Resumo: A intolerância religiosa se tornou uma mazela social no Brasil e suas causas são diversas, destacando-se, nesse estudo, a disseminação da intolerância religiosa nas redes sociais. Nesse contexto, pretende-se verificar até que ponto as manifestações de cunho religioso proferidas nas redes sociais ultrapassam a liberdade de manifestação religiosa, configurando-se em discurso de ódio. A escolha do tema justifica-se pela sua relevância teórica e prática, haja vista a linha tênue existente o livre direito de expressar e a propagação das manifestações odiosas em razão da religião. O direito à livre manifestação de pensamento nas redes sociais é democraticamente legitimo no momento em que não reproduz a violência, a exclusão e, tampouco, não estimula o tratamento desigual entre as pessoas. Trata-se de uma pesquisa teórico-bibliográfica, de cunho documental, partindo da premissa dedutiva do panorama histórico de construção das liberdades individuais, e delimitando a análise na intolerância religiosa, propagada nas redes sociais.
Palavras-chave:Liberdade de Manifestação de PensamentoLiberdade de Manifestação de Pensamento, Discurso do Ódio Discurso do Ódio, Intolerância Religiosa Intolerância Religiosa, Redes Sociais Redes Sociais, Liberdade Religiosa Liberdade Religiosa.
Abstract: Religious intolerance has become a social malaise in Brazil and its causes are diverse, highlighting, in this study, the spread of religious intolerance in social networks. In this context, it is sought to verify to what extent the religious manifestations given in social networks surpass the freedom of religious manifestation, configuring itself in discourse of hatred. The choice of the theme is justified by its theoretical and practical relevance, given the tenuous line that exists the free right to express and the propagation of the odious manifestations due to religion. The right to free expression of thought in social networks is democratically legitimate at the moment when it does not reproduce violence, exclusion and, moreover, does not encourage unequal treatment between people. It is a theoretical-bibliographic research, documental, starting from the deductive premise of the historical panorama of the construction of individual freedoms, and delimiting the analysis in the religious intolerance, propagated in the social networks.
Keywords: Freedom of Manifestation of Thought, Discourse on Hate, Religious Intolerance, Social Networks, Religious Freedom.
A linha tênue entre o exercício do direito de liberdade religiosa em face do discurso de ódio
The tennis line between the exercise of the right of religious freedom in face of hate speech
Recepção: 26 Outubro 2017
Aprovação: 20 Dezembro 2017
Formalmente, o Brasil é visto como um país de paz religiosa. Este consenso ideológico, no entanto, é desafiado quando se observam religiões sendo, cotidianamente, discriminadas por adeptos de outros grupos religiosos e excluídas das políticas públicas do Estado.
A intolerância religiosa é um conjunto de ideologias e atitudes ofensivas às diferentes crenças e religiões. Em casos extremos, esse tipo de intolerância torna-se uma perseguição, sendo definida como um discurso de ódio que fere a liberdade e a dignidade humana. A perseguição religiosa é de extrema gravidade e costuma ser caracterizada pela ofensa, discriminação e, até mesmo, por atos que atentam à vida de pessoas que integram grupos sociais que tem em comum certas crenças que destoam do padrão adotado e imposto socialmente.
As liberdades de expressão e de culto são asseguradas e protegidas no âmbito do direito internacional, sendo considerada um direito humano, além de gozar de proteção trazida pela Constituição Federal. A religião e a crença de um ser humano não devem constituir barreiras fraternais às relações humanas. Todos devem ser respeitados e tratados de maneira igual perante a lei, independente da escolha religiosa.
O Brasil é um estado laico, ou seja, não há uma religião oficial brasileira, pois o Estado se mantém neutro e imparcial às diferentes religiões. Dessa forma, há uma separação entre Estado e Igreja o que, teoricamente, assegura uma governabilidade imune à influência de dogmas religiosos. Além de separar governo de religião, a Constituição Federal de 1988 também garante o tratamento igualitário a todos os seres humanos, quaisquer que sejam suas crenças. Dessa maneira, a manifestação do direito de escolher livremente a religião ou crença a ser seguida está protegida e não deve, de forma alguma, ser desrespeitada.
É importante salientar que a crítica religiosa não se confunde com manifestações odiosas e intolerantes quanto à determinadas religiões. O direito de revisitar criticamente posicionamentos dogmáticos de uma religião é assegurado pelas liberdades de opinião e expressão. Todavia, isso deve ser feito de forma que não haja desrespeito e ódio ao grupo religioso a que é direcionada a crítica.
Com o propósito de avaliar os limites do livre direito de expressar o pensamento religioso, a fim de não se configurar manifestações de ódio, busca-se, na presente pesquisa, analisar quais são os parâmetros que devem nortear o direito de livremente cultuar ou escolher uma determinada religião diante de discursos discriminatórios veiculados nos meios de comunicação, principalmente nas redes sociais, verificando até que ponto a liberdade de expressão não se transforma em discurso do ódio.
