Artigos
Guia ilustrado de orientações a cuidadores de crianças com deficiências neuromotoras
Illustrated guide for caregivers of children with neuromotor disabilities
Guia ilustrado de orientações a cuidadores de crianças com deficiências neuromotoras
ConScientiae Saúde, vol. 18, núm. 1, pp. 8-17, 2019
Universidade Nove de Julho

Recepção: 24 Abril 2018
Aprovação: 22 Fevereiro 2019
Resumo: Introdução: o aumento do público idoso nos serviços de saúde requer instrumentos de avaliação cada vez mais específicos e precisos no diagnóstico deles. Objetivo: comparar a especificidade da SPPB e Índice de Tinetti validadas no Brasil em pacientes com e sem disfunções neuromotoras. Materiais e Métodos: 39 sujeitos (19 saudáveis e 20 com alterações neuromotoras) de ambos os sexos com idade entre 60 e 75 anos, residentes em Coari – AM, realizaram em datas alternadas avaliação pelas escalas SPPB e Tinetti. Resultados e discussão: foi observada diferença significativa entre as escalas, onde a distribuição mostrou-se muito concentrada em Tinetti e mais dispersa na SPPB para o grupo saudável, demonstrando que a SPPB conseguiu detectar as mínimas diferenças em marcha e equilíbrio entre indivíduos saudáveis; enquanto a escala de Tinetti discriminou melhor os indivíduos saudáveis dos patológicos. Conclusão: a SPPB mostrou-se mais específica que Tinetti, sendo capaz de detectar melhor alterações em marcha e equilíbrio. Descritores: Marcha. Equilíbrio Postural. Idosos. Introduction
Palavras-chave: Guias Informativos, Família, Desenvolvimento Infantil.
Abstract: Introduction: Increasing elderly populations require specific and accurate health assessment tools. Purpose: To compare the specificities of the short physical performance battery (SPPB) and the Tinetti Index validated in Brazil in patients with and without neuromotor dysfunctions. Materials and methods: Thirty-nine individuals (19 healthy and 20 with neuromotor changes) of both sexes aged 60–75 years, living in Coari (Amazonas state in Brazil), underwent SPPB and Tinetti scale assessments on alternate dates. Results and discussion: We observed significant differences between the scales, where the distribution was very concentrated after the Tinetti assessment and more dispersed after the SPPB in healthy individuals. This demonstrated that SPPB can detect minimal differences in gait and balance between healthy individuals, while the Tinetti scale is better at discriminating between healthy and those affected by mobility disorders. Conclusion: SPPB was more specific than the Tinetti Index in detecting changes in gait and balance.
Keywords: Gait, Postural Balance, Aged.
Introdução
A chegada de um filho com deficiência traz uma nova realidade para a família1. O impacto pode ser tão significativo a ponto de comprometer a aceitação e o estabelecimento de vínculo com o filho e a compreensão de informações dadas por profissionais que cercam a família. Também pode haver alteração da rotina diária, dos sonhos e dos projetos de cada membro da família. Famílias com crianças deficientes também são mais propensas ao estresse e têm maior probabilidade de sofrerem desajustamento familiar1,2.
Dados do censo nacional de 2013 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelaram que 2,8% das crianças brasileiras de zero a quatro anos têm algum tipo de deficiência, seja ela auditiva, física, visual e/ou intelectual3.
A deficiência física pode se apresentar como completa ou parcial, de um ou mais segmentos do corpo humano. As etiologias mais recorrentes são: a paralisia cerebral, que traz limitações psicomotoras devido a uma lesão no sistema nervoso central, cuja característica mais marcante é a espasticidade nos músculos; a lesão medular, geralmente ocorrida devido a acidentes que levam a lesões do sistema nervoso que, dependendo de sua altura, podem comprometer diferentes partes do corpo. E a má formação congênita, que acarreta uma anomalia física desde a gestação4.
