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A Lei 13.300/16 que regula o Mandado de Injunção: opção ativista ou dialógica?
Fábio José Silva de Assis; José Ribas Vieira
Fábio José Silva de Assis; José Ribas Vieira
A Lei 13.300/16 que regula o Mandado de Injunção: opção ativista ou dialógica?
Law 13.300/16 that regulates the injunction: an activist or dialogical option?
Prisma Jurídico, vol. 16, núm. 2, pp. 315-340, 2017
Universidade Nove de Julho
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Resumo: Dentre os instrumentos constitucionais de garantia cidadã, o Mandado de Injunção permanecia, até pouco tempo atrás, sem regulamentação legislativa. A omissão legislativa não impediu que a cidadania se apropriasse do instituto e o utilizasse largamente para demandar ao Judiciário a concretização de direitos fundamentais. Depois de um lento processo de consolidação, foi criada, em 2016, a lei do mandado de injunção. Contudo, diante das teorias que pugnam por um retorno da soberania popular aos debates constitucionais, em especial o constitucionalismo popular e o constitucionalismo democrático, e as teorias dialógicas que indicam o necessário debate entre as diversas instituições e poderes, cabe indagar sobre a necessária abertura procedimental do mandado de injunção às fórmulas de participação popular na jurisdição constitucional. A partir desta concepção teórica, o objetivo do artigo é examinar o Mandado de Injunção, utilizando-se de pesquisa documental, jurisprudencial e de revisão bibliográfica no campo do direito constitucional.

Palavras-chave:Diálogos ConstitucionaisDiálogos Constitucionais, Mandado de Injunção Mandado de Injunção, Participação Popular Participação Popular, Ativismo Ativismo.

Abstract: Among the constitutional instruments of citizen security, the Writ of Injunction remained, until recently, without legislative regulation. The legislative omission did not prevent the citizens to appropriate the institute and widely used to demand the judiciary the realization of fundamental rights. After a slow process of consolidation, the law of the injunction was created in 2016. However, in the face of theories that favor a return of popular sovereignty to constitutional debates, especially popular constitutionalism and democratic constitutionalism, and the dialogical theories that indicate the necessary debate between the different institutions and powers, it is necessary to inquire about the necessary procedural openness Of the writ of injunction to the formulas of popular participation in the constitutional jurisdiction. From this theoretical concept, the purpose of this article is to examine the Law of regulation of the Writ of Injunction, using documentary research, case law and literature review in the field of constitutional law.

Keywords: Constitutional Debates, Writs of Injunction, Popular Participation, Activism.

Carátula del artículo

A Lei 13.300/16 que regula o Mandado de Injunção: opção ativista ou dialógica?

Law 13.300/16 that regulates the injunction: an activist or dialogical option?

Fábio José Silva de Assis
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil
José Ribas Vieira
Universidade Federal Fluminense (UFF), Brasil
Prisma Jurídico, vol. 16, núm. 2, pp. 315-340, 2017
Universidade Nove de Julho

Recepção: 20 Agosto 2016

Aprovação: 02 Setembro 2016

Introdução

A Constituição da República Federativa do Brasil – CF trouxe como um de seus pilares a instituição de um Estado Democrático de Direito, utilizando como ferramenta para manter o perfil democrático desse Estado o princípio da tripartição dos poderes. No entanto, foi se desenvolvendo o ativismo judicial, que embora não tenha um conceito unívoco, pode ser, a título introdutório, designado como uma postura proativa do Poder Judiciário, que passa a interferir de maneira regular e significativa nas relações sociais e nas opções políticas dos demais poderes.

Com isso, nas últimas décadas, houve um agigantamento das funções do Poder Judiciário, o levando a se manifestar em questões que antes eram de competência dos demais poderes do Estado. O Brasil, nos últimos anos, esteve em um momento de redesenho das suas instituições, com a abertura do poder Executivo para a participação popular direta por meio de conselhos variados, conferências nacionais e agências reguladoras, e com a participação mais ativa do Judiciário na arena política, motivo pelo qual é necessário definir o modelo de separação de poderes a ser adotado para a abertura de novas possibilidades e dinâmicas institucionais dentro desse cenário.

Em contraposição, são examinadas diversas teorias e concepções que buscam formas alternativas ou de oposição ao ativismo judicial, ou por meio das teorias dos diálogos, que propõem que haja um diálogo entre os poderes, suas instituições e os movimentos populares; ou por modelos de Estado que não contemplem o Judiciário como detentor da palavra final no direito, como é o caso do constitucionalismo popular, do constitucionalismo democrático e do Minimalismo.

Neste quadro teórico, o artigo estuda a postura ativista do Supremo Tribunal Federal – STF na efetivação do mandado de injunção, seus limites e possibilidades, refletindo sobre sua importância para a garantia do acesso à justiça e para a fruição dos direitos fundamentais nas democracias contemporâneas, até a edição da lei do mandado de injunção no ano de 2016.

