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Afinidade, afetividade, organização: processos de mobilização de black blocs1
Affinity, affection, organization: black blocs’ mobilization processes
Ciências Sociais Unisinos, vol. 55, núm. 1, pp. 12-23, 2019
Universidade do Vale do Rio dos Sinos Centro de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais

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Recepção: 10 Fevereiro 2018

Aprovação: 18 Janeiro 2019

DOI: https://doi.org/10.4013/csu.2019.55.1.02

Resumo: Investigamos neste trabalho os processos de mobilização de black blocs para eventos de protesto, baseados na realização de entrevistas semiestruturadas com militantes e observação participante. Para isso, em primeiro lugar, localizamos os black blocs no campo do autonomismo, chamando atenção para a pluralidade identitária e cultural autonomista. Em segundo lugar, mapeamos as análises sobre processos de mobilização de black blocs, no Brasil e no exterior. Por fim, analisamos o conteúdo de nossas entrevistas, amparando-nos, por um lado, na literatura especializada e, por outro, nos temas emergentes das narrativas dos entrevistados e na experiência etnográfica. Nossos resultados convergem para a criação de três tipos inter-relacionados de mobilização de black blocs, orientados (a) pela articulação de grupos de afinidade; (b) pela organização prévia e sistemática de blocos; e (c) pela formação espontânea de blocos a partir do compartilhamento de estados afetivos e da interação em redes sociais digitais.

Palavras-chave: Black blocs, mobilização, organização.

Abstract: On this paper, we investigate black bloc’s mobilization processes for protest events, based on semi-structured interviews and participant observation. In order to do so, firstly we localize black blocs in the field of autonomism, highlighting the autonomist cultural and identity plurality. Secondly, we proceed to map the analysis on black bloc’s mobilization processes in Brazil and abroad. Finally, we take on our interviews’ content analysis, provided with theoretical elements extracted from the expert literature on one hand and, on the other hand, with ethnographical experience. Our results converge into the creation of three interrelated types of black blocs’ mobilization, oriented by (a) the articulation of affinity groups; (b) previous and systematic bloc organization; and (c) the spontaneous bloc formation through the sharing of affective states and interaction on digital social networks.

Key words: Black blocs, mobilization, organization.

Introdução: “primaveras”, autonomismos e o (res)surgimento dos encapuçados

Occupy Wall Street, Argélia e Egito, Espanha e Grécia, Parque Gezy e Brasil: manifestações, levantes e insurreições diferentes têm se tornado, a partir do começo do século XXI, protagonistas da arena midiática, dos espaços públicos, da arena política, em muitos países. É a emergência de um ciclo de protestos, com características peculiares, que parece ainda não estar arrefecendo. Há um número crescente de trabalhos que buscam criar e adaptar categorias analíticas e aportes teóricos de caráter explicativo a fim de apreender singularidades das mobilizações sociais mais recentes. Enquanto novas formas de mobilização, organização e operacionalização da ação coletiva contenciosa no atual contexto de “fragmentação e individualização das sociedades contemporâneas” (Bennett e Segerberg, 2012, p. 743), têm sido abordadas (Gerbaudo, 2017), condicionantes sociotécnicos da ação coletiva consolidam-se como um campo de pesquisa fecundo (Castells, 2012) e novos agentes, identidades e agendas políticas são identificados e analisados (Gohn, 2018; Graeber, 2015; Ross, 2017).

Nesse amplo contexto de mobilizações contemporâneas insere-se o caso brasileiro das chamadas “jornadas de junho”, a onda de protestos iniciada em 2013 e que, aparentemente, encontrou ressonâncias nos atos públicos e manifestações logradas ao longo dos anos de 2014, 2015 e 2016, até a eventual deposição da presidenta Dilma Rousseff (Bringel e Pleyers, 2015). Os desafios interpretativos colocados por essas movimentações suscitaram a investigação sistemática dos eventos de protesto a partir de abordagens distintas, com muitos estudos focados nos de junho de 2013 (por exemplo, Antunes e Braga, 2014; Ricci e Arley, 2014; Solano et al., 2014; Gohn, 2017), que apontam, entre outros aspectos, a a relevância crescente de grupos e posições de cunho autonomista.

Conforme a literatura especializada, essa ampla categoria denominada “autonomista” engloba um conjunto variado de práticas e relações animadas, via de regra, pelo anarquismo e por vertentes heterodoxas do marxismo, que visam a superação da configuração política e econômica vigente mediante ação direta descentralizada. Algumas de suas expressões mais conhecidas são a Autonomia Operaia italiana, nos anos 1970, os Autonomen europeus, nos anos 1980 e 1990, a insurgência zapatista no México, a Ação Global dos Povos e o que ficou conhecido como “movimento antiglobalização”, na virada do século XX para o XXI. No Brasil, recentemente, têm sido destacados tanto na mídia quanto em meio acadêmico, o Movimento Passe Livre (MPL) e a atuação de black blocs. Para além disso, poderíamos, ainda, chamar atenção para o espraiamento da Coordenação Anarquista Brasileira e das organizações e movimentos sociais a ela ligados, dos coletivos feministas, bem como a intensificação de ocupações urbanas e coletivos a elas associados, a exemplo das escolas e universidades em 2016. Todavia, não obstante a crescente relevância da ação política direta, do ativismo e militância autonomista em contexto nacional e estrangeiro, os estudos nesse campo permanecem exíguos. Num exercício de bibliometria recente, por exemplo, Francisco Tavares e Ian Oliveira (2016) observaram que as investigações em ativismo têm sido negligenciadas pela Ciência Política no Brasil, representando menos de 3% das publicações em periódicos qualificados. A literatura especializada em ativismo e militância de caráter autonomista e anticapitalista mostra-se ainda mais escassa. Nessa esteira, a fim de apreender os sentidos atribuídos a uma parcela das práticas autonomistas no Brasil, voltamos nossa atenção para as manifestações de black blocs em Belo Horizonte, Minas Gerais. Colocamo-nos duas perguntas: por meio de quais processos constituíram-se black blocs na capital mineira, segundo a percepção de alguns de seus participantes? Qual o sentido da ação direta levada a cabo por black blocs, na visão de alguns de seus militantes?

Para responder às nossas perguntas, recorremos à realização de entrevistas semiestruturadas com participantes de black blocs em Belo Horizonte nos anos de 2013 e 2014 e à observação participante em protestos, assembleias, reuniões e outros eventos organizados por ativistas. Nossos resultados apontam para a existência de uma variedade de formas de mobilização e organização de black blocs, atravessados por conflitos de classe e gênero, bem como para uma pluralidade de sentidos associados à chamada “tática”, que, em alguns casos, pode ser caracterizada por matizes revolucionários.

