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Antonio Gramsci: escritos sobre educação e política (1916-1919)
Práxis Educativa, vol. 12, núm. 3, pp. 1035-1040, 2017
Universidade Estadual de Ponta Grossa

Os artigos aqui traduzidos são inéditos no Brasil e abordam dois temas que se contrapõem e se entrelaçam: os objetivos da educação da classe trabalhadora e os objetivos da educação repressiva. Tais objetivos expressam projetos de sociedade diversos e antagônicos, perpassados pela noção de luta de classes. Eles implicam, portanto, a explicitação da função do Estado e das leis no âmbito desta luta: a educação repressiva toma uma ampla dimensão no contexto de um Estado autoritário e assume um caráter ideológico enquanto mascara as relações de dominação com as bases do discurso liberal. Cabe ainda salientar que, em 1916, a Itália se encontrava envolvida na Primeira Guerra Mundial e, em 1919, a Itália presenciava a ascensão do fascismo. Consideramos que esse contexto histórico tem paralelos com a situação vivida pelo Brasil neste início do século XXI e que, por isso, nos ajudam a explicitar contradições de nossa realidade social e política.

A primeira pedra

Há algum tempo, aconteceu em Milão um importante Congresso onde foram discutidos a fundo os problemas da educação popular. Participaram homens de diversas tendências, pedagogos fisiólogos, economistas e parlamentares. Presenciavam também membros influentes do partido socialista. Na ordem do dia, estavam estas questões: Como deve ser educado o povo? Como devem ser preparados para a vida do trabalho, que os espera, os jovens da classe operária? Que orientação deve ter o trabalho pedagógico na escola italiana, seja em relação às necessidades práticas, quanto em relação àquelas intelectuais e morais dos futuros trabalhadores? Ou seja, como se vê, era uma discussão nem mais nem menos que o problema central da própria formação do homem na sua dupla função técnica e espiritual.

Certamente foram ditas, naquela circunstância, muitas belas coisas nas intervenções: elogiou-se o trabalho da escola; celebraram-se as suas vantagens, as suas altas finalidades; fizeram-se as promessas habituais de melhoramento e de progresso; e desenvolveram-se as mais brilhantes teorias. Não vamos nos ocupar disso tudo, mas somente fixar a atenção sobre aquela que foi a tese fundamental afirmada pela maioria: a necessidade da educação do povo. É necessário que a escola forme sobretudo o cidadão italiano, essa é a sua tarefa precípua, a sua mais nobre e delicada missão. Educadores, criem a alma nacional nos seus alunos, eis o lema escrito sobre a bandeira da moderna pedagogia. E, em apoio a essa tese, apontava-se para o espetáculo da moderna Europa, cujos povos maiores e menores, recolhidos na forte consciência da própria nacionalidade, combatem a mais tremenda luta da história para a sua conservação e o seu desenvolvimento.

Contudo, contra esta tese de uma educação nacional e contra o argumento derivado da presente conflagração das linhagens europeias, nós devemos opor a tese socialista de uma educação nova, de uma educação simples e francamente humana, a única que convém às classes populares que a devem receber. Que a classe dirigente e os intelectuais que estão a seu serviço queiram impor para as grandes massas de trabalhadores rurais e urbanos um plano de educação que sirva para formar um estado de consciência e uma mentalidade nos conformes de seus objetivos de dominação é coisa muito natural e toda a história das instituições pedagógicas a confirma.

A importância e o significado de tal pretensão não escapam a ninguém. Em nosso país, até aqui, a escola foi disputada por duas forças diversas: a Igreja e a Maçonaria. A estas fazem frente também as duas máximas organizações Magistrais. O povo, porém, que, depois de tudo, é o mais interessado, no fundo é completamente estranho e indiferente tanto a uma como a outra tendência. Escola confessional ou escola laica, velhos termos antagônicos entre os quais se fechava o debate sobre o tema da educação do povo, já superados para sempre. Infelizmente, ainda muitos homens do nosso partido caem nesse erro e acreditam ter dito tudo quando formularam o programa anticlerical vazio, que se sintetiza na frase estereotipada: escola laica e educação civil.

