Dossiê: Desenvolvimento profissional docente

Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - PNAIC: a formação continuada na prática dos professores alfabetizadores

National Pact for Literacy in the Right Age - PNAIC: the continuing education in the practice of literacy teachers

Pacto Nacional por la Alfabetización en la Edad Correcta - PNAIC: la formación continuada en la práctica de los profesores alfabetizadores

Andréa de Paula Pires
Universidade Estadual do Centro-Oeste, Brazil
Marisa Schneckenberg
UNICENTRO, Brazil

Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - PNAIC: a formação continuada na prática dos professores alfabetizadores

Práxis Educativa, vol. 13, núm. 2, pp. 463-480, 2018

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 18 Junho 2017

Aprovação: 27 Novembro 2017

Resumo: Este artigo apresenta uma análise da política educacional de formação continuada oferecida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), na prática dos professores alfabetizadores da Rede Municipal de Ensino. Para a análise, optou-se, como referencial teórico-metodológico, pela abordagem do ciclo de políticas do inglês Stephen Ball e seus colaboradores: Bowe, Ball e Gold (1992). Contempla-se, também, Mainardes (2006), detendo-se, neste texto, na análise do terceiro contexto, o contexto da prática. A análise das vozes dos participantes desta pesquisa permitiu inferir que a formação continuada do PNAIC é uma ação inovadora e necessária, mas não suficiente para um impulso efetivo da qualidade da educação. Destarte, defende-se que a melhoria de tal qualidade demanda o encaminhamento de outras práticas, que vão além da formação continuada de professores.

Palavras-chave: Política educacional, Formação continuada, Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - PNAIC.

Abstract: This article presents an analysis of the education policy of continuing education offered by the National Pact for Literacy in the Right Age (called PNAIC), in the practice of the literacy teachers of the municipal school network. For the analysis, we chose, as theoretical-methodological framework, Stephen Ball and his collaborators’ approach of policy cycle: Bowe, Ball e Gold (1992). We also contemplate Mainardes (2006), focusing in this text on the analysis of the third context, the context of practice. The analysis of the voices of the participants of this research allowed to infer that the continuing education of PNAIC is an innovative and necessary action, but not sufficient for an effective promotion of the quality of education. Thus, we argue that the improvement of such quality demands the referral of other practices, which go beyond the continuing teacher education.

Keywords: Education policy, Continuing education, National Pact for Literacy in the Right Age - PNAIC.

Resumen: El artículo presenta un análisis de la política educativa de formación continuada ofrecida por el PNAIC, en la práctica de los profesores alfabetizadores de la Red Municipal de Enseñanza. Para el análisis, se optó como referencial teórico-metodológico por el abordaje del ciclo de políticas del inglés Stephen Ball y sus colaboradores: Bowe; Ball e Gold (1992). Se contempla también a Mainardes (2006), deteniéndose, en este texto, en el análisis del tercer contexto, el contexto de la práctica. El análisis de las voces de los participantes en esta investigación permitió inferir que la formación continuada del Pacto Nacional por la Alfabetización en la Edad Correcta (PNAIC) es una acción innovadora y necesaria, pero no suficiente para un impulso efectivo de la calidad de la educación. De este modo, se defiende que la mejora de tal calidad demanda del encaminamiento de otras prácticas, que van más allá de la formación continuada de profesores.

Palabras claves: Política Educativa, Formación Continuada, Pacto Nacional por la Alfabetización en la Edad Correcta - PNAIC.

Introdução

No contexto das políticas educacionais, a partir da Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em março de 1990, na Tailândia, e da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei Nº 9.394/96, a redução das taxas de analfabetismo, a universalização da Educação Básica e a formação continuada de professores para atuar na Educação Básica foram algumas das estratégias e prioridades educacionais elencadas e tomadas como primordiais para a educação brasileira.

Assim, a formação continuada de professores teve notório reconhecimento, excedendo as experiências isoladas, passando a ser assumida como política pública. A partir dessas premissas, a formação continuada passou a ser reconhecida como um direito assegurado de valorização dos profissionais da educação, estando também associada à melhoria da qualidade da educação.

Em decorrência disso, no Brasil, da mesma forma que ocorreu nos demais países da América Latina, a partir da década de 1990, houve forte influência do neoliberalismo no sistema educacional, trazendo para este âmbito os princípios da economia e as regras do mercado. A política educacional brasileira não pode ser discutida sem considerar esse contexto de luta pela redemocratização e princípios neoliberais para as políticas sociais, visto que a educação está ligada ao processo político-ideológico.

Considera-se fundamental destacar que, conforme Cury (2007), o estudo de políticas públicas não pode estar alheio, do entendimento das atribuições impostas pelo Regime Federativo, ao Distrito Federal, aos estados e aos municípios, considerando suas responsabilidades e sua natureza diferencial em matéria de políticas educacionais.

A Constituição Federal de 1988 definiu pelo chamado Federalismo1 de cooperação, sob a designação de um regime de colaboração mútua, descentralizada e com atribuições compartilhadas entre os entes federados. Nesse molde, pretende-se o equilíbrio de poderes entre a União e os estados, municípios e Distrito Federal, estabelecendo alianças de colaboração na distribuição das várias competências, mediante atividades planejadas e articuladas entre si, com o intuito de fins comuns. É, portanto, por meio desse regime federativo que são implantadas e executadas diferentes políticas públicas no Brasil. A Constituição pressupõe um sistema de repartição de atribuições e competências legislativas diferenciadas entre os integrantes do sistema federativo, assegurando a autonomia de cada ente federado.

No campo educacional, as políticas públicas chegam às instituições escolares materializadas em ações do Estado por meio de legislações, de programas, de projetos e de planos que têm o intuito de incutir no sistema de ensino metas, estratégias, indicadores e objetivos a serem alcançados e realizados pelas instituições escolares, pelos alunos e pelos docentes, ainda que não tenham participado do processo de decisão (SILVA; CUNHA, 2014, p. 2).

Baseando-se em estudo de Ball (2006), compreende-se que a política pública é uma ação proposital, com intenções a serem alcançadas. Dessa forma, a política pública organiza-se em múltiplas vozes, que disputam espaços de poder e compreende o que o governo propõe executar e o que, de fato, executa. Uma política pode ser gerada em curto, médio e em longo prazo, considerando que seus efeitos, em diversos casos, só se mostram após o tempo de gestão dessa mesma política.

Nessa direção, a política de formação continuada de professores encontra-se entre as políticas educacionais que buscam a melhoria da qualidade do ensino e, consequentemente, a inclusão social, delegando a esse processo formativo a incumbência de reverter os indicadores de desempenho dos alunos das escolas brasileiras.