O texto está organizado da seguinte maneira: na primeira seção, apresentamos o que vêm a ser black blocs, onde estão localizados no espectro autonomista e algumas de suas peculiaridades, especialmente no Brasil. Na segunda seção, expomos nosso trabalho empírico e os procedimentos metodológicos adotados. Por fim, desenvolvemos uma discussão acerca dos resultados obtidos.

Autonomismo e black blocs: localizações necessárias

Se há consenso em torno da ideia de que black blocs consistem numa manifestação da política de caráter autonomista, não parece haver muita clareza, pelo menos em parte de trabalhos dedicados à investigação de black blocs e do autonomismo em geral, sobre o sentido desses conceitos e as práticas que eles traduzem. Grande parte das análises referentes a movimentos autonomistas remetem-se a maio de 1968 e os esforços conscientes de grupos para reconfigurar relações entre vida cotidiana, subjetividade e anticapitalismo (Kellner, 2001; Katsiaficas, 2006; Steen et al., 2014). Com efeito, é na esteira de maio de 1968 e de profundas mudanças nas relações entre trabalho e capital que surgem na Itália novos movimentos de intelectuais e trabalhadores críticos ao marxismo ortodoxo: partindo de figuras como Raniero Panzieri e Antonio Negri, entre outros, o operaismo tinha como foco a experiência do trabalhador em “fábricas de verdade” e denunciava programas políticos que tomavam por base análises demasiadamente abstratas do capitalismo (Gautney, 2009). Nas palavras de Giuseppe Cocco (2001), na concepção da escola operaista, “[...] a classe operária existe porque luta, se forma nos concretos acontecimentos nos quais ela se nega como força de trabalho e afirma sua autonomia” (p. 17). Em outras palavras,

[...] A problemática militante era completamente revertida. A urgência não era mais a de submeter as novas figuras operárias às diretivas político-sindicais para conscientiza-las. Muito pelo contrário, tratava-se de subordinar os dispositivos político-sindicais às novas configurações de subjetividade operária. O operariado, suas dimensões técnicas e políticas, era afirmado como o cerne da análise. (Cocco, 2001, p. 17-18).

Esse deslocamento no marxismo - da classe como sujeito revolucionário histórico para o próprio sujeito individual das lutas, independente de organizações políticas -, em conjunção com as lutas de trabalhadores e estudantes que já tomavam forma, foi responsável na década de 1970 pela organização de uma série de protestos, greves, ocupações de fábricas e prédios abandonados (algumas delas articuladas por meio de assembleias autônomas) e “redução autônoma” de preços de produtos e serviços (as pessoas pagavam o que julgavam justo ou podiam), entre outras ações de “desapropriação proletária” (Cocco, 2001, p. 18). O caráter autônomo das reivindicações desembocaria no surgimento de um conjunto de grupos e organizações políticas autoritárias e antiautoritárias, dentre as quais destacam-se a Autonomia Operaia e a Autonomia Creativa. Patrick Cuninghame (2002) sugere que a Autonomia só poderia ser identificada enquanto um movimento na medida em que ela se unia em torno de um princípio teórico e prático: “a autonomia em relação ao Estado, partidos políticos institucionalizados e sindicatos ou qualquer forma de mediação política, social e cultural” (p. 2)4.

Assim como a Autonomia italiana não consistia num partido ou organização única e centralizada, os Autonomen da Alemanha Ocidental foram, notadamente, um movimento abrangente e de identidade ambígua, fortemente ancorado nas lutas por moradia que, no início da década de 1980, atingiu seu ponto alto. E, inspirando-se na Autonomia italiana, os Autonomen se traduziriam em grupos de jovens insatisfeitos com as possibilidades ofertadas pela política institucional (della Porta, 1995; Geronimo, 2012).

As jaquetas pretas de couro vestidas por muitas pessoas em manifestações e as bandeiras negras carregadas por outros sinalizavam menos um anarquismo ideológico do que um estilo de vestuário e comportamento - símbolos de um novo estilo de vida que confrontava instituições estabelecidas e seus “protetores” estadunidenses, e isso era transformado numa virtude, bem como o desdém pelos governos “socialistas” da Europa Oriental. O preto tornara-se a cor de um vácuo político - do afastamento de partidos políticos, governos e nações (Katsiaficas, 2006, p. 90).

Vestidos de preto e em balaclavas, manifestantes Autonomen viriam progressivamente a ser reconhecidos como black blocs em eventos de protesto.

O que constituía um epifenômeno das ações de movimentos sociais autônomos alemães aparece, nos Estados Unidos em meados dos anos 1990, como um repertório de ação em eventos de protesto associado ao anarquismo, mas, ao mesmo tempo, sem laços com movimentos sociais quaisquer. Para Dupuis-Déri (2010), o black bloc foi disseminado enquanto maneira de se comportar num protesto por meio de “uma rede contracultural do movimento punk e da extrema esquerda e seus fanzines, grupos musicais e contatos pessoais entre ativistas em viagem” (p. 52). Para David Van Deusen e Xavier Massot, black blocs norte-americanos devem pagar tributos aos Autonomen alemães. Não obstante, o autor sugere que blocos de ação direta, em muito semelhantes aos que ganharam intensa cobertura midiática na chamada “Batalha de Seattle”, em 1999, existiram sempre que “pessoas constituintes de uma classe ou grupo militante se levantaram contra seus opressores” (2010, p. 10). Van Deusen afirma que as pessoas que decidem participar de black blocs o fazem em grupos de afinidade, não se restringem a classes sociais específicas e são, não obstante, de orientação “socialista”. Os black blocs, assim, antes de táticas ofensivas ou defensivas, seriam formas de ação coletiva possivelmente revolucionárias em si, num contexto em que à luta de classes soma-se a resistência contra a colonização do mundo da vida pelo capital. AK Thompson, por sua vez, argumenta que o movimento autonomista e os black blocs norte-americanos devem ser investigados como “um fenômeno de classe média branca” (2010, p. 15). Partindo de tal ponto, Thompson caracteriza manifestações de black blocs como uma excepcional tentativa de resgate de uma condição de sujeito político ativo, levada a cabo por indivíduos inseridos num estrato social intrinsecamente conservador que, de modo geral, delega suas responsabilidades políticas a outrem ou, no limite, reclama-se “apolítico” em seu confortável consumismo e controle. Um resgate do sujeito político numa incipiente forma “pós-representativa”. Investigando black blocs mexicanos, por outro lado, Carlos Illades identifica dezenas de grupos inspirados pelo socialismo libertário atuando junto a movimentos sociais e comunidades urbanas e rurais, participando efetivamente das chamadas “autodefesas cidadãs”, no interior do México, e, mais recentemente, de black blocs, em contexto urbano. Ao passo que chama atenção para o fato de que os black blocs analisados são compostos por grupos de orientação política variada, Illades argumenta que manifestações autonomistas no século XXI não podem ser interpretadas sem que levemos em conta um processo de expansão global do “neoanarquismo” desde meados da década de 1990, sobretudo na América Latina.