Especificamente, pretende-se demonstrar a distinção existente entre o direito de expor livremente seu pensamento e posicionamento crítico frente à tênue relação que tais manifestações de pensamento possuem com o discurso de ódio, exclusão, que estimula a produção e a reprodução da violência e discriminação em razão da religião.
A escolha do tema justifica-se em razão de sua relevância teórica e prática, pretendendo-se esclarecer o que é o direito de exercer com legitimidade a liberdade de expressão e pensamento nas sociedades democráticas, frente às manifestações odiosas quanto à escolha da religião e crenças religiosas, principalmente por meio das redes sociais.
Inicialmente apresentam-se, mesmo que de forma breve, as proposições teóricas iniciais e indispensáveis ao entendimento das liberdades individuais, por um viés histórico. Em seguida, busca-se analisar o contexto da intolerância religiosa, ligada às redes sociais, verificando se a disseminação dos conteúdos discriminatórios ultrapassa a dimensão do direito de livremente expressar o pensamento, visando averiguar se o abuso no exercício de tais liberdades constitui discurso de ódio religioso.
Com o intento de atingir esse objetivo, apresentar-se-á um panorama geral acerca da luta pelos direitos voltados a proteger integralmente a pessoa humana, especialmente no que atine a suas liberdades individuais, partindo-se da investigação macroanalítica sobre a noção geral do direito de exercer com legitimidade as liberdades para, assim, delimitar a construção da análise da liberdade religiosa enquanto direito fundamental, destacando-se o seu real alcance dentro do ordenamento jurídico brasileiro, de modo a legitimar seu exercício sem a reprodução da violência e do ódio advindos da intolerância..
A abordagem proposta se pauta no exame da intolerância religiosa difundida nas redes sociais, trazendo breves apontamentos sobre o conceito, formas de manifestação e propagação de conteúdos discriminatórios e preconceituosos, com vistas a demonstrar em que consiste o discurso do ódio. Por fim, analisam-se os limites para legitimar o exercício democrático do direito à liberdade de expressar crenças, cultos e religiões, de modo a evidenciar que o exercício de tais liberdades não poderá configurar em fanatismo, discriminação, repulsa ao modo de pensar e expressar do próximo, situações essas que contribuem significativamente para a reprodução da violência nas redes sociais, em razão de motivações religiosas.
Todo esse recorte tem por finalidade evidenciar a violência e ofensa à liberdade de expressar suas crenças e religiões em redes sociais, visto que, sob o manto do exercício incondicional e irrestrito das liberdades individuais dissemina-se o discurso virtual carreado de conteúdo discriminatório e preconceituoso, extrapolando os limites reais da liberdade de exteriorizar suas convicções e pensamentos. Ressalta-se que não se pretende esgotar as possibilidades de discussão acerca do tema, pois o interesse é unicamente apresentar uma análise, mesmo que sucinta, acerca dos temas elencados, visto a sua relevância no cenário atual, apoiando-se na doutrina atual e em legislação pertinente com a respectiva proposta temática.
Com base nos objetivos propostos e no problema exposto, a pesquisa apresenta-se como um estudo teórico-bibliográfico, em que os referenciais selecionados objetivam reforçar, justificar, demonstrar, esclarecer e explicar o tema. Utilizou-se, também, da pesquisa documental, com a localização e consulta de fontes diversas de informações escritas, para coletar dados gerais ou específicos a respeito do tema, visando articular às informações coletadas, com um nível de análise crítico-epistemológica.
Utilizar-se-á do método dedutivo, partindo de uma concepção macro analítico para uma concepção específica, considerando-se que o estudo se inicia a partir de um breve histórico acerca da gênese da liberdade de manifestar pensamentos, convicções, posicionamentos, para delimitar a análise no âmbito do direito à religião, religiosidade e crenças, mais precisamente, na intolerância religiosa difundida pelas redes sociais como sinônimo de discurso do ódio.
Inicia-se, portanto, com uma abordagem histórica acerca da luta e conquistas sociais vivenciadas pela humanidade no que atine à concretização do direito de livremente fazer suas escolhas, ser respeitado em suas decisões, delimitando-se o estudo na abordagem da religião, crenças e religiosidade, tudo no afã de estabelecer as bases necessárias à compreensão crítica do tema proposto.
O Brasil é um país laico; significa dizer que inexiste uma religião oficial, pois o Estado deve manter-se imparcial no tocante às religiões. Porém, sendo um país de maioria cristã, práticas religiosas africanas foram duramente perseguidas pelas delegacias de costumes até a década de 1960.
