Demanda contínua

Participação política de estudantes de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa

Political participation of students of Pedagogy from the Universidade Estadual de Ponta Grossa

Participación política de estudiantes de Pedagogía de la Universidade Estadual de Ponta Grossa

Carina Alves da Silva Darcoleto
Universidade Estadual de Ponta Grossa, Brazil
Geovani Roberto Kreling
SENAI, Brazil

Participação política de estudantes de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa

Práxis Educativa, vol. 13, núm. 2, pp. 617-633, 2018

Universidade Estadual de Ponta Grossa

Recepção: 20 Outubro 2017

Aprovação: 01 Maio 2018

Resumo: Este texto tem como objetivo tratar sobre a participação de estudantes do curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) em questões relacionadas à Política. O referencial teórico-metodológico adotado na pesquisa foi o materialismo histórico-dialético, que permite compreender a realidade a partir de sua totalidade concreta. O levantamento dos dados contou com a elaboração e a aplicação de um questionário com dez questões abertas, respondido por cinquenta e um (51) estudantes do curso. A análise dos dados aponta para um contexto de desmobilização e individualização das ações, além da demonstração, por parte de um número significativo dos sujeitos que participaram da pesquisa, de descrença em relação à efetividade da participação em atividades políticas.

Palavras-chave: Trabalho, Educação, Participação política.

Abstract: This text aims to discuss the participation of students of the Pedagogy course from the Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Paraná, Brazil, on issues related to politics. The theoretical-methodological framework adopted in the research was the historical-dialectical materialism, which allows to understand the reality from its concrete totality. The data collection counted on the elaboration and application of a questionnaire with ten open questions, answered by 51 students from the course. The data analysis points to a context of demobilization and individualization of actions, and also the demonstration, by a significant number of the subjects that participated in the research, of disbelief regarding the effectiveness of participation in political activities.

Keywords: Work, Education, Political participation.

Resumen: Este texto tiene como objetivo tratar sobre la participación de estudiantes del curso de Pedagogía de la Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) en cuestiones relacionadas a la política. El referencial teórico-metodológico adoptado en la investigación fue el materialismo histórico-dialéctico, que permite comprender la realidad a partir de su totalidad concreta. El levantamiento de los datos contó con la elaboración y aplicación de un cuestionario con diez preguntas abiertas, que fue respondido por 51 estudiantes del curso. El análisis de los datos apunta a un contexto de desmovilización e individualización de las acciones, además de la demostración, por parte de un número significativo de los sujetos que participaron de la investigación, de incredulidad en relación a la efectividad de la participación en actividades políticas.

Palabras clave: Trabajo, Educación, Participación política.

Introdução

Este texto aborda a participação dos estudantes de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) em questões relacionadas à Política. A discussão aqui apresentada é parte dos resultados de uma pesquisa desenvolvida com estudantes de duas turmas do último ano do curso de Pedagogia (4º ano), do período noturno, realizada no ano de 2015. A coleta de dados ocorreu por meio de questionário, com dez questões abertas, aplicado a cinquenta e um (51) estudantes do curso.

Na pesquisa realizada, buscamos compreender a influência dos processos de alienação na participação política dos estudantes de Pedagogia. O interesse por essa temática partiu da observação, na qualidade de integrantes do curso (um como estudante e outra como professora), da baixa participação de grande parte, se não da maioria, dos estudantes do curso de Pedagogia, da UEPG, em atividades como manifestações e mobilizações sociais, mesmo quando tais atividades estivessem diretamente relacionadas à sua formação, às condições de trabalho e estudo, dentre outros aspectos que influenciam suas/nossas vidas.

O referencial teórico-metodológico adotado na discussão e na análise dos dados é o materialismo histórico-dialético, que nos possibilita compreender a realidade a partir de sua totalidade e, com isso, como determinados fenômenos têm influenciado a maneira de agir e pensar dos indivíduos, os quais, nos limites da lógica da sociedade capitalista, geralmente fazem escolhas a partir de seus interesses imediatos, desconsiderando-se as necessidades sociais, que devem ter como parâmetro a coletividade. A compreensão da política e da participação política, nessa perspectiva, deve considerar a articulação da esfera da política com a forma como os homens se organizam em sociedade, em determinado espaço e tempo histórico. Assim sendo, para chegarmos ao cerne da nossa discussão, a participação política dos estudantes de Pedagogia, iniciamos abordando a importância da atividade do trabalho para a vida humana, a fim de apontar seus nexos com a Política.

Essa discussão é relevante, tendo em vista o contexto econômico, social e político atual em geral, e, particularmente, o caso brasileiro, considerando-se que a participação política, muitas vezes entendida como restrita ao voto, tem sido negligenciada, uma vez que vivenciamos o processo de impeachment ilegítimo da presidente Dilma Rousseff, democraticamente eleita pela maioria dos votos. Ela assumiu seu segundo mandato em 1 de janeiro de 2015, sendo impedida de continuar à frente dele em 31 de agosto de 2016.

Fundamentos ontológicos do trabalho

O trabalho é a atividade que funda, do ponto de vista ontológico, a vida humana em sociedade. Esse pressuposto marxiano, desenvolvido por G. Lukács, na sua Ontologia do ser social, corrobora o entendimento de que as relações sociais - que se dão a partir da forma como os homens se organizam para produzir a vida (trabalho) - adquirem determinadas características que influenciam diretamente na vida dos homens, incluindo-se aí a sua participação ou não nas decisões políticas.

O trabalho é a atividade de transformação da natureza pelo homem, que se estabelece com o objetivo de produzir a base material necessária para sua sobrevivência, sendo o trabalho, assim, a categoria fundamental para a existência do mundo dos homens. Uma vez que o homem não consegue suprir suas necessidades, a partir da forma como a natureza se põe imediatamente, ele precisa transformar essa natureza, criando os instrumentos e os objetos necessários à sua própria sobrevivência. No processo de transformação da natureza pelos homens, estes transformam também a si mesmos, pois apreendem novos conhecimentos e habilidades, dando origem a novas possibilidades e novas necessidades tanto objetivas quanto subjetivas. Nas palavras de Lukács: "Nesse sentido originário e mais restrito, o trabalho é um processo entre atividade humana e natureza: seus atos estão orientados para a transformação de objetos naturais em valores de uso” (LUKÁCS, 2013, p. 83), os quais são necessários para a existência humana, que está condicionada à produção de trabalho pelo próprio homem. Vale destacar que, ao realizar o trabalho, os homens não só garantem a sobrevivência de sua espécie, como, ao mesmo tempo, desenvolvem-se como indivíduos singulares e sociedade.