1 O Mandado de Injunção: breves características

O mandado de injunção, remédio constitucional previsto no art. 5º, LXXI, da CF/88, surgiu no Brasil com a Constituição de 1988, resultado das preocupações do Constituinte originário em estabelecer ideais de liberdade e de garantia de direitos fundamentais, em oposição ao regime militar até então vigente. É, portanto, uma das diversas ferramentas de judicialização criadas pela CF/88, que objetiva salvaguardar e viabilizar o exercício dos direitos e liberdades constitucionais, que se mostram inviabilizados pela ausência de norma regulamentadora.

Pode ser conceituado como um instituto processual civil, outorgado ao legítimo interessado como remédio constitucional, para a obtenção, mediante decisão judicial de equidade, a imediata e concreta aplicação de direito, liberdade ou prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania popular ou à cidadania, quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o seu exercício (SILVA, 1989, p. 51). Dessa forma, o mandado de injunção visa viabilizar ao cidadão a busca pela garantia de direitos previstos na constituição, mas que se encontram ameaçados pela omissão do órgão competente em regulamentar a norma competente para lhe conferir eficácia.

Junto com a criação do mandado de injunção, vieram diversas dúvidas quanto a sua eficácia e quanto a sua aplicabilidade, já que a constituição não trazia sua regulamentação e não havia ação idêntica no direito comparado. O mandado de injunção seria uma inovação brasileira com raízes históricas no writ of injunction norte americano, que consiste numa ordem judicial expedida por qualquer Tribunal proibindo a prática ou determinando a abstenção para determinado ato, consistindo, portanto, numa ordem judicial extraordinária, aplicada apenas em casos especiais. Hely Lopes Meirelles observa que:

Referida ação, no Direito anglo-saxônico, tem objetivos muito mais amplos que no nosso, pois que na Inglaterra e nos Estados Unidos, o writ of injunction presta-se a solucionar questões de direto público e privado, sendo considerado um dos remédios extraordinários (extraordinary writs: mandamus, injunction ou prohibition, quo warranto e certiorari, oriundos da common law e do equity). (MEIRELLES, 1989, p. 132).

Ambos buscam dar efetividade a direitos constitucionais, protegendo o impetrante diante da ausência de lei. Todavia, enquanto o mandado de injunção busca sanar uma omissão legislativa de normas carentes de regulamentação, a injunction se dirige a normas auto-aplicáveis não carentes de regulamentação (MACHADO, 2004, p. 59).

Ademais, é difícil afirmar que há um parentesco entre os institutos, porque enquanto o sistema judiciário brasileiro tem origem romano-germânica, em que a norma é criada previamente, no plano abstrato, a partir de uma hipótese; nos Estados Unidos, pelo sistema da common law, as regras são feitas a partir de casos concretos decididos pelo Judiciário.

Para Bonavides, embora os institutos tenham o mesmo nome, dificilmente um jurista de países de origem do writ of injunction o reconheceria ao estudar o mandado de injunção, que já adquiriu feitura, conteúdo e forma próprios (BONAVIDES, 2001, p. 505). O writ of injunction tem aplicação mais ampla, podendo ser utilizado para resolver litígios nas esferas civil e constitucional, e não apenas em casos específicos em que a ausência de norma regulamentadora ameaça a eficácia de direitos constitucionais, caso do mandado de injunção.

Pela ausência de um guia no direito comparado, a doutrina e a jurisprudência ficaram responsáveis por traçar as características do mandado de injunção. Inicialmente, precisou-se enfrentar a discussão acerca da sua auto-aplicabilidade, pois o próprio mandado de injunção não tinha uma norma regulamentadora definindo seus contornos. Seria uma ironia a ferramenta criada para combater omissões legislativas ser barrada pela sua própria omissão e, diante disso, fundamentou-se sua auto-aplicabilidade no art. 5º, §1º da CF/88, por visar a garantia de direitos fundamentais. Nas palavras de Flávia Piovesan:

Por fim, ressalte-se que o mandado de injunção é garantia auto-aplicável, tendo em vista o próprio princípio da aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais. Admitir o contrário resultaria no curioso paradoxo de a ação constitucional dirigida contra a inação normativa permanecer inerte em virtude de norma regulamentadora (PIOVESAN, 2003, p. 142).

Como o mandado de injunção não possuía uma norma regulamentadora definindo seus contornos, o STF, para solucionar essa omissão, ao julgar o primeiro mandado de injunção, decidiu que a ele seria aplicável o procedimento previsto para o mandado de segurança, decisão que posteriormente foi confirmada pela Lei nº 8.038/1990, em seu art. 34.

Essa decisão não solucionava todas as questões necessárias para a utilização do mandado de injunção, que possui peculiaridades que deveriam ser observadas para que lhe fosse conferido eficácia. O procedimento do mandado de segurança, por exemplo, não previa quais seriam os efeitos da sentença de procedência proferida em sede de mandado de injunção.