Assim sendo, o objetivo deste artigo é analisar a política educacional de formação continuada oferecida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), na prática dos professores alfabetizadores da Rede Municipal de Ensino de Rio Azul - PR. O PNAIC é uma política do Ministério da Educação (MEC), a qual se configura como um compromisso assumido no ano de 2012 entre os governos Federal, Estadual e Municipal, no que se refere à alfabetização de todas as crianças até os oito anos de idade.

Diferentes argumentos têm impulsionado a implantação de políticas de formação continuada de professores alfabetizadores, especialmente programas governamentais. Dentre tais argumentos, destaca-se o grau de desempenho insatisfatório das crianças dos ciclos de alfabetização, que tem sido constatado pelos sistemas nacionais de avaliação e o discurso de que a formação continuada pode colaborar para resolver ou abrandar os entraves em relação ao baixo desempenho das crianças, com vistas à qualidade do ensino.

Nesse contexto, o PNAIC institui-se como compromisso formal assumido pelos entes federados, os quais dedicam seus esforços para incrementar os índices educacionais e o alcance da melhoria da qualidade do ensino no país. Muitos são os discursos promissores acerca dessa política, mas, na prática, há condições de fato para cumprir tal compromisso? Qual o posicionamento dos professores e que compromissos assumem? Como se dá na prática essa política e quais as oportunidades de aperfeiçoamento na prática docente?

Para tanto, busca-se compreender na prática as recriações e as reinterpretações e os processos de disputas e contradições presentes na formação continuada do PNAIC, envolvendo a pesquisa empírica no município de Rio Azul/PR, tendo como participantes os orientadores de estudo do PNAIC e professores alfabetizadores que participaram da formação continuada dessa política nos anos de 2013 e 2014. O contato com os participantes da pesquisa deu-se por meio de entrevista semiestruturada, partindo de onze questões abertas, as quais foram consideradas primordiais para o atendimento dos objetivos deste estudo.

Na análise desse contexto, verificou-se que vinte e quatro professores alfabetizadores participaram da formação continuada do PNAIC nos anos de 2013 e 2014, porém, devido ao sucinto tempo para a realização da pesquisa, optou-se em reduzir o número de participantes para a pesquisa empírica, totalizando, assim, nove professores alfabetizadores, acreditando que, com tal redução, seja possível alcançar um trabalho mais consistente e significativo.

Esclarece-se que os critérios adotados para a escolha dos professores participantes da pesquisa foram: a) professores com formação em Licenciatura Plena em Pedagogia; b) professores com maior tempo de serviço como professor alfabetizador. Para a escolha dos orientadores de estudo, não se fez necessário o estabelecimento de critérios, em razão de o município possuir apenas dois orientadores de estudos do PNAIC.

Como referencial teórico-metodológico, optou-se pela abordagem do ciclo de políticas do inglês Stephen Ball e seus colaboradores: Bowe, Ball e Gold (1992). Contempla-se, também, Mainardes (2006), detendo-se, neste texto, na análise do terceiro contexto, o contexto da prática. Vale destacar que a abordagem do ciclo de políticas propõe um ciclo contínuo para o estudo e a análise de políticas, constituído, de início, por três contextos: contexto da influência, contexto do texto ou da produção do texto e contexto da prática. Esses contextos contêm uma relação recíproca, não apresentando uma perspectiva temporal ou sequencial, como também não são estágios lineares.

No contexto de influência, as políticas públicas são iniciadas e os discursos são construídos, entrando em embates. Tais embates acontecem em diferentes áreas para o predomínio da sua influência na definição (MAINARDES, 2006). O segundo contexto da abordagem do ciclo de políticas contempla a produção do texto, que diz respeito às condições nas quais os textos políticos são elaborados, compreende o resultado dos embates e dos acordos políticos firmados para que uma política pública seja desenvolvida. É quando os textos se manifestam em forma de políticas, como, por exemplo: os textos oficiais, legais, políticos, vídeos oficiais etc. (MAINARDES, 2006). O contexto da prática é o terceiro contexto, no qual a política é compreendida como uma arena de batalhas e contradições, que envolve diferentes leituras dos textos voltados à vida prática, ou seja, como a política é encarada pela pluralidade de leitores (MAINARDES, 2006).

Ressalta-se que, para a identificação das respostas emitidas pelos orientadores de estudo, adotou-se como critério a numeração dos respondentes, sendo OE1 e OE2; da mesma forma para os professores alfabetizadores, ficando: PA1, PA2, PA3, PA4, PA5, PA6, PA7, PA8 e PA9.

A formação continuada do PNAIC na prática e o aperfeiçoamento do professor alfabetizador: relatos e vivências docentes

De acordo com Mainardes (2006, p. 53), o contexto da prática "[...] é onde a política está sujeita à interpretação e recriação”. Esse espaço não é neutro, considerando que, nesse contexto, estão as instituições escolares e os profissionais que não são receptores ingênuos das argumentações, pois trazem valores, conceitos, histórias e experiências.

Nessa perspectiva, verificou-se que os participantes da pesquisa possuem um entendimento consolidado frente à compreensão acerca do PNAIC e quanto aos objetivos dessa política, os quais entendem como um compromisso assumido entre Distrito Federal, estados e municípios em atingir ao objetivo frente à alfabetização das crianças das escolas públicas brasileiras.

Para tanto, no que tange às condições para cumprir tal objetivo, os entrevistados destacaram que o município está cumprindo parcialmente, entendendo que a formação continuada é um dos mecanismos para se atingir a determinado acordo, não é o único, visto que as escolas necessitam de melhores investimentos em infraestrutura, valorização docente, condições plausíveis de trabalho e o fortalecimento de políticas educacionais voltadas à inclusão.

Apontou-se ainda o fato da diversidade de alunos em sala de aula, especificamente as crianças que apresentam dificuldade de aprendizagem, o que pode impedir que o processo de alfabetização seja atingido por todas as crianças até o final do terceiro ano do Ensino Fundamental. O documento Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa - O Brasil do futuro com o começo que ele merece (BRASIL,2012a) reconhece essa diversidade de alunos presente nas salas de aulas.

Considerando que a avaliação é parte constituinte do processo pedagógico e que, com base nela, é possível entender melhor quais são os conhecimentos das crianças e suas dificuldades, podem ser desenvolvidas estratégias diversas em sala de aula em que as crianças sejam atendidas de formas diferenciadas. Os sistemas de ensino devem se organizar para lançar mão de estratégias de acompanhamento especial às crianças que, em relação aos objetivos esperados, estejam precisando de apoio pedagógico mais intenso e diferenciado [...]. (BRASIL, 2012a, p. 35).