O trabalho, portanto, é a atividade que possibilita a existência do homem como ser social e histórico, pois, conforme afirmam Lessa e Tonet (2011, p. 26), "[...] todo ato humano tem por base a evolução passada da sociedade, a situação presente concreta em que se encontra o indivíduo e suas aspirações e seus desejos para o futuro”. Nesse sentido, podemos afirmar que não há ação humana e, por consequência, não há ato do trabalho fora da história ou da sociedade. Para Marx e Engels (2005):

A história não é outra coisa senão a sucessão das diferentes gerações, em que cada uma delas explora os materiais, os capitais e as forças de produção a ela transmitidas pelas gerações que a antecederam; assim, por um lado, prossegue em condições completamente distintas a atividade anterior, enquanto, por outro lado, transforma as circunstâncias anteriores por meio de uma atividade completamente diferente. (MARX; ENGELS, 2005, p. 77).

As diversas maneiras encontradas pelos homens para produzir, por meio do trabalho, os meios e os produtos necessários para sua sobrevivência, dependem da natureza e da reprodução social das formas de organização social anteriores. Nesse sentido, a maneira como se constituem, na qualidade de indivíduo singular e sociedade, depende do que e de como produzem sua própria existência. O que os homens são, portanto, resulta das formas como eles se organizam em sociedade para produzir a base material de sua existência.

Da mesma maneira, as relações sociais que nascem e se desenvolvem a partir do trabalho também dependem da forma como os homens se organizaram para realizá-lo em um determinado momento histórico. Assim, em cada forma de sociabilidade, em cada momento histórico, o homem produziu e produz meios de realizar trabalho e, por consequência, relações e complexos sociais diferentes. Quanto mais o homem se desenvolve, mais complexos se tornam os meios de produção de trabalho e mais complexas se tornam as relações sociais a que ele está submetido.

É importante compreender que são as condições materiais e históricas que produzem as condições de existência dos indivíduos e de suas ações como manifestação de si mesmos. Essas condições não são produto meramente da consciência dos homens, mas, como afirmamos, de condições materiais e históricas construídas pelo próprio homem, que usa sua consciência para escolher dentre as alternativas possíveis para a realização de suas atividades, desde o trabalho, a educação, até a política, só para mencionar algumas. No que tange à questão das decisões alternativas, Lukács (2010) aponta:

[...] o homem singular que busca reproduzir a si mesmo socialmente pelas decisões alternativas de sua práxis precisa, na maioria esmagadora dos casos - não importa com quanto de consciência -, assumir posição sobre como imagina o presente e o futuro da sociedade na qual, mediado por tais decisões, ele se reproduz individualmente, como ele a deseja enquanto ser, sobre qual direção do processo corresponde a sua ideia sobre o curso favorável de sua própria vida e da de seus semelhantes. (LUKÁCS, 2010, p. 99).

A forma de organização social dos homens, pelo trabalho, em determinada sociedade e momento histórico, dá-se, como já destacamos, a partir de possibilidades e de limites que tais homens encontram na materialidade da vida. São precisamente essas possibilidades e esses limites que apontarão para os indivíduos e os grupos alternativas sobre as quais eles devem tomar decisões, escolhendo entre uma e outra(s). As decisões alternativas sempre se reportam à esfera do valor, às vezes se considerando mais o interesse da coletividade, às vezes o do indivíduo.

Trabalho, sociedade capitalista e participação política

Ao longo da história, os homens desenvolveram várias formas de produzir trabalho e, por consequência, várias formas de organização social, como as sociedades escravista, feudalista, capitalista etc. O surgimento da propriedade privada trouxe consigo a exploração do homem pelo próprio homem, e as necessidades realmente humanas acabaram sendo deixadas de lado para priorizar a acumulação de propriedade privada.

Na sociedade capitalista, que é uma forma de organização social criada pelos próprios homens, as necessidades humanas são sempre submetidas às demandas produzidas pelo capital, produzindo relações sociais cada vez mais desumanas. A sociedade capitalista constrói-se e mantém-se a partir de uma forma específica de exploração do homem sobre o homem: o trabalho assalariado. Com o trabalho assalariado, a força de trabalho dos produtores de toda riqueza material passa a ser tratada como uma mera mercadoria, que pode ser comprada e ou vendida de qualquer forma e a qualquer momento. Justamente a força de trabalho, a força da categoria que possibilitou ao homem se desenvolver e chegar até onde chegou, perde seu caráter essencialmente humano e passa a ser tratada como uma simples mercadoria. A força de trabalho carrega consigo todo o desenvolvimento e o conhecimento construído pela humanidade a partir de sua relação com a natureza, por meio do trabalho. Ao tratar a força de trabalho do homem como mercadoria, a sociedade capitalista nega a esse homem seu caráter essencialmente humano. As necessidades humanas são deixadas de lado para que as necessidades do capital possam ser supridas.

Sob a lógica capitalista, em vez de impulsionar o desenvolvimento do homem e da sociedade, o trabalho transforma as relações sociais em relações essencialmente desumanas, que, quanto mais se complexificam, mais desumanas se tornam. Nesse sentido, Marx (2001) afirma que:

O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador torna-se uma mercadoria tanto mais barata, quanto maior o número de bens que produz. Com a valorização do mundo das coisas, aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens. O trabalho não produz apenas mercadorias; produz-se também a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria, e justamente na mesma proporção com que produz bens. (MARX, 2001, p. 111).