No período colonial, as leis puniam com penas corporais as pessoas que discordassem da religião imposta pelos escravizadores. O Decreto de 1832 obrigava os escravos a se converterem à religião oficial. Um indivíduo acusado de feitiçaria era castigado com pena de morte. Com a proclamação da República, foi abolida a regra da religião oficial, mas o primeiro Código Penal republicano tratava como crimes o espiritismo e o curandeirismo. A lei penal atual, aprovada em 1940, manteve os crimes de charlatanismo e curandeirismo.
Até 1976, havia uma lei na Bahia que obrigava os templos das religiões de origem africana a se cadastrarem na delegacia de polícia mais próxima (BRASIL, Senado Notícias). Na Paraíba, uma lei aprovada em 1966 obrigava sacerdotes e sacerdotisas dessas religiões a se submeterem a exame de sanidade mental, por meio de laudo psiquiátrico (BRASIL, Senado Notícias).
Muitas mudanças ocorreram até 1988, quando a Constituição Federal passou a garantir o tratamento igualitário a todos os seres humanos, quaisquer que fossem suas crenças e religião. O texto constitucional propõe a inviolabilidade da liberdade de crença, culto e escolha da religião a ser seguida por cada indivíduo, garantindo-se o direito de realizar cultos religiosos em locais onde as pessoas possam professar sua fé e crenças, destacando-se que os locais de culto e as liturgias devem ser protegidos por lei.
A Lei 9.459, de 1997, tipifica como crime a prática de atos discriminatórios ou de preconceito contra religiões; ninguém pode ser discriminado em razão de credo religioso, sendo o crime de discriminação religiosa inafiançável e imprescritível. A postura do Estado em criminalizar tais condutas evidencia a relevância do tema para a construção democrática de uma sociedade marcada pelo pluralismo, diversidade e diferenças, especialmente no que atine ao tema religião, religiosidade e crenças.
“Os direitos fundamentais, como resultado da personalização e positivação constitucional de determinados valores básicos [...] integram, ao lado dos princípios estruturais e organizacionais [...] a substância propriamente dita, o núcleo substancial, formado pelas decisões fundamentais” (SARLET, 2004, p. 70). Nesse sentido, “o conteúdo dos direitos ganhou diversidade tanto em relação aos seus titulares (especificação subjetiva) [...]; quanto pela introdução de novas pretensões tuteladas (especificação objetiva) [...]; ou de projeções solidaristas, também conhecidas como direitos de fraternidade ou direitos coletivos” (SAMPAIO, 2004, p. 245).
O exercício legitimo direito à liberdade, indistintamente por todas as pessoas, é corolário da dignidade humana nas sociedades democráticas. “O conceito de Estado democrático de direito exige redefinição dos princípios do Estado democrático e do Estado de direito, em seus modelos clássicos” (SOARES, 2000, p. 111). Significa dizer que “a concepção dos direitos fundamentais no Estado democrático de direito se caracteriza por dupla qualificação de tais direitos. Os direitos fundamentais são concebidos como direitos subjetivos de liberdade pertinentes ao titular perante o Estado” (SOARES, 2000, p. 111).
“É a pauta de direitos fundamentais em um sistema político que noticia o seu caráter autoritário ou democrático, liberal ou social” (GONÇALVES, 1997, p. 35). A compreensão da liberdade como um direito fundamental no Estado Democrático legitima os indivíduos quanto às escolhas individuais, sem qualquer ingerência estatal. As crenças, religiões, convicções religiosas, religiosidade são escolhas feitas por cada cidadão individualmente. O Estado, além de não ter legitimidade de intervir nessas escolhas, deve proteger amplamente as pessoas contra qualquer tipo de violência, repressão ou retaliação decorrente de suas decisões individuai. Isso decorre do fato de que “os direitos fundamentais constituem o cerne de qualquer ordem jurídica, a medula das constituições e a teoria que se pretende desenvolver acerca de tais direito há de vislumbrá-los sob este ângulo” (GONÇALVES, 1997, p. 35). Ser livre é ter a possibilidade de igual escolha dentre as diversas opções existentes, sem sofrer qualquer ingerência do Estado, da sociedade ou qualquer instituição que fomenta a desigualdade e coisifica a pessoa humana.
Nos dizeres de Canotilho (1998), os direitos fundamentais possuem quatro funções primordiais, a saber: prestação social, defesa, não-discriminação e proteção perante terceiros. Nesta investigação, serão abordadas apenas as três últimas, pois parece que a função de prestação social não incide sobre as liberdades religiosas aqui debatidas.
Para o constitucionalista português, os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa (ou de liberdade) sob uma dupla perspectiva: a) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídico-individual; b) implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa) (CANOTILHO, 1998).