Desse modo, faz-se importante a reflexão acerca dos direitos que todos têm ao conhecimento, implicando o preparo dos docentes para atuarem em espaços educacionais diversificados, tendo a possibilidade de ensinar a todos os estudantes mediante o respeito às suas necessidades e, assim, a efetivação da igualdade de acesso ao saber.

Frente a tal questão, constata-se que o educar na diversidade se constitui como um desafio, conhecer cada aluno, com suas potencialidades, experiências anteriores, desejos e necessidades, identificando nesse processo as necessidades de aprendizagem específicas.

Todos os entrevistados reconhecem o PNAIC como uma política educacional importante e indispensável, que acrescenta e enriquece o trabalho docente. No entanto, quando questionados a respeito dos discursos promissores dos gestores federais frente às políticas educacionais, enfatizam que:

Desconhecem a realidade dos municípios, talvez eles nem imaginam como é a realidade das escolas e falam coisas que talvez nem venha ser alcançado. É preciso ter conhecimento das realidades mesmo que regionais, pois juntam todos os municípios como se fossem iguais, cada um, como cada região tem suas demandas e dificuldades, falta esse conhecimento para os formuladores das políticas. (OE1).

PA7 destaca que,

[...] na teoria, os discursos são promissores e bonitos, mas é na prática que sentimos a realidade e as dificuldades, principalmente nós que trabalhamos em escola multisseriada. (PA7).

Das quatro professoras alfabetizadoras entrevistadas que atuam em escolas multisseriadas, todas destacaram a dificuldade em organizar o trabalho pedagógico, pois o professor trabalha com diferentes turmas ao mesmo tempo, e tal organização constitui-se como um desafio para o professor. O docente precisa gerenciar seu tempo de modo a atender a todos os níveis, estando atento para que, entre um e outro atendimento, um grupo de alunos de uma determinada turma não fique sem atividade ou sem acompanhamento. PA8 destaca que:

O planejamento das aulas precisa ser diferenciado se comparado a de um professor que atua em sala seriada, pois o docente que trabalha com turmas distintas terá que planejar diferentes atividades, conforme a quantidade de turmas e alunos que irá atender. Com isso, haverá um aumento no número de planejamentos que o professor realizará, podendo muitas vezes não conseguir desenvolver uma prática pedagógica condizente com a necessidade de todos os alunos. (PA8).

Tal preocupação dá-se tendo em vista que isso pode colocar em risco o compromisso assumido frente ao PNAIC, uma inquietação que ficou evidente no relato dos professores que atuam em escolas multisseriadas.

Há uma disparidade entre a realidade vivenciada e o que é esperado pelos entes federados, considerando a realidade local, a desvalorização do profissional docente, a escassez de recursos oferecidos ou até mesmo mal aplicados e a grade curricular, considerando que existem escolas multisseriadas, o que exige muito mais do professor, o que pode comprometer a qualidade do ensino e, consequentemente, a alfabetização de todas as crianças até o final do terceiro ano do Ensino Fundamental. (PA9).

Da mesma forma, verifica-se, na fala dos professores que atuam na zona urbana, que os discursos dos gestores federais não condizem com a realidade vivenciada pelos municípios:

[...] os discursos são promissores e há uma luta pela alfabetização de todas as crianças, mas a realidade poderia ser melhorada com maior valorização docente e melhores condições de trabalho. (PA9).

Com base em tais discursos, pode-se observar a insatisfação, não em relação à política de formação continuada do PNAIC, mas de alguns aspectos relacionados à realidade educacional, o que pode levar a pensar a respeito de tais questões, como fruto das reformas educacionais, as quais acompanharam uma tendência mundial da necessidade de se aferir resultados dos sistemas educativos mediante a capacidade de resposta da escola aos objetivos e às metas afixados a ela.

Ao falar-se de aprendizagem, fala-se, inevitavelmente, do professor (NÓVOA, 2009). Pôde-se constatar que há muitas declarações de que a aprendizagem dos estudantes não respondia às expectativas colocadas pelo sistema educacional; consequentemente, o olhar volta-se para o docente - o que supõe que, para ter uma boa prática, os professores devem apresentar uma qualificação compatível com as exigências de suas atribuições; para tanto, precisam de formação permanente.

Diante disso, o desenvolvimento profissional docente aparece como indiscutível na busca pela qualificação do docente e pela qualidade do ensino. Essa relação direta entre a qualidade do trabalho do professor e o sucesso escolar dos alunos faz com que as políticas voltadas ao desenvolvimento profissional docente concentrassem suas ações, sobretudo, na formação continuada. Entretanto, se, por um lado, a formação continuada é considerada indispensável para o desenvolvimento do professor; por outro, a centralidade das ações nessa perspectiva vem esquecendo outros princípios tão indispensáveis.

Por esse viés, Oliveira (2010) destaca que, apesar de à formação continuada ser atribuído grande peso, a noção de desenvolvimento profissional deve envolver outros elementos de grande relevância, como o salário do professor, as condições de trabalho2 e o progresso na carreira. A remuneração do professor também representa um aspecto relevante do perfil profissional nas redes de ensino, o que demonstra, de certo modo, a valorização profissional, ou seja, o reconhecimento pelo trabalho exercido pelo docente.

Fica evidente, nas vozes dos participantes desta pesquisa, que o PNAIC é uma política necessária e importante, mas os entes federados precisam olhar a realidade das regiões, dos estados e dos municípios, pois há uma divergência entre o que é propagado e a realidade vivenciada nos municípios.

Oliveira (2010) oferece amparo quando afirma que as políticas educacionais de desenvolvimento profissional docente vêm carregadas de uma grande contradição em seus propósitos: de um lado, exigem dos professores a atualização, disposição e adaptação para responderem e adequarem-se às mudanças que vêm sendo implantadas, bem como um maior desenvolvimento profissional; por outro, não lhes proporcionam as condições de trabalho necessárias para que isso seja efetivado.

Frente às questões discutidas, os professores alfabetizadores entrevistados reiteraram com precisão a questão da valorização docente e das melhores condições de trabalho. Ao serem questionados acerca das aspirações que têm com relação ao seu trabalho, ao futuro e à sua carreira docente, destacaram que almejam continuar estudando e participando de formação continuada para que exerçam a profissão com dedicação e comprometimento. Eles afirmaram:

Eu quero ser mais valorizada profissionalmente. (PA6).

