p. 20), ao referir-se à formação de docentes em serviço, afirma que a reflexão coletiva dos professores “[...] dá sentido ao seu desenvolvimento profissional”, destacando a importância de considerar condições existentes nas escolas e nas políticas públicas relacionadas aos professores.

Deixamos claro que a reflexão em grupo é muito saudável e foi um aspecto positivo do PNEM, bem como o trabalho em grupo, o que deve ser diferenciado, conforme Imbernón, de trabalho colaborativo e em equipe. Imbernón (2016, p. 52) refere que, hoje em dia, não é possível ser professor sem trabalhar em grupo, o que envolve “[...] aspectos éticos, relacionais, grupais, atitudinais, emocionais dos professores”. Como resultados das reuniões, o orientador de estudo OE1/13CRE reconhece que “o fato de estarmos reunidos para estudar e discutir novas propostas de ensino, faz com que estejamos desconstruindo as nossas práticas e (re)significando o nosso fazer pedagógico”.

Imbernón (2016) destaca, também, a importância de os professores serem protagonistas de mudanças em prol da qualidade da educação, mas ressalta a necessidade de terem tempo para refletir sobre si mesmos, promover mudanças e conquistar melhorias trabalhistas, sociais e pedagógicas. A oportunidade de reflexão sobre si mesmo foi apontada por um orientador de estudo como uma forma de promover a valorização profissional, conforme relato durante o curso de formação pelo PNEM:

Ao finalizarmos as atividades de orientações, ficamos com a certeza de que a formação continuada é um importante dispositivo para rediscutirmos nossas ações, com vista a aprimorá-las, trocar experiências, e que não são apenas atualizações, mas também motivação e valorização do docente. (OE4/ 10CRE).

Podemos inferir que, na percepção desse orientador de estudo, a formação continuada pelo PNEM foi motivadora e promoveu sua profissionalidade por enriquecer e aperfeiçoar seu saber docente. Percebemos que o desenvolvimento da profissionalidade é associado ao aprimoramento de estratégias para o ensino, ao considerarem que os encontros de formação proporcionaram “momentos de idealização de projetos e de construção de práticas interdisciplinares, atravésde um trabalho colaborativo, visando a valorização dos saberes de cada educando” (OE5/10CRE).

Um outro orientador de estudo fez referência à potencialidade do curso de formação para fortalecer a proposta pedagógica de sua escola, dizendo que se fazia urgente uma formação continuada que contemplasse os temas abordados nos cadernos do PNEM (OE2/13CRE). Relatos como esses indicam uma avaliação positiva do PNEM pelos orientadores de estudo, o que pode ter decorrido do modelo de formação promovido pela universidade formadora que, diferentemente do proposto pelo MEC, além de promover a formação dos formadores regionais, também incluiu os orientadores de estudo (que seriam formados pelos formadores regionais) em encontros de formação na universidade. Nesse caso, a “formação em cascata” ocorreu apenas para os professores da escola que tiveram sua formação em serviço com os orientadores de estudo. Acreditamos que, ao considerarem as ações de formação como valorização docente, os orientadores de estudo estejam se referindo à valorização dos saberes e às práticas dos professores das escolas para trabalhar as atividades planejadas, a partir dos cadernos do Pacto.

Além dos orientadores de estudo, também os professores em atuação nas escolas produziram escrita de relatos. Para a maior parte desses professores, o PNEM mostra-se como curso de atualização para melhoria da prática em sala de aula, o que caracteriza profissionalidade, como indica a fala a seguir:

Há muito tempo se falava e se discutia que a escola necessitava desses espaços para repensar todas as suas dimensões, e o Pacto pelo Fortalecimento do Ensino Médio trouxe para dentro da escola esses momentos de atualização, de integração, de diálogo, de comprometimento e de resgate da valorização do professor e da Escola Pública (P1/13CRE).

Ainda, para os professores de uma escola do campo, o PNEM foi positivo, pois proporcionou “pôr em prática a proposta da politecnia, a interdisciplinaridade, a pesquisa científica, a realidade do aluno e a valorização do homem do campo” (P19/19CRE).

Percebemos, nas manifestações dos professores, reconhecimento da formação no sentido de aperfeiçoamento e de atualização das práticas, para a melhoria do seu trabalho em sala de aula, ou seja, foi potencializador da sua profissionalidade. Para Nóvoa (2009), essa melhoria na realização do trabalho docente implica em “[...] conhecimento e tato pedagógico, mas também em desenvolver a cultura profissional, o trabalho em equipe e o compromisso social” (NÓVOA, 2009, p. 44).

Os professores e os orientadores de estudo apontam contribuições do PNEM para o desenvolvimento do seu protagonismo na realização de práticas diferenciadas na escola, considerando como “fortalecimento do que já vinham fazendo antes do curso” (OE8/35CRE). Para Imbernón (2016), o protagonismo do professor é fundamental para que mudanças ocorram na escola, sendo importante que esse elemento seja incentivado na organização de cursos de formação continuada.

Sobre o protagonismo na realização das práticas, também o professor P21/19CRE se manifestou ao trabalhar com poemas em suas aulas, comentando que “o Pacto veio ao encontro do que pensava em trabalhar na escola”. Disse ainda que, a partir das ações do PNEM, teria passado a utilizar as redes sociais para registrar e socializar os textos dos alunos, o que os teria motivado a escrever mais. O relato desse professor parece atender às orientações do Caderno II da etapa I, quando se refere às transformações que as tecnologias produzem nas subjetividades dos jovens e nos processos educativos, considerando que “[...] as possibilidades que as redes sociais de internet oferecem são ambíguas, mas também potencialmente educativas” (BRASIL, 2013d, p. 29).