Assim, por exemplo, o art. 5º, inciso IV, da Constituição brasileira, assegura subjetivamente o direito de expressar e divulgar livremente o pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio (liberdade positiva), assegurando-se que tais direitos sejam exercidos sem intervenção ilegítima e abusiva por parte dos poderes públicos (liberdade negativa). Além disso, a norma em questão proíbe a edição de qualquer ato normativo que importe em censura (norma de competência negativa).
A função de não-discriminação busca assegurar que as proposições estatais tratem os seus cidadãos como fundamentalmente iguais. Esta função, anota Canotilho (1998), alarga-se a todos os direitos; tanto se aplica aos direitos, liberdades e garantias pessoais (ex: não discriminação em virtude de religião), como aos direitos de participação política (ex: direito de acesso aos cargos públicos) como ainda aos direitos dos trabalhadores (ex: direito ao emprego e formação profissional). Alarga-se, de igual modo, aos direitos às prestações (prestações de saúde, habitação) (CANOTILHO, 1998). Seu fundamento é o princípio geral de igualdade, declarado no art. 5º, caput, das premissas constitucionais brasileiras vigentes.
A função de proteção, por fim, diz respeito à responsabilidade estatal no que atine a adotar medidas positivas destinadas a proteger o exercício dos direitos previstos no plano constituinte de atividades perturbadoras ou lesivas praticadas por terceiros. Diversamente do que ocorre na função de defesa, a conduta exigida do Estado, aqui, é comissiva.
Como ressalta Alexy (2008, p. 436), o espectro dos direitos que visam assegurar proteção integral da pessoa humana é muito amplo, alcançando, inclusive, os chamados “direitos de primeira geração”, como a vida, a liberdade, a privacidade e a propriedade. Ao contrário do que entende a doutrina tradicional das liberdades públicas, também esses direitos são objeto de atuação direta do Estado, com o escopo de protegê-los e assegurar-lhes a maior eficácia possível. As ações estatais de proteção podem ter natureza normativa ou fática. Os direitos às ações positivas normativas são direitos a atos estatais de imposição de uma norma jurídica (ALEXY, 2008). As normas penais que tutelam os bens jurídicos fundamentais e as normas de organização indispensáveis à proteção desses bens (v.g., as normas de organização do Sistema Único de Saúde) são ações positivas desta natureza. Há o direito a uma ação positiva fática, por exemplo, quando a Constituição obriga o Estado a garantir amplamente o exercício efetivo à religião, crenças, convicções e religiosidade a todos os cidadãos, indistintamente, incluindo-se os militares, os detentos (CR, art. 5º, VII), a fim de garantir o pleno exercício das liberdades individuais no espaço coletivo.
A liberdade de escolha de crenças, religião, cultos e religiosidade é corolário da dignidade humana, considerando-se que integra o patrimônio imaterial do homem, conferindo-lhe condições de se sentir pleno no âmbito de sua individualidade, não podendo sofrer qualquer intervenção do Estado no sentido de tolher o exercício de tal direito. “A opção religiosa está tão incorporada ao substrato do ser humano [...] que o seu desrespeito provoca idêntico desacato à dignidade da pessoa” (SILVA NETO, 2003, p. 116). Nesse sentido, “a religião é o mediador pelo qual os indivíduos ou grupos interpretam a si mesmo e a realidade em que vivem, seu imbricamento com a formação e a manifestação da identidade é muito intenso” (MARTEL, 2007, p. 13).
O exercício livre do direito de escolher uma religião, credo, crendices “permite aos indivíduos e grupos construir sua maneira de ser no mundo; que dá lugar à possibilidade de as pessoas adotarem concepções morais, políticas, ideológicas - abrangentes ou não - a partir de uma gramática específica” (MARTEL, 2007, p. 13). Nos dizeres de Jorge Miranda, há estreita relação entre a liberdade religiosa e a liberdade de consciência:
A liberdade religiosa aparece indissociável, como não podia deixar de ser, da liberdade de consciência. No entanto, não se lhe assimila, visto que a liberdade de consciência é mais ampla e compreende quer a liberdade de ter ou não ter religião (e de ter qualquer religião) quer a liberdade de convicções de natureza não religiosa (filosófica, designadamente); e, depois porque a liberdade de consciência vale, por definição, só para o foro individual, ao passo que a liberdade religiosa possui (como já se acentuou) também uma dimensão social e institucional (MIRANDA, 2014, p.13).
Nos dizeres de Vladimir Brega Filho e Fernando Brito Alves “liberdade religiosa é enquadrada na classificação clássica de Norberto Bobbio como direito fundamental de primeira geração, podendo ser considerada, ainda, como um direito civil fundamental que demandava uma prestação negativa por parte do Estado, uma não-ação” (2009, p. 77).