A postura neoanarquista é o questionamento frontal ao modo de ser da sociedade atual, da racionalidade instrumental que funda seu desenvolvimento tecnológico e sua razão cínica, que governa a ética pública. Uma constante condição de desemprego, exclusão, racismo, violência e destruição da natureza alimentam essa perspectiva desencantada em que a detonação de um coquetel molotov representa um ato libertador e o caos - o elemento desruptor da racionalidade dominante [...] (Illades, 2014, p. 430).

Com efeito, é por meio desses dois movimentos, histórico e sociológico, que trabalhos recentes tendem a localizar black blocs no campo mais amplo do autonomismo, associando-os, mais especificamente, à ideia de tática anarquista para autodefesa em eventos de protesto, e à crítica anticapitalista mais ou menos violenta por meio da depredação de determinados estabelecimentos (Juris, 2005; Gordon, 2008; Graeber, 2009; D’Angelo, 2014; Dupuis-Déri, 2014). As maiores referências aqui são, ainda, as manifestações de Seattle, em 1999, e de Gênova, em 2001 - embora as atuações dos blocos no Primeiro de Maio, na França, em 2018, tenham sido surpreendentemente grandes, e black blocs continuem a ocupar as ruas em outros lugares, como no Brasil, por exemplo, na ocasião da reforma trabalhista, em 2017.

De todo modo, observamos que os trabalhos sobre black blocs convergem para três pontos em comum: (1) black blocs emergem do campo autonomista, exprimindo valores e aspirações típicas da articulação de movimentos autônomos europeus; (2) por suas próprias características, black blocs viriam a ser identificados como formas de ação anarquistas em eventos de protesto, sobretudo a partir dos anos 1990; (3) o sentido conferido a black blocs varia em função do sentido atribuído ao anarquismo, em especial, e ao autonomismo, em geral, em contextos sociais diferentes - na Alemanha dos anos 1980, trata-se da dimensão mais militante dos Autonomen que, em si, não é dotada de nenhuma finalidade específica; nos EUA dos anos 1990, da crítica simbólica ao capitalismo e da libertação do sujeito político, sendo, no limite, uma “tática de autodefesa” (Graeber, 2009); no México atual, a reação de grupos oprimidos, mais ou menos organizados, à racionalidade política dominante.

No Brasil, há um conjunto de trabalhos que tende a importar conceitos e experiências de outros contextos sociais a fim de analisar black blocs aqui manifestos. José Zúquete (2014, p. 96-98), por exemplo, após refletir sobre o sistema filosófico que, segundo ele, anima a tática de Berlim a Uberlândia, de Nova York ao Cairo (mas cuja referência “ideológica e militante” é o coletivo anarquista estadunidense CrimethInc), parte para a distinção entre black bloc (entenda-se: o autêntico black bloc) e jovens pobres de periferias e favelas que participaram de quebra-quebras no Brasil. Para Edson Passetti (2013), o black bloc é, diante das formas atuais de nos organizarmos socialmente, de todo insuportável: ontologicamente (uma vez que os blocos são capazes de fagocitar grupos marginalizados e comumente associados ao comportamento desviante), epistemologicamente (rejeitam a identidade e a representação) e, portanto, moral e politicamente (os black blocs mostram-se antiautoritários e anticapitalistas). Outras investigações apostam em um embasamento empírico. Um exemplo notável desses trabalhos é o livro de Esther Solano e colegas (2014). Entrevistando black blocs na cidade de São Paulo, a autora observou que muitos dos jovens que se dispuseram a tomar parte dos blocos eram estudantes, trabalhadores e não necessariamente brancos, membros de coletivos libertários etc. Diego Oliva (2017), também utilizando-se de entrevistas, observação participante nas ruas de Curitiba e em plataformas sociais digitais, traçou um “perfil” de black blocs, expondo o que os militantes com quem teve contato entendem por relações de gênero, suas visões sobre a estética dos blocos, bem como os objetivos que pretendem alcançar em eventos de protesto.

Tudo levado em conta, os trabalhos empiricamente embasados compartilham um terreno comum sobre black blocs, cujas características são sintetizadas por Valerio D'Angelo (2014): (1) trata-se de uma ação coletiva de caráter temporário e cujo sentido está em constante transformação, organizada por meio de “grupos de afinidade” de “amilitantes” independentes e autônomos5. David Graeber (2009) define os grupos de afinidade como a forma mais elementar da associação voluntária. Em suas palavras, os grupos de afinidade consistem em

[...] pequenos grupos de pessoas que sentem que compartilham algo importante e decidem trabalhar juntas num mesmo projeto. O termo em si deriva do espanhol, grupos de afinidad, que se referia a agrupamentos de amigos, [...] mas na década de 1920 os grupos de afinidade designavam a unidade básica organizacional da confederação anarquista espanhola (FAI). (Graeber, 2009, p. 288-289).

(2) por serem constituídos por anarquistas, black blocs são marcados pela democracia e horizontalidade e prezam pelas decisões tomadas por consenso, baseadas no princípio da igualdade (étnica, de gênero etc.); (3) black blocs se distinguem de outros manifestantes sobretudo pelo uso da violência direcionado para símbolos do capitalismo mundial, respeitando, ao mesmo tempo, a “diversidade de táticas” que podem vir a ser empregadas num evento de protesto.

O presente trabalho busca somar às observações dessas investigações de caráter empírico, com um foco específico: a visão dos próprios participantes quantos às formas e às causas de agregação, mobilização, ação. Na medida em que black blocs exprimem uma faceta do autonomismo, buscamos compreender como foi possível, na visão de nossos entrevistados, a formação dos blocos em Belo Horizonte, bem como o sentido atribuído às suas ações. Na próxima seção, apresentamos nossa metodologia e os dados por nós obtidos e analisados.