O distúrbio neuromotor relaciona-se à desordem no controle da postura e do movimento, causada por lesão no sistema nervoso central, podendo gerar ainda alterações do tônus muscular e o aparecimento da movimentação involuntária. Em alguns casos, as combinações de alguns ou muitos desses fatores geram a desorganização da ação das crianças que apresentam o que se denomina de distúrbio neuromotor5,6.
O termo neuromotor também se refere às deficiências cujas manifestações exteriores consistem em fraqueza muscular, paralisia ou falta de coordenação, geralmente são designadas mais apropriadamente como neuromusculares, uma vez que as dificuldades encontram-se mais frequentemente nos centros e vias nervosas que comandam os músculos, do que nos músculos em si. Lesões nervosas podem ser causadas por infecções ou por lesões ocorridas em qualquer fase da vida da pessoa, podendo também ocorrer por uma degeneração sem causa aparente7.
Muitas orientações dadas no contexto ambulatorial e clínico são desperdiçadas pelo desconhecimento da realidade da rotina familiar, escolar e da comunidade em que a criança com deficiência neuromotora está inserida8. A abordagem centrada na família é uma resposta a esse problema, ao passo que firma um compromisso de exploração dos pontos fortes da família e de trabalho a partir deles, reconhecimento de suas necessidades, respeito a suas crenças e valores e, encorajamento para a realização dos desejos e aspirações da família9. A insensibilidade a essas questões pode ser um dos motivos pelos quais pais de crianças com deficiência neuromotoras manifestem descontentamento em relação às orientações que recebem dos profissionais de saúde10.
A orientação familiar consiste em elaborar uma série de instruções com base em conhecimentos científicos e transmiti-las aos cuidadores e/ou responsáveis. A construção de materiais de orientação ao cuidado traz contribuições importantes aos profissionais de saúde e têm como objetivo subsidiar a orientação verbal dos profissionais11,12.
No entanto, vale ressaltar, que a pesquisa visa abranger a deficiência física de forma geral. Ainda que se encontrem especificidades dentre os casos, busca-se circunscrever o que há de regularidade nos grupos, ou seja, quais são as dificuldades, habilidades e dúvidas que os pais / responsáveis de crianças deficientes possuem.
Há presente na literatura alguns materiais ilustrativos destinados à algumas populações13,14. A importância deste estudo se deve principalmente à abordagem centrada na família, em que pais / responsáveis de crianças deficientes foram ouvidos para criação do material.
Sendo assim, este estudo teve como objetivo principal a criação de um guia ilustrado que possa ser usado como material complementar às orientações fisioterapêuticas dadas em terapia.
Métodos
Este estudo teve caráter descritivo, com delineamento transversal prospectivo e foi feito em quatro etapas consecutivas:
Etapa 1
A amostra foi composta por famílias de crianças de sete a quarenta e dois meses de idade com diagnóstico clínico de alterações neurológicas que eram atendidas no Ambulatório de Fisioterapia Neuropediátrica do Hospital Escola. Foram excluídos da amostra famílias de crianças com diagnóstico de outras patologias ou síndromes não-neurológicas e responsáveis por crianças institucionalizadas. Todas as famílias (N=26) que atendiam aos critérios de inclusão na época (2015) foram convidadas a participar do estudo. O número amostral final desta etapa foi de 15 familiares.
Para conhecermos a rotina de cuidados das famílias com as crianças com alterações neurológicas e possíveis dificuldades enfrentadas por eles, elaboramos um questionário composto por tópicos que permitiu a elaboração do perfil sociodemográfico dos participantes, da dinâmica familiar, das habilidades e dificuldades dos participantes no manuseio e cuidados com a criança e de sua rotina, bem como de seus aspectos funcionais. A dinâmica da criança também foi investigada: aspectos funcionais, aquisições motoras e posturas adotas, entendimento de sua rotina diária tais como, onde e com quem passa a maior parte do tempo, uso (ou não) de dispositivos para posicionamento, atividades (e terapias) das crianças, onde e com quem gosta de brincar.
Cada entrevista foi feita individualmente com cada participante, com duração aproximada de 40 minutos, enquanto a criança fazia fisioterapia.