Dessa forma, no modo de produção capitalista, os interesses individuais, mais precisamente os interesses dos capitalistas, sobrepõem-se aos interesses coletivos, gerando grande contradição. O que importa ao capitalista é acumular cada vez mais riqueza, esta que é produzida pelo trabalhador, mas que a este é negada. "A riqueza produzida pelos trabalhadores é apropriada pelos capitalistas como riqueza pessoal, privada; o que interessa à burguesia é aumentar o lucro individual dos proprietários.” (LESSA; TONET, 2011, p. 82). Disso, resultam maneiras de agir e pensar que têm colocado em primeiro lugar a escolha por alternativas que levam ao atendimento apenas das necessidades imediatas e dos interesses privados dos indivíduos, deixando-se de lado o desenvolvimento humano genérico e a preocupação com a coletividade das ações.

O individualismo torna-se uma espécie de força motora das relações sociais: o que importa é o enriquecimento individual, nem que, para isso, seja necessário tirar proveito do trabalho de outros homens. A concepção da classe burguesa (a capitalista), alicerçada na "necessidade” de enriquecer a todo custo, passa a dominar as relações sociais. Nesse sentido, conforme Lessa e Tonet (2011, p. 83): "[...] todas as relações humanas são convertidas em instrumentos dessa luta pela acumulação privada de capital. Os homens têm no capital seu espelho e se constroem cotidianamente como sua imagem”.

Assim, a sociedade capitalista produz-se e reproduz-se como uma forma de organização social essencialmente contraditória, marcada pelas disputas individuais (que refletem a luta de classes), em que o interesse coletivo é deixado de lado. Para que seja possível lidar com essas contradições sem que haja um colapso dessa forma de organização social vigente, é necessário, aos capitalistas, criar formas de organização da produção e da sociedade como um todo que tornem as contradições fatos socialmente aceitos. Um desses aparatos é a democracia burguesa.

A democracia, idealizada pelo modo de produção capitalista, constitui-se em uma forma de organização que afirma a igualdade política entre todos os homens. Nesse sentido, tanto os capitalistas quanto os trabalhadores são considerados politicamente iguais na sociedade. Essa concepção de igualdade política entre os homens desconsidera o fato de haver, na sociedade capitalista, uma divisão social de classes, que, inclusive, é a base da estrutura em que o modo de produção capitalista se sustenta. Se o burguês é muito mais poderoso do que o trabalhador, podemos afirmar que a igualdade política, concebida pela democracia burguesa, não passa de uma ferramenta para a afirmação das contradições presentes no modo de produção capitalista.

A democracia burguesa possibilita ao homem atuar nos limites de sua emancipação política na sociedade capitalista. Embora represente um progresso, é preciso considerar que a emancipação política jamais representará a verdadeira forma de liberdade humana e igualdade. A emancipação política, na sociedade capitalista, sempre será limitada, porque o Estado capitalista é o mediador dessa liberdade. Como instituição burguesa,

[...] o Estado moderno, na sua função política, apenas pode declarar como formal e legalmente existentes aquelas demandas sociais que não se manifestam contrariamente à garantia da propriedade privada, à organização hierárquica da classe trabalhadora, à livre compra e venda da força de trabalho, à acumulação privada da mais-valia. (MELO; PANIAGO; ANDRADE, 2012, p. 17).

Mesmo que os homens possam não desejar, suas atividades possuem significado político ativo, pois os comportamentos individuais repercutem diretamente na vida dos outros membros da sociedade e vice-versa. Na sociedade capitalista, os direitos sociais e políticos, concedidos ao homem pela democracia burguesa, só podem ser exercidos pelos indivíduos participantes de uma determinada sociedade. O conteúdo desses direitos sociais e políticos, segundo Marx (2001, p. 30), "[...] é a participação na vida da comunidade, na vida política do grupo, na vida do Estado”.

A combatividade política torna-se uma ferramenta importante para a classe trabalhadora no enfrentamento das contradições presentes na sociedade capitalista e que são favorecidas por instituições que têm o objetivo de controlar a sociedade, como: o Estado, o direito, a polícia, a política etc. Basta olharmos para a História para vermos como a burguesia alcançou o poder superando o modo de produção feudal. Do mesmo modo, também é possível à classe trabalhadora superar as contradições presentes na sociedade capitalista; e as lutas políticas, nesse preciso sentido, constituem-se, também, como luta de classe, da classe trabalhadora contra a classe burguesa. Nessa perspectiva, Marx e Engels (2005) afirmam que:

Pelo menos na história moderna fica, portanto, demonstrado que todas as lutas políticas são lutas de classes e que todas as lutas de emancipação de classes, apesar de sua inevitável forma política, pois toda luta de classe é uma luta política, giram, em última instância, em torno da emancipação econômica. (MARX; ENGELS, 2005, p. 131).

Do mesmo modo, a consciência de classe também pode desenvolver, na classe trabalhadora, a consciência política, mas o desenvolvimento de ambas está articulado à compreensão da própria realidade concreta. Entender que os aspectos do desenvolvimento econômico determinam o desenvolvimento dos demais aspectos da vida humana em sociedade é extremamente importante para que as lutas políticas, tendo como horizonte a superação da luta de classes, sejam efetivadas.

Participação política e o papel da educação

A consciência de classe e a consciência política pressupõem uma reflexão teórica sobre a realidade concreta articulada a ações práticas que busquem transformar essa realidade, estando diretamente articulada ao desenvolvimento humano genérico, com a preocupação com a coletividade das ações e com o bem-estar de todos os membros da sociedade. O entendimento dessas questões é essencial para que a consciência política de classe possa ser desenvolvida pelos próprios trabalhadores. O fato é que essa forma de conscientização não é espontânea e precisa ser desenvolvida a partir das relações sociais.

Nessa dimensão, a educação constitui-se como uma forma de mediação que contribui para a reprodução da vida social. É por intermédio da educação que o homem pode transmitir os conhecimentos adquiridos por meio de sua atividade de transformação da natureza a partir do trabalho. Da mesma forma que em outras esferas da vida social, a educação acaba sendo influenciada pela hegemonia da classe burguesa, que detém o poder econômico e político. Segundo Tonet (2012), isso

[...] não significa que a educação seja uma mera reprodutora dos interesses dessas classes, pois numa sociedade de classes, a educação [...] é sempre o resultado da luta de classes. Significa, apenas que ela estará sempre sob a hegemonia das classes dominantes. (TONET, 2012, p. 54).

