Articles
Recepção: 03 Agosto 2017
Aprovação: 13 Novembro 2017
DOI: https://doi.org/10.4013/csu.2017.53.3.14
Resumo: O presente artigo realiza uma “radiografia” das publicações acadêmicas, sob o formato de dossiês, relacionadas com a temática “ensino de Sociologia” (2007-2017). A atenção concentrou-se prioritariamente em quatro elementos constitutivos da publicação científica em questão: (i) a revista; (ii) os organizadores; (iii) os autores e; (iv) os artigos. O termo “radiografia” faz alusão ao propósito de desvelar configurações não explícitas nos dossiês em análise, o que corrobora para a compreensão da História recente desse subcampo da Sociologia. Dentre os pontos identificados, destacamos o papel central das universidades públicas e a importância de pesquisadores vinculados às instituições localizadas no Nordeste e no Sul na ampliação dos espaços de publicação de pesquisas sobre o ensino de Sociologia, assim como ficou evidente a recente expansão do prestígio social do subcampo de pesquisa no interior da comunidade acadêmica e seu alargamento.
Palavras-chave: Ensino de Sociologia, dossiês, produção acadêmica, subcampo.
Abstract : This article carries out an “x-ray” of academic publications, in the format of dossiers, related to the theme “Sociology Teaching” (2007-2017). Attention was focused primarily on four essential elements of the scientific publication in question: (i) the journal; (ii) the organizers; (iii) the authors, and; (iv) the articles. The term “radiography” alludes to the purpose of uncovering non-explicit configurations in the dossiers under analysis, which corroborates the understanding of the recent history of this subfield of Sociology. Among the identified points we highlight the central role of public universities and the importance of researchers linked to the institutions located in the Northeast and South in the expansion of the spaces of research publication on the teaching of Sociology, as it was evident by the recent expansion of the social prestige of the subfield of research within the academic community, as well as its enlargement.
Keywords: Sociology teaching, dossiers, academic production, subfield.
Introdução
A consolidação da Sociologia no Ensino Básico depende, para além das definições legislativas, da consolidação curricular, de métodos pedagógicos e de recursos didáticos, bem como do reconhecimento social. Para tanto, é fundamental que a Sociologia escolar alcance reconhecimento no interior da comunidade de cientistas sociais, uma vez que tal consolidação depende de ações e desdobramentos que se dão, em grande parte, no interior da academia, sobretudo por meio de debates, pesquisas e publicações em periódicos científicos. Desta forma, compreender o status de um campo ou subcampo de pesquisa no interior da comunidade acadêmica fornece subsídios para desvelar a configuração de tal campo ou subcampo, assim como compreender o estado de sua inserção na sociedade via disciplina escolar. Uma das formas possíveis de observar o status atribuído pela comunidade acadêmica a um campo ou subcampo de pesquisa é analisando a sua presença em periódicos acadêmicos, o que se convencionou chamar de “Estado de Arte”. Mais especificamente, análises de dossiês publicados em periódicos científicos podem ser colaborativos por ser um indicativo de existência de leitores e pesquisadores interessados na temática abordada.
Quando um dossiê é proposto em um periódico acadêmico três questões, ao menos, são evidentes: (i) a comissão editorial do periódico e os proponentes julgam o tema ser relevante para parte da academia; (ii) acredita-se na existência de um conjunto significativo de pesquisadores interessados na temática e que vem se dedicando à produção de pesquisas sobre o tema proposto e; (iii) há a expectativa de que existam leitores interessados no assunto. Assim, as publicações de dossiês são indicativos de que a temática abordada é tida como importante ou está em processo de reconhecimento. Dito isto, analisar os dossiês publicados parece ser colaborativo na compreensão do status do subcampo de pesquisa. Partindo desse pressuposto, e buscando compreender a configuração do subcampo de pesquisa “ensino de Sociologia no Ensino Médio”, nos propomos a realizar uma “radiografia” dos dossiês sobre o “ensino de sociologia” (20072017). O termo “radiografia” aqui empregado faz alusão ao propósito de desvelar configurações não explícitas no conjunto da produção científica em questão.
Percorridos dez anos, desde as duas primeiras publicações de dossiês sobre ensino de Sociologia no Brasil, tomamos como problema de pesquisa a seguinte questão: o que os dossiês publicados nesse período (2007-2017) podem revelar quanto a configuração do subcampo em questão?
A fim de operacionalizar nossa “radiografia”, nos voltamos a atenção à, prioritariamente, quatro elementos constitutivos da publicação dos dossiês: (i) a revista; (ii) os organizadores; (iii) os autores e; (iv) os artigos. Essa operacionalização será, posteriormente, melhor esboçada.
O artigo está estruturado em cinco partes. A primeira é esta introdução. A segunda traz uma breve exposição do processo litigioso em relação a obrigatoriedade da Sociologia no Ensino Médio, bem como um balanço-síntese da constituição do subcampo de pesquisa “ensino de Sociologia”. Na terceira, o leitor encontrará os procedimentos metodológicos adotados. Na quarta parte é realizada uma “radiografia” dos dossiês sobre “ensino de Sociologia”, estes publicados entre os anos de 2007 e 2017. Nessa mesma parte são efetivadas algumas discussões pertinentes em torno das questões implícitas e explicitas presentes no conjunto dos dossiês analisados. Por fim, na quinta e última parte, apresentamos algumas considerações finais.
O litigioso da Sociologia Escolar e a produção de um subcampo de pesquisa
Ainda que não seja nosso objetivo realizar um levantamento metódico ou detalhado do histórico da presença e ausência da Sociologia no ensino secundário, uma breve exposição dessa trajetória corrobora para a compreensão da importância de dossiês sobre o ensino desse componente curricular para a consolidação de um subcampo de pesquisa ainda marginalizado nos estudos brasileiros das Ciências Sociais (Moraes, 2003).