Devido à insegurança que toda essa omissão gerava e quase 30 anos depois da promulgação da CF/88, o Congresso Nacional finalmente editou a Lei 13.300/16, após a tramitação do projeto de lei complementar nº 18/2015, que disciplina o processo e o julgamento dos mandados de injunção individual e coletivo, aprovado pelo Senado Federal, como casa revisora, no dia 31 de maio de 2016

Na referida lei, o Congresso, de forma bem sucinta e sem abordar minuciosamente as diversas nuances sobre o tema, confirmou o que a jurisprudência do STF já vinha aplicando, permitindo que as decisões de procedência no mandado de injunção tenham efeitos ultra partes ou erga omnes, mas apenas quando esses efeitos forem indispensáveis ao exercício do direito em questão:

Art. 9º A decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma regulamentadora. § 1º Poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração.

A lei ainda determina que quando for criada a norma regulamentadora para sanar a omissão combatida por meio do mandado de injunção, sua eficácia será ex nunc, de forma que a decisão anterior transitada em julgado no mandado de injunção vai continuar produzindo efeitos para os que já estiverem dela se beneficiando, exceto se a norma regulamentadora for mais favorável.

2 O Mandado de Injunção e a jurisprudência do STF

Devido à ausência de norma regulamentadora quanto ao procedimento a ser seguido no mandado de injunção durante quase 30 anos, o STF foi modificando o seu entendimento quanto aos efeitos que a sentença de procedência do pedido formulado em sede mandado de injunção produziria, até a edição da Lei 13.300/16, quando finalmente o Congresso Nacional regulou o tema em questão.

Logo após a edição da CF/88, o STF adotava a teoria denominada de não concretista, tendo como adeptos autores como Manoel Gonçalves Ferreira Filho e Hely Lopes Meirelles (FERREIRA FILHO, 1999; MEIRELLES, 1989). Essa teoria se posicionava contra a edição da norma diretamente pelo STF, por entender que o Judiciário não poderia invadir funções tipicamente legislativas, levando a um rompimento da separação dos poderes e, consequentemente, a uma quebra da democracia. Caberia ao STF tão somente reconhecer formalmente a inércia do Poder Público, devendo informar o estado de mora ao poder competente, para que ele mesmo editasse a norma. Essa posição restringia o conteúdo do mandado de injunção, já que não viabilizava o exercício do direito constitucional questionado.

O STF foi modificando seu entendimento, passando, posteriormente, a adotar a teoria concretista, de autores como Flávia Piovesan e José Afonso da Silva (PIOVESAN, 2003; SILVA, 2005), que se posicionavam a favor da regulamentação, pelo próprio Judiciário, do direito constitucional ameaçado, que não poderia se submeter a uma indeterminada e possível manifestação do legislativo, pois isso representaria um retrocesso nos direitos fundamentas. O Judiciário, ao declarar a existência da omissão legislativa, deveria ele mesmo implementar o exercício do direito ameaçado, até que fosse editada a norma pelo poder competente.

A teoria concretista ainda se dividia em geral e individual. Para a geral, a decisão proferida pelo Judiciário teria efeitos erga omnes, implementando o exercício da norma constitucional através de uma normatividade geral e abstrata, até que a omissão fosse suprida pelo poder competente. Em sentido contrário, a teoria concretista individual defendia que a sentença de procedência no mandado de injunção apenas poderia produzir efeitos inter partes, de forma que cada beneficiário do direito em questão teria que entrar com o seu próprio mandado de injunção.

Não poderá a Justiça legislar pelo Congresso Nacional, mesmo porque a Constituição manteve a independência dos Poderes (art. 2º). Em vista disso, o Judiciário decidirá o mandado de injunção, ordenando à autoridade impetrada que tome as providências cabíveis, fixando-lhe um prazo, se necessário. Essa decisão não fará coisa julgada erga omnes, mas apenas inter partes. Somente a norma regulamentadora, expedida pela autoridade impetrada, terá aquele efeito, cessando, com isso, a competência do Judiciário (MEIRELLES, 1996, p. 176).

Em sua obra de 1995, Regina Quaresma já defendia a necessidade do STF adotar a posição concretista, afirmando que o “STF, em várias decisões, sustentou a tese de que é requisito essencial para o cabimento do mandado de injunção a falta de auto-aplicabilidade do dispositivo que carece de regulamentação” (QUARESMA, 1995, p. 77), de forma que o Poder Judiciário não apenas comunicaria o poder omisso, mas também executaria a decisão, regulamentando o caso a ele submetido.

