Resumen: O uso das redes sociais pelas polícias é considerado uma inovação em segurança pública, criando valor e gerando benefícios aos seus usuários externos e internos. Este trabalho se propôs realizar uma revisão sistemática da literatura, e seu objetivo foi analisar, segundo a literatura internacional, como as redes sociais estão sendo utilizadas pelos departamentos de polícia. A partir de busca direcionada em seis bases de dados e informações adicionais do Google Scholar, recuperou-se 4.814 estudos primários candidatos. Com auxílio do protocolo picoc, e após aplicação de critérios de exclusão e de parâmetros de qualidade, analisaram-se 70 artigos. Além das informações bibliométricas, verificou-se que as redes sociais mais utilizadas são Twitter, Facebook, Instagram e Youtube. Os principais resultados revelam que sua utilização pelas polícias transpassa a comunicação, informação e interação com a população, buscando engajamento e atuação em emergências e pandemia. E as redes contribuem para o aprimoramento das atividades policiais de vigilância, dissuasão criminal e do controle de desordens. Para além disso, este trabalho lança luz à temática no cenário acadêmico, propondo oportunidades de pesquisa. Como limitação, aponta-se na análise apenas da literatura qualificada e assim alguns artigos podem não ter sido incluídos por não se enquadrarem nos parâmetros elegidos.
Palavras-chave: Segurança pública, departamentos policiais, revisão sistemática, polícia, mídias sociais.
Resumen: El uso de las redes sociales por parte de la policía se considera una innovación en la seguridad pública, que crea valor y genera beneficios para sus usuarios externos e internos. Este trabajo pretendía realizar una revisión sistemática de la literatura, y su objetivo era analizar, de acuerdo con la literatura internacional, cómo las redes sociales están siendo utilizadas por los departamentos de policía. Mediante una búsqueda específica en seis bases de datos e información adicional de Google Scholar, se recuperaron 4.814 estudios primarios candidatos. Con ayuda del protocolo picoc, y tras aplicar criterios de exclusión y parámetros de calidad, se analizaron 70 artículos. Además de la información bibliométrica, se constató que las redes sociales más utilizadas son Twitter, Facebook, Instagram y Youtube. Los principales resultados revelan que su uso por parte de la policía va más allá de la comunicación, información e interacción con la población, buscando el compromiso y la actuación en emergencias y pandemias. Y las redes contribuyen a la mejora de la vigilancia policial, la disuasión de la delincuencia y las actividades de control del desorden. Además, este trabajo arroja luz sobre el tema en el escenario académico, proponiendo oportunidades de investigación. Como limitación, se señala en el análisis solo de la literatura calificada y por lo tanto algunos artículos pueden no haber sido incluidos por no ajustarse a los parámetros elegidos.
Palabras clave: Seguridad pública, departamentos de policía, revisión sistemática, policía, redes sociales.
Abstract: The use of social media by the police is considered an innovation in public safety, creating value and generating benefits for both external and internal users. This work aimed to conduct a systematic literature review and analyze, according to international literature, how social media is being used by police departments. Through a specific search in six databases and additional information from Google Scholar, 4.814 candidate primary studies were retrieved. With the help of the picoc protocol, and after applying exclusion criteria and quality parameters, 70 articles were analyzed. In addition to bibliometric information, it was found that the most used social media platforms are Twitter, Facebook, Instagram, and YouTube. The main results reveal that the police use of these platforms goes beyond communication, information, and interaction with the public, aiming for engagement and action during emergencies and pandemics. Social media contributes to improving police surveillance, crime deterrence, and disorder control activities. Additionally, this work sheds light on the topic in the academic arena, proposing research opportunities. As a limitation, it is noted that the analysis only includes qualified literature, and therefore, some articles may not have been included because they did not meet the chosen parameters.
Keywords: Public Safety, Police Departments, Systematic Review, Police, Social Media.