A Sociologia aparece no Brasil como disciplina antes mesmo de um curso acadêmico. Suas origens no currículo escolar remontam ao final do século XX (Alves e Costas, 2006; Bodart e Cigales, 2015), embora sua obrigatoriedade, enquanto componente curricular, deu-se apenas em 1925, com a Reforma Rocha Vaz (Bodart e Cigales, 2015). Segundo Meucci (2000), nesse período, a introdução da Sociologia no ensino secundário colaborou com o desenvolvimento de diversos manuais de Sociologia. Contudo, em 1942, por meio da Reforma Capanema, a Sociologia deixou de ser obrigatória. Por meio da Lei e Diretrizes de Base da Educação (LDB), Nº 4.024, de 1961 (Brasil, 1961), não retornou como obrigatória no ensino secundário e, em 1971, por meio da LDB, nº 5.692 (Brasil, 1971), passou a ser optativa, juntamente com outras 104 disciplinas (Bodart e Silva, 2016). No ano de 1982, a Lei de nº 7.044 (Brasil, 1982), reabriu espaços para as disciplinas de Ciências Humanas, sem, contudo, tornar a Sociologia obrigatória. A partir daquele momento deu-se início a movimentos em vários estados da federação em favor do retorno da Sociologia no Ensino Médio (Bodart e Silva, 2016). Entre os anos de 1990 e a primeira metade dos anos 2000 encontramos diversas escolas públicas e privadas ofertando a disciplina de Sociologia, assim como leis estaduais incluindo-a como componente escolar do Ensino Básico. Esse retorno gradativo, ainda que bastante insipiente, foi a base para a inclusão oficial da disciplina no Ensino Médio nacional, assim como o desenvolvimento das primeiras propostas curriculares estaduais. No ano de 2008 a Sociologia retornou, por força de Lei, ao currículo nacional do Ensino Médio. Por conta de sua longa ausência3 no currículo e pelo histórico distanciamento da Sociologia em relação ao seu ensino na escola secundária (Moraes, 2011), temos hoje um subcampo ainda em construção, o que necessariamente afeta a sua prática de ensino.
Como destacou Moraes (2003, p. 13), só teremos uma consolidação de conteúdos pragmáticos e de materiais didáticos de Sociologia se tivermos o “reconhecimento pela comunidade de cientistas sociais de uma área de pesquisa em Ensino de Sociologia, com espaço para debates e divulgação de pesquisas nos seus fóruns e para a publicação em sua imprensa periódica”.
Temos observado um esforço no sentido de compreender a evolução do subcampo “ensino de Sociologia”, e seu reconhecimento pela comunidade de cientistas. Nessa direção algumas pesquisas buscaram examinar: (i) o volume de grupos de pesquisas registrados no diretório do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) voltados ao tema; (ii) evolução do número de cursos de licenciatura; (iii) a ampliação do número de dissertações e teses sobre ensino de Sociologia e; (iv) uma análise dos livros coletâneas sobre ensino de Sociologia.
Neuhold (2015), ao examinar os grupos de pesquisas registrados no diretório CNPq, destacou que enquanto no ano de 2000 apenas um grupo havia se dedicado ao tema ensino de Sociologia, em 2013 esse número havia saltado para 22 grupos. Oliveira (2015) ao observar a evolução do número de cursos de licenciatura após a reintrodução da Sociologia como componente curricular obrigatório no Ensino Médio, destacou que houve um significativo incremento no volume de cursos de licenciatura em Ciências Sociais no Brasil. Destacaram Bodart e Cigales (2017), ao observar a presença da temática dos trabalhos de pós-graduação stricto sensu brasileiros, que temos presenciado uma ampliação do interesse pela temática ensino de sociologia no âmbito da pós-graduação brasileira. Essa mesma observação havia sido destacada por Handfas e Maçaira (2015). Eras e Oliveira (2015), por sua vez, evidenciaram o crescente número de livros coletâneas que tiveram por escopo o ensino de Sociologia, embora tais obras tivesse tido baixas tiragens (300, 500 e 1000) e não digitalização, o que dificulta o seu acesso. Todas essas pesquisas são indicativos quantitativos da ampliação da presença da temática “ensino de Sociologia” na academia brasileira.
Corroborando com as pesquisas mencionadas, realizamos uma análise dos dossiês sobre o ensino de Sociologia. Não que esta análise seja suficiente para desvelar o estágio do subcampo em questão, mas agrega elementos empíricos a tal propósito.
Procedimentos metodológicos
Como mencionado, a operacionalização da “radiografia” aqui proposta, dar-se por meio de análise de, prioritariamente, três elementos constitutivos da publicação dos dossiês: (i) a revista; (ii) os organizadores; (iii) os autores e; (iv) os artigos.
Para a coleta dos dossiês publicados, realizamos uma busca na internet, utilizando o buscador Google, a partir dos seguintes descritores: “Dossiê: ensino de sociologia”, “Dossiê: ensino de Ciências Sociais”, “Dossiê: formação de professores de Sociologia”, “Dossiê: práticas didáticas em sociologia”, “Dossiê: Professores de Sociologia”, “Dossiê: Sociologia no ensino básico”. Em um segundo momento, o contato com outros pesquisadores da temática nos foi importante para confirmar se nosso levantamento havia abarcado todos os dossiês sobre ensino de Sociologia até então no Brasil.
Ao voltarmos nossa atenção à revista que publicou o dossiê, objetivamos averiguar sua importância no interior da comunidade científica. Para isso observamos os seguintes elementos: (i) a instituição responsável pelo periódico; (ii) se há vínculo da revista à programa de pós-graduação stricto sensu e; (iii) sua classificação Qualis-Periódicos.
O status atribuído pela comunidade acadêmica a um periódico está, em certa medida, relacionado a sua vinculação institucional, bem como à programas de pós-graduações stricto sensu. Por esse motivo, buscamos averiguar a vinculação de cada um dos periódicos que tenha publicado um ou mais dossiês sobre o ensino de Sociologia. Outro indicativo de prestígio dado ao subcampo de estudo está relacionado ao perfil acadêmico do organizador do dossiê, uma vez que pode indicar que pesquisadores qualificados têm reconhecido a necessidade de abertura de espaços à temática “ensino de Sociologia” ou temas diretamente relacionados.