Elaboração do guia ilustrado
A partir dos resultados da Etapa 1, o esboço do guia ilustrado foi elaborado com texto e referências visuais que pudessem servir de modelo para as ilustrações. A escolha da ilustradora foi feita em função do estilo e do traço de seus trabalhos e de sua experiência prévia com materiais semelhantes. As pesquisadoras participaram ativamente da construção das ilustrações do guia por meio de troca de e-mails, telefonas e encontros presenciais.
O teste Flesch de leiturabilidade (recurso presente no Microsoft Word) foi usado na versão preliminar do texto do guia a fim avaliar a adequação do texto ao grau médio de escolaridade do público alvo.
Etapa 2
Os critérios de inclusão e exclusão foram os mesmos da etapa 1. Todas as famílias (N=5) atendidas no Ambulatório de Fisioterapia Neuropediátrica do Hospital Escola que entravam nos critérios de inclusão foram convidadas a participar do estudo, e todas aceitaram. A grande diferença no número de famílias que atendiam aos critérios das etapas 1 e 2 reflete uma mudança estrutural do ambulatório no período da coleta de dados (2016).
Uma cópia da versão preliminar do guia ilustrado foi entregue a cada família participante para que, após quinze dias úteis, respondessem presencialmente e individualmente a um questionário semiestruturado. Todas as entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas e analisadas por meio da Análise de Conteúdo.
Adequação do guia ilustrado
O guia ilustrado foi modificado a partir dos dados obtidos na Etapa 2. Além disso, foram levadas em consideração sugestões de profissionais experientes da área (banca de defesa de Mestrado a qual o trabalho foi apresentado).
Análise de dados
Os dados coletados da avaliação do guia ilustrado e do diário de campo foram organizados e as narrações orais transcritas; para que posteriormente unidades de análise fossem criadas e estruturadas em categorias para serem analisados por meio da Análise de Conteúdo. Os resultados encontrados foram analisados a partir da categorização proposta por Bardin15 em que cada categoria é formada por um grupo de elementos com características comuns.
Ética
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sob o número CAAE 32051114.7.0000.5404. Foram respeitados todos os preceitos éticos da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.
Este estudo teve caráter descritivo, com delineamento transversal prospectivo e foi feito em quatro etapas consecutivas:
a) Etapa 1: conhecer a rotina, as dificuldades e habilidades das famílias em relação aos cuidados com a criança com alterações neurológicas
b) Elaboração do guia ilustrado
c) Etapa 2: conhecer a possível contribuição do guia para as famílias
d) Adequação do guia ilustrado
Resultados
Quinze famílias (pais, mães e responsáveis) de crianças atendidas no ambulatório de fisioterapia do Hospital-escola participaram da Etapa 1 do estudo. As características sociodemográficas e clínicas das crianças das famílias participantes dessa estão no Quadro 1.
O tempo de seguimento na fisioterapia variou entre seis meses a um ano e nove meses, com sessões de duração média de 60 minutos e com frequência de atendimento de uma vez por semana.
A média etária das mães foi de 30 anos e a dos pais foi de 31 anos. A distribuição dos níveis de escolaridade dos participantes da pesquisa está na Figura 1.
Nove dos responsáveis afirmaram ter alguma dificuldade para lidar ou cuidar da criança em casa; cinco disseram não terem nenhuma dificuldade e um não soube opinar. As maiores dificuldades relatadas foram: posicionar, alimentar, dar banho, carregar, vestir, estimular e brincar.
A maioria das famílias afirmou seguir orientações dadas pelos profissionais da saúde. De acordo com eles, as orientações eram dadas predominantemente por fisioterapeutas e eram relacionadas ao posicionamento das crianças em casa. Mesmo respondendo que seguiam as orientações, todos os pais expuseram em outro momento da entrevista não dispor de muito tempo para praticá-las e sobrecarga com outros familiares e dinâmicas do lar era um impedimento para dedicação maior com o filho deficiente.