Artículos
Departamentos policiais e redes sociais: uma interlocução entre pesquisas e práticas*
Departamento de policía y redes sociales: una interlocución entre investigación y práctica
Department of Police and Social Media: An Interaction Between Research and Practice
Received: 03 August 2023
Accepted: 17 May 2024
Published: 30 June 2024
Enriquecida pela internet de alta velocidade e a disseminação do smartphone, as redes sociais permitem um canal bidirecional de comunicação com a possibilidade de feedback. Via de regra, redes sociais proporcionam interação entre emissor e receptor, tornandose parte integrante da comunicação moderna (Hu et al., 2018; Mayes, 2020).
Por se tratarem de recursos online que promovem interconexões e geração de conteúdos pelos usuários, as redes sociais tornaram-se protagonistas de estratégias de comunicação, apresentando-se como uma alternativa de custo relativamente modesto e demonstrando um extenso alcance geográfico e de público (Penha et al., 2020). Amplamente utilizadas pelas organizações, principalmente as comerciais, as redes sociais ainda não foram difusamente adotadas na área da segurança pública (Penha et al., 2020).
Nesse sentido, o legado de afastamento institucional das polícias com a população incide perversamente na organização de diversas maneiras (Cano, 2013). A relutância da difusão de informações pelas organizações policiais recai nessa problemática, diminuindo a capacidade de algumas corporações em adotarem as redes sociais (Anderson et al., 2015).
A resistência às inovações e ao desenvolvimento de novas ideias, na maioria das vezes, é relatada como características intrínsecas às polícias, compartilhadas entre essas organizações de diversas nacionalidades (Anderson et al., 2015; Minayo & Adorno, 2013). Se em áreas como Administração o risco inerente ao desenvolvimento e a difusão da inovação está vinculado ao ganho, em polícias esses riscos estão associados à segurança que deve ser assegurada por essas organizações ao Estado e à sua população (Minayo & Adorno, 2013).
Ainda assim, o uso das redes sociais pela polícia vem sendo considerado uma inovação em segurança pública, inovação esta diretamente atrelada à criação de valor e à geração de benefícios aos seus usuários externos e internos (Penha et al., 2020; Rogers, 2013). O uso das redes sociais vem paulatinamente se tornando popular entre os departamentos de polícia para divulgação de informações públicas (Grimmelikhuijsen & Mei-jer, 2015; Hu et al., 2021).
Relata-se também que há o aproveitamento das redes sociais pelas unidades policiais de inteligência, tanto na condução de vigilância quanto na extração de conhecimento oficial sobre atividades, personalidades e motivações de suspeitos e vítimas (Walsh & O"Connor, 2019). As redes sociais ainda são consideradas nos processos de investigações policiais, e seu conteúdo pode ser usado para complementar e verificar material probatório como álibis de suspeitos (Brunty & Helenek, 2014; Frank et al., 2011).
Denota-se que o uso proativo de redes sociais pela polícia apresenta-se como uma oportunidade de sua aproximação com a comunidade, permitindo a essas organizações expandir o alcance da informação e potencializar a interação com o público (Hu & Lovrich, 2019). Especialmente com jovens, que são avaliados como sujeitos de difícil envolvimento e mantêm lugar de destaque como grupo vulnerável nas estatísticas criminais (Hu & Lovrich, 2019; Minayo & Adorno, 2013; Wessels, 2009).
Acrescenta-se também que as redes sociais podem melhorar a qualidade e a frequência da comunicação entre polícia e cidadão. No entanto, os esforços de divulgação das informações públicas e o uso das potencialidades dessas redes por essas organizações têm apresentado alcance limitado (Hu & Lovrich, 2019; Wessels, 2009). Fundamentando-se nesse cenário, as pesquisas empíricas publicadas sobre o uso das redes sociais pela polícia crescem pouco a pouco (Hu & Lovrich, 2019).
Dessa forma, este estudo se esforça para reunir essas publicações independentes por intermédio de uma revisão sistemática da literatura (RSL), oferecendo uma visão retrospectiva acerca do uso dessas redes pelos departamentos policiais, de acordo com os pesquisadores. Caracterizada por utilizar uma metodologia de pesquisa com rigor científico e transparência, a RSL foi empregada buscando minimizar o enviesamento da literatura.