Procedimentos metodológicos e discussão

Os dados que aqui apresentamos foram coletados por duas vias: uma, a da observação participante em encontros de sociabilidade entre ativistas, assembleias, reuniões e eventos de protesto; a outra, a da realização de entrevistas semiestruturadas junto a participantes de blocos em eventos de protesto em Belo Horizonte. A imersão no campo por meio da observação participante ocorreu, a partir de 2014, em sessões da Assembleia Popular Horizontal (APH)6, nos eventos de protesto dela provenientes, em reuniões de grupos de ativistas, nas quais buscava-se uma avaliação coletiva do evento de protesto mais recente, e também em ocasiões de festas e momentos de sociabilidade em geral. Esses dados são combinados ou contrapostos à nossa experiência enquanto participantes - mas não pesquisadores - dos acontecimentos relacionados a junho e julho de 2013 na capital mineira. Participamos tanto das manifestações e sessões da APH de então, quanto da ocupação da câmara dos vereadores de Belo Horizonte em 2013, estando por vezes bastante próximos de pessoas que tomaram parte da ação direta de black blocs. No total, foram realizadas seis entrevistas. É preciso ressaltar a importância das conversas informais e dos relatos off the record como fontes importantes de dados. Isso porque a dificuldade de se convencer um participante de blocos a gravar uma conversa sobre o assunto, ou até mesmo conversar sobre black blocs enquanto o participante admite, abertamente, sua própria militância, mostrou-se muito grande. Muitas das pessoas com quem travamos conversa sobre esta pesquisa mostraram-se interessadas na mesma, e falaram sobre os blocos com propriedade e um nível de detalhes interessantíssimo. Entretanto, logo descobrimos que, de ter participado em black blocs para admitir tê-lo feito, há uma distância que nem todos estão dispostos a percorrer. O desconforto em falar abertamente - mesmo que não publicamente - como black bloc é compreensível na medida em que o ativismo mais voltado à militância foi duramente reprimido, perseguido e ameaçado ao longo dos protestos. A realização de entrevistas, aliás, é por si só uma tarefa de considerável dificuldade em função da própria natureza do sujeito de que tratamos. Nas palavras de Uri Gordon, “o black bloc é uma formação tática ad hoc na qual grupos e indivíduos se aglomeram, vestindo-se principalmente de preto e em geral cobrindo seus rostos” (2008, p. 80), e isso, segundo o autor,

deve-se tanto à necessidade de proteção de si mesmos contra a identificação policial, quanto pelo “simbolismo do anonimato”, como preconizado pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional. Além disso, conforme apontam algumas pesquisas, black blocs não são senão uma formação de todo efêmera, volátil, em constante transformação e que raramente coincidem significativamente no que diz respeito às pessoas que o constituem (Dupuis-Déri, 2014). Diante desses empecilhos, optamos por fazer uso do método bola-de-neve para a seleção da amostra a ser entrevistada. Essa escolha pareceu-nos a mais adequada por uma razão em especial: nós não teríamos que definir, a partir de nossas próprias categorias de pensamento, quem era, ou não, constituinte de black blocs, a não ser a primeira pessoa entrevistada. Isso possibilitou que a própria amostra se definisse, garantindo assim sua fiabilidade (Fragoso et al. 2013), e certificando-nos, eventualmente, de que ela não ficasse restrita a um grupo social específico. Abaixo, apresentamos um sumário do perfil das seis pessoas assim selecionadas.

As falas assim coletadas foram analisadas por meio de análise temática (Krippendorff, 2004; Bardin, 2011). Os temas orientadores da análise foram construídos levando em conta, por um lado, os apontamentos da literatura especializada e, por outro, os próprios temas relacionados à mobilização de black blocs emergentes nas narrativas de nossos entrevistados. Afinal, constituíram-se três categorias de análise: grupos de afinidade, mobilização organizada e mobilização por redes sociais digitais e ação conectiva. As entrevistas tomaram aproximadamente 90 minutos para serem concluídas. O conteúdo delas é atravessado por temas como violência, conflitos internos e de gênero e revolução social. Ao analisarmos as entrevistas, notamos que maneiras distintas de mobilização e de operacionalização da ação direta, na visão dos entrevistados, correspondiam a percepções distintas sobre si mesmos e, consequentemente, sobre os próprios black blocs. A seguir, expomos o conteúdo dos temas obtidos, bem como a discussão por eles suscitada.

Identificamos três tipos de vivências relativas à mobilização de black blocs nos relatos de nossos entrevistados. Evidentemente, o que chamamos de “tipos de mobilização” não são encontrados, tal como definimo-los, na prática, e todos tomam de empréstimo, mutuamente, elementos que usamos para caracterizar somente um ou outro deles. O primeiro tipo de mobilização se refere àquele operado por grupos de afinidade que, espontaneamente, agregam-se num evento de protesto como black blocs. O segundo tipo atravessa uma dinâmica de planejamento e organização prévia, semelhante àquela de movimentos sociais. O terceiro tipo é caracterizado, basicamente, pela imitação da ação de black blocs “pioneiros” e pela lógica que Bennett e Segerberg chamam de ação conectiva.

Tabela 1
Perfil dos entrevistados

Os grupos de afinidade

O Entrevistado 1 nos dizia, quando interpelamo-lo sobre a composição dos blocos em junho de 20137:

...Vei, a ALF cola muito. E também os punks. Tem punk pra caralho que curte estar ali. E rola alguns independentes. Depois, rolou muita galera da periferia; por exemplo, muita gente de Venda Nova, de coletivo de lá. [...] No segundo ato, o bloco devia ter umas dez pessoas. No terceiro já tinha uns cinquenta; muito independente cola, é tranquilo. Mas, mesmo assim, a galera meio que se conhece, mesmo tendo muito cara aleatório. [Entrevistado 1].

Na percepção deste primeiro entrevistado, os participantes de black blocs constituem grupos de pessoas bastante diferentes. Esses grupos, em outras condições que não um evento de protesto no qual formam-se black blocs, não necessariamente se agregariam ou sequer frequentariam espaços comuns. O grupo que mais lhe chama atenção, ou, pelo menos, que lhe vem à cabeça de imediato, abarca militantes da conhecida Animal Liberation Front (ALF), organização reticular, anarquista e cuja atuação se pauta por um mote geral, animal liberation, human liberation:

A Animal Liberation Front (ALF) leva a cabo ações diretas contra o abuso animal na forma do resgate de animais e causando danos financeiros aos exploradores, geralmente através do dano e destruição de propriedade. [...]

Em função das ações da ALF serem eventualmente ilegais, seus ativistas trabalham anonimamente, seja em pequenos grupos ou individualmente, e não têm uma organização centralizada ou coordenação.