Na esteira de Tonet (2012), podemos afirmar que, na sociedade capitalista, a hegemonia da classe dominante impõe dois grandes objetivos para a educação: a formação de mão de obra qualificada para produzir riquezas para o capital, ou seja, a educação para o mundo do trabalho; e a formação que visa difundir valores que contribuam para manter e reproduzir a ordem social vigente, ou seja, a educação para a cidadania.

Devido aos limites e aos objetivos deste texto, iremos deter-nos nas discussões em torno da relação entre educação e cidadania. Nos dias de hoje, o discurso da educação para a cidadania e democracia acabou sendo incorporado por grande parte dos profissionais ligados à educação, tanto no âmbito das pesquisas, quanto no âmbito do próprio ensino formal. Formar o cidadão crítico e participativo acabou se tornando papel essencial das escolas. Podemos observar que o termo cidadania tem sido utilizado a partir de significações diferentes, que sempre estão relacionadas a uma determinada forma de compreender a realidade (TONET, 2012).

Para Tonet (2012), na concepção do liberalismo, o termo cidadania, de uma maneira geral, acaba sendo utilizado como sinônimo de liberdade. Esse modo de entender a cidadania parte da ideia de que todos os homens são essencialmente iguais e livres. Nesse sentido, as desigualdades sociais são entendidas como um fato natural e inerente a essa liberdade e igualdade. Essas desigualdades sociais podem trazer problemas sérios para a vida humana, e por isso "[...] os homens ter-se-iam vistos obrigados a se organizar em sociedade e a instituir uma autoridade (Estado) capaz de garantir a observância de certo limites” (TONET, 2012, p. 64). Portanto, a organização e o controle social, estabelecidos pelo Estado, têm a função específica de amenizar e controlar as desigualdades sociais, mas não de erradicá-las. Dessa maneira, a cidadania teria o papel de contribuir para minimizar os efeitos das desigualdades sociais para a vida humana em sociedade.

Outra forma de compreender a cidadania, ainda de acordo com Tonet (2012, p. 65), tem a ver com "[...] a perspectiva da esquerda democrática (que) parte da ideia de que a cidadania é sinônimo de socialidade”, e, portanto, exercer a cidadania é uma atividade condicionada à própria existência humana, independentemente, inclusive, das desigualdades sociais. A partir dessa abordagem, "[...] não há uma articulação essencial entre cidadania e classes sociais e, portanto, entre cidadania e capitalismo” (TONET, 2012, p. 64). Logo, essa maneira de compreender a cidadania não está articulada à eliminação das desigualdades sociais, ou seja, não está articulada à superação do modo de produção capitalista.

É importante deixar claro que, como Tonet (2012), compreendemos que a emancipação política, estabelecida na sociedade capitalista a partir do exercício da cidadania e/ou democracia, é um importante avanço, em relação a outras formas de sociedade, quanto à possibilidade de liberdade para o homem. Contudo, a emancipação política é apenas uma forma de liberdade humana, a liberdade política, não se configurando como a única possibilidade de liberdade e nem como uma forma de liberdade plena do homem.

A educação formalizada, realizada pelas instituições escolares, no contexto atual, tornou-se necessária para que os homens possam se apropriar do conhecimento historicamente construído pela própria humanidade. Esse patrimônio, como herança do desenvolvimento social do gênero humano, pertence a todos os homens e, portanto, o acesso a tal conhecimento também deveria ser direito de todos os homens. Embora o acesso universalizado à educação formal seja sempre controlado a partir da hegemonia da classe dominante, entendemos, com Tonet (2012), que práticas educativas voltadas à verdadeira emancipação humana são possíveis de acontecer, embora de forma limitada, no interior da escola. Essas práticas podem contribuir para o desenvolvimento da consciência política de classe, o que significa "[...] a formação de pessoas comprometidas com a transformação radical da sociedade” (TONET, 2012, p. 55).

A consciência política traz a possibilidade à classe trabalhadora de lutar por conquistas e direitos no âmbito da democracia e das instituições democráticas, e isso se configura como uma atividade política extremamente importante para os trabalhadores. Entretanto, o exercício da cidadania nunca deve estar comprometido apenas com a redução dele em si mesmo, pois essa instância jamais permitirá aos indivíduos a realização plena de suas potencialidades como seres humanos. Sobre isso, Marx (2010) afirma que:

O intelecto político é político exatamente na medida em que pensa dentro dos limites da política. [...]. O princípio da política é a vontade. Quanto mais unilateral, isto é, quando mais perfeito é o intelecto político, tanto mais ele crê na onipotência da vontade e tanto mais é cego frente aos limites naturais e espirituais da vontade e, consequentemente, tanto mais é incapaz de descobrir a fonte dos males sociais. (MARX, 2010, p. 62).

Nesse sentido, entendemos que professores comprometidos com a emancipação humana devem fomentar o desenvolvimento da consciência política de classe nos seus estudantes, a partir de atividades educativas articuladas com a plena liberdade humana. Entendemos que a educação não é e nem pode ser considerada a atividade responsável por liderar a superação das desumanidades da sociedade capitalista e a construção de uma nova forma de sociabilidade. Entretanto, de acordo com Tonet (2012, p. 73), "[...] ela pode dar uma contribuição importante na medida em que desperte e fundamente as consciências para a necessidade de uma transformação revolucionária e, ao mesmo tempo, transmita o que de mais avançado existe em termo de conhecimento”.

Assim, a revolução pela construção de uma nova forma de organização social deve partir da esfera do trabalho, pois, como apontamos, é a partir dessa atividade que os homens organizam a produção de sua vida material. O papel dos professores que se comprometem com uma educação voltada à emancipação humana é o de despertar, em seus estudantes, a consciência política de classe, o que, em nosso modo de ver, é essencial para a transformação radical da sociedade capitalista.