Tomando-se essa premissa, a questão principal que norteou este estudo foi: segundo a literatura internacional, como as redes sociais estão sendo utilizadas pelos departamentos de polícia? Para responder a essa pergunta, foram feitas as escalações dos artigos publicados sobre o tema empregando--se os critérios do protocolo picoc (acrônimo de População, Intervenção, Comparação, Recuperação e Contexto), de Kitchenham et al. (2007).
Com esse escopo em vista, após esta introdução, este trabalho se estrutura da seguinte forma: é apresentada a metodologia da revisão sistemática; em seguida, explica-se a condução da RSL dessa pesquisa; a seguinte seção apresenta os resultados, reiterados por sua discussão, e as oportunidades de pesquisa sobre a temática em pauta; e, por fim uma conclusão é exibida.
Neste estudo, a abordagem teve enfoque qualitativo, ainda que haja resultados quantificados, a estratégia de pesquisa adotada foi a bibliográfica. O delineamento do estudo teve propósito tanto descritivo quanto exploratório. Os sujeitos da investigação são os artigos que realizaram pesquisa de campo, ou seja, estudos primários (considerados as unidades de análise) selecionados para atender as perguntas de pesquisa elaboradas (Cordeiro et al., 2007; Creswell, 2010).
Segue-se o detalhamento do desenvolvimento da RSL, iniciando-se por seu planejamento. Nessa etapa foram registrados os passos da pesquisa não só para que esta possa ser replicável por outra investigação, como também para se aferir que o processo aqui executado seguiu um rito previamente definido e absolutamente respeitado, conforme a literatura consultada (ver Donato & Donato, 2019; Figueiredo Filho et al., 2014).
Primeiramente, a questão principal delineada na introdução trouxe, subsequentemente, duas perguntas secundárias (Figura 1).

Para estruturar as questões de pesquisa de forma a enfatizar essa premissa proposta, utilizou-se o picoc, que também foi empregado na extração dos textos, identificando termos de buscas e sinônimos (Kitchenham et al., 2007; Petticrew & Roberts, 2006). Advoga-se que o protocolo picoc maximiza a recuperação de evidências nas bases de dados, focando o escopo da pesquisa, evitando buscas desnecessárias (Santos et al., 2007). Cada letra da sigla do acrônimo picoc representa um passo a ser seguido no protocolo, explicado em sequência (Figura 2):
*Nota: o passo "C" foi parcialmente realizado, pois a orientação é que seja empregado quando se deseja exatamente cotejar métodos. Mas, como essa pesquisa não pretendeu fazer acareações entre estudos, apenas realizou-se o levantamento dos procedimentos metodológicos adotados nos trabalhos.
Iniciou-se os procedimentos para realização da RSL definindo-se metas e objetivos da revisão, critérios de inclusão e exclusão dos textos, parâmetros de avaliação da qualidade dos estudos e procedimentos empregados no resumo e na interpretação dos dados coletados que findaram nos resultados apresentados (Nightingale, 2009; White & Schimidt, 2005). A Figura 3 explana a dinâmica dos critérios empregados no presente estudo, a partir do protocolo picoc.

Como parte do protocolo, definiram-se fontes e strings de buscas dos textos empregados na RSL. As seis bases de dados digitais selecionadas para este estudo, por serem as que cobrem os fóruns mais importantes da comunidade acadêmica-científica (periódicos, anais de conferências e workshops), foram: Web of Science (WOS), ACM Digital Library (ACM DL), IEEE Explore, Science Direct (SD) da Elsevier, Scopus e Springer Link. E ainda se utilizou o Google Scholar para apoiar as buscas com informações adicionais sobre cada artigo, como quantidade de citações e informações de autores.
Realizou-se a busca pelos estudos empíricos sem restrição de área e data inicial (limitada até o ano de 2022), de forma automática, e os resultados foram coletados no campo de busca de cada biblioteca digital, através da execução das strings de pesquisa: "social media" OR "social network" OR "instagram" OR "facebook" OR "twitter" AND "police" OR "policing". Essas strings de busca foram baseadas no picoc e na questão principal de pesquisa, acrescentando os termos "social network" e "policing" como correspondentes para "social media" e "police", respectivamente.