A avaliação Qualis-Periódicos é uma classificação realizada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (CAPES), fundação vinculada ao Ministério da Educação (MEC). Embora a avaliação tenha por objetivo classificar a produção científica dos programas de pós-graduações, apresenta certo indicativo da qualidade das revistas acadêmicas. Tal classificação dar-se anualmente, sendo os periódicos “enquadrados em estratos indicativos da qualidade - A1, o mais elevado; A2; B1; B2; B3; B4; B5; C - com peso zero” (CAPES, 2014)4. Identificar o estrato do periódico no ano de publicação do dossiê nos proporcionará indicativo para a compreensão do prestígio que ocupa a temática na produção científica nacional via periódico. Infelizmente em 2009 a CAPES reestruturou a avaliação, mudando os critérios e atualmente o acesso a elas só é possível a partir de 2010. Desta forma, para os dossiês publicados antes de 2010 estaremos utilizando a nota aferida naquele ano, 2010. Quando aos dossiês publicados em 2016 e 2017 consideramos a última avaliação realizada, em 2015. O objetivo foi aproximar ao máximo estrato aferido aos periódicos ao ano de publicação dos dossiês.
Ao voltarmos nossa atenção aos organizadores e aos autores dos artigos constituintes dos dossiês sobre ensino de Sociologia, buscamos averiguar quatro elementos: (i) titulação; (ii) vinculação institucional; (iii) proximidade com o Ensino Médio e; (iv) sexo. A observação da titulação do autor, sua vinculação institucional e o sexo nos parece ser um meio de observarmos se tal temática é tida como secundária ou periférica, como destacaram algumas pesquisas em torno da constituição desse subcampo. A vinculação institucional também nos permitirá termos um indicativo importante da distribuição geográfica dos pesquisadores brasileiros que se dedicam ou se dedicaram à pesquisa em torno do ensino de Sociologia. A proximidade com o ensino básico pode ser um indicativo de que a experiência profissional teria exercido influência na escolha da temática de pesquisa.
Por fim, nos voltamos para os artigos com o objetivo de identificar quais são as principais temáticas abordadas. O processo de identificação deu-se pela averiguação do objetivo central/geral do artigo. Agrupamos os artigos em sete focos5. São eles: (i) a prática docente; (ii) a história e o/do processo de institucionalização da Sociologia escolar; (iii) os livros didáticos e manuais; (iv) as condições do trabalho docente do professor de Sociologia; (v) o currículo de Sociologia; (vi) a percepção da prática docente em Sociologia pelo professor e alunos e; (v) formação docente.
O recorte temporal da pesquisa vai de 2007 ao fim do primeiro semestre de 2017. O uso do ano de 2007 dar-se por ter sido o ano de publicação dos dois primeiros dossiês sobre o ensino de Sociologia. Assim, por desconhecermos dossiês sobre esse tema anterior a essa data, optamos por avaliar o período que abarca todos os dossiês sobre o Ensino de sociologia já publicados no Brasil.
Uma “radiografia” dos dossiês sobre “ensino de Sociologia” (2007-2017)
Como bem destacou Barbalho (2005), apenas publicar não é suficiente, é sine qua non que a pesquisa publicada seja acessada, lida e avaliada, sobretudo por seus pares. Nesse sentido, observar o estrato de classificação das revistas que veicularam os dossiês nos parece ser um indicativo importante para checarmos, ainda que sem muita precisão, se os mesmos são lidos e avaliados por outros pesquisadores e estudantes em geral6. Partimos do pressuposto de que revistas bem avaliadas, nos mais altos estratos, são mais lidas do que periódicos mal classificados, de “baixo estrato”. Ainda que seja possível realizarmos diversas críticas ao sistema de avaliação Qualis-Periódicos, esta é a única avaliação sistemática dos periódicos acadêmicos brasileiros, na qual considera alguns elementos para a classificação, tais como o Fator de Impacto na área, o número de indexadores, a regularidade do periódico etc.
A partir do levantamento realizado, identificamos que os primeiros dossiês foram lançados em 2007, nas revistas Mediações (UEL) e Cronos (UFRN). De 2007 até abril de 2017 haviam sido lançados vinte e cinco (25) dossiês, como demonstra a Tabela 1.

Table 1. Published dossiers, journals and their organizers (2007-2017).
Nota: *A revista Perspectiva Sociológica publicou originalmente um (01) dossiê de ensino de Sociologia em 2016, porém devido aos atrasos nas edições anteriores (2015 e 2016), optaram em dividir esse dossiê em quatro edições, contendo cerca de três artigos em cada uma delas. Assim, originou-se os dossiês “Ensino de Sociologia e currículo” (2015), “Caminhos do Ensino de Sociologia” (2015), “Ensino de Sociologia Decolonial” (2016) e “Ensino de Sociologia: instrumentos e práticas” (2016). Consideramos em nossa análise o formato original de publicação, como identificamos no momento da coleta de dados, no mês de abril de 2017. Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.Os periódicos
A Tabela 1 nos traz elementos importantes para nossos propósitos, nos indicando cada um dos periódicos, os títulos dos dossiês e os seus respectivos organizadores. Notamos que a revista Inter-legere foi a que mais destinou edições à dossiês sobre o ensino de Sociologia, três ao total (2011, 2013 e 2016), seguida dos periódicos Revista Café com Sociologia (2014 e 2015) e Revista Urutaguá (2011 e 2017), que publicaram dois dossiês cada. A revista Em Debate ao abrir chamada para o dossiê “Ensino de Ciências Sociais” acabou publicando-o em duas partes (dois volumes) por conta do número de artigos recebidos e aprovados que tratavam do ensino de Sociologia. Ao todo, a temática ensino de Sociologia envolveu, em dez anos, dezenove (19) revistas7, sendo 24 dossiês com 199 artigos8.