José Afonso da Silva ainda argumenta que dar à sentença do mandado de injunção efeitos meramente declaratórios seria lhe dar o mesmo objeto da ação de inconstitucionalidade por omissão, o que não faria sentido, pois criaria uma ação de inconstitucionalidade por omissão subsidiária, de forma a permitir que qualquer interessado postulasse direitos que os titulares da ação direta de inconstitucionalidade por omissão se omitiram em fazer (SILVA, 2005, p. 450).

Diante de tantas críticas e após cerca de 20 anos de inércia do legislador em sanar as lacunas existentes no ordenamento, o STF deixou de adotar a teoria não concretista e, aderindo a uma posição de ativismo judicial, passou a adotar as teorias concretista geral e individual. Elival Ramos argumenta que essa mudança de posicionamento se deu após o julgamento do mandado de injunção nº 721, no qual a decisão que acolheu o pedido de injunção passou a “emprestar natureza constitutivo-condenatória ou constitutivo-mandamental, importando, em maior ou menor extensão (objetiva e subjetiva), no oferecimento da disciplina normativa reclamada” (RAMOS, 2010, p. 196). Essa decisão, no entanto, não teria a generalidade e abstração das leis, pois seus efeitos apenas se dariam entre as partes impetrantes do mandado de injunção.

A partir do ano de 2007, que o STF, ao julgar o Mandado de Injunção nº 708, passou a entender que, se reconhecida a mora na produção da norma, o Judiciário deveria possibilitar o exercício do direito questionado, com efeitos erga omnes, abrangendo todos os casos que tivessem fundamento em tal omissão, em clara adoção a teoria concretista geral.

3 Ativismo Judicial

Depois de duas décadas em uma ditadura militar, o novo modelo constitucional brasileiro instaurou ideais democráticos, com avanços institucionais e sociais. A vontade do legislador constituinte não se traduziu em uma ação hegemônica, mas da “composição e das soluções de compromisso entre forças díspares, cuja unidade se exercia melhor sobre temas tópicos do que na formulação de uma concepção sistemática e coerente de um novo projeto para o país” (VIANNA; CARVALHO; MELO; 1999, p. 39).

Luís Roberto Barroso define o ativismo judicial como a adoção de medidas proativas pelo Poder Judiciário, que passa a interferir no âmbito de atuação que seria reservado aos demais poderes, com a finalidade de garantir direitos constitucionalmente estabelecidos. Em suas palavras:

A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas (BARROSO, 2008, p. 6).

Nesse sentido, Barroso vê o ativismo judicial como um meio de concretizar direitos fundamentais constitucionais quando o Poder público os vem ignorando. Para isso, o intérprete aumenta o alcance das normas, potencializando seu sentido e alcance, para ir além do legislador ordinário, que manteve uma postura nula ou insuficiente, quando não o deveria. “Trata-se de um mecanismo para contornar, bypassar o processo político majoritário quando ele tenha se mostrado inerte, emperrado ou incapaz de produzir consenso” (BARROSO, 2014). Essa é a concepção jurisdicional ou formal do ativismo judicial, onde o Judiciário, por meio de suas decisões, redefine os limites da sua competência jurisdicional (VIEIRA; CAMARGO; SILVA, 2009, p. 44).

Essa concepção acaba sendo criticada por conferir ao ativismo uma visão meramente técnica, sem qualquer vinculação com os conflitos sociais ou com os debates na esfera pública, o que acabaria impedindo os avanços sociais. O normativismo que tem sido conferido ao Judiciário, sem ligação alguma com o conflito social e com os debates na esfera pública, por meio da noção de ativismo judicial, faz com que o direito seja visto como um código incompreendido, uma “caixa preta”, impedindo que ele possa ser usado como uma ferramenta de transformação (NOBRE; RODRIGUEZ, 2011, p. 13).

Diante disso, Elival Ramos critica o ativismo judicial, afirmando que ele não se trata de apenas um aumento no alcance das normas, mas sim de uma verdadeira descaracterização da função do Judiciário, que invade funções legislativas, administrativas e de governo. O autor defende que o Judiciário, ao agir de forma ativista, fere o núcleo essencial dos demais poderes, ultrapassando limites que haviam sido impostos pelo próprio ordenamento jurídico (RAMOS, 2010, p. 116). Caberia ao Judiciário, no caso, apenas criar novas interpretações do direito, dentro dos limites permitidos pela constituição, e não estabelecer normas indeterminadas e genéricas, como o faz por meio do ativismo judicial. Nas palavras de Ramos:

[...] o exercício da função jurisdicional para além dos limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe, institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar, resolvendo litígios de feições subjetivas (conflitos de interesse) e controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos). Há, como visto, uma sinalização claramente negativa no tocante às práticas ativistas, por importarem na desnaturação da atividade típica do Poder Judiciário, em detrimento dos demais Poderes. Não se pode deixar de registrar mais uma vez, o qual tanto pode ter o produto da legiferação irregularmente invalidado por decisão ativista (em sede de controle de constitucionalidade), quanto o seu espaço de conformação normativa invadido por decisões excessivamente criativas (RAMOS, 2010, p. 129).