Para garantir a coerência dos textos e a consecução do objetivo dessa pesquisa, foram aplicados nos trabalhos critérios de inclusão e exclusão. Como não há consenso sobre como deve ser realizada a inclusão ou não de um artigo na RSL, com o intuito de mitigar os vieses, optou-se por escolher apenas textos revisados por pares. Além disso, adicionou-se como critério de inclusão trabalhos que tenham sido oriundos da técnica de bola de neve, encontrados em pesquisa exploratória realizada antes do protocolo. Ou seja, manuscritos relevantes citados pelos trabalhos encontrados na busca anterior.
Já os critérios adotados para exclusão dos artigos (Tabela 1) consistiram em:

Para investigar a qualidade dos trabalhos, verificou-se que não há uma definição sobre o que é um estudo de alto nível. O que existe é um consenso de que, para se obter resultados confiáveis em uma revisão, os textos escolhidos apresentem qualidade (Kitchenham & Charters, 2007). Com isso em vista, adotou-se os seguintes Parâmetros de Qualidade (PQ) (Figura 4) para analisar os estudos:

O PQ1 foi desmembrado em itens gerais e específicos (Tabela 2) baseados em Ahmad et al. (2012). Essa ação objetivou alcançar rigor técnico dos conteúdos, evidenciando trabalhos que apresentam uma descrição clara de seus objetivos, método bem definido e estruturado e descrição dos principais achados, dificuldades e ou limitações do trabalho, a fim de reduzir a subjetividade na análise.
Os itens de verificação do PQI apresentam uma média ponderada na qual os pontos específicos pesam três vezes mais que os gerais, tornando as contribuições específicas de um estudo mais importantes que as gerais (Ahmad et al., 2012). Esses itens permitiram a classificação dos estudos calculada através da fórmula Quality Score (Equação 1), conforme Ahmad et al. (2012):
Equação 1. Quality Score

A quantificação numérica resultante do Quality Score qualificou os estudos em PQI em três status: "Alto", para pontuação > 3; "Médio", para pontuação ≥ 1,5 e ≤3; e "Baixo", para pontuação < 1,5. Ressalta-se que essa avaliação buscou alinhar as contribuições dos artigos encontrados com o propósito do estudo. Feito isso, apenas os trabalhos com status "Médio" ou "Alto" seguiram para serem avaliados pelos PQ2 e PQ3.
Em PQ2 a ponderação da qualidade foi atribuída considerando a medida estatística quartil (Q) aplicada segundo o SJR ou Qualis para periódicos. Deste modo, Q1 e Q2 foram considerados quartis com valores altos de classificação e Q3 e Q4 valores medianos (Sicsu et al., 2017). Assim, periódicos "A" foram avaliados como "Alto", "B" foram considerados "Médio" e "C" ou "sem classificação" foram tidos como "Baixo".
Em sequência, PQ3 classificou os textos como: "Alto" para artigos com mais de cinco citações; "Médio" para textos com uma a cinco citações; e "Baixo" para artigos que não apresentassem citações, com exceção de textos publicados nos últimos seis anos (esses foram considerados com status "médio" devido a serem publicações avaliadas como jovens). Para que o artigo fizesse parte dessa análise, precisou satisfazer a condição: PQ1 ≥ 1,5 e "PQ2 e PQ3" serem iguais a "Médio" ou "Alto".
Realizou-se a execução das strings de pesquisa nas bibliotecas digitais em 15 de maio de 2023, utilizando o campo "busca avançada" que se mostrou mais preciso do que o "busca simples". Recuperou-se 4.814 estudos primários candidatos, sendo provenientes da: Springer Link (66%); Scopus (19%); WOS (12%); SD (5%); IEEE (1%); e ACM DL (menos de 1%, quatro trabalhos). Os textos foram importados em formato RIS e exportados para o software StArt (escolhido para criar o banco de dados e dar suporte no processo da RSL), que realizou uma varredura em busca de estudos duplicados.