Esses dados evidenciam um recente e rápido crescimento de espaço dado à temática ensino de Sociologia. O ano de 2007 foi palco das primeiras aparições da temática como dossiê em periódico acadêmico; possivelmente por conta das disputas - efervescente naquele período - em torno da inclusão da Sociologia como componente curricular obrigatório no Ensino Médio, litígio destacado por diversos autores (Moraes, 2011; Silva, 2010; Feijó, 2012; Oliveira, 2013). Com exceção do ano de 2010, dossiês foram publicados em todos os anos, com destaque para os anos de 2014 e 2015, quando foram lançados 6 e 5 dossiês, respectivamente. Esses dados revelam que: (i) pesquisadores da temática tiveram espaços privilegiados para publicar suas pesquisas e; (ii) os editores das 19 revistas julgaram ser a temática importante.
A Tabela 2 nos traz outras informações que também corroboram na compreensão da configuração da temática no interior da comunidade acadêmica.

Table 2.Journals that published dossiers on the teaching of Sociology (2007-2017), their Qualis-Periódicos/CAPES standing in the year of publication, and ties with post graduate Masters or Doctorate programs.
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.É sabido que não adianta, no meio acadêmico, apenas existir espaços de divulgação das pesquisas realizadas. É necessário que tais espaços sejam (re)conhecidos pela comunidade acadêmica. Tal reconhecimento é, em certa medida, representada pela avaliação Qualis-Periódicos. Por esse motivo, buscamos averiguar se os dossiês foram publicados em revistas reconhecidamente bem-conceituadas no campo da Sociologia, ou seja, em estratos superiores (A1, A2, B1) nessa área.
Nota-se, a partir da Tabela 2, que o estrato de classificação Qualis-Periódicos das revistas que publicaram dossiês são variados. Dos vinte e quatro dossiês, cinco (5) foram publicados em revistas classificadas, no ano da publicação, no estrato superior (de A1 a B1). Apenas dois (2) dossiês foram publicados em periódicos que, na época, haviam recebido a classificação C e duas (2) sem avaliação9. Onze (11) dossiês foram publicados em periódicos B5, dois (2) em B4, um (1) em B3 e um (01) em periódico B2. Esses dados mostram que periódicos tidos como qualificados abriram espaços à temática ensino de Sociologia. Destacamos o dossiê presente nas revistas da Associação Brasileira de Sociologia (SBS): Revista Brasileira de Sociologia (2014), na revista Educação e Realidade (2014) e Ciências Sociais Unisinos (2015). Contudo, nos chamou atenção a ausência de periódicos de algumas universidades importantes, tais como a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade de Brasília (UnB), entre outras.
Observando a Tabela 3, identificamos que a maioria dos dossiês, onze (11) no total, foram publicados em periódicos vinculados a universidades federais; nove (09) dossiês foram publicados em revista vinculadas a universidades estaduais; uma (01) à fundação pública e; uma (01) à escola de ensino básico federal; um (01) a associação; dois (02) a revista independente e; dois (01) a instituições privadas de ensino. Esses dados tornam evidente o papel das instituições públicas na promoção do subcampo “ensino de Sociologia”. Papel semelhante identificou Oliveira (2015) quanto a formação de professores de Sociologia.

Table 3. Academic degree of the organizers at the date of publication of each of the dossiers (Jan. 2007-Jul. 2017).
Nota: Alguns dos organizadores estiveram na organização de mais de um dossiê, número indicado entre parênteses após indicação de seus nomes. Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos e na plataforma Lattes.Ainda a partir da Tabela 3, notamos que a promoção da temática via dossiês está geograficamente centrada em duas regiões brasileiras: Nordeste e Sul. No Nordeste foram publicados oito (8) dossiês, no Sul foram nove (10). Embora concentrando maior parte da produção acadêmica brasileira, bem como o maior volume de periódicos existentes, notamos que apenas três (03) dossiês foram publicados a partir da Região Sudeste. A partir da região Centro-Oeste apenas um (01) foi publicado10. Na Região Norte não temos notícias de publicação de dossiê sobre ensino de Sociologia ou temática diretamente correlacionada.
A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a Universidade Estadual de Maringá (UEM) e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foram as universidades que mais publicam dossiês sobre o ensino de Sociologia. A primeira com quatro (04) publicações e as demais com três (03). A Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos) foi a única instituição privada a abrir espaço, por meio de uma de suas revistas, à publicação de dossiê sobre o ensino de Sociologia.
Buscamos observar também o vínculo dos periódicos - que publicaram dossiês relacionados à temática “ensino de Sociologia” - aos programas de pós-graduação stricto sensu. Diferentemente do que vem sendo observado em relação a teses e dissertações, as revistas não estavam vinculadas, em sua maioria, aos Programas de Educação (apenas 3), mas de Ciências Sociais (07). Doze (12) periódicos não estão vinculados aos programas de pós-graduação stricto sensu. Se considerarmos programas que embora não tenham a nomenclatura “Ciências Sociais”, mas que se enquadram nessa grande área (Sociologia, Ciência Política e Antropologia), vamos notar que nove (09) dossiês publicados estão vinculados a revistas de programas dessa área. Notamos ainda que os três primeiros dossiês foram publicados em revistas vinculadas a dois programas de pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCS-UEL e PPGCS-UFRN), o que pode ter corroborado para fomentar futuras pesquisas e organizações de dossiês. Como destacado, os dados evidenciam um recente e rápido crescimento de espaço dado à temática ensino de Sociologia.
Os organizadores
Observando os organizadores, notamos que há uma diversidade de pesquisadores, uma vez que os vinte e quatro dossiês envolveram vinte e sete (27) organizadores11. Quatro dossiês não indicam os organizadores, tendo sido, possivelmente, uma organização coletiva do corpo editorial. Notamos que dos 27 organizadores, doze (12) eram do sexo feminino e quinze (15) do sexo masculino, diferença não substantiva.
Observando a titulação dos organizadores vamos notar que a grande maioria possuía título de doutor na data de publicação do dossiê, o que evidencia que a temática ensino de Sociologia alcançou prestígio entre pesquisadores qualificados.