Participação política no curso de Pedagogia da UEPG

As reflexões que traçamos ao longo deste texto têm o objetivo de nos guarnecer de subsídios teóricos para que possamos apresentar a análise dos dados coletados a partir de nossa pesquisa. Os resultados dessas reflexões permitiram-nos compreender alguns motivos pelos quais certos fenômenos sociais acontecem na realidade no atual momento histórico, corroborando para limitar o desenvolvimento da consciência política. Os sujeitos participantes da pesquisa foram os estudantes do quarto ano (4º) do curso de Pedagogia, do período noturno, da UEPG. Participaram da pesquisa cinquenta e um (51) estudantes, que responderam a um questionário com dez (10) questões abertas. O questionário foi aplicado no mês de abril de 2015. A análise dos dados obtidos por meio do questionário foi realizada a partir da categorização de respostas comuns ou semelhantes dadas pelos estudantes em cada uma das respostas. Nosso objeto de investigação foi a concepção desses sujeitos em relação ao conceito de alienação e a participação deles na esfera das atividades políticas. Para o escopo deste artigo, iremos expor os resultados referentes à participação política desses estudantes.

No Gráfico 1 a seguir, apresentamos a compreensão dos estudantes de Pedagogia da UEPG em torno do conceito de política.

Compreensão dos acadêmicos de Pedagogia sobre Política - UEPG -
							2015
Gráfico 1
Compreensão dos acadêmicos de Pedagogia sobre Política - UEPG - 2015
Fonte: Dados de pesquisa sistematizados pelos autores.

No Gráfico 1, podemos observar que 28% dos estudantes entendem Política como Regras/Lei/Ações que organizam/estruturam/governam/administram a sociedade; 25% concebem como uma forma de representação/organização democrática para decidir o que é melhor para a população em geral; 17% compreendem política como jogo de interesses ideológicos para benefícios pessoais ou de/para determinados grupos; 15% entendem que política está ligada a lutar pelos seus direitos e pelos direitos da população em geral, exercendo seu papel de cidadão; 8% relacionam-na com votar e eleger seus representantes, sempre ligados à política partidária; 6% se referem à política como participação social; e apenas 1% dos estudantes compreendem-na como lutar por aquilo que se entende ser correto, estando relacionada a maneira como vemos o mundo e como agimos a partir disso. A partir da análise dos dados assinalados no Gráfico 1, podemos notar que a concepção de grande parte dos alunos aponta para a ideia de que a esfera política não se constitui como uma atividade inerente à vida humana em sociedade. A noção de representatividade também é fortemente difundida como atrelada à democracia e, nesse contexto, o voto passa a ser considerado como uma ferramenta importante (quando não a única) para a transformação social. Outro aspecto que nos chama bastante a atenção é a descrença em relação à importância e à efetividade da consciência política e da atividade política para a luta contra as desigualdades e a conquista de direitos no âmbito social.

Esse cenário permite-nos refletir sobre a organização da esfera política na atualidade, que, principalmente a partir da atuação do Estado e da democracia representativa, tem contribuído para que os interesses da classe dominante acabem se sobressaindo aos da classe trabalhadora. A descrença em torno da esfera política é, porém, um discurso pensado e deliberado pela classe dominante com o intuito de desarticular os trabalhadores na luta pela superação dessa forma de sociabilidade. Nesse sentido, Konder (2009) afirma que:

Através do seu aparelho estatal, das suas instituições de ensino, da sua imprensa, e com o apoio da sua autoridade e o peso de uma tradição negativa, a burguesia difunde o desânimo desta concepção que apresenta como intrinsecamente limitadas as possibilidades do trabalho humano. (KONDER, 2009, p. 187).

Entendemos que o exercício da cidadania, embora de forma limitada, configura-se como uma atividade importante para a construção de uma sociedade mais justa e mais igualitária. Nesse sentido, exercer a emancipação política, no papel da democracia e da cidadania, pode representar uma forma de mediação para a luta pela completa eliminação das desigualdades sociais, o que só será possível com a superação radical da sociedade capitalista.

O Gráfico 2 apresenta os dados categorizados a partir das respostas dadas pelos estudantes quando perguntados sobre sua compreensão em relação à participação política.

Entendimento dos estudantes de Pedagogia sobre participação política
							- UEPG - 2015
Gráfico 2
Entendimento dos estudantes de Pedagogia sobre participação política - UEPG - 2015
Fonte: Dados de pesquisa sistematizados pelos autores.

No Gráfico 2, verificamos que 24% dos estudantes compreendem participação política como ligada à participação, à análise e à discussão das tomadas de decisão que envolvem a organização/a melhoria da sociedade/a comunidade/o contexto em que vivemos; 16% compreendem como lutar/defender interesses individuais e/ou coletivos; 12% concebem como cobrar/fiscalizar os representantes políticos, escolhendo bem os candidatos no momento do voto; 11% entendem participação política como exercício do papel de cidadão, reivindicando direitos e cumprindo os deveres em sociedade; 10% sinalizam como participar/fazer algo de bom para a sociedade; 8% relacionam a estar por dentro dos assuntos que envolvem a própria política; 7% como participar de movimentos sociais; 6% compreendem como expor o ponto de vista/opinião; 4% entendem participação política como participar de greves, de manifestações, de atos etc.; e 2% somados compreendem como manifestar-se a favor ou contra as ideias colocadas pelos representantes políticos e participar de partidos políticos.

Podemos notar que a maioria das respostas converge para a compreensão de participação política como algo baseado na discussão, na fiscalização, no exercício da cidadania, na manifestação livre das ideias que vão orientar a organização da sociedade como um todo, sinalizando que tal concepção, a de participação política, é bastante ampla e diversificada. Outro fator que também chama bastante atenção é que a ideia de representatividade se mantém.

Uma contradição encontrada na percepção da representatividade política está no fato de que os representantes políticos, eleitos pela classe trabalhadora por meio do voto, representam, na imensa maioria das vezes, apenas os interesses da classe dominante. A partir da ideia de que é possível à classe trabalhadora eleger seus próprios representantes no Estado, surge o entendimento de que apenas votar e eleger seus próprios representantes é suficiente para que seus interesses coletivos sejam atendidos. Segundo Konder (2009, p. 187), "[...] o próprio fato de que o governo do Estado não possa ser desempenhado por uma classe como um todo impede a aceitação plena do abstencionismo político pelo conjunto desta classe”.