As categorias e subcategorias que surgiram da análise da fala espontânea dos pais, mães e responsáveis da Etapa 1 da pesquisa estão na Figura 2. Essas falas foram numeradas de F1 a F15 e as falas das mães que avaliaram o guia, na Etapa 2, foram numeradas de M1 a M5. As mais representativas delas serão apresentadas a seguir exatamente como foram transcritas.
As dificuldades relatadas em relação à alimentação eram relacionadas a refluxo gastresofágico, engasgos com alimentos líquidos e/ou pastosos, e a alterações da mastigação.
F1: “Meu neto engasga muito, fico com medo dele engasgar e não conseguir ajudar, fico apavorada.”
F11: “Eu tenho dúvidas, mas ninguém nunca me falou disso. É lógico que a gente tem muitas dúvidas e fica sem saber o que fazer algumas vezes.” Esta mãe disse que nunca havia sido orientada em relação à alimentação do filho.
Em relação ao banho da criança, as famílias apontaram o fato de elas terem que tomar banho junto com os pais ou com a avó, resultando em banhos inadequados tanto para os adultos quanto para as crianças.
F10: “Ele está bem pesado e grande, a gente tem cadeira de banho, mas mesmo assim fica difícil pra mim tirar e colocar de lá. O peso não ajuda. Acabo ficando sempre com dor nas costas e não tem ninguém pra me ajudar.”
Cinco famílias relataram ter dificuldades para carregar as crianças em razão do seu peso corporal.
F11: “Carregar é difícil por conta do peso. Ele tá bem pesadinho. Para sair sozinha com ele dependendo do lugar eu peço ajuda pro meu marido ou pra minha mãe. É pra revezar né, quando eles não podem, eu nem saio para longe.”
A maioria dos pais e responsáveis associou a compra ou não de brinquedos para seus filhos de acordo com o diagnóstico clínico da criança.
F 3: “É difícil ele brincar, ele não fixa o olhar, a gente nem compra brinquedo.”
F8: “Ele nem brinca, daí nem compro nada.”
Os pais, mães e cuidadores sentem medo de posicionar, movimentar e estimular a criança por não saberem fazer certo ou quando a criança demonstra choro.
F4: “Tento fazer como a fisio me diz pra fazer, mas quando chega em casa tudo é diferente, o meu filho chora e eu fico com medo de fazer algo que está machucando, como ele não fala, fica difícil saber se estou machucando. Quando ele chora eu fico mais nervosa ainda.”
F12: “Ela faz uns movimentos bruscos, daí não sei se ela está se sentindo bem, se tá gostando ou se tô machucando.”
As dificuldades para realizar as tarefas de vida diária com a criança também estavam associadas às condições de saúde dos responsáveis.
F12: “Eu tenho fibromialgia, sinto dores constantemente, não consigo ter tempo para cuidar de mim, e cada dia fica mais difícil.”
Os pais F8 são fisioterapeutas, mas a mãe afirmou não usar em casa todo conhecimento que possui para os cuidados com o filho.
“Eu sei que eu tenho que fazer as coisas com ele, eu sei como posicionar, brincar, fazer tudo isso que você está me perguntando, mas eu confesso que não faço. Eu deixo para minha filha brincar com ele, acho que ela lida melhor com a deficiência do que eu. Tratar os pacientes é fácil, difícil é cuidar do filho da gente”.
Com os dados obtidos nesta etapa construímos uma lista com dez áreas que precisariam ser abordadas no guia ilustrado: principais posicionamentos, orientações gerais de posicionamento, quarto de dormir, alimentação, hora do banho, carregando seu filho, vestir, cuidados com quem cuida, dicas de lazer e brinquedos e brincadeiras.
O teste Flesch para o texto elaborado classificou o texto como de leitura relativamente fácil (72 pontos).
A versão preliminar do guia passou por uma avalição opinativa com cinco mães. As características sociodemográficas e clínicas das crianças das famílias participantes estão no (Quadro 2). Quatro das cinco mães aprovaram totalmente a versão preliminar do guia ilustrado, classificando-o no como ótimo e uma outra mãe o classificou como bom.
M1: “Achei muito bom. Minha filha também olhou o guia e comentou comigo que é muito interessante e que nunca ninguém tinha nos dado algo do tipo.”