Buscamos observar a relação entre os organizadores com a Sociologia do Ensino Básico. Para isso observamos o currículo lattes de cada um deles buscando averiguar quais atuaram em algum momento no Ensino Básico. A Tabela 4 apresenta a formação inicial dos organizadores, destacando a experiência com o Ensino Básico.

Table 4. Background and experience in Primary Education of the organizers of the dossiers published between January 2011 and July 2017.
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.Nos chama atenção o fato de que a maioria dos organizadores serem licenciados em Ciências Sociais (65,5%) e desses 63,1% terem tido alguma experiência como docente no Ensino Básico. Dentre os organizadores apenas dois eram bacharéis em Ciências Sociais confirmando o que, ainda no ano de 2007, Moraes (2007) destacava: a urgência em reduzir o distanciamento dos bacharéis em relação à temática ensino de Sociologia escolar. De lá para cá, tivemos espaços abertos em diversos periódicos por meio de dossiês, porém, ao menos, no que diz respeito a organização desse formato de publicação, o distanciamento continua latente.
Os dados apresentados na Tabela 3 demonstram que as condições objetivas são fatores importantes nas escolhas dos temas de pesquisa, bem como aponta, em carta medida, que os envolvidos no interior do subcampo de pesquisa de ensino de Sociologia estão próximos da realidade da prática docente cotidiana. Se por um lado uma produção “politicamente engajada” e “umbilicalmente ligada” pode dificultar a objetividade das análises, por outro possibilita tocar em questões reais, urgentes e importantes.
Os autores
Buscamos averiguar se a ampliação do espaço dado a temática foi acompanhado por um envolvimento significativo de autores/pesquisadores. A Tabela 5 apresenta o quantitativo dos autores que tiveram artigos em cada um dos dossiês.

Table 5. Total number of participating authors of dossiers by academic degree and sex.
Notas: (i) não são autores únicos, ou seja, um autor pode ter publicado mais de um artigo, sendo aqui contabilizado por mais de uma vez; (ii) ao todo foram 287 autores envolvidos, 4 deles não encontramos registros de seu currículo lattes e; (iii) se consideramos apenas uma vez os autores que publicaram mais de um artigo, teremos 197 autores. Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.Observando a Tabela 5 temos uma ideia geral da mobilização de autores provocadas pelos dossiês publicados. Ao todo, os dossiês envolveram 197 pesquisadores, sendo que 48 pesquisadores publicaram mais de um artigo no conjunto dos dossiês analisados, totalizando 283 autorias; destas, a maioria eram doutores (55,8%) na data de publicação do dossiê. Observamos que 28,9% eram mestres e 15,2% eram graduados.
Observando o sexo dos autores identificamos que 50,5% deles são do sexo feminino e 49,5% do sexo masculino. A fim de observar se houve mudanças na participação de autores, segundo o sexo, observamos em separado os cinco primeiros anos e os cinco últimos. Desconsideramos aqui o ano de 2017 por está incompleto, tendo a coleta ocorrido apenas até o mês de junho.
Na comparação dos cinco primeiros anos de publicações de dossiês e os cinco anos posteriores torna-se evidente as seguintes questões: (i) uma ampliação significativa de dossiês no segundo período (2012-2016) quando comparado ao primeiro (2007-2011); (ii) ampliação, em números absolutos, de autores com título de doutor; (iii) incremento na participação de mestres, graduados e graduandos no segundo intervalo temporal analisado, passando de 33,3% para 46,2% e; (iv) nos primeiros cinco anos, 66,6% dos autores eram do sexo feminino, contra 47,7% no segundo período. A mudança da composição de autores acompanha a mudança identificada por Bodart e Silva (2016) na participação de professores dos sexos feminino e masculino nos últimos anos, tendendo a um maior equilíbrio.
É comum pesquisadores se dedicarem a temas de pesquisa presentes em seu cotidiano ou que, em algum momento, tenham tido contato com eles. Buscamos observar se os autores dos artigos já haviam, até a data da publicação, atuado como professores do Ensino Básico. Os dados são apresentados no Gráfico 1.

Graphic 1. Authors of articles published in the dossiers (2007- 2017) by experience in Primary Education as a teacher.
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.Nota-se que a maioria dos autores (63%) ou eram, ou havia sido, professores do Ensino Básico quando da publicação de seu artigo em um dos dossiês. Apenas 31% deles nunca haviam atuado como docente nesse nível de ensino. Esses dados indicam que a experiência docente pode ter sido um elemento sensibilizador para se dedicarem a temática ensino de Sociologia, sobretudo na participação dos primeiros dossiês, período de forte militância em prol da obrigatoriedade da Sociologia no currículo nacional. Podemos aferir que o contato com esse nível de ensino é característica predominante dentre os autores. Se por um lado, a aproximação com o objeto de pesquisa, pode afetar negativamente o rigor científico, podendo conduzir a produção à um discurso mais militante e menos que analítico, por outro, possibilita uma maior compreensão do objeto de estudo.
Quanto a regionalização das publicações, buscamos identificar quais eram as vinculações institucionais dos autores quando publicaram seus artigos. A Tabela 7 apresenta as instituições mais presentes nos dossiês por meio de pesquisadores vinculados à instituição (como alunos ou/e professores).

Table 6. Total number of participating authors, by period, of the dossiers by academic degree and sex (2007-2017).
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.

Table 7. Teaching and research institutions present with 6 or more articles, via authors linked to their professors/researchers/ students at the time of publication of the article (2007-2017).
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.Notamos, por meio da Tabela 6, a grande presença da Colégio Pedro II, com 25 autores. Esse fato se explica por ter o referido Colégio lançado, em 2016, a primeira edição de uma revista com 17 artigos compondo um dossiê sobre o ensino de Sociologia. Neste, observamos a participação de 19 autores de seu quadro funcional. O destaque institucional, em se tratando da temática ensino de Sociologia, recai, então, sobre a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (21) e a Universidade de Santa Catarina (21).
O papel da universidade pública na produção de pesquisas no Brasil é latente; em se tratando da constituição do subcampo de pesquisa “ensino de Sociologia” a situação se repete. Das 17 instituições de ensino e pesquisa mais representadas por autores nos dossiês, todas são públicas. Nota-se, ainda que sete (7) estão localizadas no Sudeste, seis (5) no Sul e quatro (4) no Nordeste e uma (1) no Centro-Oeste.