Após essa etapa, a seguinte fase avaliou e selecionou os estudos primários aplicando os critérios de inclusão e exclusão (exceto o de qualidade, pois foi inserido após a aplicação dos demais critérios de exclusão). A Figura 5 ilustra o processo de refinamento do corpus da pesquisa.

A Tabela 3 apresenta os 70 trabalhos selecionados para a RSL.

Inicia-se com as informações demográficas dos 70 trabalhos e segue-se com sua discussão, tendo em vista as questões de pesquisa (Figura 1). Ainda que a coleta não tenha se restringido a um período específico, destaca-se o quão recente são as publicações que relacionam o lócus "polícia" com a temática "redes sociais". O debate vem angariando visibilidade, mesmo que a publicação tenha demonstrado um crescimento relevante apenas em 2021 (Figura 6).

As primeiras publicações recuperadas são de 2013, demonstrando a contemporaneidade do debate, uma vez que não emergiram trabalhos sobre a temática com mais de 10 anos no circuito académico-científico qualificado. Mesmo que não tenha apresentado um crescimento consistente, a publicação se manteve constante, não tendo nenhum ano nesse intervalo em que não houvesse um texto publicado.
Ressalta-se que 2021 se avulta como um ano diferenciado para as publicações, pois apresenta quase 100% a mais de textos que o período anterior e o subsequente, ou mesmo nos demais anos. Assinala-se que não foi encontrado nenhum eventou ou uma ocorrência específica para esse cenário diferenciado. Os cinco primeiros anos, por sua vez, ainda que não exibam uma quantidade expressiva de manuscritos (17 dos 70 textos), se destacam por possuírem os 10 trabalhos mais citados, segundo o PQ3. A Figura 8 informa a quantidade de citações desses textos.

Acredita-se que por terem carater pioneiro, os artigos de 2013 a 2017 serviram de base as pesquisas nos anos seguintes, o que findou em influenciar em ser esse periodo o predominante entre a literatura mais citada nos manuscritos relacionados na Figura 8. Em seguida, delimitou-se a nacionalidade das publicacoes com base nas regioes de estudo de cada trabalho. A Tabela 4 traz a distribuicao:

Os EUA se mostraram o principal país no que se refere ao desenvolvimento de estudos sobre o uso das redes sociais pelos departamentos policiais, e a segunda nação mais profícua nas publicações foi a Inglaterra, mas com volume menor que a metade (ver Tabela 4). Ao se analisar os textos dos EUA, percebeu-se que há no país uma instituição promotora de estudos sobre a polícia - a International Association of Chiefs of Police (IACP), antes conhecida como Sindicato Nacional de Chefes de Polícia - que tem o propósito de melhorar a segurança da população através de pesquisas, programação e oportunidades de treinamento (IACP, 2022).
Observou-se que não foram escrutinadas polícias de países das Américas do Sul ou Central, como também orientais, entre os textos da Tabela 4. No entanto, nota-se que o uso das redes sociais pelos departamentos policiais está se difundindo não somente entre os países desenvolvidos, uma vez que coletaram-se textos oriundos da Nigeria, Zimbaubue e Quênia, do continente africano.
Com o crescente interesse sobre a temática, alguns autores se destacaram com mais de uma publicação, como: Meijer (2013, 2015, 2016, 2019), Bullock (2018a, 2018b, 2021), Hu (2018, 2020, 2021), Lovrich (2018, 2020, 2021), Brainard (2015, 2016) e Jungblut (2021, 2022). Verificou-se ainda que não houve repetição de publicação de autores em um único periódico, ou seja, seus textos subsequentes não se concentraram na mesma revista de publicação anterior.
Dos 37 journals presentes na pesquisa, cinco se destacaram por concentrarem 40% das publicações (28 dos 70 manuscritos analisados). Os periódicos mais aderentes a temática foram (Figura 8):

Sobre os journals da Figura 8, esses são os que possuem o maior fator de impacto avaliado em PQ2. No que se refere à classificação dos journals, apenas o "International Journal of Scientific and Technology Research" foi classificado com status "médio" (Q4), segundo o PQ2. Quanto à área dos periódicos que publicaram sobre redes sociais e polícia, todos pertencem às Ciências Sociais, predominando as subáreas de: Direito, Sociologia e Ciência Política.