Junto ao protagonismo, a criatividade envolvendo as práticas pedagógicas dos professores é indicada como um dos efeitos do PNEM, mesmo os relatos apontando que “novas” organizações metodológicas serviram para legitimar e valorizar o que já vinham fazendo. A orientadora de estudo OE9/13CRE, por exemplo, sinalizou o protagonismo e a criatividade dos professores da sua escola, em função do reconhecimento e da valorização das experiências dos professores, que já trabalhavam com projetos interdisciplinares antes do Pacto.

De certo modo, os relatos apontaram mais para o reforço de práticas interdisciplinares já realizadas do que para o desenvolvimento de mudanças nas práticas, o que não invalida as ações do PNEM, mas mostra que, talvez, o programa não tenha tido o alcance esperado e anunciado por ter sido interrompido quando começava a fazer sentido aos professores.

Em relação ao desenvolvimento de práticas docentes contemplando “a pesquisa e a interdisciplinaridade” (OE10/10CRE), o orientador de estudo afirma que os alunos estariam sendo mais produtivos. Além disso, os professores estariam “mais dispostos a pensar suas práticas pedagógicas” (OE11/10CRE), especialmente em relação ao planejamento e ao desenvolvimento de projetos interdisciplinares, uma orientação do Caderno IV (etapa I) quando apresenta a organização curricular por áreas do conhecimento, tendo a interdisciplinaridade como princípio (BRASIL, 2013e).

Ainda sobre a realização de práticas, a orientadora de estudo OE9/13CRE relatou o desenvolvimento de projetos voltados à diversidade e à inclusão. Ela afirmou que os professores trabalhariam questões para o desenvolvimento de valores de solidariedade humana, consciência e respeito à diversidade, um efeito positivo por possibilitar um trabalho voltado ao ensino para o respeito à diferença, o que, para Charlot (2013), seria condição para o desenvolvimento da cidadania.

Ao avaliar os efeitos do PNEM para a formação docente, a professora P22/19CRE considera que o Pacto possibilitou o desenvolvimento de práticas diferenciadas, mas não conseguiu fazer com que os professores adquirissem o hábito de registrar e publicar as atividades realizadas e os resultados obtidos. Isso pode ser explicado pela extensa carga horária de trabalho que muitos professores acumulam para, ao final, totalizar um salário capaz de manter sua subsistência e da família.

Mesmo proporcionando espaço para reflexão coletiva, por se tratar de um curso com duração de dez meses para o estudo dos cadernos e mais dois meses para a escrita dos relatos, e considerando que a terceira etapa não ocorreu, entendemos que seria necessário um tempo maior de acompanhamento e avaliação após a formação para evidenciar os efeitos nas práticas da escola.

Como não houve previsão de continuidade da formação, o PNEM não se caracterizaria como potencializador de desenvolvimento profissional (GATTI; BARRETO, 2009). As autoras criticam cursos que sofrem descontinuidade, como o PNEM, pois os resultados de uma intervenção didática não são imediatos e, quando começam a tomar forma, são interrompidos/concluídos. Para elas, a formação de professores deve acontecer em um contínuo, ao longo da vida, sendo esse o tipo de formação que possibilitaria o desenvolvimento profissional, implicando em mudanças e reflexos no futuro das gerações.

Considerações finais

Esta pesquisa buscou mostrar o modo como a formação continuada de docentes pelo PNEM é descrita em documentos oficiais e como é reconhecida e referida pelos professores participantes, com uma possível relação entre a valorização pela formação e as práticas pedagógicas dos professores. Os documentos apresentam o PNEM como política de valorização pela formação, mas a bibliografia de referência na área destaca ser preciso considerar que o exercício da docência deve envolver condições favoráveis de trabalho e de remuneração para os profissionais docentes.

Ao estabelecermos uma relação da profissionalização pelo PNEM com valorização da profissão, percebemos que os professores reconhecem as temáticas discutidas no PNEM como profissionalidade, sendo importantes e necessárias para ampliar suas competências e qualificar seu ensino. No entanto, medidas restritivas aos investimentos públicos em educação inviabilizaram a terceira etapa de realização do Programa, fase em que haveria a avaliação das práticas da escola, durante e após a conclusão do Pacto.

O fator descontinuidade do programa e a carga horária de trabalho dos professores são fatores que comprometeram a qualidade da formação e o desenvolvimento profissional, em função da necessidade de um tempo maior para estudo, planejamento de atividades e avaliação dos resultados. Mesmo sendo apontadas essas dificuldades, durante a formação foi possível reconhecer o profissionalismo dos docentes, traduzido nas atitudes de aceitação da formação, nas reflexões em grupo sobre a prática e nos projetos de ensino, dos quais os professores se sentiram protagonistas. Os resultados mostram que os objetivos do PNEM foram atingidos em parte, uma vez que a maioria dos projetos executados nas escolas, por orientação do curso de aperfeiçoamento, estava voltada ao fortalecimento do que já era realizado na escola antes do PNEM.

O resultado da pesquisa sobre o PNEM possibilitou reconhecer a ambivalência entre a prescrição na qualidade (na formação e na educação) e a efetivação das políticas que se traduzem em desvalorização de quem deve promover a educação de qualidade. Ainda, reforçou a importância de investir em uma formação contínua, que proporcione aos professores condições de mudar sua maneira de pensar e agir, aliada a condições salariais e carga horária compatíveis com o compromisso assumido para a formação das crianças, dos jovens e dos adultos, sendo esse o sentido da valorização da profissão docente com reflexos na qualidade da educação.

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Notas

1 Disponível em: <http://origemdapalavra.com.br/consultorio-etimologico/>. Acesso em: 10 jul. 2018.
2 No estado do Rio Grande do Sul, os salários do funcionalismo público estadual têm sido atrasados ou parcelados desde 2015.


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