Observando a totalidade das universidades representadas nos dossiês por meio de publicação de alunos e/ou professores, identificamos o quantitativo de 64 instituições de ensino e pesquisa. A Tabela 8 destaca a distribuição desse quantitativo por região brasileira comparando com o percentual de universidades públicas federais e estaduais em cada uma das regiões.

Table 8. Representation of universities by authors of articles published in dossiers (2007-2017) by Brazilian region.
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.A Tabela 8 nos possibilita realizar duas análises: uma com números absolutos e outra considerando a proporção de universidades públicas12 de cada região em relação a totalidade existente no Brasil. Em termos absolutos, a Região Sudeste é a que mais teve instituições representadas nos dossiês por meio de seus pesquisadores e/ou alunos (36,2%), sendo seguida, respectivamente, pela Região Nordeste (31,3%) e Sul (25,1%). Levando em consideração a proporção de universidade públicas existentes nas regiões brasileiras, observamos que a participação do Sudeste foi de maior peso, uma vez que suas universidades representam 32,1% das universidades públicas brasileiras e a presença de suas instituições nos dossiês representaram 36,2%, uma diferença positiva de 4,1%. Seguido do Sudeste vem a Região Nordeste, com uma diferença positiva de 3,8% e o Sul, com 3,1%.
Os artigos
Ao realizar o levantamento do número de dossiês e de artigos contidos nestes, observamos uma significativa oscilação na evolução de dossiês e, consequentemente, de artigos publicados. Percebemos que no período que antecede a aprovação da legislação que tornaria a Sociologia obrigatória no currículo do Ensino Médio houve o lançamento de dois dossiês compostos por 24 artigos. Entre 2008 e 2010 não há dossiês organizados sobre o ensino de Sociologia, sendo lançado em 2011 três dossiês e em 2012 apenas um. A partir de 2013 observamos um quantitativo significativo de dossiês e artigos publicados. Algumas hipóteses podem ser levantadas: (i) a produção dos dossiês em 2007 teriam sido uma das estratégias adotadas para chamar atenção para a importância da disciplina no Ensino Médio; (ii) O maior interesse do ensino de Sociologia como objeto de estudo teria sido ampliado após aprovada a lei que a tornou obrigatória no Ensino Médio e; entre 2008 e 2010 após conquistada a demanda de tornar obrigatória essa disciplina teria ocorrido uma temporária acomodação daqueles que antes se organizavam em luta em prol da Sociologia no campo acadêmico e; (iii) com a presença da disciplina nas escolas, a necessidade de pensar o tema ensino de Sociologia se torna ainda mais latente, o que teria fomentado a ampliação do número de dossiês e de artigos publicados entre 2013 e 2016. Longe de trazer respostas a todas essas questões expostas, o presente artigo suscita questionamentos que podem contribuir como combustível para outras pesquisas.
Buscamos observar a distribuição de artigos por região, já que há instituições representadas por seus pesquisadores e alunos mais de uma vez nos dossiês. O Gráfico 3 traz um demonstrativo dos dados.

Graphic 2. Evolution of the number of dossiers and articles (2007-2017).
Nota: Não incluímos os dossiês publicados em 2017 por conta da coleta dos dados não ter abarcado todo o ano.Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.

Graphic 3. Percentage of articles published in dossiers (2007- 2017) by Brazilian region.
Fonte: Elaboração própria com base nos sites dos periódicos.É notório o volume de artigos cujos autores estavam, na época da publicação de seus artigos, vinculados a instituições de ensino e pesquisa na Região Sudeste (41%). Infelizmente por dificuldades operacionais e de acesso à informação não nos foi possível relativizar esse percentual considerando a proporção de pesquisas publicadas, no geral, em cada região brasileira. Contudo é sabido que o Sudeste concentra o maior volume de produção acadêmica do país, o que faz com que esses dados não represente uma surpresa. Nos chamou a atenção a ausência de autores da Região Norte no conjunto dos dossiês analisados e a expressividade do percentual da Região Sul (34%).
No Quadro 1 apresentamos o número de artigos distribuídos por temas, o que corrobora para: (i) identificar os temas mais e menos abordados; (ii) se houve mudança significativa de tema de interesse no transcorrer desses dez anos (2007-2017).

Chart 1. Distribution of articles published in dossiers by theme (2007-2017).
Nota: (*) Foram identificados 16 temas no interior dos dossiês não relacionados ao ensino de Sociologia. Fonte: Elaboração própria.Havíamos indicado a hipótese de que o ano de 2007 teria sido palco das primeiras aparições da temática como dossiê em periódico acadêmico por conta das disputas legalistas em torno da obrigatoriedade da Sociologia como componente curricular do Ensino Médio daquele período. Observando os temas dos artigos dos dois primeiros dossiês, do ano de 2007, notaremos que, dentre os 20 trabalhos sobre o ensino de Sociologia, predominou artigos (7) que tratavam sobre a história e a institucionalização da Sociologia; o que fortalece nossa hipótese de que a luta pela obrigatoriedade da Sociologia teria influenciado a produção os dois primeiros dossiês lançados um ano antes da Sociologia tornar-se obrigatória no Ensino Médio brasileiro. A centralidade da preocupação com institucionalização da Sociologia escolar se estendeu por todo o período. Contudo, se dividirmos o período analisado em duas partes (2007-2011 e 2012 a 2017) vamos notar que no primeiro período a temática “História e a Institucionalização da Sociologia escolar” representou 34,2% dos artigos publicados nos dossiês. Todos os dossiês desse primeiro período tiveram, ao menos, um artigo tratando da institucionalização da Sociologia escolar. Já no segundo período, essa representação reduz para 22,4% dos artigos contidos nos dossiês.