Quanto às características da metodologia dos estudos analisados, algumas identificações foram obtidas. Em todos os trabalhos, o método empregado foi o dedutivo e verificou-se que a abordagem adotada pelas publicações no intervalo dos primeiros cinco anos foi prioritariamente qualitativa, seguida pela combinação quali-quanti e, em menor escala, quantitativa. Pelo período subsequente, identificou-se o mesmo padrão de adoção de metodologia pelos estudos. Desse modo, a distribuição da abordagem adotada pelas 70 pesquisas se deu da seguinte forma: 38 qualitativas, 14 quantitativas e 18 adotaram as duas.
Esse achado é coerente com o corpus desse estudo (um campo recente de pesquisa) e o que se advoga sobre a abordagem qualitativa (que tem por objetivo entender determinada situação social, fato, papel, grupo ou interação) (Creswell, 2010). E mesmo com o interesse de pesquisa instigando as publicações, esses trabalhos publicados durante esses 10 anos tenderam a estudar o fenômeno com objetivo metodológico exploratório, reforçando a contemporaneidade do debate.
Como as mídias sociais se tornaram parte integrante da rotina na sociedade, não é surpreendente que profissionais e acadêmicos as identifiquem como um meio potencial para fortalecer relações entre polícia e sociedade (Bullock, 2018; Grimmelikhuijsen & Meijer, 2015). Denota-se que o texto mais difundido aborda a confiança e o engajamento cívico presentes no ambiente virtual.
São 25 manuscritos dos 70 trabalhos analisados por este estudo os que exibiram status "Alto", de acordo com o PQI. Ou seja, auferiu-se que apenas 36% dos trabalhos analisados que relacionam as redes sociais às organizações policiais apresentaram qualidade elevada, segundo os critérios de qualidade adotados por este trabalho (os PQs).
São 37 artigos (52% do total) que avaliaram postagens das redes sociais das polícias (mas não o artigo mais citado), a saber (Tabela 5):

Para a execução de suas verificações, alguns dos autores dos estudos da Tabela 5 optaram por utilizar a técnica de análise de conteúdo (Lieberman et al., 2013; O'Connor, 2017; Yang & Stewart, 2019; Hand & Ching, 2020; Adorjan & Ricciardelli, 2021) e outros optaram por técnicas estatísticas (Yang & Stewart, 2019; Hu et al., 2020; Solymosi et al., 2021), havendo também autores que preferiram associar mais de uma técnica em suas análises (Huang et al., 2017; Livingstone, 2021; Ceccato et al., 2021).
Os autores que escrutinaram as postagens argumentaram que a finalidade de uso das mídias pelas polícias é prioritariamente (mas não só isso) comunicar, informar e interagir com o público. Esse posicionamento coaduna com Hu et al. (2020), que advogam que as organizações policiais adotaram o uso das mídias sociais para uma variedade de propósitos. A Tabela 6 sumariza o uso das redes sociais pelas polícias, segundo os 70 trabalhos:

Além desses propósitos de uso apontados (Tabela 6), alguns outros ainda podem ser registrados. Walby & Wilkinson (2021) abordaram a transformação da visão tradicional da cultura policial para organizações mais inclusivas, enquanto Mayes (2021) auferiu a construção de uma imagem pela polícia que projete humanidade, permitindo que a comunidade perceba essas organizações como membros e não uma força de oposição.
Ademais, também foi indicado que redes sociais podem ser empregadas pelas polícias como plataformas para deter o terrorismo e a agitação civil (Mugari & Muzinda, 2021). Há ainda o uso das redes sociais pelas polícias com o objetivo de coleta de dados de inteligência, na condução de investigações e realização de vigilância (Fallik et al., 2020; Mugari & Muzinda, 2021; Trottier, 2017). E seu uso instiga a população a participar da governança do combate à criminalidade e à insegurança, instruindo os cidadãos sobre prevenção de crimes e estimulando denúncias e colaboração da população em casos de desaparecimentos (Ferguson & Soave, 2021; Walsh, 2020).