Note-se, portanto, que o direito de exercer livremente a escolha de uma religião, sob a ótica do texto da Constituição brasileira de 1988, é visto como o status de direito fundamental, tendo em vista sua relevância e essencialidade, conforme aferido no seu processo de desenvolvimento e já apresentado nesse estudo. Noutro norte, é importante que se perceba que a ideia de livre expressão do pensamento e das crenças religiosas não pode ser entendida de uma maneira estática, sem atentar-se para as mudanças de nossa sociedade.
Pontes de Miranda (1974)1 reforça esses argumentos ao afirmar que tem se perguntado se no âmbito das liberdades individuais caberia o livre pensamento de se posicionar contra certa religião ou contra as religiões. Salienta que, nas origens, o princípio não abrangia essa emissão de pensamento, tendo posteriormente sido incluído com alteração do nome para liberdade de consciência, para que se prestasse a ser invocado por teístas e ateus. Afirma, por fim, que "liberdade de religião é liberdade de se ter a religião que se entende, em qualidade, ou em quantidade, inclusive de não se ter” (PONTES DE MIRANDA, 1974, p. 122), garantia esse objeto de lutas que percorreram séculos de história. O exercício material da liberdade individual deve ter como pressuposto a igualdade jurídica no acesso às informações e condições de ser livre, haja vista que pensar em liberdade no âmbito da desigualdade da condição humana constitui profunda contradição aos olhos da crítica científica.
As liberdades de expressão e de culto são asseguradas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Constituição Federal. A religião e a crença de um ser humano não devem constituir barreiras às relações humanas. Todos devem ser respeitados e tratados de maneira igual perante a lei, independente da orientação religiosa.
O Brasil é um país de várias religiões que se manifestam formando a identidade nacional. Apesar de ser um Estado laico, desde 1890 a intolerância religiosa ainda é muito praticada por alguns grupos, que por meio do preconceito, violência ou agressão infringem o direito de os cidadãos manifestarem suas crenças - independente de qual seja - de forma igualitária.
Contudo, o que se vê na atualidade é um exagero dessas colocações, elevando o tom de posicionamentos pessoais e críticas a uma ideologia diversa, materializando-se em atos de preconceito e discriminação.
Nessa perspectiva, diversas exibições do discurso de ódio que podem ser idealizadas enfatizam a intolerância religiosa, motivando indivíduos às manifestações de preconceito e discriminação, promovendo agressão física, moral e psicológica contra os princípios das vítimas dessas situações.
Nesse contexto, ainda torna-se nítido uma crescente parcela da população brasileira que promove condutas de discriminação, manifestações apresentadas cotidianamente nas redes sociais, que apresentam grande facilidade para expor qualquer situação de preconceito, opressão e hostilidade em razão, muitas vezes, do anonimato.
Fruto do inegável e rápido avanço da tecnologia, a informação está disponível a todos, pelo menos nos países onde há razoável nível econômico, liberdade de expressão e acesso gratuito e amplo à internet. Neste contexto, as redes sociais ganham destaque, pois garantem a troca de informações entre cidadãos comuns que, através delas, expõem seus pensamentos sobre tudo e todos, às vezes sem uso do bom senso e desrespeitando a liberdade de escolha e expressão do próximo.
Na rede mundial de computadores, a intolerância proveniente dos chamados haters é algo que vem ganhando visibilidade através dos vários comentários postados nas redes sociais, pois essas pessoas demonstram sentimentos de ódio, hostilidade, utilizando várias discriminações, como a racial, homofóbica, religiosa, rivalidades desportivas, xenofobia, entre outros. Ou seja, a rede mundial de computadores é vista como um lócus de reprodução de violências, estímulo às discriminações, exclusões de pessoas e convivência com o medo que atinge as vítimas.
Como já elencado, a liberdade de expressão é assegurada em inúmeros tratados internacionais, entre eles, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948 – art. 19); a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (OEA, 1969 – art. 13) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ONU, 1966 – art. 19), dos quais o Brasil é signatário.
Na Constituição brasileira, o direito de expressão consta de diversos dispositivos, tanto no capítulo dos direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º, IV, V e IX), quanto no capítulo destinado à comunicação social em que houve o reconhecimento expresso de que “a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” (art. 220). Assentou-se, ainda, que “[é] vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” (art. 220, § 2º).
Nas sociedades democráticas, ainda que não se deva afirmar a primazia absoluta e definitiva de algum direito fundamental, há aqueles que têm um destaque relativo, gozam de preferência inicial e cobram razões especialmente fortes para justificar a restrição. Tal é a situação da liberdade de expressão que, tanto em sua perspectiva individual, como na coletiva, serve de fundamento para o exercício de outros direitos fundamentais e para a própria democracia enquanto regime que requer a formação de uma opinião pública livre (STROPPA; ROTHENBURG, 2015).