No primeiro período (2007-2011) notamos que apenas um artigo discute a temática “livros didáticos e manuais de Sociologia” e apenas dois a “prática docente”. As temáticas “condições docentes” e o “currículo” representam respectivamente 8,5% dos artigos. Além da temática “História e a Institucionalização da Sociologia escolar” observamos uma presença do tema “percepção da prática docente ou da sociologia” significativa (22,8%), sendo artigos que buscavam identificar e discutir como o professor e/ou os alunos enxergavam o ensino dessa disciplina. Fica claro, nesse primeiro período, que havia preocupação latente: legitimar a importância do ensino da Sociologia escolar. Preocupação que já estava presente no período anterior (Moraes, 2003; Florêncio, 2007; Azevedo e Nascimento, 2015).
Entre 2012 e 2017 notamos uma maior diversificação dos temas presentes nos dossiês. Justamente com o tema “institucionalização da Sociologia escolar” (22,1%), observamos uma significativa presença das temáticas “formação docente” (20%), “prática docente” (18%) e “percepção da prática docente e discente em relação ao ensino de Sociologia” (18%). Nota-se que os temas giram em torno de uma questão: como ensinar. Se antes a preocupação era quase que exclusivamente em garantir a presença da Sociologia no Ensino Médio, no segundo momento as preocupações se ampliam, girando em torno de como se daria o ensino de Sociologia. Se até 2012 apenas um artigo havia tomado o livro didático como objeto de análise, após essa data foram publicados 11 artigos no interior dos dossiês. Essa mudança pode ser explicada pela inclusão da Sociologia no Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), em 2012.
Observando todo o período (2007-2017) nota-se que as três maiores preocupações presentes nos artigos são “a institucionalização da Sociologia escolar”, “a formação de professores de Sociologia”, a “percepção do ensino de Sociologia” e a “forma como o ensino dessa disciplina vem sendo percebida por professores e alunos”. É certo que a inclusão da Sociologia no Ensino Médio demandou uma ampliação na formação de professores, situação destacada por Oliveira (2015), o que justifica a atenção a essa questão. É natural que após a implantação da Sociologia no Ensino Médio houvesse a preocupação em avaliar a percepção dos professores e alunos quanto a sua qualidade, importância e dificuldades e acreditamos que, por isso, identificamos uma significativa presença dessa temática no conjunto dos dossiês, sobretudo nos últimos seis anos.
Considerações finais
A questão central do presente artigo foi realizar uma “radiografia” dos dossiês relacionadas à temática “ensino de sociologia” (2007-2017), buscando centra-se nas revistas, nos autores e nos artigos. A proposta estava em colaborar na compreensão do estágio de construção do campo. Os dados aqui apresentados evidenciam um recente e rápido crescimento de espaço dado à temática ensino de Sociologia, sendo muitos desses espaços reconhecidos no seio da comunidade acadêmica. Aqui nos referimos às revistas com boas classificações na avaliação Qualis-Periódicos e a universidades com prestígio.
Observamos a importância da universidade pública para a produção de pesquisas sobre o ensino de Sociologia, uma vez que apenas uma instituição privada abriu espaço para publicação de um dossiê.
As duas regiões brasileiras que mais publicaram dossiês foram a Região Sudeste e Nordeste, respectivamente. No Norte não encontramos dossiês publicados e nem autores vinculados às instituições dessa região. Do Sudeste veio maior número de artigos publicados nos dossiês. Se considerarmos a proporcionalidade do número de instituições de universidades públicas, o Sudeste e o Nordeste, respectivamente, apresentam maior participação nos dossiês.
Observamos uma tendência de mudança na composição dos autores quanto ao sexo. Enquanto que nos primeiros cinco anos, 66,6% dos autores eram do sexo feminino, no período posterior esse percentual reduziu para 47,7%. Em relação aos autores dos artigos, 63% ou eram, ou havia sido, professores do Ensino Básico quando foi publicado o seu artigo em um dos dossiês. Os dois dados evidenciam a forte relação entre docência no Ensino Básico e interesse pela temática ensino de Sociologia.
Passados 10 anos da afirmativa de Takagi e Moraes (2007) quanto ao histórico distanciamento dos bacharéis em relação à temática ensino de Sociologia escolar, observamos que, ao menos, no que diz respeito a organização desse formato de publicação, o distanciamento persiste. A temática tem sido preocupação, prioritariamente, de licenciados e pesquisadores que tiveram a experiência de lecionar no Ensino Básico.
Observamos uma mudança na preocupação presente nos artigos. Nos primeiros anos centrava-se quase que exclusivamente em abordar a institucionalização da Sociologia escolar, enfatizando a importância de sua presença no Ensino Médio; num segundo momento as preocupações se ampliam, girando em torno de como se daria o ensino de Sociologia. Em outros termos: se antes a preocupação era “justificar a permanência da Sociologia no Ensino Médio”, nos últimos anos passou a ser discutir “como está sendo ou deve ser o ensino de Sociologia”. Com a recente reforma do Ensino Médio, pode ser que as preocupações daquele período ressurjam com certa força, o que nos parece ser legítimo e necessário.
Observamos que são poucos os trabalhos presentes nos dossiês que se dedicaram a pensar as condições do trabalho docente do professor de Sociologia. Tal temática é de grande importância para o conhecimento de situações que possam estar prejudicando a prática de ensino e a qualidade de vida do professor. Notamos que apenas nos últimos cinco anos há uma ampliação no número de artigos que se dedicaram a discutir e problematizar os livros didáticos e os manuais. Tornar os livros didáticos de Sociologia objetos de estudos é fundamental por ser, muitas vezes, estes o único material didático acessível ao professor e ao aluno.
Observar os dossiês publicados entre janeiro de 2017 e abril de 2017 corroborou para confirmar algumas impressões destacadas por outros autores, tais como o fortalecimento do campo e a importância da universidade pública nesse processo, a diversificação de temáticas exploradas, a mudança no perfil dos pesquisadores, que deixam de ser prioritariamente do sexo feminino. Identificamos ainda que Nordeste e Sul vêm desempenhando uma participação importante nesse subcampo de pesquisa e que os pesquisadores que se dedicaram a organizar dossiês são predominantemente dessas duas regiões, sendo doutores e licenciados em Ciências Sociais, tendo já atuado no Ensino Básico como professor. Nos chamou a atenção a ampliação recente de não doutores demarcando presença nesse subcampo por meio de publicações, indicando que o volume de pesquisas e de pesquisadores da temática ensino de Sociologia está em continua expansão, o que corrobora para a consolidação desse subcampo de pesquisa e, consequentemente, para o aprimoramento do ensino de Sociologia no Ensino Básico.