Via de regra, aponta-se que 53% dos adultos utilizam redes para se informar (Shearer & Mitchell, 2021). Com isso em vista, na medida em que os departamentos de polícia adotam mídias sociais, dentre as plataformas existentes, quatro vêm prevalescendo (Figura 9).

Observa-se a preferência pelo uso do Twitter e do Facebook devido à possibilidade de compartilhamento de diversos tipos de conteúdo, como notícias, atualizações, comentários e fotos (Williams et al., 2018). A escolha por priorizar essas redes sociais pode estar atrelada aos grupos sociais que essas plataformas agregam, permitindo às polícias alcançarem o público-alvo desejado e maximizarem efeitos potenciais (Dai et al., 2017; Dwyer, 2020). O Instagram e o Youtube também são utilizados pelas polícias (Figura 9), mesmo sendo redes sociais pouco exploradas e difundidas nas pesquisas dos artigos.
Diante disso, pode-se entender que o uso das mídias sociais está sendo percebido como um ajuste natural de comunicação com a comunidade em que o departamento policial está inserido. Portanto, a maioria das organizações policiais está fazendo uso das redes sociais ciente de sua onipresença na sociedade e de sua capacidade de influenciar a imagem pública de seu trabalho (Livingstone, 2021).
Verificou-se também que os estudos relatam que os departamentos policiais têm buscado estender sua atuação no meio digital, fomentando as unidades de inteligência para alcançarem os princípios básicos do policiamento: dissuadir crimes e desordens, preservar a ordem, administrar a justiça, garantir que infratores sejam punidos por seus atos e assegurar a transparência de suas ações.
Avalia-se que, tratando-se de uma temática recente, muitas perspectivas precisam de análise acerca do assunto, possibilitando estudos que irão lançar luz às discussões sobre inovação na segurança pública, contribuindo ao campo teórico e à sociedade. Como parte do resultado de um escrutíneo subjetivo baseado nas sugestões de pesquisas futuras sugerida pelos autores dos textos analisados, algumas abordagens se tornaram relevantes e com potencial de contribuição.
Segundo os autores, entre as abordagens que podem emergir, sobressai-se a gestão da prestação do serviço de policiamento e sua interação com as mídias sociais. Com isso em vista agrupam-se seis linhas de estudos emergentes as oportunidades vislumbradas:
usar as redes sociais para o policiamento é inovador (Bullock, 2018;Edlins & Brainard, 2016;Hu et al., 2021). Uma análise com isso em vista permitirá conceber uma visão de como ocorre o processo de inovação para adoção das redes sociais em instituições hierarquizadas e como se encontra a evolução da difusão dessa inovação nos diversos departamentos de polícia de tamanhos variados;
ainda na perspectiva da inovação, dentre os tipos de inovação, o uso dessas redes para comunicação, informação e engajamento com o público torna-se uma extensão do serviço de policiamento (Beshears, 2017;Hu et al., 2018;Mugari & Mu-zinda, 2021). Assim, sua adoção transforma-se em uma inovação em serviço, tornando um estudo sobre essa nova forma de acesso e entrega do policiamento relevante à compreenção do caso;
alguns trabalhos apontaram deficiências quanto ao uso das redes sociais para atingir os objetivos propostos pelo departamento policial (Fallik et al., 2020;Mugari & Chisuvi, 2021). Portanto, uma investigação nessas instituições em seus tamanhos variados para conhecer estratégias para um melhor aproveitamento do que as redes sociais proporcionam, pode instigar estudos que usam as tecnologias de informação e comunicação de forma estratégica;
assim como o tamanho dos departamentos influencia em como estão sendo desenvolvidas e praticadas a adoção e utilização das redes sociais, a localização também tem efeito sobre seu uso pelas polícias (as redes sociais são consideradas uma inovação de baixo custo) (Boateng & Chenane, 2020;Ceccato et al., 2021;Meijer & Thaens, 2013). A distinção cultural de uma cidade grande para uma pequena sugere uma abordagem de comparação adequada para entender diferenças e semelhanças da adoção e do uso dessas plataformas pelos departamentos;
há uma necessidade premente de pesquisas para considerarem o impacto na sociedade (social, econômico, político, entre outros) das diferentes formas de utilização das redes sociais pelos departamentos policiais (Hand & Ching, 2020;Walby & Wilkinson, 2021); e
também deve-se buscar o aprofundamento das atitudes e da percepção dos cidadãos em relação ao serviço da polícia prestado via redes sociais (Leott, 2019;Warren et al., 2014).