Barroso também traz alguns riscos que o ativismo judicial poderia gerar a democracia e ao Estado de Direito. Para ele, o Judiciário, ao exercer o ativismo judicial, deve agir tão somente como guardião da Constituição, com o objetivo de garantir direitos fundamentos e valores democráticos, e qualquer atuação fora dessa esfera apenas pode se dar a favor da democracia, caso contrário, deve o Judiciário aceitar as escolhas feitas legitimamente pelo Legislador. Além disso, o ativismo deve ocorrer de forma moderada, sob o risco de obter os efeitos contrários ao pretendido, não podendo essa expansão do Judiciário tirar a atenção do real problema: a crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade do Poder Legislativo (BARROSO, 2008, p. 19).

O ativismo judicial surgido no Brasil é de ordem estrutural do modelo constitucional adotado, decorrente de tendências, práticas institucionais e atos de vontade característicos do momento histórico vivenciado (RAMOS, 2010, p. 268). Podemos citar alguns fatores da nova constituição como essenciais para essa mudança: antes o poder Judiciário ficava limitado a uma máquina estatal burocrática e autoritária, sem a possibilidade de uma atuação autônoma e abrangente, de forma que a emergência de uma ordem democrática permitiu essa judicialização.

A CF/88 também trouxe uma nova arquitetura institucional, com a criação de um Ministério Público autônomo e com a implementação de um modelo de separação de poderes, o que permitiu a expansão do Judiciário, que passou a poder intervir autonomamente na defesa dos interesses sociais em cumprimento as determinações constitucionais.

Além disso, a CF/88 trouxe uma grande quantidade de direitos, de caráter individual, coletivo, social e político, que permitiram que o Judiciário pudesse conhecer demandas que até então lhe eram estranhas. Exemplo disso é a criação do direito subjetivo de acesso à educação e a saúde, que permitem que qualquer cidadão vá ao Judiciário exigir os referidos direitos. Essa teria sido uma escolha do constituinte, que optou por definir programas de ação futura, em uma constituição dirigente, almejando ideais e promessas de futuro que eram impossibilitados pelo contexto histórico.

Nesse contexto de ampliação de direitos fundamentais, que a CF/88 ampliou os instrumentos judiciais de acesso à justiça, de controle sobre as políticas públicas e de proteção de interesses coletivos e difusos. Dentre eles o mandado de injunção, a ação popular, a ação declaratória de inconstitucionalidade, a ação declaratória de constitucionalidade, a arguição de descumprimento de preceito fundamental e a ação civil pública. O reforço no sistema concentrado de constitucionalidade também foi importante para esse processo de judicialização, pois permitiu um maior controle a ser exercido pelo Judiciário perante os demais poderes. Nas palavras de Elival Ramos:

[...] finalmente, a jurisdição constitucional, assim desenvolvida, interfere diretamente no conteúdo dos atos legislativos controlados. O exercício da fiscalização de constitucionalidade, nas condições apontadas, é fator desencadeante do ativismo judiciário, na medida em que o órgão de controle perceba tornar-se menos nítida a distinção entre legislação e jurisdição (RAMOS, 2010, p. 277).

4 As teorias dialógicas do constitucionalismo popular, do constitucionalismo democrático e do minimalismo

De forma crítica a essa supremacia judicial, alguns autores, como Larry Kramer e Post e Siegel, vêm trazendo novas concepções de Estado e de constituição, como no constitucionalismo popular e no constitucionalismo democrático, que buscam estabelecer um diálogo entre os poderes, a sociedade e as diversas instituições do estado, na busca da melhor forma de proteger direitos e garantias fundamentais.

Para Larry Kramer, essa supremacia judicial seria responsável por impedir o avanço do constitucionalismo popular (KRAMER, 2004, p. 252-253). Nele, é contestada a exclusividade do Judiciário no ato de interpretação da Constituição, defendendo que deveria haver a participação popular na determinação e aplicação do significado constitucional (SULTANY, 2012, p. 373), por meio de uma democracia mais direta e participava. O constitucionalismo popular propõe a retirada substancial da interpretação e aplicação da Constituição das Cortes e a sua devolução a soberania popular, “seja na sua atuação nas ruas, nas urnas eleitorais, ou no Parlamento através dos seus representantes” (BRANDÃO, 2015). Deve haver no processo de interpretação da Constituição a participação de entes não estatais, externos ao processo de julgamento, que tragam a participação popular na sua interpretação, de forma que todos aqueles que vivem a Constituição sejam responsáveis por interpretá-la.

Diante disso, para Kramer, ao invés de um modelo de supremacia judicial, no qual o Tribunal é um dos vários autorizados a interpretar a Constituição, é aplicado um modelo de soberania judicial, em que o Tribunal é o único autorizado a tal. Essa exclusividade é criticada, argumentando o autor que a Constituição não é uma lei ordinária a ser definida sozinha pela Corte, devendo a sua interpretação ser confiada ao povo.