Referências
ALVES, E.M.S.; COSTA, P.R.S.M. 2006. Aspectos históricos da cadeira de sociologia nos estudos secundários (1892-1925). Revista Brasileira de História da Educação, 6(12):31-52. Disponível em: http://rbhe.sbhe.org.br/index.php/rbhe/article/viewFile/149/158. Acesso em: 10/04/2017.
AZEVEDO, G.C. de; NASCIMENTO, T.B.V. do. 2015. O discurso de apoio à Sociologia no Ensino Médio nos anos 30/40 e nos anos 90/00: apontamentos sobre os dois períodos. Revista Café com Sociologia, 4(3):8-20. Disponível em: http://revistacafecomsociologia.com/revista/index.php/revista/article/view/529/pdf. Acesso em: 20/06/2017.
BARBALHO, C.R.S. 2005. Periódico científico: parâmetros para avaliação de qualidade. In: S.M.S.P. FERREIRA; M. das G. TARGINO (orgs.), Preparação de revistas científicas: teoria e prática. São Paulo, Reichman & Autores Editores, p. 123-158.
BODART, C. das N.; CIGALES, M.P. 2015. Apresentação do dossiê especial História do ensino de Sociologia. Revista Café com Sociologia, 4(3):2-7. Disponível em: http://revistacafecomsociologia.com/revista/index.php/revista/article/view/606. Acesso em: 19/06/2017.
BODART, C. das N.; CIGALES, M.P. 2017. Ensino de Sociologia no Brasil (1993-2015): um estado da arte na pós-graduação. Revista de Ciências Sociais, 42(2):256-281. Disponível em: http://www.periodicos.ufc.br/revcienso/article/view/19500. Acesso em: 29/06/2017.
BODART, C. das N.; SILVA, R.S. 2016. Um “Raio-X” do professor de Sociologia brasileiro: condições e percepções. Estudos de Sociologia, 2(22):197-233. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revsocio/index.php/revista/article/view/591/412. Acesso em: 10/06/2017.
BRASIL. 1961. Lei n. 4.024 de 20 de dezembro de 1961. Estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-4024-20-dezembro1961-353722-publicacaooriginal-1-pl.html. Acesso em: 21/07/2017.
BRASIL. 1971. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5692-11-agosto-1971357752-norma-pl.html. Acesso em: 21/07/2017.
BRASIL. 1982. Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982. Estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-7044-18-outubro1982-357120-publicacaooriginal-1-pl.html. Acesso em: 21/07/2017.
CAPES. 2014. Classificação da produção intelectual. Disponível em: http://www.capes.gov.br/avaliacao/instrumentos-de-apoio/classificacao-da-producao-intelectual. Acesso em: 10/07/2017.
FEIJÓ, F. 2012. Breve histórico do desenvolvimento do ensino de sociologia no Brasil. Percursos, 13(1):133-153. Disponível em: http://www.periodicos.udesc.br/index.php/percursos/article/view/2508/2071. Acesso em: 10/06/2017.
FLORÊNCIO, M.A. de L. 2007. A Sociologia no Ensino Médio: a trajetória histórica no Brasil e em Alagoas. In: A.A. PLANCHEREL; E.A.F. de OLIVEIRA, Leitura sobre Sociologia no Ensino Médio. Maceió, Edufal, p. 63-88.
HANDFAS, A.; MAÇAIRA, J.P. 2015. O Estado da arte da produção científica sobre o ensino de Sociologia na educação básica. In: A. HANDFAS; J.P. MAÇAIRA; A.B. FRAGA (orgs.), Conhecimento escolar e ensino de Sociologia: instituições, práticas e percepções. Rio de Janeiro, 7 Letras, p. 25-48.
MEUCCI, S. 2000. Institucionalização da sociologia no Brasil: os primeiros manuais e cursos. Campinas, SP. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual de Campinas, 157 p.
MORAES, A.C. 2003. Licenciatura em Ciências Sociais e ensino de Sociologia. Tempo Social, 15(1):5-20. https://doi.org/10.1590/S0103-20702003000100001
MORAES, A.C. 2011. Ensino de Sociologia: periodização e campanha pela obrigatoriedade. Cadernos Cedes, 31(85):359-382. https://doi.org/10.1590/S0101-32622011000300004
NEUHOLD, R. 2015. A produção científica sobre o ensino de Sociologia: grupos e linhas de pesquisa no Brasil (2000-2003). In: E. OLIVEIRA; A. OLIVEIRA, Ciências Sociais e Educação: um reencontro marcado. Maceió, EDUFAL, p. 103-124.
OLIVEIRA, A. 2015. Cenários, tendências e desafios na formação de professores de Ciências Sociais no Brasil. Política & Sociedade, 14(31):39-62. https://doi.org/10.5007/2175-7984.2015v14n31p39
OLIVEIRA, A. 2013. A formação de professores de Ciências Sociais frente às políticas educacionais. Crítica e Sociedade: revista de cultura política, 3(2):132-152. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/criticasociedade/article/view/23425. Acesso em: 10/04/2017.
SILVA, I.L.F. 2010. O ensino das Ciências Sociais/Sociologia no Brasil: histórico e perspectivas. In: A. MORAES (org.), Sociologia. Brasília, Ministério da educação, Secretaria de Educação Básica, p. 15-44. (Coleção Explorando o Ensino).
TAKAGI, C.T.T; MORAES, A.C. 2007. Um olhar sobre o ensino de Sociologia: Pesquisa e Ensino. Mediações, 12(1): 93-112. https://doi.org/10.5433/2176-6665.2007v12n1p93
Notas