A ALF consiste em pequenos grupos autônomos de pessoas em todo o mundo, que se empenham em ação direta alinhada às diretrizes da ALF. Qualquer grupo de pessoas que são vegetarianos ou veganos e desempenham ações de acordo com essas diretrizes têm o direito de se considerar parte da ALF (ALF Online, sem ano).

Percebe-se, pelo excerto acima, as similitudes em termos de mobilização e organização entre ALF e black blocs - indivíduos ou pequenos grupos de “amilitantes” autônomos (Dupuis-Déri, 2014) que, compartilhando dos mesmos princípios, engajam-se em ação direta declaradamente não-violenta a partir da organização voluntária de grupos de afinidade, anônima, informal e descentralizada (Graeber, 2009; D'Angelo, 2014).

Um segundo grupo mencionado pelo entrevistado engloba integrantes do “movimento anarcopunk”. Representantes de uma espécie de “subcultura”, anarcopunks podem organizar-se em coletivos específicos, mas eles, em seu conjunto, não necessariamente têm algo em comum para além do fato de apreciarem as práticas, os costumes e a estética emergentes da junção do punk com o anarquismo. O entrevistado, ao falar que muitos punks cerram fileiras em black blocs, está se referindo a agrupamentos, maiores ou menores, de pessoas ligadas entre si por relações de amizade ou que, ao menos, conhecem, mesmo que superficialmente, umas às outras. Vê-se, também aqui, o alinhamento das observações de Dupuis-Déri (2014) sobre a importância da contracultura e do movimento punk para o espraiamento da tática black bloc.

O terceiro grupo é o de “ativistas independentes”, dentre os quais o próprio entrevistado se coloca. Segundo as próprias definições do entrevistado, o “ativista independente” é aquele que, apesar de lutar por determinadas causas, não faz parte de organização, coletivo ou movimento social algum, somando forças em certas ações, promovidas por outrem ou por si mesmo, e mobilizando para isso sua rede pessoal, ainda que ocasional e temporariamente:

[...] eu colava com os punk, continuava nesse rolé de mudança de postura... fraguei a galera da ALF e comecei a me interessar bastante pelas questões ligadas à agricultura, a princípios de autossuficiência, me envolvendo ainda mais com o veganismo. [...]. Mas nunca fiz parte de coletivo nenhum, apesar de estar sempre em contato com a galera. Hoje minha militância é a da permacultura e da autossuficiência [Entrevistado 1].

O ativista independente, como sugere o Entrevistado 1, não se mantém alheio aos movimentos sociais que lhe interessam, mas simplesmente não “oficializa” a condição de membro em nenhuma organização. Como nosso primeiro interlocutor mesmo diz, os “independentes” nunca são completos desconhecidos. Um bom exemplo de ativista independente que mobilizou sua rede pessoal a fim de tomar parte de black blocs em junho de 2013 pode ser o Entrevistado 2. O Entrevistado 2 afirmou que, para participar das manifestações em junho de 2013, entrou em contato com alguns de seus amigos e conhecidos para que não se encontrasse inevitavelmente isolado em meio à multidão e diante da repressão policial.

A galera aqui no morro, por exemplo, me criticou porque eu estava indo nas manifestações. Me achava doido, me chamava de doido. Falava que as manifestações eram coisa de playboy, mas eu dizia: “não cara, a manifestação tem muito playboy, mas eu tenho minha demanda também, eu estou ali pela minha demanda”. E mais gente foi, não fui sozinho, mas pouca gente, né mano? [Entrevistado 2].

Alguns autores, como por exemplo Van Deusen e Massot, concluíram em seus trabalhos que black blocs, em geral, são “compostos por pessoas adeptas à contracultura contemporânea e, provindo de um background de classe trabalhadora, são expressão do desenvolvimento da revolução social via consciência de classe” (2010:8). O Entrevistado 2, contudo, aponta para a questão de que black blocs podem ser vistos como uma manifestação típica de classes mais privilegiadas. De fato, ele parece confirmar as impressões de Thompson (2010), que propõe “investigar o movimento antiglobalização que emerge no Canadá e nos Estados Unidos como um fenômeno de classe média branca” (p. 15). Dupuis-Déri reitera, adicionando que “mesmo nas redes antifascistas e antirracistas do Ocidente, os membros do Black Bloc são majoritariamente de origem europeia, quase não havendo pessoas negras ou hispânicas” (2014, p. 54-55), e explicando que a ação direta é mais propícia àqueles sobre os quais a repressão tende a intervir de forma mais branda, como brancos, universitários e de classes médias. Notamos, ainda, que um dos fatores mobilizadores para o Entrevistado 2 não se referia a dinâmicas de grupo delineadas ideologicamente. Antes, o que o impulsionou às ruas na forma de black bloc foi sua demanda, e somente a partir dela ele buscou mobilizar suas redes pessoais.

Essas são, basicamente, as características que definem o primeiro tipo de mobilização tal como relatado por dois dos entrevistados. Segundo este tipo de mobilização, black blocs formar-se-iam graças à associação entre grupos de afinidade autônomos e independentes, sendo o resultado final uma massa relativamente homogênea de pessoas que “incorporam uma visão política baseada no anticapitalismo, na confrontação física e na total rejeição do mercado e do Estado” (Juris, 2005, p. 421). Francis Dupuis-Déri, nesta esteira, defende que black blocs tendem a formar-se espontaneamente, mas aponta que “grupos de afinidade podem se encontrar horas ou dias antes de uma manifestação para planejar e coordenar suas ações” (2014, p. 13). Uri Gordon corrobora tais apontamentos. Assim, esses grupos, em seu conjunto, teriam como principal objetivo “indicar a presença de uma crítica radical ao sistema econômico e político. Nesse sentido, um black bloc é como uma grande bandeira negra [...] no centro de uma manifestação” (Gordon, 2008, p. 10). Carlos Illades afirma que integrantes de black blocs utilizam-se do anonimato como “dispositivo identitário”, de modo que a “tática” só funcionaria em decorrência de sua “organização em blocos compactos de tamanho variável, conhecidos como ‘grupos de afinidade’” (2014, p. 414). Entretanto, o próprio Entrevistado 1 afirma abertamente que a modalidade de grupos de afinidade não é a única possível, de modo que são diversas as formas de mobilização dos blocos.

Cada um quer uma coisa; uns caras acham que não tem que ter estratégia, que é chegar lá e ver o que pega. Outros querem fazer o rolé ficar bem organizado... nisso, os independentes ficam sem lugar, e sem voz. A galera participa, mas quando começa a organizar demais, eles participam do seu próprio jeito. [Entrevistado 1].