Ao longo da história, o Estado constituiu-se como uma instituição criada para defender os interesses da classe dominante. Nesse contexto, entendemos que é uma ilusão acreditar que é possível participar efetivamente do controle social exercido pelo Estado priorizando os interesses coletivos e deixando de lado os interesses individuais, que estão no cerne da sociedade capitalista. De acordo com Marx (2010):

Quanto mais poderoso é o Estado e, portanto, quanto mais político é um país, tanto menos está disposto a procurar no princípio do Estado, portanto no atual ordenamento da sociedade, do qual o Estado é a expressão ativa, autoconsciente e oficial, o fundamento dos males sociais e a compreender-lhes o princípio geral. (MARX, 2010, p. 62).

A história também nos mostra que, nas sociedades de classe, em que predominam modos de produção baseados na exploração do homem pelo homem, os interesses da classe dominante jamais irão se confundir com os interesses dos produtores da riqueza material (no caso da sociedade capitalista, os trabalhadores). Como na sociedade capitalista os interesses individuais sempre se sobrepõem aos interesses coletivos, a participação política, em nosso modo de ver, sempre deve ser compreendida e estar articulada à superação dos limites da própria emancipação política - isso implica necessariamente a superação dessa forma de sociabilidade.

Aqui cabe a reflexão em relação ao papel da Universidade na formação da consciência política de classe de seus estudantes e sua articulação para a transformação radical da sociedade capitalista. Entendemos, conforme Tonet (2012), que:

Certamente, não cabe à educação a tarefa de liderar a construção de uma nova sociedade. Contudo, ela pode dar uma contribuição importante na medida em que desperte e fundamente as consciências para a necessidade de uma transformação revolucionária e, ao mesmo tempo, transmita o que de mais elevado existe em termos de conhecimento. (TONET, 2012, p. 73).

A crise estrutural do capital tem impulsionado uma série de consequências que afetam diretamente várias dimensões da vida humana em sociedade. É possível notar o crescimento desenfreado do individualismo, que acaba levando as pessoas a se preocupar apenas com seus problemas particulares, deixando a coletividade de lado. Essa preocupação cada vez maior com as questões individuais em detrimento das coletivas traz consigo um cenário de conformismo e desmobilização social. Nesse contexto, a educação tem se submetido cada vez mais à lógica do capital, o que pode implicar na ampliação dos limites para contribuir para o desenvolvimento do sentido de coletividade nos indivíduos.

Nessa perspectiva de crise do próprio sistema, com uma educação estruturada a partir dos interesses do capital, o papel da Universidade, no que diz respeito à formação da consciência política de classe nos indivíduos, tem se tornado cada vez mais limitado. Ainda que limitado, compreendemos ser possível a educação, de forma geral, fomentar a participação dos sujeitos nas lutas sociais, desarticulando as práticas de desmobilização social e de conformismo, geradas pela ideia de que é impossível superar a estrutura social vigente.

A partir desse entendimento, buscamos, na pesquisa, verificar se os estudantes de Pedagogia participam ou já estiveram envolvidos com algum Movimento Social. O Gráfico 3 que segue apresenta a sistematização dos dados sobre essa questão.

Participação dos estudantes de Pedagogia em Movimentos Sociais - UEPG
							- 2015
Gráfico 3
Participação dos estudantes de Pedagogia em Movimentos Sociais - UEPG - 2015
Fonte: Dados de pesquisa sistematizados pelos autores.

Os dados sistematizados no Gráfico 3 mostram-nos que mais da metade, mais precisamente 59% dos estudantes, não participa ou participou de qualquer tipo de movimento social. Esse fato pode apontar para um sentimento de descrença em relação à concepção de atividade política como possibilidade de transformação social, o que traz consigo a desmobilização social e a sentimento de conformismo. Nesse sentido, Konder (2009) afirma:

A subestimação das possibilidades da atividade política do homem e a descrença quanto a uma reorganização da sociedade e a uma superação da divisão social do trabalho marca, na consciência acumpliciada com a alienação, o seu conteúdo de classe. A realidade empírica de uma atividade política também transformada em especialização parece justificar, de fato, o desânimo. Como acreditar que este determinado tipo de atividade política que ainda hoje é largamente praticado seja capaz de mudar radicalmente a vida social? (KONDER, 2009, p. 186).

O momento histórico em que a pesquisa foi realizada nos permitiu articular algumas questões referentes à perspectiva de participação política com a greve dos professores (da Educação Básica e do Ensino Superior) do Paraná, que aconteceu no ano de 2015. Nesse episódio, os professores da rede pública de ensino do Paraná entraram em greve, reivindicando uma serie de pautas, dentre elas, a contrariedade acerca da mudança no fundo previdenciário dos servidos públicos do Estado do Paraná e o sucateamento das escolas e das universidades públicas. A mobilização foi intensa, contando com a participação de professores e de estudantes, além de outras categorias do funcionalismo público do Paraná, e culminou no episódio que ficou conhecido como "massacre dos professores do Paraná”. No dia 29 de abril de 2015, milhares de grevistas cercaram a Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (ALEP), para se manifestar contra a aprovação de um pacote de Leis que previam a alteração no regime previdenciário dos trabalhadores, sem uma discussão com as categorias que seriam diretamente afetadas. Os grevistas foram impedidos de entrar na ALEP, para acompanhar a discussão/votação da lei, por policiais militares que agiram violentamente contra a manifestação, agredindo os professores, estudantes, demais servidores públicos e comunidade em geral de forma truculenta e cruel. A violência foi tamanha que cerca de duzentas (200) pessoas ficaram feridas durante esse episódio. A greve dos professores do Paraná de 2015 foi um exemplo legítimo da importância da mobilização da classe trabalhadora para a luta por conquista de direitos ou, ainda, para a manutenção de direitos conquistados ao longo da história - tratando-se desse segundo caso o mote da greve em questão.