Por meio do direito fundamental à liberdade de expressão, atualmente se verifica um grande abuso na proliferação de conteúdos dos mais variados, dentre eles, aqueles com grande teor discriminatório. Trata-se do exercício ilegítimo e abusivo das liberdades individuais, como meio de praticar violência mediante a expressão de discursos de ódio.
São esses discursos enraizados no preconceito e na discriminação que são objeto de análise por este estudo, para avaliar até que ponto as manifestações propagadas pelas redes sociais se materializam em liberdade de expressão ou se ultrapassam o mero disseminar de opinião, constituindo o discurso do ódio.
Se o conflito de ideias e de posicionamentos é inevitável em uma sociedade plural, a questão que se coloca com particular relevo consiste em saber se os conteúdos envolvendo as manifestações de opinião se materializam em discurso de ódio (hate speech)2 ou são apenas manifestações da liberdade de expressão. Nesse passo, necessário definir, primeiramente, em que consiste o discurso do ódio.
Nos dizeres de Botelho (2012), o discurso de ódio tem que ter seu componente consistente na vontade de ofender, de insultar, de intimidar ou assediar grupo ou pessoas. Do contrário, ausente este objetivo específico, haverá manifestação do pensamento, protegido (...) no campo religioso, pela liberdade de crença e religião.
O discurso de ódio incide na apropriação de todas as formas de expressão que propagam, incitam, promovem ou justificam o ódio racial, a discriminação religiosa e outras formas de ódio baseadas na intolerância. Nos espaços virtuais os indivíduos podem ser igualmente vítimas e agentes de abusos e violações dos Direitos Humanos, entre as quais, o discurso de ódio que dissemina a violência verbal entre os sujeitos, assim servindo como arcabouço para a promoção e exteriorização de conteúdos discriminatórios e preconceituosos.
O discurso do ódio consiste na divulgação de mensagens que difundem e estimulam o preconceito religioso e outras formas de ataques baseados na intolerância, confrontando-se com os limites éticos de convivência, visto que o objetivo precípuo é justificar a privação de direitos, a exclusão social e até a eliminação física daqueles que são discriminados. (STROPPA; ROTHENBURG, 2015).
A Constituição brasileira dispõe expressamente que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (art. 5º, XLI).
O discurso de ódio, como tal, não é um assunto novo na internet, nem no debate sobre direitos humanos. Este discurso está presente nas redes sociais e no convívio interpessoal.
Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos arts. I e II todos têm direito de igualdade e liberdade, o que evidencia que os discursos de ódio vão contra os princípios constitucionais apregoados em nossa Constituição vigente. Vale conferir a redação dos dispositivos da Declaração:
artigo I: Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.
artigo II: Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
Indubitavelmente compreende-se que os discursos de ódio devem ser reprimidos para o bem social, buscando-se promover a pacificação através da repressão dos discursos violentos e agressores que são disseminados constantemente na sociedade atual. Desta forma, incumbe à sociedade a contribuição na busca da proteção dos Direitos Humanos e combate de tais discursos e incitações.
Potiguar explica o discurso do ódio como uma prática discursiva do desrespeito:
A existência de um procedimento democrático que propicie o debate entre diferentes visões acerca do mundo e a obtenção de um determinado entendimento, que se sabe precário, contingente e passível de futura modificação, que ocasione uma ação voltada ao entendimento mútuo, é o que permite que diferentes coassociados sob o direito sejam, ao mesmo tempo, seus atores e destinatários. São esses procedimentos e não seus conteúdos que asseguram a legitimidade, por garantirem a participação no jogo democrático e possibilitam a transformação desse poder comunicativo, oriundo da esfera pública e civil, em um poder administrativo por meio da passagem por filtros legislativos institucionalizados (POTIGUAR, 2012, p. 160).
Além disso, a artigo 19 da Declaração recomenda a adoção de alguns critérios para enquadrar um discurso como discurso do ódio, tornando-o passível de punição. Tais critérios são considerados como elementos constitutivos da incitação, conforme o artigo 20 da PIDCP (Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos), e foram elaborados para servir de orientação às Cortes para identificar o discurso de ódio, sendo:
I. severidade: a ofensa deve ser “a mais severa e profunda forma de opróbrio”
II. intenção: deve haver a intenção de incitar o ódio
III. conteúdo o forma do discurso: devem ser consideradas a forma, estilo e natureza dos argumentos empregados
IV. extensão do discurso: o discurso deve ser dirigido ao público em geral ou à um número de indivíduos em um espaço público.
V. probabilidade de ocorrência de dano: o crime de incitação não necessita que o dano ocorra de fato, entretanto é necessária a averiguação de algum nível de risco de que algum dano resulte de tal incitação.