Isso nos conduz, portanto, à análise das demais formas de mobilização. A seguir, abordamos um tipo de constituição de black blocs que supõe a articulação mais sistemática da ação direta.

A mobilização organizada

Alguns ativistas entrevistados trazem relatos de uma outra dimensão, no processo de mobilização, que implica em certo nível de articulação, discussão, construção de consenso sobre o que deve ser, e de que maneira deve ser, um black bloc. Mencionam, em outras palavras, a importância e a existência de processos deliberativos entre um ou mais grupos de afinidade, e de um trabalho de comunicação das resoluções no interior e externamente ao grupo de afinidade. Como indicou o Entrevistado 1, pode haver pessoas e agrupamentos que discordam de decisões tomadas num círculo restrito. Haverá, também, num contexto de formação de bloco antes ou durante uma mobilização na rua, aqueles que sequer saberão que, em algum lugar e por algum motivo, esteve em curso um processo de organização para um black bloc. A Entrevistada 6 é um exemplo disso:

...Então, eu lembro que no primeiro dia da manifestação eu fiquei sabendo, não sei por quem, quem me falou. Aliás, algumas pessoas estavam se reunindo já num parque [...]. Justamente para articular uma maneira de atuar no dia. [...] Aí eu fiquei sabendo no dia que eles iam se encontrar, o horário, e que estavam indo todos de preto. Aí eu fui de preto, e encontrei com o pessoal. E a galera estava andando em bloco mesmo, com umas faixas e tal. E foi todo mundo de preto, marchando, bem bloco, e eu participei disso por um dia. [Entrevistada 6].

Essas reuniões deliberativas, pelo que pudemos apurar por meio da observação participante, poderiam muito bem constituir discussões de todo comuns entre indivíduos integrantes de um grupo de afinidade.

[A chamada para participação] é uma coisa que só passa de boca em boca. As pessoas se conheciam, e tinham certeza que eram uma galera do rolé, assim. Era um pessoal que eu já conhecia desde o movimento punk, uma coisa restrita. Era tudo organizado por vias seguras, né? [...] Então, foi bem organizado, eu acho. Eu não participei das rodas de conversa, mas eu tenho certeza que se chegasse um cara aleatório e sentasse, ele seria expulso. Então só estava lá quem era conhecido. Se um conhecia o outro, então podia entrar. [Entrevistada 6].

David Graeber, numa descrição etnográfica do coletivo anarquista estadunidense Direct Action Network, informa-nos que os papeis atribuídos e assumidos pelos militantes integrantes de um grupo de afinidade, em geral, resumiam-se aos seguintes: ao de facilitador do processo de tomada de decisão no grupo, o de responsável por cuidados médicos na efetivação da ação direta, o de responsável técnico por eventuais procedimentos jurídicos e, enfim, o de delegado do grupo de afinidade (2009, p. 289). Num grupo de pessoas que se conhecem relativamente bem, essas tarefas de definição de papeis, aponta o autor, não eram de todo difíceis de se levar a cabo. Mas esse não parece ser exatamente o caso das reuniões das quais participou a Entrevistada 5, e das quais fala a Entrevistada 6.

Segundo a Entrevistada 5, as reuniões não só tinham como objetivo a definição de uma miríade de papeis e táticas a serem adotados pelos militantes, como também intentavam estabelecer um todo coeso no que diz respeito ao próprio sentido da ação direta que estavam por efetivar. Era preciso definir objetivos e meios comuns, uma estética minimamente comum e fazer com que tudo isso fosse publicitado para promover o anarquismo e a própria formação de black blocs.

Uma vez teve uma reunião, por exemplo, de black bloc, que durou umas doze horas! Acho isso muito desgastante, sabe? E ela terminou com um vídeo, que eu não tinha muito aprovado, mas que era para ser divulgado, o pessoal tinha começado a fazer esses vídeos para pôr na internet né, pessoal de preto e tal. E uma coisa meio V de Vingança, né? Mas eram os black blocs. E na verdade o primeiro vídeo que sairia desses era para ser de Belo Horizonte, foi gravado, e tinha muita gente, tinha umas quinze pessoas aparecendo. Todo mundo em pé, uma coisa PCC assim, mas no fim das contas uma pessoa ficou com medo e a outra apagou. Mas o texto era muito... dava medo, sabe? Parecia que tinha sido escrito no século XIX [...]. Ah, estava meio viajandão, sabe? Tipo, o grupo se dividiu, né? Entre os que gostaram muito daquilo, uma coisa bem clássica, anarquismo social, não sei o que, e outro pessoal que queria uma coisa mais informal, mais acessível, como eu, que todas as pessoas pudessem ver e entender o que estava sendo dito, em vez de ficar pensando: “o que que é isso? São os amish?”. E teve o pessoal que só achou que achou muito horrível, do tipo “que medo, parece um bando de terrorista”. E não era para ser nenhuma das três coisas. Esse dia aí, por exemplo, esse dia aí foi um dia que foi bem desgastante, porque primeiro a gente fez grupos de trabalho, na casa de uma pessoa, ficou reunindo, decidindo umas táticas [...]. E assim, tá, são detalhes né, bem práticos, que têm que ser discutidos, né, mas não em doze horas! E que terminou com esse vídeo que, no fim, jogaram fora o vídeo. E de manhã todo mundo precisou ir embora, trabalhar, estudar, ir para casa, e a pessoa que ficou lá, responsável por editar e postar [...], ficou com outra pessoa que estava com medo e optaram por deletar. Assim, sem conversar com ninguém também. Aí né... eu fico... putz!

O tipo de mobilização relatado pelas Entrevistadas 5 e 6 guarda certas semelhanças com as características que distinguem movimentos sociais de outras formas de ação coletiva contenciosa. Para Sidney Tarrow, movimentos sociais são definidos, basicamente, “como desafios coletivos baseados em objetivos comuns e solidariedade social numa interação sustentada com as elites, opositores e autoridades” (2009, p. 21). De acordo com Donatella della Porta e Mario Diani, movimentos sociais distinguem-se de outras formas de ação coletiva porque consistem, primeiro, numa coletividade de atores “engajados em conflitos políticos e/ou culturais no intuito de promover ou se opor a mudanças sociais”. Segundo, movimentos sociais consistem numa densa rede informal formada por seus militantes que “mantêm trocas de recursos na busca de objetivos comuns”. Terceiro, “observa-se um processo de movimento social quando identidades coletivas são desenvolvidas e sustentadas para além de eventos e iniciativas específicas” (della Porta e Diani, 2006, p. 21). Segundo Alberto Melucci, a ação coletiva a que chamamos “movimento social” é uma categoria analítica que: supõe uma solidariedade entre as pessoas que tomam parte do movimento; supõe o conflito, isto é, “a oposição entre dois ou mais atores que numa disputa por recursos sociais valiosos” e o “rompimento dos limites de compatibilidade de determinado sistema de relações sociais dentro do qual ocorre a ação” (Melucci, 1996, p. 24).8