Eu espero valorização docente, melhores condições para que eu possa exercer minha profissão. Espero ainda que os profissionais da educação, principalmente os professores, sejam uma classe mais unida na luta pelos seus direitos e reconhecimento docente. (PA7).

Estou exercendo minha profissão há 9 anos e gostaria de trabalhar com apenas uma turma, pois sempre trabalho em salas multisseriadas, às vezes me sinto impotente, parece que não rende como deveria, isso me deixa frustrada. Contando ainda com o horário cansativo, fico 13 horas fora de casa. Trabalho em duas escolas localizadas no campo e em salas multisseriadas em ambas as escolas, isso é valorização docente? Isso é ter boas condições de trabalho? Almejo que os professores sejam mais valorizados, não somente em salário, mas como seres humanos que enfrentam muitas dificuldades na escola e, na maioria das vezes, não são reconhecidos. (PA9).

Dos professores alfabetizadores entrevistados, todos possuem dois padrões de trabalho, alguns, na mesma escola, e outros em escolas distintas. Partindo dos relatos anteriores, pode-se observar que a jornada de trabalho do professor é uma questão que inquieta o docente, pois se verifica uma carga horária intensa, o que pode revelar mais uma vez a precariedade das condições de trabalho e de vida desses profissionais, podendo, muitas vezes, ultrapassar quarenta horas semanais de dedicação ao trabalho. Caldas (2007, p. 82) destaca que essa intensa jornada de trabalho pode se dar "[...] como consequência do rebaixamento dos salários, os professores vão se obrigando a aumentar o número de aulas dadas, triplicando a jornada de trabalho, atuando em diversas escolas”.

Deve-se enfatizar que o trabalho docente é uma atividade com atributos muito específicos, os quais não são apresentados por outras profissões, como a questão frente à necessidade de se trabalhar várias horas semanais, além daquelas dedicadas ao ensino em sala de aula, destinando, dessa forma, um tempo considerável para o planejamento de aulas, correção de atividades dos alunos, dentre outras. Isso significa que o tempo dedicado pelos docentes para a realização das atividades da docência varia muito e, por isso, não se pode aferir exatamente quantas horas de trabalho efetivo demanda a jornada docente, além das horas dedicadas em sala de aula.

Ademais, a docência também é uma atividade que implica grande envolvimento emocional e desgaste físico e intelectual, apresentando-se como um trabalho de elevado grau de exigência. Sob esse prisma, Duarte (2008) aponta que a jornada de trabalho do professor é intensa e extensa. Intensa pelo grau de exigência da atividade desenvolvida e extensa porque o número de professores que possuem carga horária de trabalho com quarenta horas ou mais é bastante significativo.

Quando essa questão é pensada, na visão do professor que trabalha com turmas multisseriadas, o trabalho torna-se ainda mais desafiador, pois, como nessa realidade geralmente um único professor trabalha com várias turmas ao mesmo tempo, o planejamento e a organização pedagógica tornam-se desafiadores e, na maioria das vezes, exaustivos. Desse modo, a classe multisseriada constitui-se como uma especificidade de uma realidade eminentemente do campo, a qual se dá em diferentes países como uma resposta no que se refere ao acesso da população do espaço rural à educação, já que, muitas vezes, o baixo número de alunos inviabiliza a organização seriada.

Por esse viés, valendo-se das considerações anteriores e dos relatos dos professores alfabetizadores, pode-se entender que a valorização docente e a jornada de trabalho do professor apresentam-se fragilizadas, visto que, por um lado, os entes federados discursam a respeito da valorização da educação e do trabalho docente; por outro, sobrecarregam e tornam precário o trabalho dos profissionais.

Para melhor conhecer como a política do PNAIC foi estabelecida no município, foram questionados os orientadores de estudo acerca do número de professores que participaram da formação continuada do PNAIC nos anos de 2013-2014 e como a política de formação continuada foi recebida pelos professores.

Eles destacaram que, no ano de 2013, participaram trinta e sete professores e, em 2014, foram trinta e quatro, contando ainda com professores ouvintes, aqueles docentes que não recebiam a bolsa de estudos por não estarem na base de dados do Censo escolar do ano de 2012, ou seja, não atuavam em 2012 no 1º ciclo dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Contudo, nos anos de 2013 ou 2014, exerciam a docência nessa modalidade de ensino, o que permitiu assim participar da formação continuada, mas como ouvintes. Professor ouvinte para o PNAIC é aquele professor que participa da formação continuada, mas não é contemplado com bolsa de estudo e não recebe certificação, em razão dos critérios estipulados pelo Censo escolar acima destacados. É relevante destacar que, nesse número de participantes, foram apenas vinte e quatro professores alfabetizadores que participaram consecutivamente nos anos de 2013 e 2014, dos quais nove participaram desta pesquisa. Todos os participantes recebiam bolsa de estudos.

As orientadoras de estudo foram unânimes em destacar que a formação continuada do PNAIC foi muito bem recebida pelos professores alfabetizadores, visto a necessidade que sentem em participar de formação contínua e assim buscar a melhoria da prática pedagógica. No entanto, a principal reclamação dos professores alfabetizadores frente à participação na formação continuada deu-se em razão dos critérios adotados pelo MEC para a seleção dos participantes, por causa da necessidade de o professor constar no Censo do ano de 2012 para a permissão em participar e receber a bolsa de estudos. OE1 e OE2 destacam que:

De início teve bastantes críticas, eles não entendiam e não queriam aceitar que só os professores do 1º ciclo que estavam no censo de 2012 podiam participar recebendo bolsa. As reclamações se referiam a isso, pois queriam que todos os professores participassem, mesmo aqueles que segundo o MEC não tinham direito à bolsa, pois queriam ter os mesmos direitos dos professores bolsistas. A crítica veio por não poder participar como bolsista. (OE1).

Houve reclamações sobre os critérios adotados para participar da formação como professor bolsista, não foi reclamação por participar do curso, mas sim referente à bolsa de estudos. Para tanto, se teve vários professores ouvintes, que mesmo não recebendo a bolsa fizeram a formação e aplicaram todas as atividades em sala de aula. (OE2).

Verifica-se, dessa forma, que os professores estavam motivados a participar da formação continuada do PNAIC, e que, no decorrer das entrevistas, percebeu-se que concebem esse espaço de participação como oportunidade de ampliação de conhecimentos.