M2: “…quando tive alta não tive nenhum suporte por parte dos médicos, eu tinha medo até de dar banho no meu filho. Realmente me fez muita falta ser bem orientada desde o começo. Eu só fui ficar mais tranquila quando ele entrou aqui na fisio e a gente conversa com outras mães, pais, percebe que não é só você que tem medos e insegurança.”
As cinco mães afirmaram que nunca haviam recebido um material como o apresentado a elas e ressaltaram a importância de ter um suporte por escrito na fase inicial de descoberta do diagnóstico de seus filhos:
M4: “Eu te falo que fez muita falta pra mim, essa parte…. Se eu tivesse um material igual o seu dando as orientações, as dicas, como posicionamento, brinquedos, acho que eu teria ajudado muito mais no desenvolvimento dele.”
M3: “Foi a primeira vez que eu recebi algo assim por escrito. Sempre é da boca pra fora né, são tantas coisas que a gente até esquece ou fica perguntando toda hora como é que se faz.”
Todas as mães afirmaram ter mostrado o guia para outros membros da família, como companheiros e avós; e afirmaram que dariam o guia para outros pais de crianças com deficiência. Todas as mães disseram que certamente o guia seria útil para facilitar as atividades do cotidiano.
Recebemos sugestões para melhoria do guia ilustrado de duas mães e ambas se referiram a parte de brinquedos e brincadeiras, pedindo a ampliação deste capítulo. As sugestões de profissionais especialistas resultaram em revisões gramaticais e de algumas ilustrações e na inclusão de um capítulo sobre órteses.
Assim, a versão final do guia ilustrado foi dividida em onze capítulos e uma sessão para anotações. Os capítulos são: principais posicionamentos, orientações gerais de posicionamento, órteses, quarto de dormir, alimentação, hora do banho, carregando seu filho, vestir, cuidados com quem cuida, dicas de lazer e brinquedos e brincadeiras.
O guia ilustrado foi publicado pela Memnon Edições Científicas e está disponível para download gratuito no site http://memnon.com.br/produto/guia-ilustrado-para-cuidadores-de-criancas-com-deficiencias-neuromotoras/
| Criança | Gênero | Idade (meses) | Diagnóstico clínico | Distúrbios associados e complicações | GMFCS (Nível) |
| 1 | M | 34 | PC | RGE | IV |
| 2 | F | 27 | PC | — | IV |
| 3 | M | 32 | PC | RGE, Síndrome de West | V |
| 4 | M | 19 | PC | Síndrome de West | IV |
| 5 | F | 31 | MMC | — | — |
| 6 | F | 36 | MMC | Hidrocefalia | — |
| 7 | M | 42 | PC | — | I |
| 8 | M | 37 | PC | Distúrbio visual | V |
| 9 | M | 32 | PC | — | IV |
| 10 | M | 16 | PC | Hidrocefalia | III |
| 11 | F | 18 | PC | — | IV |
| 12 | F | 10 | PC | Síndrome de West | IV |
| 13 | F | 7 | PC | Hidrocefalia, Síndrome de Dandy Walker | V |
| 14 | F | 9 | PC | — | IV |
| 15 | F | 18 | PC | — | V |


| Criança | Gênero | Idade (meses) | Diagnóstico Clínico |
| C1 | Masculino | 36 meses | Paralisia Cerebral (GMFCS nível V) |
| C2 | Masculino | 18 meses | Acidente Vascular Encefálico |
| C3 | Feminino | 6 meses | Mielomeningocele |
| C4 | Masculino | 32 meses | Paralisia Cerebral (GMFCS nível IV) |
| C5 | Masculino | 36 meses | Paralisia Cerebral (GMFCS nível III) |
Discussão
O guia ilustrado destinado a pais e familiares de crianças com deficiências neuromotoras foi elaborado para oferecer orientações sobre cuidados diários a essas crianças a partir dos relatos dessas famílias sobre seu dia-a-dia, dúvidas e desafios diários, ou seja, pautado na abordagem centrada na família9, que têm demonstrado maior eficácia no tratamento10,16. O nível de escolaridade das amostras das duas etapas do estudo é superior ao nível médio de escolaridade da população brasileira17. As crianças das famílias participantes das duas etapas possuíam as afecções neurológicas mais encontradas na primeira infância3,4,5,6 e todas se encontram na mesma faixa etária.