Nesse sentido, os adeptos do constitucionalismo popular se diferem radicalmente dos progressistas quanto aos ideais de democracia que defendem: enquanto estes favorecem a “soberania da razão”; aqueles clamam pela “soberania do povo”, com ideais de democracia baseadas na persuasão, na discussão e no diálogo racional. Embora as medidas do constitucionalismo popular possam ser vistas como “indisciplinadas, vulgares ou não refinadas”, elas trazem ferramentas eficazes, tais como a rotação nos cargos, os curtos mandatos ou a descentralização do poder (GARGARELLA, 2006).

O controle de constitucionalidade, visto como um dos fatores para o desenvolvimento do ativismo judicial é criticado por Gargarella. Para ele, a maioria dos constitucionalistas populares não questiona a legitimidade do controle judicial de constitucionalidade, mas parece compartilhar a noção de que, ao menos em circunstâncias específicas, o controle judicial deveria levar em conta os pontos de vista populares sobre o significado da Constituição, o que não é feito em um sistema de supremacia judicial (FRIEDMAN, 2005, p. 125).

Para Kramer não é necessário que haja a abolição do controle jurisdicional, mas esse controle só deve ocorrer quando for estritamente necessário, de forma a tirar a centralidade do papel do Judiciário na aplicação do direito. Manter essa centralidade do Judiciário leva a uma diminuição do envolvimento popular, prejudicando o exercício da cidadania (KRAMER, 2004, p. 252-253). Um sistema sem a aplicação da supremacia judicial expandiria a possibilidade de reações políticas e levaria a uma mudança de percepção da Corte quanto aos seus próprios poderes, já que poderia ter suas decisões sendo revistas pela soberania popular, que deixaria de ser uma entidade abstrata, para ser vista como uma verdadeira autoridade. Com isso, a Corte passaria a ver o povo como uma autoridade, da mesma forma que ela é vista pelos Tribunais inferiores: a Constituição seria interpretada pela Corte de forma independente, mas levando em consideração que uma autoridade (no caso, o povo), poderia rever suas decisões (KRAMER, 2004, p. 253).

Kramer, todavia, lamenta que a população aceite o papel “moderno” da Suprema Corte, já que não há correntes de opinião popular contra a insistência da Suprema Corte em dar a palavra final em questões de significado constitucional. O próprio povo não parece ansioso para voltar as práticas de interpretação constitucional pela multidão, por marchas ou manifestações, estando mais propenso a aceitar que as decisões da Suprema Corte possam ser anuladas por emenda constitucional ou pelo próprio Tribunal, mas não por meio da expressão extralegal de insatisfação popular (ALEXANDER; SOLUM, 2005, p. 1638).

Ainda quanto ao constitucionalismo popular, importa trazer uma breve diferenciação entre o modelo norte americano e o brasileiro e a dificuldade que essas diferenças trazem para a implementação de um modelo de constitucionalismo popular no âmbito brasileiro. Os EUA têm mais de 200 anos de experiência na judicialização da política, uma sólida cultura liberal que impediu o êxito de autoritarismos e todos os seus Poderes se encontram seriamente vinculados a um ideal democrático. O Brasil, por outro lado, tem uma experiência na judicialização da política que data de pouco mais de uma década, uma história político-institucional repleta de exemplos de governos autoritários e o constitucionalismo e os direitos ainda não se incorporaram plenamente a nossa cultura política. Diante disso, qualquer proposta de extinção do controle judicial seria prejudicial à democracia brasileira, ainda que sejam propostas de reações a decisões judiciais (BRANDÃO, 2015).

Além do constitucionalismo popular, temos outras duas correntes, por vezes em sentido contrário, que trazem novas propostas de constitucionalismo e de Estado. São o Minimalismo, de Cass Sustein; e o constitucionalismo democrático, de Post e Siegel.

Diferente do constitucionalismo popular, o constitucionalismo democrático legitima a atuação do Judiciário por meio de princípios constitucionais que permitem uma interação entre as Cortes e os movimentos sociais no seu processo de interpretação, motivo pelo qual a jurisdição constitucional seria uma instituição genuinamente democrática. Post e Siegel afirmam que diferente do constitucionalismo popular, “o constitucionalismo democrático não procura retirar a Constituição das Cortes”, mas reconhece o papel essencial dos direitos constitucionais judicialmente garantidos na sociedade americana e, diferentemente do foco juricêntrico nas Cortes, aprecia o papel essencial que o engajamento público desempenha na construção e legitimação das instituições e práticas do judicial review (POST; SIEGEL, 2007, p. 7).