É necessário mudar de curso, é necessário dar ao programa de educação do povo um conteúdo real, derivado da consciência imediata e direta das suas necessidades e das suas aspirações, dos seus direitos e deveres. A história pedagógica demonstra que toda classe que empreendeu a conquista do poder tornou-se idônea mediante uma educação autônoma. A primeira emancipação da servidão política e social é aquela do espírito. O programa de educação do proletariado deve ser formulado e efetivado por órgãos que o próprio proletariado constituiu em defesa dos próprios interesses. Eu coloco primeiro esta nova ideia: a escola popular deve ser colocada sob o controle dos grandes sindicatos operários. O problema da educação é o máximo problema de classe e só pode ser resolvido sob o ponto de vista da classe, que é o único que permite a valoração proletária das instituições sociais e das leis.

A Confederação geral do trabalho, os diversos sindicatos, as múltiplas organizações profissionais, exercem a gestão dos interesses atuais e imediatos da grande massa operária. Ao fazer assim elas tutelam o presente na sua realidade econômica. No entanto, se a sua tarefa propõe-se ultrapassar o momento atual, se pretendem concorrer para a preparação de um futuro próximo de elevação e conquista material e moral, é necessário que se coloquem as bases desse futuro melhor nas novas gerações com a educação.

Somente desse modo o proletariado pode conquistar uma sólida garantia sobre a humanidade em vias de formação e contribuir para a fundação do Estado democrático do trabalho que deve substituir o presente estado de violência e de privilégio. Nunca como hoje se impôs o problema da educação. Temos sob os olhos o quadro sangrento de um continente desordenado, devastado, empobrecido, e por quem? Precisamente por aquelas gerações de homens que foram educados conforme o espírito humano. Coloca-se a necessidade de efetuar uma revolução íntima dos espíritos, antes ainda de efetuar uma revolução das coisas.

Tiremos das classes dirigentes a educação do povo, que os direciona para a obra de destruição e de sangue, e teremos feito o primeiro e decisivo passo em direção a uma nova era, que é o propósito constante de nossos corações.

GRAMSCI, A. La prima pietra. In: GRAMSCI, A. Cronache Torinesi (1913-1917). Torino: Einaudi, 1980. p. 642-643.

A liberdade de divertir-se

O Estado italiano é o Estado de um país alegre. Os cidadãos italianos ignoram até que o Estado exista: de fato, não sabem como funciona nem sabem como deveria funcionar em cumprimento às leis fundamentais do reino e, diante de um ato dos poderes, não sabem dizer se esse ato é justo ou injusto, se fere ou não o Estatuto e, portanto, se fere ou não os direitos adquiridos pelos cidadãos, o mínimo de liberdade que o Estatuto garante. A liberdade é concebida de modo grotesco e pueril: não se chega a compreendê-la como garantia para todos, tutelados impessoalmente pelas leis, que a autoridade deve ser a primeira a respeitar. O povo italiano não é povo de livres, ou de cidadãos que querem tornar-se livres: a Itália é, na verdade, infelizmente, a nação carnaval e a liberdade é a liberdade de divertir-se e coçar-se ao sol1.

(Oitenta linhas censuradas). Os cidadãos têm apenas uma vaga noção das leis do Estado e acreditam que estas sejam somente punitivas; não concebem a lei como garantia, como segurança individual. Os italianos são individualistas, dizem os psicólogos. Contudo, a verdade é que os italianos são analfabetos e incultos, e que a Itália é a nação carnaval com uma liberdade, a única desejada: a liberdade de divertir-se.

01/06/1918. GRAMSCI, A. Sotto la Mole. Torino: Einaudi, 1975. p. 405-406.