Para a prática da formação continuada do PNAIC, o MEC disponibiliza material didático para o trabalho nas formações com os professores alfabetizadores, material considerado de boa qualidade pelas orientadoras de estudos e pelos professores alfabetizadores, trazendo "[...] bons textos, mas que, muitas vezes não condizia com a nossa realidade, o que exigia que o orientador de estudo estivesse adaptando” (OE1).

Da mesma forma, OE2 destaca que "[...] material muito bom, rico em sugestões de atividades e materiais, porém, muitas vezes, não condizia com a realidade do município, não foi pensado nas realidades dos estados e regiões”. Frente a essa questão, a OE1, quando indagada acerca de quais aspectos do material didático não condiziam com a realidade, destaca:

Uma parte muito boa dos cadernos era a parte das atividades que traziam relatos de experiência, mas geralmente tais relatos eram relacionados às experiências do Nordeste do Brasil, a qual é uma realidade bem diferente da nossa, então a gente utilizava tais relatos para fazer uma comparação com a nossa realidade; assim, fazíamos algumas adaptações. (OE1).

As questões pontuadas pelos professores alfabetizadores no tocante ao material didático utilizado nas formações são positivas, como já mencionadas anteriormente; entretanto, faz-se necessário elencar alguns depoimentos.

Muito bom, ajudou bastante a refletir sobre minha prática pedagógica. Eu avalio um material excelente para nós professores. (PA4).

Muito bom, novas metodologias, novas ideias que ajudam na nossa prática cotidiana. (OE7).

Avalio o material didático utilizado nas formações como uma ferramenta importante, pois é também nos cursos de formação continuada que confeccionamos e levamos para sala de aula diferentes materiais. Juntamente às sugestões que já vêm sendo oferecidas enriquecemos ainda mais o nosso trabalho. (PA5).

Apesar de considerarem o material didático muito bom para uso na prática docente, alguns professores alfabetizadores destacaram a insuficiência de material para todos os cursistas e o atraso no envio pelo MEC para a realização das formações. No ano de 2014, o município precisou reproduzir os materiais que estavam disponibilizados no site do PNAIC, para que as orientadoras de estudo pudessem realizar os encontros de formação. O atraso na entrega e o pouco acesso docente ao material foram, portanto, as características negativas do material didático do PNAIC.

Outra questão enfatizada nesta pesquisa foi acerca dos possíveis resultados da formação continuada do PNAIC na prática pedagógica e na aprendizagem dos alunos. Pôde-se verificar que os participantes foram unânimes em enfatizar que, por meio da formação continuada dessa política, puderam contar com contribuições significativas de formação como docentes e com um espaço de aperfeiçoamento da prática pedagógica, como também contribuições na aprendizagem dos alunos.

A OE2 destacou que a formação continuada do PNAIC apresenta bons resultados na prática dos professores participantes, o que

[...] deu ânimo no trabalho. Os professores traziam relatos de atividades realizadas em sala a partir das temáticas trabalhadas no curso. Foram muitas atividades práticas diferenciadas e aplicadas em sala de aula. Percebia-se que elas estavam motivadas e os alunos também. Foi uma injeção de ânimo para o desenvolvimento do trabalho. (OE2).

Os professores alfabetizadores evidenciaram que os resultados da formação continuada do PNAIC foram positivos:

A formação foi muito boa, as atividades foram bem aceitas pelos alunos e refletiu no aprendizado deles. Para mim foi uma atividade nova, novos conhecimentos e diferentes metodologias para apresentar o conhecimento às crianças. (PA2).

Perceberam-se algumas mudanças positivas em nós professores, como o hábito em trabalhar com jogos em sala de aula, a gente sabia da importância, trabalhava, mas com pouco destaque. Após a formação, eu utilizo mais jogos para a aprendizagem dos meus alunos, nota-se que há um melhor rendimento. (PA8).

Por meio dos relatos dos professores, constata-se que a formação continuada do PNAIC oportunizou um melhoramento na prática pedagógica dos professores. Essa formação conquistou espaço por permitir uma aproximação entre os processos de mudança que se almejam promover no âmbito da escola e a reflexão proposital das repercussões dessas mudanças.

Acredita-se que a formação continuada, concebida como possibilidade de mudança das práticas docentes e da escola, oportuniza a experiência do diferente, do novo, a partir das vivências profissionais que acontecem nesse espaço e tempo, indicando, assim, um processo de permanente mudança e intervenção na realidade em que se insere e impera a formação.

Ao corroborar com o exposto, Imbernón (2009) sublinha:

Somente quando o professor vê que o novo programa formativo ou as possíveis mudanças da prática que lhes é oferecida repercutem na aprendizagem de seus estudantes, mudam suas crenças e atitudes de forma significativa e supõe um benefício para o alunato e a forma de exercer a docência, então, abre-se a forma de ver a formação não tanto como uma "agressão” externa, mas como um benefício individual e coletivo. (IMBERNÓN, 2009, p. 27).

O professor em processo de formação tem a oportunidade de estabelecer e redimensionar a relação que estabelece entre o campo teórico e os fatores que permeiam a construção do seu trabalho, ou seja, os alunos, a escola, o currículo, as políticas educacionais, etc. "Refletir sobre a prática educacional, mediante a análise da realidade do ensino, da leitura pausada, da troca de experiências. Estruturas que tornem possível a compreensão, a interpretação e a intervenção sobre a prática” (IMBERNÓN, 2010, p. 43).

É relevante trazer para essa discussão algumas dificuldades encontradas pelos orientadores de estudo e professores alfabetizadores quando de sua participação na formação continuada do PNAIC. As orientadoras de estudos destacaram que a maior dificuldade foi trabalhar as temáticas dos cadernos nos encontros de formação, conforme relato da OE1:

Como já comentei anteriormente, o material didático utilizado nos encontros não condizia com a nossa realidade, o que vinha a dificultar bastante o trabalho, o que de certo ponto era bom, pois podíamos fazer análise e comparação da realidade de outros estados e municípios com o nosso, mas dificultava o processo de preparação dos encontros. (OE1).

A partir da explanação da orientadora, pode-se destacar que os materiais didáticos oferecidos pelo MEC, ainda hoje, possuem um conteúdo unificado com textos específicos, que, muitas vezes, não atendem às emergências locais de todos os estados, municípios e regiões, o que pode causar entraves para o desenvolvimento efetivo de um trabalho pedagógico com enfoque nas diferenças regionais.