VI. iminência: o tempo entre o discurso e a ação (discriminação, hostilidade ou violência) não pode ser demasiado longo de forma que não seja razoável imputar ao emissor do discurso a responsabilidade pelo eventual resultado.
VII. contexto: o contexto em que é proferido o discurso é de suma importância para verificar se as declarações têm potencial de incitar ódio e gerar alguma ação. (artigo 20, PIDCP)
É também nesse sentido que o próprio resultado do discurso do ódio não se coaduna com o ideal democrático de proporcionar a todos a possibilidade de exprimir suas opiniões, vez que ele resulta em um efeito sancionador. Tal discurso retira das pessoas o direito de exprimir livremente, de forma legítima, suas manifestações de pensamento, crenças, convicções e religiões.
A proteção da liberdade de expressão está diretamente associada à garantia da dignidade da pessoa humana e da democracia. Ocorre que as relações sociais, no ambiente democrático e contexto multicultural, impõem contornos ao direito de expressão, que – tal como os demais direitos fundamentais – conhece restrições.
Nesse escopo, não é permitido se valer do manto da liberdade de expressão para, assim, exteriorizar conteúdos discriminatórios ou discursos do ódio, sob a pretensa afirmação de que se trata de liberdade de expressão.
O exercício abusivo da liberdade de expressão é potencializado com a generalização do acesso à internet que permite às pessoas assumir uma posição ativa na relação comunicacional ao saírem da posição de receptores da informação e passarem à posição de criadoras de conteúdos, os quais podem ser divulgados de maneira instantânea, sobretudo nas mídias sociais como Facebook, Twitter e Instagram, com acentuada velocidade de propagação e uma aparente possibilidade de anonimato. Com isso, os discursos discriminatórios (hate speech) ganharam sua versão cibernética e, nesse contexto, a reflexão prática a respeito dos limites da liberdade de expressão em razão da veiculação de mensagens preconceituosas que atingem as pessoas e os grupos vulneráveis também precisa ser feita. (STROPPA; ROTHENBURG, 2015; p. 451)
O ministro Celso de Mello bem pontuou, recentemente, os limites da liberdade de expressão e o discurso de ódio:
O repúdio ao 'hate speech' traduz, na realidade, decorrência de nosso sistema constitucional, que reflete a repulsa ao ódio étnico estabelecida no próprio Pacto de São José da Costa Rica. (...) Evidente, desse modo, que a liberdade de expressão não assume caráter absoluto em nosso sistema jurídico, consideradas, sob tal perspectiva, as cláusulas inscritas tanto em nossa própria Constituição quanto na Convenção Americana de Direitos Humanos. (...) Há limites que conformam o exercício do direito à livre manifestação do pensamento, eis que a nossa Carta Política, ao contemplar determinados valores, quis protegê-los de modo amplo, em ordem a impedir, por exemplo, discriminações atentatórias aos direitos e liberdades fundamentais (CF, art. 5º, XLI), a prática do racismo (CF, art. 5º, XLII) e a ação de grupos armados (civis ou militares) contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (CF, art. 5º, XLIV)"[3].
É notório que, embora a liberdade de expressão seja assegurada constitucionalmente, há de se ater aos desvios e abusos de sua finalidade. O que se tem visto nas redes sociais é um aumento deliberado de manifestações preconceituosas e discriminatórias quanto às crenças religiosas. Esse comportamento supera os limites da liberdade de expressão legitimamente exercida no Estado Democrático de Direito, materializando-se em discurso do ódio por intolerância religiosa.
Há aqueles que defendem a liberdade absoluta de manifestação e expressão de ideias, acreditando-se que isso levaria à evolução gradual do pensamento. Ideias, porém, não se confundem com agressões e ofensas, que estimulam o preconceito, a discriminação e o aniquilamento do outro. O debate franco e democrático somente é possível no contexto social em que há o respeito aos grupos, inclusive aos politicamente minoritários, e o direito de voz é igual para todos.
O exercício da liberdade de expressão é delimitado no âmbito da legitimidade democrática, ou seja, o direito de expressar pensamentos, opiniões, críticas, apontamentos somente é juridicamente legítimo quando não vem acompanhado do animus injuriandi, difamandi, ou seja, da intenção de ofender, desmoralizar o outro, desqualificar um grupo, estimular a violência e intolerância.
Ser livre numa sociedade democrática é conseguir enxergar o outro; não torná-lo invisível aos próprios olhos; é ser visto pelo seu interlocutor; é colocar as pessoas no mesmo plano fático e jurídico de debate, reflexão e opinião; é não hierarquizar posicionamentos e concepções de mundo; é enxergar o outro como igual no momento de fazer suas escolhas de vida; é perceber que as próprias escolhas não são melhores nem piores que as escolhas do outro; é ter o direito de escolher sem ser coisificado e tolhido por pessoas, instituições públicas ou privadas.