O problema da escola (no contexto de uma política socialista)

Ao abrir, com esta nota, a discussão sobre o problema da escola, devemos fixar os critérios segundo os quais desejamos que a discussão se desenvolva. O problema da escola (como, de resto, qualquer problema que diga respeito a uma atividade geral do Estado, uma função necessária da sociedade) deve ser estudado como pertencente à esfera de ação do Estado dos Conselhos operários e camponeses. Nós tendemos a suscitar uma psicologia dos construtores, dos companheiros, já idealmente organizados no Estado dos Conselhos, já idealmente operosos e ativos no criar todos os órgãos da nova vida social. A propaganda educativa desenvolvida até agora pelos socialistas foi, em grande parte, negativa e crítica: não podia ser de outra maneira. Hoje, depois das experiências positivas dos companheiros russos, pode e deve ser de outro modo, se quisermos que as experiências dos companheiros russos não sejam vãs para nós. Devemos elaborar criticamente essas experiências, desfolhá-las de tudo quanto nelas é meramente russo e está em dependência das condições particulares nas quais a República dos Sovietes encontrou a sociedade russa no seu início; discernir e fixar o quanto nela é necessidade permanente da sociedade comunista, dependente das necessidades e das aspirações da classe dos operários e dos camponeses, explorada de modo igual sob todos os aspectos.

O problema da escola é problema técnico e político ao mesmo tempo. No Estado parlamentar-democrático, o problema da escola é técnica e politicamente insolúvel: os Ministros da Educação pública assumem o cargo porque pertencem a um partido político, não porque são capazes de administrar e dirigir a função educativa do Estado. Não se pode nem afirmar, em consciência, que a classe burguesa oriente a escola para seus fins de domínio: se isso acontecesse, significaria que a classe burguesa tem um programa escolar e o persegue com energia e retidão; a escola seria uma coisa viva. Entretanto, não o é: a burguesia, como classe que controla o Estado, desinteressa-se da escola, deixa que os burocratas façam e desfaçam a seu bel prazer, que os Ministros da Educação pública sejam escolhidos conforme os caprichos da concorrência política, pela intriga das facções, para alcançar o equilíbrio feliz dos partidos na composição dos gabinetes. Em tais condições, o estudo técnico do problema escolar é puro exercício de jogo de xadrez mental, é ginástica intelectual e não uma contribuição séria e concreta para a solução do próprio problema; quando não é enfadonha lamúria e repetição abusada de banalidades sobre a excelência da função educativa do Estado, sobre os benefícios da instrução, etc.

No Estado dos Conselhos, a escola representará uma das atividades públicas mais importantes e essenciais. Ao contrário, digamos: ao desenvolvimento e ao bom êxito da escola comunista, está ligado o desenvolvimento do Estado comunista, o surgimento de uma democracia na qual seja absorvida a ditadura do proletariado. A nova geração educar-se-á na prática da disciplina social necessária para realizar a sociedade comunista, com comícios, com a participação direta nas deliberações e na administração do Estado socialista. A escola deverá educar as novas gerações, aquelas que usufruirão os frutos dos nossos sacrifícios e esforços, aquelas que conhecerão, depois do período transitório das ditaduras proletárias nacionais, a plenitude de vida e de desenvolvimento da democracia comunista internacional. Como a escola comunista realizará essa tarefa? Como deverá ser organizada a função educativa do Estado no sistema geral dos Conselhos? Que tarefa administrativa deverá ser desenvolvida pelos sindicatos dos mestres e dos professores? As Universidades e os politécnicos, como serão transformados e coordenados à atividade geral de cultura? Transformada a constituição e mudados os princípios fundamentais do direito, qual a forma deverá ter a faculdade de legislar? E as bibliotecas, museus, galerias, que objetivos deverão ter? A nossa revista conta, entre os assinantes e os leitores, uma forte adesão de jovens estudantes, de artistas, de professores, de mestres que têm a capacidade e a preparação para colocar criticamente esses problemas e tentar a sua solução. Façamos apelo à sua boa vontade, ao desejo vivo que eles sentem de colaborar utilmente para a construção da nova ordem comunista.

(Não assinado, L’Ordine Nuovo, 27/06/1919, I, n. 7). GRAMSCI, A. L’Ordine Nuovo. Torino: Einaudi, 1975. p. 255-256.