Tal situação acaba por exigir cada vez mais dos profissionais da educação um esforço, no sentido de adaptar os conteúdos à realidade da escola e dos alunos, buscando uma aproximação do ensino-aprendizagem à visão de mundo de cada professor, como também a visão de mundo que cada aluno traz ao ingressar na escola, adaptando assim às especificidades do local. Nesse sentido, evidencia-se que as

[...] políticas, principalmente educacionais, são pensadas e em seguida escritas com relação às melhores escolas possíveis (salas de aula, universidades, faculdades), com pouco reconhecimento de variações de contexto, em recursos ou em capacidades locais. (BALL, 2007apudMAINARDES; MARCONDES, 2009, p. 305-306).

Sabe-se das dificuldades que isso acarreta; todavia, mais importante ainda é ter a compreensão dos desafios postos, como o caso do material didático do PNAIC. O profissional necessita possuir habilidades e saberes necessários para superar tais limitações, que, por sua natureza genérica, por vezes, não atendem às necessidades locais; é uma importante tarefa acrescentar, adaptar os conteúdos, para assim dar maior sentido aos materiais oferecidos pelos órgãos gestores de uma política.

Quanto às dificuldades encontradas pelos professores alfabetizadores, cinco destacaram que não encontraram problemas para participar da formação; os demais, em um total de quatro professores, elencaram como dificuldade: a falta de tempo destinado para a realização das atividades; a confecção de material didático e os dias escolhidos para a realização dos encontros, conforme será explicitado a seguir.

A maior dificuldade que encontrei foi a falta de tempo porque tinha material para confeccionar e o número de materiais era significativo para posteriormente trabalhar em sala. Nos encontros eles davam um exemplo, mas para aplicar em sala de aula precisávamos confeccionar mais, e o tempo que temos é curto, pois trabalho em 2 turnos. (PA1).

A dificuldade encontrada foi em relação aos horários, tanto para confeccionar o material didático para uso em sala, como também os horários para participar dos encontros formativos, pois precisávamos deixar a família para cumprir com o compromisso assumido. Poderia ser realizado os encontros de formação nos dias de semana, no horário de trabalho, dividir o tempo entre estar em sala de aula e o de participar presencialmente dos encontros de formação desta política. (PA3).

Diante desses relatos, foi indagado aos participantes desta pesquisa acerca da questão da autonomia e das oportunidades em discutir e expressar dificuldades, opiniões, insatisfações e dúvidas com os gestores dessa política. Os orientadores de estudo destacaram que existia essa autonomia no âmbito municipal, em que os professores, juntamente à coordenação local e aos orientadores de estudo, podiam discutir e opinar, tirar dúvidas e elencar as dificuldades que estavam encontrando. Os orientadores de estudo buscavam tirar suas dúvidas junto à coordenação do PNAIC da Instituição de Ensino Superior (IES), nos encontros, por telefone ou via e-mail.

Todos os professores alfabetizadores destacaram que no âmbito Estadual e Federal o professor não tem oportunidade para discutir e dar opiniões, muito menos participar da formulação de uma política educacional. Essa autonomia dá-se apenas no âmbito municipal, segundo o relato da PA1. Para PA2, PA9 e PA6:

Sim, tivemos autonomia, houve discussões, cada um participou e contribuiu junto ao município sobre diferentes aspectos no decorrer desta formação que passamos. (PA2).

Em nível Estadual e Federal não temos acesso, apenas em nível municipal. (PA 9).

Pudemos, no município, junto à coordenação local e orientadores de estudos, defender, opinar e discutir sobre a política de formação continuada no PNAIC, mas, com os gestores estaduais e federais, nós professores não temos oportunidades em manifestar nosso ponto de vista e muito menos participar da elaboração das políticas. (PA6).

Os professores alfabetizadores foram unânimes em destacar que, no âmbito municipal, teve-se autonomia em poder expressar-se, discutir e dar opiniões referentes ao processo de formação pelo qual estavam passando; mas três professores destacaram que, apesar de haver essa autonomia em nível municipal, nem sempre tais opiniões e ideias eram aceitas pelos gestores, demonstrando certa insatisfação frente a tal fato.

Conforme o exposto, verifica-se que a autonomia e a participação do professor na criação e na execução de uma política estão muitas vezes limitadas, ocorrendo apenas no âmbito do município. Isso leva a refletir a respeito da realidade educacional do país, pois discutir educação e, muitas vezes, não reconhecer a importância da participação do professor nesse processo é como não reconhecer a importância no processo de ensino e aprendizagem.

Pode-se observar que, nas últimas décadas, a centralidade e a importância do docente para a qualidade de ensino e para a melhoria dos índices educacionais e, consequentemente, para o desenvolvimento do país, têm sido enfatizadas por diferentes setores da sociedade e pelos organismos internacionais. Destarte, os professores ainda se encontram distantes de serem ouvidos pelos entes federados, pois, embora conheçam de perto a realidade, as demandas e os desafios da área, seus conhecimentos não são muitas vezes considerados pelos formuladores de políticas educacionais.

Entende-se, desse modo, que os professores não têm voz ativa na formulação das políticas educacionais, e a cada nova política educacional proposta o professor não tem oportunidade de participar e opinar a respeito do tema. Gestores falam; economistas, historiadores, especialistas de outras áreas trazem suas contribuições e opiniões, mas os professores não são ouvidos, não têm oportunidades de apresentar suas demandas, seus conhecimentos e seus desafios enfrentados no cotidiano educacional.

Concorda-se com Ball (2006) quando enfatiza que as políticas não são somente implementadas, mas interpretadas e materializadas de diferentes maneiras, em razão de as políticas serem elaboradas pelos gestores sem, na maioria das vezes, contar com a participação dos professores, o que leva então a política a ser colocada em prática de diferentes maneiras, pois elas são interpretadas e traduzidas para ambientes específicos, partindo de capacidades específicas.

Frente à prática da formação continuada no município de Rio Azul- PR, nos anos de 2013 e 2014, foi pesquisado, também, quanto ao apoio recebido para a realização dos encontros de estudos. Os orientadores de estudo destacaram que:

Pudemos contar com o apoio do município, em nível Federal e Estadual não tivemos essa mesma sorte. Do município não tenho nenhuma reclamação, pois tudo que solicitei foi atendido. (OE1).

Recebemos apoio, claro que do município recebemos um apoio maior, no município não tivemos nenhum problema frente a isso. Do MEC não foi um apoio tão efetivo, recebemos a primeira remessa de cadernos para trabalharmos na formação. Já na segunda tivemos que imprimir, não contamos com muito apoio. A IES também nos apoiou, tínhamos o respaldo dela, muitas vezes não era suficiente, mas vejo que dentro das suas limitações fizeram o que puderam. (OE2).