O minimalismo sustenta que não cabe aos Tribunais interferirem em questões que vão além do caso concreto, pois isso poderia levar a um refluxo social. As questões polêmicas que surgirem, que possam levar a uma divisão nacional, devem ser julgadas por meio de deliberação democrática, não cabendo aos Tribunais criarem regras amplas de abstratas, devendo se restringir ao que for imprescindível para o julgamento do caso apresentado. Os Tribunais devem se abster de decidir questões desnecessárias, devendo adotar as chamadas “virtudes passivas”, em que a atuação jurisdicional se limitaria a presunções mais fortes de inconstitucionalidade, e ao uso construtivo do silencio (SUNSTEIN, 1999, p. 10). Sunstein traz como exemplo o caso Romer versus Evans, em que a Suprema Corte, ao invalidar disposições legais discriminatórias contra homossexuais, se absteve de decidir questões diversas que também envolvessem o tema da discriminação contra homossexuais, como o próprio casamento entre pessoas do mesmo sexo (SUNSTEIN, 1999, p. 10). O minimalismo se posiciona claramente contra o ativismo judicial.

No minimalismo, defende-se que as Cortes devem evitar o “blacklash”, que significaria o refluxo social gerado pelo conjunto de efeitos de uma decisão ativista. O exemplo citado pelo autor é do caso Roe versus Wade, que foi a favor da legalização do aborto e que, segundo o autor, teria gerado um refluxo social com os movimentos pró-vida por meio de críticas à decisão. Todas essas características do minimalismo acabariam promovendo responsabilidade e deliberação democrática, já que essas questões passíveis de gerar o “blacklash” devem ser decididas por meio do correto processo deliberativo.

O constitucionalismo democrático discorda dessas ideias apresentadas pelo minimalismo, argumentando que as divergências interpretativas são importantes para o desenvolvimento do Direito Constitucional, legitimando o Tribunal a decidir as questões controversas que lhe são. O Constitucionalismo Democrático busca compreender as práticas acerca dos direitos constitucionais e como eles foram instituídos em uma cultura constitucional marcada pelas controvérsias (POST; SIEGEL, 2007, p. 374). Post e Siegel defendem que o Minimalismo enfraquece as práticas de engajamento deliberativo, não se sustentando diante de minorias sociais estigmatizadas, de forma que para o Constitucionalismo democrático representam fontes de estabilidade social (POST; SIEGEL, 2007, p. 405). Quando o processo democrático não permite a participação de todos os afetados, cabe ao Judiciário resguardar direitos fundamentais das minorias estigmatizadas, que foram ignoradas pelo processo político majoritário.

O conflito trazido pelo Constitucionalismo Democrático permite uma multiplicidade de interpretações constitucionais, com benefícios positivos para a ordem constitucional, pois ao se oporem as decisões judiciais, os cidadãos se tornam politicamente ativos e abraçam seus entendimentos constitucionais, criando uma identificação com a cultura constitucional (POST; SIEGEL, 2007, p. 390).

5 A lei em debate

Importa trazer à baila a Lei Complementar 13.300/16, resultante do projeto de lei complementar nº 18/2015, que disciplina o processo e o julgamento dos mandados de injunção individual e coletivo, aprovado pelo Senado Federal, como casa revisora, no dia 31/05/2016.

Nela, o Congresso Nacional confirmou a Jurisprudência que já vinha sendo adotada pelo STF, permitindo que as decisões de procedência do MI produzam efeitos erga omnes ou ultra partes, mas trazendo uma ressalva: quando isso for “inerente ou indispensável ao exercício do direito” em questão.

A lei determina, ainda, que quando for criada a norma regulamentadora, sua eficácia será ex nunc, de forma que a decisão transitada em julgado no MI vai continuar produzindo efeitos para os que já estiverem dela se beneficiando, exceto se a norma regulamentadora for mais favorável. Os arts. 10 e 11 trazem essa provisoriedade da decisão proferida em sede de mandado de injunção: havendo a edição de norma regulamentadora no curso do mandado de injunção, o processo será extinto sem resolução do mérito, devendo ser observada a referida norma. Se, por outro lado, já houver decorrido o trânsito em julgado da decisão, a nova norma não retroagirá em relação à decisão judicial, salvo se mais benéfica. Assim, “a edição de norma regulamentadora definitiva substitui de forma imediata o regime antes instituído pelo Judiciário” (FONSECA, p. 152, 2016).

Quanto aos requisitos para a ação do mandado de injunção, a Lei 13.300/16 traz os mesmos de uma ação comum, exigindo apenas que haja legítimo interesse na expedição da norma a ser regulamentada, podendo ocupar o polo ativo da ação qualquer pessoa natural ou jurídica que afirme ser titular dos direitos em questão. Nesse sentido, para Fonseca, para a propositura da ação constitucional de Mandado de Injunção “é necessário que ela atribua ao impetrante um direito subjetivo, claramente delineado, cujo exercício esteja inviabilizado única e exclusivamente por conta da ausência de regulamentação” (FONSECA, p.81, 2016).