Este artigo possibilitou uma apreciação exploratória de como vem se dando o uso das plataformas de redes sociais pelos departamentos de polícia, a partir de trabalhos publicados na literatura qualificada. As fases e os procedimentos metodológicos adotados pela pesquisa estão descritos com o intuito de possibilitar sua repetição. Nesta RSL, visou-se encontrar evidências empíricas relatadas pelos autores de esforços e ações adotadas pelas polícias que estão inseridas no meio digital para estabelecerem objetivos básicos do policiamento e cumprirem sua missão institucional com a comunidade a qual pertencem.
E, ainda que departamentos policiais de diversas nacionalidades e realidades tenham sido pesquisados, constatou-se que, ao adotarem as redes sociais, compartilham, além de suas atribuições básicas, propósitos em comum. Verificou-se que o uso das redes sociais vem mudando os padrões de inteligência e comunicação nas polícias, demonstrando o interesse dessas organizações em difundir essa inovação e transpor a visão de uma organização policial distante de sua comunidade.
Ademais, com evidente foco em comunicação e informação, os departamentos policiais buscam disseminar uma imagem organizacional transparente e legítima, e construir relacionamentos com os cidadãos por meio da interação direta atraves do ambiente digital. Em conjunto, os resultados apresentam implicações de que as informações publicadas pelos departamentos policiais impactam na forma como os cidadãos respondem e interagem com essas organizações.
Prioritariamente, entende-se que cidadãos bem informados podem contribuir à segurança pública, tomando medidas preventivas adequadas ou fornecendo informações relevantes à polícia.
Destaca-se também, na análise de alguns trabalhos, que algumas instituições tendem a utilizar as redes sociais mais para orientação da aplicação da lei e aprimoramento das atividades policiais, enquanto outras são mais direcionadas à comunidade, como extensão do policiamento comunitário.
Constatou-se que o cenário acadêmico demonstra uma produção evolutiva de massa crítica na construção do conhecimento a respeito do objeto da pesquisa. No entanto, por ser um tema que recentemente vem ganhando notoriedade, a literatura ainda se encontra limitada - tanto em quantidade quanto em métodos adotados pelos estudos - e são várias as perspectivas possíveis de pesquisa, conforme apresentadas na seção anterior e também para além delas. Assinala-se aqui que a agenda de pesquisa que se sobressaiu pode ser considerada um reflexo da área de publicação dos textos avaliados (Ciências Sociais).
Como limitações desta pesquisa, aponta-se que se optou em analisar apenas a literatura qualificada e por isso podem não ter sido abarcados alguns estudos que não se enquadram nos parâmetros elencados e descritos. Além disso, o tamanho considerado como mínimo dos textos, assim como não se buscar tecnologias, serviços e outros elementos já classificados como inovativos às polícias, e associadas as redes sociais, podem também ter contribuído à não inclusão de algum estudo nesta pesquisa.
No entanto, avalia-se que esta pesquisa revelou como as redes sociais estão sendo utilizadas pelos departamentos de polícia, além das duas questões secundárias levantadas. Considerando a atualidade e a pertinência da proposta, como não foi encontrado nenhum outro texto de análise da bibliografia sobre a temática, sugere-se, posteriormente, buscar a replicação desta RSL para evidenciar a evolução do campo de pesquisa.
Espera-se que futuras pesquisas possam desenvolver as oportunidades identificadas na sessão anterior, alargando o conjunto da literatura e fornecendo mais evidências sobre o tema. E que outras áreas de conhecimento busquem também ampliar o escopo do entendimento da relação entre redes e polícias.