Sabe-se que a demanda por atendimentos de fisioterapia é maior que a capacidade de atendimento dos serviços de saúde pública as crianças com deficiências neuromotora precisam de estímulos frequentes para obter ganhos no controle motor, a prática dos exercícios em domicílio é fundamental18,19,20. Entretanto, dez famílias admitiram não seguirem as orientações passadas pelos profissionais por falta de tempo, dado que concorda com os achados de Sari e Marcon21.
Como o manuseio e a posicionamento dessas crianças é fundamental para que se tenha melhor controle motor1,19,21 e já que a maioria dos entrevistados na Etapa 1 tinha dúvidas e dificuldades em relação ao posicionamento da criança, o guia traz sugestões de auxílios de posicionamento de baixa tecnologia, como calça de posicionamento, rolo e plano inclinado22 e nos diversos posicionamentos (decúbitos dorsal, ventral, lateral, sentado e em pé).
Atendendo às dificuldades das famílias em relação à alimentação das crianças deste estudo e sabendo-se que os problemas relacionados à alimentação são bastante comuns nestas crianças23 o guia aborda questões sobre o posicionamento adequado na hora da alimentação, a importância de conviver com a família durante as refeições e cuidados adicionais com crianças que tenha refluxo gastroesofágico.
O banho foi outra atividade bastante relatada como fonte de dúvidas e de preocupações, queixa apresentada por outro estudo24. Observando-se as falas dos participantes buscou-se apresentar informações acerca desta atividade de vida diária no guia ilustrado, preocupando-se também com posturas adotadas pelos cuidadores ao realizar esta tarefa.
Pelas falas dos participantes da Etapa 1 constatamos a falta de expectativa das famílias em relação ao desenvolvimento de seus filhos, o que parece ter contribuído para a uma falta de investimento em brinquedos e brincadeiras que, por sua vez, limita ainda mais o desenvolvimento motor, psíquico e afetivo dessas crianças. Há a necessidade de o profissional esclarecer à família sobre a importância do brincar, mesmo quando o prognóstico da criança é limitado25,26.
Nove mães são as cuidadoras principais da criança deficiente enquanto a figura paterna é a que tem trabalho remunerado e provém o lar, achados na literatura, reforçam que a figura da mãe é responsável pelos cuidados para com as crianças que possuem disfunções motoras1,2,8,12. Talvez por isso mães de crianças com paralisia cerebral apresentam sinais de sobrecarga emocional, dificuldade de aceitar o diagnóstico, culpa, necessidade de apoio do cônjuge e busca ineficiente de apoio familiar4,8,12. Sabe-se também que a deficiência física de uma criança leva a família a um grande estresse, atingindo as relações familiares e repercutindo no desenvolvimento da criança e na rotina da família1,2. Por essas razões tomou-se o cuidado de ilustrar vários membros da família no guia ilustrado (mãe, do pai, do irmão mais velho, avó e avô), já que todos podem contribuir com os cuidados e as atividades de vida diária das crianças e foi dedicada uma sessão do guia aos cuidados com o cuidador.
Houve a inclusão no guia ilustrado de um capítulo específico sobre lazer e outro sobre brinquedos e brincadeiras, na expectativa de que as famílias sejam levadas a considerar a importância dos passeios, do contato da criança com a natureza e com estímulos diferentes dos quais ela está acostumada a receber em casa. Além disso, é necessário incentivar a família a reservar um tempo específico para brincar com a criança. É muito importante que os pais reconheçam os sinais que a criança dá quando brinca: interesse ou desinteresse, diversão ou aborrecimento, facilidade ou dificuldade. Desse modo a família aprende a reconhecer as atividades favoritas da criança e pode oferecer-lhe outros brinquedos e brincadeiras que terão mais chances de promover momentos agradáveis entre a criança e a família.