A sociedade humana passou por transformações substanciais, mas estas não extinguiram o preconceito e a discriminação face à liberdade religiosa. Historicamente, a intolerância religiosa está presente na esfera das relações humanas, fundadas em sentimentos e crenças religiosas. Foi em razão da religião que a humanidade vivenciou inúmeras guerras, vários povos foram violentados, pessoas foram presas e queimadas. Isso evidencia que a questão do ódio decorrente de crenças e religiões distintas percorre todos os fatos históricos, perdurando até a sociedade contemporânea.
Atualmente as redes sociais têm sido utilizadas como espaço de reprodução do ódio, intolerância, discriminação e violências em razão da religião. O ambiente em rede facilita a disseminação de manifestações de cunho ofensivo e discriminatório, sob a sensação de um pretenso anonimato. O mundo virtual abriu espaço para a propagação de conteúdos que extrapolam os limites da liberdade de expressão, configurando, claramente, discurso de ódio.
O direito de criticar dogmas e crenças é assegurado como liberdade de expressão, mas atitudes agressivas, ofensas e tratamento diferenciado a alguém em função de crença ou de não ter religião são condutas juridicamente vedadas.
A liberdade de expressão não pode ser tida como imensurável e sem limites, a ponto de culminar pela proliferação do ódio entre as pessoas. A melhor forma de prevenir a influência da intolerância e suas manifestações (a violência, a discriminação e o preconceito) é esclarecer à sociedade os efeitos nocivos dessas formas de pensar e agir, e, principalmente, conscientizar a todos para uma atitude de paz e tolerância.
Juridicamente há uma linha tênue entre liberdade de expressão e ofensas, ódio, preconceitos e discriminações. No Estado Democrático de Direito, o exercício legítimo do direito fundamental à liberdade passa diretamente pela expressão de pensamentos críticos, manifestações artísticas, políticas, de gênero e religiosas. O direito à liberdade não é absoluto a ponto de justificar escolhas e condutas unilateralmente voltadas à esfera individual. Por meio do exercício das liberdades individuais, deve-se proteger liberdades públicas e escolhas individuais alheias.
O discurso de ódio, intolerância, preconceito e discriminação decorre de o desinteresse do indivíduo conhecer e compreender as escolhas alheias; da falta de solidariedade para com o próximo; da necessidade de impor seu modo de ser, pensar, agir e expressar suas crenças e religião. O papel da ciência do direito, nesse contexto, é intervir para regular as relações humanas e, caso necessário, punir os agentes que reproduzem discursos de ódio e que geram todo tipo de violência entre as pessoas em razão da religião.
As proposições legislativas objetivam uma convivência harmoniosa e pacífica entre pessoas, grupos, povos e nações de todo o mundo. Para que isto aconteça, a tolerância e o respeito ao próximo são requisitos fundamentais. Ser tolerante significa aceitar as diferenças entre as pessoas, sejam quais forem: de pensamento, valores, culturas, cor, raça, etnia, nacionalidade, religião, orientação sexual etc. As redes sociais devem ser usadas com o fim pacífico de manifestação de pensamentos e ideologias, não como instrumento de reprodução do preconceito e da discriminação.
Tolerar é procurar aceitar as diferenças entre as pessoas, sem abrir mão de sua própria individualidade e diferença. É, por exemplo, entender e aceitar que os outros têm direito de pensar e agir de maneira diferente que nós. É perceber que a humanidade é feita de inúmeras diferenças e compreender que todos têm os mesmos direitos a viver com dignidade.
As proposições cientificas debatidas na presente pesquisa evidenciam a necessidade de priorizar atitude de cooperação, reciprocidade e respeito mútuo, essencial a uma educação para a paz, para a democracia e para o respeito aos direitos humanos.
Trata-se do reconhecimento, pelo próprio Estado, da existência do problema. A intolerância religiosa é um discurso de ódio que fere a liberdade e a dignidade humana. O Brasil é o país que abriga uma das maiores diversidades religiosas do mundo e, por isso, tem a obrigação de ser verdadeiramente um exemplo de paz nessa questão, coibindo a disseminação desse tipo de conduta odiosa em virtude de razões religiosas.
Nesse contexto, o papel do Estado na tolerância religiosa tem o condão de garantir as condições de igual liberdade religiosa e moral a todos, indistintamente. A liberdade religiosa é uma garantia do cidadão, sem a qual não se pode conceber um Estado Democrático de Direito; portanto, admitir a proliferação de uma intolerância com base numa crença diversa é ir contra aos preceitos constitucionais.