Nesse sentido, a diferença entre um movimento social e a operação do black bloc, tal como percebida por nossos entrevistados, é que o bloco que compuseram (1) não sustentou - e nem teve a pretensão de sustentar - o confronto com seus opositores para além de um evento específico; (2) os blocos não consistem num acoplamento entre redes informais e identidade coletiva, mas entre redes informais e várias identidades diferentes, com objetivos, métodos e entendimentos distintos sobre a ação direta que almejam concretizar. Nesse sentido, não podemos presumir, pelo relato de nossas entrevistadas, que black blocs distintos, tomando parte de um mesmo protesto, bem como os grupos de afinidade que os compõem, sejam solidários (mantenham unidade identitária) entre si.

Esse segundo modo de mobilização implica a submissão de um indivíduo que deseje compor um black bloc a um mínimo de normas específicas de cooperação e reconhecimento mútuo, estabelecidas entre e para militantes de um agrupamento particular. Essas normas não são acessíveis a qualquer um e condicionam o “recrutamento” de novas pessoas para a formação de um bloco. Isso não impede, evidentemente, que blocos sejam formados por outras vias e, num evento de protesto, todos cerrem fileiras em conjunto, à revelia da variedade dos processos de mobilização em operação - fato que fica bastante claro pelos relatos que fundamentaram nosso terceiro tipo de mobilização, do qual tratamos em seguida.

Afetos, redes sociais digitais e ação conectiva

Alguns entrevistados indicaram-nos que um fator que deve ser levado em conta para entendermos parte dos processos de mobilização de black blocs é de natureza afetiva. Vejamos o que nos dizem os Entrevistados 2 e 3 sobre o que os levou a ir às ruas em 2013 como black blocs.

Olha, primeiro, o que eu achei muito doido, tipo, black bloc estava tomando frente, batendo de frente com a polícia, tá ligado, estava batendo de frente com a polícia, e para você ver, com aquela minoria batendo de frente com a polícia, por causa daquela multidão, acho que muita gente se revoltou e foi lá bater de frente também, entendeu? Eu sou um deles. [Entrevistado 3].

Para mim é revolta, a galera tem esse sentimento de revolta muito grande, mano. E a gente sabe que a juventude negra vem sendo exterminada, e ninguém faz nada, o estado, a mídia, ninguém fala nada. Mas as pessoas sentem a opressão. Elas participam do bloco, para mim, muito por isso. Estão na luta, estão revoltados, só falta a organização mesmo. [Entrevistado 2].

Castells (2012) sugere que um traço típico de mobilizações sociais, sejam contemporâneas ou não, é justamente o amplo compartilhamento de determinadas emoções em redes sociais. Um elemento mobilizador de novos militantes pode estar vinculado a um sentimento reprimido de revolta, tristeza e opressão que, nos eventos de protesto daquele ano, traduziam-se na imitação dos atos de blocos “pioneiros”. Nas palavras da Entrevistada 5,

[...] é um pessoal tomando para si a revolta, essa ideia, de uma forma até muito mais legítima do que a gente, porque eles estavam lá para expressar não era: “Copa, 20 centavos”. [...] Acho que realmente eles estavam, assim, nossa, aquele momento estopim, em que se explode e põe tudo para fora, né? E foi legal, porque, poxa, acho que se eles teriam feito... teriam feito também por conta, mas acho meio legal, meio que encoraja, ter uma galera ali, né, meio, todo mundo junto, na frente, indo para a frente, né? Nossa, e isso assim, para mim pelo menos, foi uma coisa que me deu um ânimo, olhar para o lado e ver que tem gente vindo, sabe, “é, vamos lá!”. [Entrevistada 5].

Contudo, a mera aparição e atuação de black blocs, por si sós, não foi a causa suficiente para levar os Entrevistados 2 e 3 a somar forças aos blocos. A construção e contraposição de interpretações pessoais dos protestos representou, para ambos, um processo fundamental para a mobilização política. Nosso terceiro entrevistado ressaltou a importância de suas conversas com o Entrevistado 2 para que ele se mobilizasse politicamente quando dos protestos de junho daquele ano.

Tinha um desejo de ver isso acontecer, ir todo mundo pra rua, ver todo mundo na rua, não só a burguesia mas a favela também, tá ligado? Ver a favela descer, principalmente ela. Aí foi que em 2013 começou... eu estava sentindo muito a galera discutindo muita coisa, todo mundo revoltado já. E começou a galera a descer. Sou muito recente nessa questão. Comecei mesmo pelo Entrevistado 2: vi ele discutindo e não entendia nada, nada daquilo... vim de uma família muito simples, com pouca educação e pouca informação. Aí fui vendo a realidade e aquilo foi me dando revolta, revolta, em relação a isso, e fui às ruas com a galera. [Entrevistado 3].

E, de fato, o Entrevistado 2 vê seu próprio proselitismo, e midiativismo, como elementos mobilizadores relevantes, desmentindo algumas análises que compreenderam os blocs como “niilistas”.

[Eu] postava tudo no Facebook, mostrando a violência do Estado, assim, mostrando as mentiras que a mídia e o governo contavam, fazia muito post. Enquanto eles mostravam uma coisa na televisão, a gente estava filmando e jogando tudo na rede, denunciando, propagando o que a gente vive, o que a polícia é, divulgando mesmo. É uma arma que a gente tem, agora não tem como esconder mais como as coisas são. [...] Mas, mesmo assim, são poucos os que acreditam, os que buscam se politizar. É foda cara, porque a iniciativa é do morro, de gente do morro, e o morro não fortalece. Mas eu continuo, eu continuo estudando, eu acredito na mudança pelo coletivo. Tem um chegado meu que gosta muito de Nietzsche, Saramago, e diz que não existe isso de mudança coletiva, que você muda o mundo mudando a si mesmo. Mas como que isso é possível, mano? Eu já me mudei, e aí? Isso para mim é individualismo. Ele fala que eu saí da igreja, mas que continuo pregando, que isso é colonização. Mas para mim é o contrário. [Entrevistado 2].