A aplicação do Test Flesch na versão final do guia ilustrado classificou o texto como leitura relativamente fácil (pontuação 76) e, portanto, adequada até para leitores que tenham concluído unicamente o ensino fundamental. A produção e a oferta de materiais educativos e terapêuticos são importantes para potencializar ações dos serviços de saúde19,21, e reforçar a orientação dos profissionais de saúde aos pacientes e familiares19.
Relatos encontrados neste estudo e na literatura mostram que pais, mães e cuidadores de crianças com deficiência neuromotoras são carentes de orientações em linguagem adequada ao receptor, principalmente para os primeiros anos de vida das crianças24,26,27. Assim, consideramos que este material vem suprir uma necessidade urgente das famílias e pode ser uma ferramenta importante para reforçar as ações de educação em saúde que fazem parte da responsabilidade de todos os profissionais de saúde19,28.
Embora o guia seja oferecido no formato digital, entendemos que o material deva ser impresso para economizar tempo, facilitar a consulta e o manuseio do guia no dia-a-dia. O ideal seria que os serviços e/ou profissionais pudessem baixar e imprimir o guia para as famílias sem acesso digital.
Uma das limitações do estudo foi o número reduzido de participantes na etapa de avaliação do material produzido. No entanto, a colaboração de profissionais especialistas após o término do estudo, também acrescentou observações pertinentes e que agora fazem parte do material.
Reforçamos que a utilização do guia ilustrado não substitui a orientação às famílias no ambiente terapêutico e, especialmente, no próprio ambiente domiciliar19, se possível com visitas domiciliares para que o profissional entenda todas as necessidades específicas da criança dentro de sua casa. Ao final do guia há páginas em branco para anotações pertinentes dos profissionais de saúde ou da própria família.
A publicação digital do guia ilustrado já chegou a mais de mil downloads, e poderá alcançar e beneficiar um número maior profissionais e familiares do Brasil e de outros países de língua portuguesa. O guia ilustrado foi divulgado na mala direta da editora e em redes sociais das autoras, da editora e de usuários do material.
Finalmente, considera-se fundamental que fisioterapeutas e outros profissionais da reabilitação ampliem o olhar técnico de seus atendimentos e enxerguem não só a criança, mas toda família e o ambiente em que ela está inserida, aderindo os preceitos da abordagem centrada na criança e na família9,10,16.
Conclusão
A partir dos relatos de pais, mães e cuidadores de crianças com deficiências neuromotoras, desenvolvemos um guia ilustrado para favorecer os cuidados, as atividades cotidianas, as estimulações, o lazer e até o reforço das orientações terapêuticas dadas a essas famílias.
O Guia Ilustrado para Famílias de Crianças com Deficiência Neuromotoras é composto 26 páginas divididas em onze capítulos que abordam principais posicionamento, orientações gerais de posicionamento, órteses, quarto de dormir, alimentação, hora do banho, carregando seu filho, vestir, cuidados com quem cuida, dicas de lazer e brinquedos e brincadeiras.
O guia foi bem aceito pelos familiares e cuidadores, que o considerou facilitador das atividades cotidianas com a criança, acrescentou informações e, ajudou-os a lembrarem de orientações que já tinham sido dadas pelos profissionais de saúde.
Agradecimentos
À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pela concessão da bolsa de mestrado como apoio financeiro aos meus estudos (Processo número 02P-4347/2015), ao Departamento da Pós-Graduação de Saúde, Interdisciplinaridade e Reabilitação da Faculdade Ciências Médicas da UNICAMP e ao Ambulatório de Fisioterapia do Hospital de Clínicas da UNICAMP.
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28. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (Pacs). Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt2488_21_10_2011.html. Acesso em 30 maio 2016.
Autor notes
jenifer_souza@yahoo.com.br
Ligação alternative
http://periodicos.uninove.br/index.php?journal=saude&page=article&op=view&path%5B%5D=8617 (html)