No decorrer das entrevistas, constatou-se que o MEC não ofereceu suporte necessário para a prática da formação continuada no município, principalmente no que tange à falta de algumas informações acerca da operacionalização da formação continuada e no atraso no recebimento de materiais didáticos, o que gerou certo desconforto entre orientadores de estudo, coordenador municipal e professores alfabetizadores, que, muitas vezes, tiveram de iniciar a formação sem os cadernos de estudo. Dessa forma, para minimizar a falta de tais materiais, a Secretaria Municipal de Educação providenciou cópias aos professores cursistas.

De acordo com as discussões das políticas educacionais, cabe destacar que o PNAIC, por meio da Portaria Nº 867/12 (BRASIL, 2012b), estabelece a avaliação do processo de aprendizagem das crianças, e de acordo com essa questão, os participantes da pesquisa tiveram a oportunidade de apresentar suas opiniões acerca do processo de avaliações sistemáticas implantadas pelo Governo Federal, destacando que:

Não concordo com esse tipo de avaliação, padroniza o modelo de avaliação, não leva em consideração a pluralidade de alunos numa sala de aula. Fala-se tanto em respeitar o aluno, respeitar suas dificuldades, mas essas avaliações não estão respeitando, pois se cria um padrão para o Brasil todo e não olham a realidade da sala de aula, dos municípios, dos estados, pois cada um tem suas particularidades. Esse tipo de avaliação deixa muito a desejar e penso que isso está frustrando bastante os professores, porque eles sabem que na sua turma tem alunos com dificuldades de aprendizagem, que frequentam salas de recursos, salas de apoio, mas chega a prova igual para todos. (OE1).

Nessa mesma perspectiva, seguem os discursos de alguns professores alfabetizadores que enfatizam:

Não concordo com tais avaliações, pois há uma padronização. A Provinha Brasil é difícil para minha turma, tem conteúdos que a gente trabalha no finalzinho do ano e nessa avaliação esse conteúdo cai no começo do ano, isso atrapalha. (PA1).

Não deveria ser feita prova igual para todos os alunos, na sala de aula temos alunos diferentes, com dificuldades de aprendizagem. Muito se fala em inclusão e adaptação curricular, mas o que estão fazendo é excluir, pois as provas são padronizadas, vem igual para todos os alunos. Não concordo com este tipo de avaliação, concordo que avaliar é bom, mas não por meio da padronização. (PA2).

Vale destacar que apenas uma professora alfabetizadora diz concordar com tais avaliações, alegando que são bem elaboradas e que é importante medir a qualidade de ensino.

Mediante o exposto, fica patente a insatisfação dos participantes desta pesquisa frente às avaliações implantadas pelo Governo Federal, como a Provinha Brasil e a Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA), tendo, como principal razão dessa insatisfação, a falta de respeito às diferenças individuais dos alunos e das regiões e dos estados, ou seja, a padronização em âmbito nacional.

Souza (2003) enfatiza que o MEC entende esse sistema avaliativo como ferramenta de gestão escolar, visto que poderia indicar as falhas dos sistemas de ensino e, em particular, os entraves mais locais. Apesar disso, mesmo com o intento de identificar falhas locais, a metodologia do Sistema de Avaliação da Educação Básica(SAEB) é focada para a caracterização do conjunto do sistema, o que não tem privilegiado a avaliação individual das instituições escolares ou dos estudantes, o que compromete tanto a metodologia de elaboração como a de análise das provas.

Entende-se que as avaliações dos sistemas de ensino, mesmo com a intenção de indicar as falhas e medir a qualidade do ensino, acabam muitas vezes apenas apontando os problemas e não os resolvendo, conforme afirma Vianna (2003). Dessa forma, pode-se pensar que nessas avaliações há um aspecto subjetivo, ao qual pode se somar àquela concepção de que elas, por si, podem alterar a realidade da educação. Entretanto, a função principal das avaliações é a de apontar informações que possam ser utilizadas na administração dos sistemas de ensino.

O que a avaliação gera, portanto, é a identificação dos aspectos da prática pedagógica já desenvolvida e, posteriormente, trazer à tona de que forma essa prática apresenta ou não problemas. Pode-se enfatizar que tais avaliações podem não explicitar de modo apropriado a realidade pedagógica de cada sala de aula e, muito menos, de cada aluno avaliado, lembrando que tais avaliações utilizam uma metodologia que nem sempre condiz com a realidade dos ambientes educativos das escolas.

Nesse sentido, Souza (2005) esclarece que a prova aplicada aos alunos por meio do SAEB, por exemplo, na disciplina de Língua Portuguesa ou Matemática, pode não estar condizente quanto ao conteúdo e quanto à forma com que foram trabalhadas nas distintas salas de aula. Contudo, o objetivo de uma avaliação dessa natureza não é, ou não tem sido, o de evidenciar o perfil de desempenho pedagógico das instituições escolares, nas quais as provas são aplicadas, de maneira solitária, mas o de estabelecer perfis pedagógicos mais ampliados, ou seja, por estados ou por regiões geoeducacionais.

Mediante os discursos dos profissionais entrevistados a respeito do sistema de avaliação do Governo Federal, pode-se destacar que há diferentes críticas empreendidas ao SAEB, como o caso de ditar a pauta do que deve ser ensinado aos alunos na Educação Básica, posto que estabelece um padrão ao cobrar um conjunto de conhecimentos das diferentes áreas de ensino, podendo ser compreendido, assim, como o currículo oficial das escolas (SOUZA, 2005).

Do mesmo modo, em relação às críticas, destaca-se que o SAEB ignora as diferenças regionais e locais e mais particularmente o uso indiscriminado de escalas padronizadas nacionalmente. Viana (2003) questiona:

Será razoável colocar centenas de milhares de sujeitos em uma única escala [...], ignorando completamente a diversidade social, econômica, cultural e educacional dessa população e as distorções que influenciam a caracterização dos vários índices de desenvolvimento humano? Não seria razoável [...] construir normas diferenciadas por regiões, levando em conta a diversidade das características individuais? (VIANA, 2003, p. 56-57).

Tais críticas são fundamentais para que se possa analisar o significado do poder público continuar avançando nesse tipo de avaliação, como também colocar em questão a possibilidade de democratizar os propósitos para que e como efetivar as avaliações de modo padronizado nacionalmente. De todo modo, não alteram o fato de que há informações sendo produzidas e é importante o debate a respeito da utilização desses dados como ferramenta de aprimoramento da ação pública, ou meramente para a reprodução da lógica da competição.