Uma verdade que parece um paradoxo

A atividade científica materializa-se em grande parte pelo esforço da fantasia; quem é incapaz de construir hipóteses nunca será um cientista. Também, na atividade política, há uma grande parte de fantasia, mas na atividade política as hipóteses não são sobre fatos inertes, de matéria surda à vida; a fantasia em política tem por elementos os homens, a sociedade dos homens, as dores, os afetos, a necessidade de vida dos homens. Se um cientista erra na sua hipótese, no fundo, faz pouco mal: perde-se certa quantidade de riqueza de coisas: uma solução foi precipitada, um balão estourou. Se o homem político erra na sua hipótese, é a vida dos homens que corre perigo, é a fome, é a revolta, é a revolução para não morrer de fome. Na vida política, a atividade da fantasia deve ser iluminada por uma força moral: a simpatia humana; e é ofuscada pelo diletantismo, assim como entre os cientistas. Diletantismo que é, nesse caso, falta de profundidade espiritual, falta de sentimento e de simpatia humana. Para que se cuide adequadamente das necessidades dos homens de uma cidade, de uma região ou de uma nação, é necessário compreender essas necessidades; é necessário poder representar concretamente na fantasia esses homens enquanto vivem e agem cotidianamente; saber representar os seus sofrimentos, as suas dores e tristezas da vida que são constrangidos a viver. Se não se possui essa força de dramatização da vida, não se pode intuir as providências gerais e particulares que harmonizem as necessidades da vida com as disponibilidades do Estado. Projeta-se uma ação na vida: é necessário saber prever a reação que essa ação despertará, os contragolpes que ela terá. Um homem político é grande na medida de sua força de previsão: um partido político é forte na medida do número de homens com tal força de que dispõe.

Na Itália, os partidos de governo não podem dispor de nenhum de tais homens: nenhum que seja grande, nenhum que seja, ao menos, mediano. Um dos caracteres italianos, e talvez aquele que é mais maléfico para a eficiência da vida pública de nosso país, é a falta de fantasia dramática. Parece uma afirmação literalmente paradoxal e, na verdade, é uma observação profundamente realista. Toda medida é uma antecipação da realidade, tem uma previsão implícita. A medida é tanto mais útil quanto mais for aderente à realidade. E, para que isso aconteça, é necessário que o trabalho preparatório seja completo, que na preparação não se tenha negligenciado alguma hipótese e, das infinitas hipóteses possíveis, se tenha eliminado aquelas que não resistem à prova da representação dramática. Pois bem: as autoridades italianas, aquelas governamentais, provinciais, cidadãs, não têm até agora decretado uma medida que não tenha sido tardia, não apresentaram uma medida que não tenha precisado ser modificada, de ser, cedo ou tarde, rejeitada, porque em vez de assegurar melhorias, fazia aumentar o mal-estar. Não conseguiram harmonizar a realidade porque foram incapazes de primeiro harmonizar no pensamento os elementos da própria realidade. As autoridades ignoram a realidade, ignoram a Itália constituída de homens que vivem, trabalhando, sofrendo, morrendo. São diletantes: não têm alguma simpatia pelos homens. [...]. A multidão é ignorada pelos homens de governo, burocratas provinciais e cidadãos. A multidão, enquanto é composta de sujeitos singulares, não enquanto é povo, ídolo das democracias. Amando o ídolo, fazem sofrer o indivíduo singular. São cruéis porque a sua fantasia não imagina a dor que a crueldade termina por suscitar. [...].

03/04/1917, publicado no “Avanti!”. GRAMSCI, A. Scritti Giovanili (1914-1918). Torino: Einaudi, 1975. p. 100-102.

Simplesmente

O “Momento” responde ao “pai de família” que há alguns dias protestava, em uma carta dirigida ao nosso jornal, pelo fato de que, em uma escola de Turim, uma professora faz as crianças recitarem o Pai Nosso antes de iniciar a lição. E faz, ao “bravo pai de família”, esta simples argumentação: “Notou na sua menina qualquer coisa de preocupante e que se possa considerar como uma consequência daquela oração que ela recita todas as manhãs com os seus companheiros de escola? É, talvez, menos obediente e respeitosa em relação a você? Em casa comete faltas maiores que antes? Porque, se isso não acontece, eu não vejo o motivo de sua preocupação. É verdade, você é um livre-pensador e quer que a sua filhinha cresça livre de qualquer pensamento religioso; se lhe agradar, o procurará mais tarde... diz você; mas você não é sincero, porque sabe muito bem que a sua menina, quando se tornar uma mulher casada e tiver de lutar em meio ao mundo, não terá nem o modo nem o desejo de aprender aquela fé e aquela oração que você a fez ignorar completamente. E onde está, então, o seu respeito pela sua liberdade de pensar? É você que exerce uma violência sobre ela e não a professora que a faz recitar o Pai Nosso”. Assim responde simplesmente o “Momento”. E o “bom pai de família” encarrega-se de responder ainda mais simplesmente:

“Eu quero ter realmente a qualificação de ‘bom pai’ que o ‘Momento’ utiliza com uma certa ironia, insinuando que eu seja um pai fantasma. De fato, preocupo-me como a minha menina está formando seu caráter por meio dos contatos com a vida escolar e por meio daquele pouco ensinamento que eu próprio lhe dou. Mandando-a para a escola, eu entendia dar-lhe a possibilidade de aprender aquelas tantas coisas que eu não seria capaz de lhe ensinar. Entretanto, eu, de fato, não queria abdicar daquilo que considero seja meu máximo dever e minha tarefa essencial a seu respeito: ou seja, ser eu o mestre de suas convicções mais profundas a fim de, em seguida, assumir-me, com absoluta convicção, a responsabilidade do seu futuro e do seu comportamento.

Essas convicções que crio nela, seguindo aquilo que eu considero seja a verdade e habituando-a, com a persuasão e com o exemplo, a colocar sempre como finalidade de suas próprias, ainda que minúsculas ações, o verdadeiro e o justo. Qualquer apriorismo, qualquer pressuposto absoluto em torno dos fatos é banido do meu modo de educação. O único apriorismo indiscutível é aquele da sinceridade, único pressuposto admissível é aquele da imparcialidade na pesquisa, na busca cotidiana daqueles elementos que devem servir para fazer dela uma criatura profundamente humana. Mas eu não posso fazer tudo. É necessário o trabalho complementar da escola. Eu reconheço que a minha menina não se tornou má pelo fato de ter sido obrigada a ouvir recitar cotidianamente o Pai Nosso. No entanto, ela, que é uma criatura viva, ainda se uma menina, e sente profundamente, está desorientada pelo fato de que a sua professora lhe ensine também as coisas que o seu pai não lhe ensina e lhe explica de maneira diferente. Está aborrecida pelo fato de estar quase sozinha (apenas uma companheira sua de família israelita não recita as orações) a não fazer aqueles atos especiais que todas as outras crianças fazem. E entre o respeito e o afeto por seu pai e o afeto e o respeito pela professora, é tomada por uma angústia que eu gostaria de evitar, visto não ser ela ainda intelectualmente madura para compreender que pode também existir desacordo entre duas pessoas que, para ela, representam toda a vida espiritual. Eu sei que nessa angústia, que não deve ser somente a minha menina a sentir, colocou um problema pedagógico que as autoridades deveriam resolver do modo mais liberal, fazendo sim que a escola seja somente uma escola de cultura, e deixando para as famílias individuais a tarefa de educar os próprios filhos como melhor lhes agradar. Se na escola ensinassem o Buda Nosso ou o Nosso Allah, as crianças não se tornariam más por isso: no entanto, então, o ‘Momento’ se uniria a mim para protestar e provavelmente exibiria também ele o nome da liberdade de consciência. Eu não quero ser hipócrita com a minha menina, eis tudo: e o seria se deixasse que ela pudesse acreditar que não estou suficientemente convencido das minhas ideias, para permitir que o seu espírito se torne uma espécie de valise de todas as opiniões correntes no mundo”.

15/12/1916. GRAMSCI, A. Sotto la Mole (1916-1920). Torino: Einaudi, 1975. p. 265-266.

Notas

Tradução de Anita Helena Schlesener
1 Literalmente coçar-se ao sol, mas que pode ser interpretado tanto como indiferença política quanto como malícia, astúcia, manha de quem sabe aproveitar-se da situação e, por isso, não deseja mudá-la.


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