Uma das principais pautas era a manifestação contra o sucateamento das Escolas e Universidades Públicas do Estado do Paraná, que têm sofrido constantemente com a falta de professores, servidores em geral, recursos estruturais e financeiros, fato que reflete diretamente na qualidade da educação ofertada e que afeta diretamente a vida dos estudantes e da população em geral, que encontram na escola pública provavelmente a única possibilidade de acesso à educação formal. Nesse sentido, Tonet (2012) afirma que

[...] lutar por uma universidade pública e gratuita, pela sua ampliação, pela sua melhoria e pelo acesso cada vez mais amplo da população a ela é lutar pelos interesses daqueles que realmente produzem a riqueza (os trabalhadores), mas não têm acesso a ela, é lutar por uma vida efetivamente digna para imensa maioria da população brasileira. (TONET, 2012, p. 93).

O questionário foi aplicado antes do episódio ocorrido no dia 29 de abril de 2015. Embora não tenhamos dados de pesquisa, foi possível notar que o fato mobilizou mais estudantes a participarem de manifestações, repudiando os atos de violência contra os professores promovidos pelo governador do Estado do Paraná. Nesse contexto, os próximos gráficos (4 e 5) mostram a participação dos estudantes nas atividades da greve dos professores de 2015, e os motivos que os levaram a não participar de tais atividades.

Participação dos estudantes de Pedagogia na greve dos professores da
							UEPG - 2015
Gráfico 4
Participação dos estudantes de Pedagogia na greve dos professores da UEPG - 2015
Fonte: Dados de pesquisa sistematizados pelos autores.

Motivos pelos quais os estudantes de Pedagogia não participaram de
							atividades referentes à greve dos professores da UEPG - 2015
Gráfico 5
Motivos pelos quais os estudantes de Pedagogia não participaram de atividades referentes à greve dos professores da UEPG - 2015
Fonte: Dados de pesquisa sistematizados pelos autores.

No Gráfico 4, verificamos que 72% dos estudantes que responderam ao questionário não participaram das atividades relacionadas à greve dos professores da UEPG de 2015. O Gráfico 5 apresenta os motivos pelos quais os estudantes não participaram dessas atividades. Quatorze estudantes (27,4%) responderam que o motivo foi o trabalho; 9 alunos (17,6%) responderam que participaram pelas redes sociais e outras mídias; e outros 9 respondentes (17,6%) alegaram falta de tempo; 7 estudantes (13,7%) disseram que não participaram por razões pessoais - sem explicar do que se tratavam essas "questões pessoais”; 6 alunos (11,8%) responderam que não participaram, mas apoiaram; e 5 deles (9,8%) responderam que não participaram por que moravam em outro município.

Os dados revelam que quase dois terços dos acadêmicos não participaram de nenhuma atividade referente ao primeiro período da greve de 2015, o que pode reforçar o entendimento de que há uma espécie de desmobilização política e pouca reflexão em relação à consciência política de classe. Também podemos verificar que a maior parte dos motivos apresentados pelos estudantes para a não participação nas atividades de greve está relacionada a questões de cunho pessoal, falta de tempo, ou necessidades relacionadas ao seu trabalho (neste caso, o trabalho é entendido como atividade remunerada). Alguns responderam que participaram utilizando mídias ou não participaram, mas apoiaram a greve.

Na sociedade capitalista, as condições de vida às quais a classe trabalhadora é submetida comprometem sua participação nas atividades políticas. Dessa forma, quando podem participar, na maior parte das vezes, os estudantes trabalhadores não o fazem porque estão extremamente cansados, devido às condições de necessidade de conciliação entre atividade remunerada e estudo, ou, podemos inferir, por desconhecerem a possibilidade de superação das desigualdades sociais, assim subestimando a importância de participar politicamente das manifestações e ou dos movimentos políticos da classe trabalhadora.

Outro aspecto que pode influenciar diretamente o desenvolvimento desse cenário de ampla desmobilização política está ligado à influência da ideologia disseminada pela burguesia, como é o caso da defesa de que o trabalho não é mais central para a vida humana, o que contribui para propagar a descrença na possibilidade de reorganização da sociedade e superação das alienações provocadas pela divisão social do trabalho, nesta sociedade. Para Marx e Engels (2005):

Toda ideologia, entretanto, uma vez que surge, desenvolve-se em ligação com a base material das ideias existentes, desenvolvendo-a e transformando-a por sua vez; se não fosse assim, não seria uma ideologia, isto é, um trabalho sobre ideias conhecidas como entidades dotadas de substância própria, com um desenvolvimento independente e submetidas tão somente às suas próprias leis. Os homens, em cujo cérebro esse processo ideológico se desenvolve, ignoram forçosamente que as condições materiais da vida humana são as que determinam em última instância, a marcha desse processo, pois, senão o ignorassem, ter-se-ia acabado toda ideologia. (MARX; ENGELS, 2005, p. 134).

A ideologia burguesa, que cerca a classe trabalhadora de todos os lados, parece entrar na vida das pessoas como uma força que se torna superior à sua própria existência, na qualidade de indivíduos, e à sua própria capacidade de reflexão acerca da realidade. Isso impede, no mais das vezes, que elas possam compreender que sua constituição como ser social se dá a partir do trabalho e que os modos como os homens se organizam para realizar esse trabalho são essencialmente históricos, criados por eles próprios, portanto, podendo ser superados. Nessa perspectiva, as desigualdades sociais aparecem como coisas naturais e próprias da existência do homem e, nessa dimensão, como se nunca pudessem ser superadas.

Considerações finais

Este texto teve como objetivo apresentar a sistematização e a análise dos dados levantados durante nossa pesquisa, que buscou compreender a relação entre a alienação e a participação política dos estudantes de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa, formandos em 2015. Devido aos limites de um artigo, abordamos os resultados referentes à participação política desses estudantes.

Os dados indicam que grande parte dos estudantes acaba, na maioria das vezes, deixando de se envolver em questões relacionadas à política. Inferimos, a partir dessa pesquisa, que as formas como os estudantes participam - ou não - da esfera da política são influenciadas pela não percepção em relação à política como uma atividade inerente à vida humana em sociedade e pela possível dúvida em relação à efetividade dessas ações quando se trata da possibilidade de conquistas no âmbito dos direitos sociais e/ou mesmo da superação radical da sociedade capitalista.