Destarte, evidenciou-se, nas vozes dos participantes desta pesquisa, que a formação continuada é considerada uma ferramenta importante para a mudança das práticas pedagógicas relacionadas ao processo de alfabetização. Contudo, para um ensino qualitativo, precisa-se ir além dos programas de formação continuada.

No entanto, observa-se que, ao mesmo tempo que enaltecem a qualidade da formação, a qual corresponde às expectativas, eles fazem críticas no sentido de uma participação mais efetiva do professor no processo de formulação das políticas educacionais, pois acreditam que tal participação possibilitaria o olhar para realidade dos estados, regiões, municípios, como também para as especificidades da sala de aula.

Vale apontar que, de um modo geral, os orientadores de estudo e os professores alfabetizadores avaliam de forma positiva a formação continuada do PNAIC, considerando que essa política tem contribuído para uma melhora das suas práticas pedagógicas.

Em todas as falas, revelou-se que o eixo central da formação continuada para os professores entrevistados foi a prática na sala de aula, que os estudos realizados na formação continuada auxiliaram na melhoria da prática profissional. Afirmação esta já evidenciada por Nóvoa (2009), de que a formação continuada é fundamental para a constituição e o fortalecimento da prática do trabalho docente.

Quando os professores entrevistados destacam que a formação continuada é um importante espaço de reflexão, em que se reúnem, compartilham ideias, aprofundam-se em alguns estudos, que atendem às suas necessidades, parte-se para o entendimento defendido por Nóvoa (1997, p.13) a respeito da formação docente: "[...] estar em formação implica investimento pessoal, um trabalho livre e criativo sobre os percursos e os projetos próprios, com vistas à construção de uma identidade, que é também uma identidade profissional”.

Desse modo, a formação continuada do PNAIC oportunizou aos professores cursistas o avanço nas aprendizagens, espaços de discussões e socializações de conhecimentos e experiência, tornando, assim, a formação mais coesa e significativa. Acredita-se que tais questões mencionadas foram expressivas no processo formativo como um todo, pois abarcaram a teoria, a prática e a reflexão - elementos indispensáveis para uma formação docente significativa e para o exercício pedagógico.

Mediante tais afirmações, defende-se, portanto, que a formação continuada pode fortalecer na escola a constituição de espaços e de ambientes educativos, os quais oportunizem a aprendizagem e a reafirmação da instituição de ensino como importantes espaços da construção da cidadania.

Considerações finais

Pode-se afirmar que o PNAIC se configura como um espaço formativo que busca conceber os professores como sujeitos inventivos e produtivos e que, mediante diferentes estratégias formativas, estimula a pensar sobre novas possibilidades de trabalho que poderão impulsionar e melhorar o seu fazer pedagógico.

Partindo das vozes dos entrevistados, constatou-se um engajamento muito grande por parte deles e do município, para que essa política cumpra com seu objetivo, ou seja, para que o processo de alfabetização e de letramento brasileiro venha a ser ressignificado e todas as crianças tenham o domínio do código escrito, o qual ainda não foi atingido em sua íntegra. Entretanto, o compromisso e o desafio continuam, há um longo caminho a percorrer, pois, como se tem verificado, um problema de tamanha relevância social, que é o caso do processo de alfabetização, não se atinge em curto prazo.

Cabe destacar, ainda, que o processo de alfabetizar e letrar as crianças brasileiras, dentre as quais muitas enfrentam tantos problemas sociais, não é uma tarefa simples. Ainda que muito se tenha tentado nas últimas décadas para a reversão dos níveis de desempenho dos estudantes, o desafio da alfabetização brasileira não é novo.

O PNAIC pode ser considerado um marco importante para a educação brasileira, uma política de abrangência nacional, em que o docente alfabetizador é chamado a refletir a respeito das suas práticas, a conhecer e experimentar diferentes metodologias e atividades, a estudar e a aprofundar seus conhecimentos e saberes, para que, assim, possa assegurar a seus alunos seus direitos de aprendizagem.

Desse modo, mediante as análises realizadas, pode-se considerar que o PNAIC é uma ação necessária, mas não suficiente para um impulso efetivo da qualidade da educação. Destarte, defende-se que a melhoria de tal qualidade demanda o encaminhamento de uma sucessão de outras práticas, que vão além da formação continuada de professores, como: uma maior valorização do profissional docente; melhores condições de trabalho; garantia de melhorias na infraestrutura das escolas; estímulo para a elaboração de propostas e políticas educacionais com a participação dos docentes; fortalecimento de políticas educacionais voltadas à inclusão, visto a diversidade de alunos existentes em sala de aula; mudanças na metodologia das avaliações externas; e que o resultado seja utilizado para o planejamento de ações de intervenção com a participação das escolas, dentre outros fatores.

Outro aspecto demonstrado na pesquisa foi o entendimento consolidado frente aos objetivos e o compromisso assumido junto ao PNAIC por parte dos orientadores de estudo e pelos professores alfabetizadores, os quais destacam que em partes o município vem conseguindo cumprir com tal objetivo, pois entendem que a formação continuada de professores é um dos mecanismos para atingir-se a determinado acordo, e não o único.

Por meio da análise do contexto da prática mediante as entrevistas, foi possível verificar que os orientadores de estudos e os professores alfabetizadores qualificaram a formação continuada do PNAIC como uma política inovadora, na medida em que realça estudos sistematizados da prática, a qual se utiliza de concepções e de entendimentos relevantes para a prática cotidiana docente.

Referências

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Notas

1 Uma federação é a união de membros federados que formam uma só entidade soberana: o Estado. No caso do Brasil, "[...] é o que denominamos de União. No regime Federal, só há um Estado Soberano, com unidades subnacionais (Estados). Estas gozam de autonomia, cuja relatividade se dá dentro dos limites jurisdicionais atribuídos e especificados. Daí que tais subunidades não são nem nações independentes nem unidades somente administrativas. Trata-se, pois, de um regime em que os poderes de governo são repartidos entre instâncias governamentais por meio de campos de competência legalmente definidas [...]” (CURY, 2007, p. 114-115).
2 Segundo Oliveira e Assunção (2010), as condições de trabalho docente referem-se à forma como está organizado o processo de trabalho nas unidades educacionais. Para as autoras, tais condições envolvem aspectos relativos à forma como o trabalho é organizado, isto é, a divisão das tarefas e as responsabilidades, a jornada de trabalho, os recursos materiais disponíveis para o desempenho das atividades, os tempos e os espaços para a realização do trabalho, abarcando ainda as formas de avaliação de desempenho, horários de trabalho, procedimentos didático-pedagógicos, admissão e administração das carreiras docentes, condições de remuneração, dentre outras.
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