Como visto acima, a procedência do mandado de injunção “tinha como único efeito jurídico a declaração da inconstitucionalidade da omissão e a ciência disso ao órgão responsável pela elaboração da norma regulamentadora” (FONSECA, 2016, p. 117-118). Todavia, a Lei 13.300/16, ao tratar do tema, foi omissa quanto a possibilidade de concessão de medida de urgência no bojo do mandado de injunção. Levando em consideração a lacuna da lei e a doutrina concretista que já vinha sendo adotada pelo STF, é possível defender a possibilidade de providências cautelares no mandado de injunção, como forma de evitar lesão a direito a do impetrante, desde que presentes seus requisitos.

Viu-se acima teorias e modelos de Estado que buscam vias alternativas ao ativismo judicial e que poderia ter sua aplicabilidade estimulada. Todavia, a lei complementar que regulamentou o mandado de injunção, de forma bem sucinta, não trouxe nenhuma forma de diálogo entre o Judiciário com os demais poderes e com a sociedade civil, se limitando a permitir que o Supremo aplique efeitos erga omnes a sua decisão, caso ele, de forma unilateral, entenda que isso é inerente ou indispensável para o exercício do direito.

Ademais, viu-se que o mandado de injunção deve ser utilizado exclusivamente para a defesa de direitos e garantias fundamentais, o que pode nem sempre ocorrer quando as decisões proferidas em sua seara não tiverem ligações com os destinatários desses direitos e garantias. Diversas ferramentas já existentes e que poderiam conferir legitimidade ao julgamento, preencher os requisitos do mandado de injunção e justificar a postura ativista do Supremo, não foram utilizadas, como o amicus curiae ou as audiências públicas.

Conclusões

Embora seja difícil conceituar de forma unívoca o que é o ativismo judicial, é possível afirmar que um dos motivos do seu surgimento foi o de resolver casos de omissão legiferante, principalmente no que tange a direitos e garantias fundamentais, criados por comando constitucional, que vinham sendo sistematicamente ignorados. De certo que o poder legislativo, por sua omissão ou ineficiência, leva os cidadãos a recorrerem ao Judiciário, na busca da garantia de seus direitos.

Levando em consideração a democratização recente do Brasil, seu abrangente controle de constitucionalidade, sua pouca experiência na manutenção de instituições livres e os diferentes tipos de sociedade, divididas por religião, etnia e linguagem, o Judiciário, por meio do ativismo judicial, passou a ser visto como um garantidor da legitimidade democrática. O ativismo judicial passou a ser o meio utilizado para corrigir as deficiências encontradas no sistema democrático representativo.

Essa descrença brasileira em torno da democracia representativa, devido as omissões/ineficiências do executivo e do legislativo, encarregou o poder judiciário de consolidar direitos fundamentais, quer no Estado social, quer no Estado democrático de direito.

Todavia, ainda que o órgão jurisdicional tenha sido provocado a atuar quando os demais poderes não o fizeram, isso não significa que não deva haver participação popular no processo de normatização e efetivação do direito. Um ativismo judicial que ignora os anseios e movimentos populares na formação do direito é incompatível com um Estado Democrático de Direito, já que o poder legislativo, a quem incumbia a produção da norma, é escolhido por meio do sistema majoritário.

Nesse sentido, o ativismo judicial poderia ser utilizado com o fito de criar meios de impulsionar os demais poderes na garantia do exercício dos direitos questionados judicialmente, o que nem sempre vem sendo o caso do Judiciário brasileiro, já que o STF, nos casos trabalhados, por diversas vezes mitigou os direitos constitucionais em questão.

Diante disso, foram apresentadas teorias e modelos de Estado que buscam vias alternativas ao ativismo judicial e que poderiam ter sua aplicabilidade estimulada. Dentre elas, o constitucionalismo popular, o constitucionalismo democrático, o minimalismo e as teorias dialógicas.

Ainda que haja dificuldade de implementação dessas teorias e modelos de Estado no Brasil pela crise de representatividade dos poderes legislativo e executivo e pelos seus longos períodos de ditadura, que levaram o Judiciário a uma posição de guardião de direitos sociais, o fato é que temos mecanismos, como o amicus curiae e as audiências públicas, que poderiam estar sendo mais utilizadas como meio de conferir legitimidade a atuação do Judiciário.

A ascendência do Supremo Tribunal Federal no âmbito de atuação dos demais poderes, embora por vezes possa ser necessária, também pode acabar impedindo a aplicação de um modelo de diálogos institucionais e engessando a atuação dos demais poderes e dos movimentos sociais. Deveria haver, ao menos, um estimulo de diálogo entre os poderes e a sociedade civil, com a criação e utilização dos mecanismos já existentes, relacionados a ideia de constitucionalismo popular, como os já citados exemplos das audiências públicas e do amicus curiae.

Material suplementar
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