Entendemos que, mesmo que os indivíduos possam não desejar, suas ações e seus comportamentos repercutem diretamente na vida de outros membros da sociedade, e, portanto, possuem significado político ativo. No entanto, na sociedade capitalista, o campo da política tem sido utilizado como ferramenta ideológica para defender os interesses do capital, deixando de lado os interesses humanos, coletivos. Esse fato pode explicar a descrença dos sujeitos e fomentar a não participação deles em ações de cunho político, contribuindo para que essa forma de agir se torne cada vez mais comum nos indivíduos.

Outro aspecto a ser levado em consideração é o fato de que a exacerbação do individualismo, que na sociedade capitalista estimula a sobreposição do desenvolvimento individual - principalmente quando se trata da classe dominante -, em detrimento do desenvolvimento humano genérico, tem contribuído para que os indivíduos deixem, cada vez mais, de participar ativamente de questões relacionadas à política. Uma vez que, na sociedade burguesa, as demandas do capital são sempre sobrepostas às necessidades humanas, os sujeitos são levados a se preocupar apenas com seus interesses individuais, deixando de lado a preocupação com a coletividade das ações e o bem-estar de toda a sociedade.

O envolvimento dos estudantes em atividades de cunho político também é comprometido pelas condições concretas de vida as quais eles são submetidos, tendo em vista que, na maioria dos casos, necessitam conciliar estudos e atividade remunerada, da qual dependem para sobreviver, manter ou ajudar a manter suas famílias. Nesse contexto, quando há a possibilidade de participar em atividades ligadas à política, acabam, muitas vezes, tendo que "abrir mão”, pois, devido à quantidade de atividades que precisam realizar cotidianamente, estão muito cansados para tal. Somado a isso, a falta de compreensão da possibilidade de superação das desigualdades sociais (que muitas vezes são naturalizadas, diga-se de passagem) acaba impelindo os sujeitos a subestimar a importância de sua participação ativa em manifestações e ou movimentos políticos organizados pela classe trabalhadora.

No cenário brasileiro, algumas manifestações e mobilizações sociais expressivas têm ocorrido, para tentar frear a perda de direitos sociais que a classe trabalhadora vem vivenciando, como é o caso da Reforma Trabalhista, aprovada em 11 de julho de 2017, e a articulação para aprovação do Projeto do governo para Reforma da Previdência, sem esquecer-se da Reforma do Ensino Médio, que mobilizou milhares de estudantes, que ocuparam escolas de Educação Básica e Universidades, lutando pela defesa da manutenção da educação pública, gratuita e efetivamente de qualidade. Essas manifestações, decorrentes de um acirramento da luta de classes, sinalizam um importante avanço no sentido da participação política, especialmente dos jovens brasileiros. Isso aponta para a necessidade dessa participação se intensificar cada vez mais, articulando-se essas lutas pontuais aos interesses mais amplos da classe trabalhadora, que deve ter como horizonte a luta pela superação das desigualdades de classes.

Referências

KONDER, L. Marxismo e alienação: contribuição para um estudo do conceito marxista de alienação. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2009.

KRELING, G. R. Alienação e participação política no curso de Pedagogia. 2015. 101 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) - Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa, 2015.

LESSA, S.; TONET, I. Introdução à filosofia de Marx. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular , 2011.

LUKÁCS, G. Prolegômenos para uma ontologia do ser social: questões de princípios para uma ontologia hoje tornada possível. São Paulo: Boitempo, 2010.

LUKÁCS, G. Para uma ontologia do ser social II. São Paulo: Boitempo , 2013.

MARX, K. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2001.

MARX, K. Glosas críticas marginais ao artigo "O rei da Prússia e a reforma social”: de um prussiano. São Paulo: Expressão Popular , 2010.

MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã. Tradução de Frank Müller. São Paulo: Martin Claret , 2005.

MELO, E.; PANIAGO, M. C. S. (Org.); ANDRADE, M. A. Marx, Mészáros e o Estado. São Paulo: Instituto Lukács, 2012.

MÉSZÁROS, I. A crise estrutural do capital. Revista Outubro, São Paulo, n. 4, p. 7-15, 2015.

SOUZA, J. A radiografia do golpe: entenda como e por que você foi enganado. Rio de Janeiro: LeYa, 2016.

TONET, I. Educação contra o capital. 2. ed. São Paulo: Instituo Lukács, 2012.

Notas

1 A pesquisa culminou na escrita e defesa do Trabalho de Conclusão de Curso em Pedagogia, que se intitula: Alienação e participação política no curso de Pedagogia (KRELING, 2015), desenvolvida sob orientação da Profa. Dra. Carina Alves da Silva Darcoleto.
2 Não é nosso objetivo discutir sobre aquilo que alguns autores têm chamado de "Golpe”, para se referir ao impeachment ilegítimo da presidente Dilma. Dentre esses autores, Jessé de Souza tem dado uma contribuição significativa para o entendimento do "Golpe contra a Democracia”, como ele mesmo tem reiterado. Sobre essa discussão, ver, em especial: SOUZA, J. A radiografia do golpe: entenda como e por que você foi enganado. Rio de Janeiro: LeYa, 2016.
3 Entende-se por marxiano o pensamento produzido por Karl Marx e Friedrich Engels.
4 Para uma análise mais aprofundada da categoria do trabalho, no sentido ontológico, indicamos a leitura do capítulo intitulado O trabalho, parte da obra Para uma ontologia do ser social II, de Lukács (2013).
5 Reprodução social, nesse sentido, refere-se à continuidade do ser social.
6 No caso da sociedade capitalista, os interesses de uma determinada classe social se sobrepõe aos interesses da própria humanidade. Trataremos dessa questão mais adiante.
7 Sobre a crise estrutural do capital, o filósofo húngaro István Mészáros explica que: "Sua severidade pode ser medida pelo fato de que não estamos frente a uma crise cíclica do capitalismo mais ou menos extensa, como as vividas no passado, mas a uma crise estrutural, profunda, do próprio sistema do capital. Como tal, esta crise afeta - pela primeira vez em toda a história - o conjunto da humanidade, exigindo, para esta sobreviver, algumas mudanças fundamentais na maneira pela qual o metabolismo social é controlado” (MÉSZÁROS, 2015, p. 1).
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