De acordo com esse entrevistado, a interação com pessoas, muitas vezes desconhecidas, por meio de redes sociais digitais, foi uma característica de sua atuação nas manifestações de 2013. Quando interrogado sobre os riscos do uso da internet, ele respondeu:

É, ninguém estava nem aí. Hoje eu vejo que me expus, que é perigoso. Eu estou ligado, trabalho com isso, mas na hora aquele romantismo do idealismo, a gente nem pensa direito, o momento é muito intenso. [...] Conheci gente de tudo quanto é lugar, cara: do Pará, de Pernambuco, da Bahia, do Rio, de São Paulo, não sei nem como era, mas muita gente veio para cá, para as manifestações aqui [...] [Entrevistado 2].

Com respeito à consciência da relevância da mídia e da comunicação nos processos mobilizadores de black blocs, o Entrevistado 3 nos informou que já ouvira falar em blocos se manifestando em algum outro momento anterior a 2013: “Tipo, já vi nas manifestações fora do país. Mas, assim, na TV e internet”. E, então, o assunto voltou-se para o tópico de utilização de TICs durante os protestos, e meu interlocutor continuou: “cara, a internet eu vejo como uma coisa muito boa. Para quem sabe utilizar. Ela é uma arma e tanto, a sociedade está com tudo na mão, mas não está sabendo utilizar, parece”. Importante observar que para Manuel Castells o processo de mobilização social para a ação direta, bem como todo processo político, depende do compartilhamento de emoções e enquadramentos individuais sobre acontecimentos e eventos significativos em redes sociais (Castells, 2009). Além disso, o autor indica que o compartilhamento de entendimentos e emoções tem sido potencializado com a ascensão de TICs nos últimos anos e com a emergência da chamada mass self-communication (Castells, 2012). Os argumentos de Castells, em certa medida, parecem corresponder ao que nos foi relatado pelos Entrevistados 2 e 3: os protestos de larga escala de junho de 2013 pareceram-lhes ocasiões fortuitas para o extravasamento de sentimentos e emoções reprimidas cotidianamente.

Foi meio que um gatilho, aquilo [os protestos de junho de 2013] foi um boom porque se reprimiu demais, e aquilo foi um choque, a polícia demonstrou a verdadeira face dela. Porque na periferia não tem respeito à lei, método... se você queima um pneu ali, igual nós queimamos no ano passado, porque atiraram num menino à queima roupa numa abordagem policial, nós botamos fogo no pneu e eles vieram para cima - nada de bala de borracha - era fuzil, metralhadora, tudo para cima. Então, nessa manifestação de São Paulo ela botou a cara e mostrou a face dela. E o pessoal ficou meio que assustado: “que polícia é essa?”. E foi um boom, né? Porque aquilo ali ativou no pessoal uma comoção e foi todo mundo para a rua, coisa que ninguém esperava. A polícia agiu de uma maneira que ela está acostumada a agir, só que com um público diferente. [Entrevistado 2].

Eu fiz muito uso antes. [...] A rede social virou piada. É: “eu na manifestação”, “vamos mudar Brasil”, era meio que isso, tá ligado? Aí eu não fiz muita utilização até porque eu estava também... eu não estava tendo muito acesso à internet, mas antes da manifestação, lá era onde eu estava me manifestando muito, participando muito da política. [Entrevistado 3].

Lance Bennett e Alexandra Segerberg, ao discutir o suposto surgimento de mecanismos de ação “conectiva”, afirmam que as implicações da emergência da mass self-communication para a mobilização da ação direta “incluem uma propensão ao desenvolvimento de identificações políticas flexíveis, baseadas em estilos de vida pessoais” por parte das pessoas envolvidas (Bennett e Segerberg, 2012, p. 744). Assim, observar-se-ia em protestos recentes o declínio de grandes narrativas ideológicas e de grupo, e a ascensão e articulação de expressões pessoais singulares, inclusivas e de larga escala. Nesse sentido, as mobilizações sociais contemporâneas tenderiam a prescindir de coordenação organizacional, de modo que a rede social em si torna-se, em alguma medida, a própria organização da ação.

Cara, isso daí cada um vai ter uma motivação específica, mas dá para falar do caso da galera do morro, da periferia. Para mim é revolta, a galera tem esse sentimento de revolta muito grande, mano. [...] Elas participam do bloco, para mim, muito por isso. Estão na luta, estão revoltados, só falta a organização mesmo. [Entrevistado 2].

Tudo isso, a nosso ver, sugere que, neste terceiro tipo de mobilização, os sujeitos podem participar de black blocs ao vê-los em ação, ao reconhecerem aquilo como uma maneira legítima, desejável, esteticamente apreciável ou politicamente potente de protesto, muito em função de seu próprio pano de fundo afetivo, sua trajetória de classe, mas também individual. Em segundo lugar, a tendência dessas pessoas à participação em black blocs pode aumentar à medida em que emoções e enquadramentos individuais relativos à ação dos blocos são compartilhados e discutidos em redes sociais: as TICs revelam ser mediadores importantes no processo comunicacional e, portanto, para a mobilização e a organização. Isso implica na agregação de pessoas que sequer fazem parte de um grupo de afinidade. A mobilização para ação em blocos, nesse sentido, é dependente, de certa forma, de (1) um pano de fundo subjetivo (em termos de entendimentos de mundo, afetos e emoções) que predisponha os indivíduos a compor black blocs, e (2) da comunicação e propagação em redes sociais desses entendimentos pessoais, afetos e emoções, o que pode funcionar como “gatilho”, nas palavras de nossos entrevistados, e levar à formação de “comunidades provisórias”.

Comentários finais

Black blocs, apesar de se manifestarem como novidades no Brasil, consistem numa forma de atuação em eventos de protesto emanada e animada pelo campo autonomista e seus programas políticos, cuja trajetória já percorre quase 50 anos. Pelas próprias características deste campo, black blocs têm sido comumente mobilizados através da iniciativa e articulação de grupos de afinidade militantes, contando, todavia, com maior sofisticação de planejamento desde os primeiros anos da década de 2000. O caso por nós analisado revela uma pluralidade de processos de mobilização de militantes para os blocos, que podem variar e se combinar em função do background individual, de classe e, em geral, identitário dos sujeitos envolvidos. Não sendo mutuamente excludentes, classificamos tais processos em três tipos-ideais: (a) mobilização por grupos de afinidade, um tipo já descrito e analisado em eventos e protestos de grupos como a ALF e black blocs europeus e estadunidenses desde os anos 1990 (Katsiaficas, 2006; Graeber, 2009, Dupuis-Déri, 2014, D'Angelo, 2014, entre outros); (b) mobilização organizada, que guarda similitudes com a forma de organização de movimentos sociais, embora prescidam de elementos-chave dessa ação coletiva, a exemplo da identidade compartilhada e a sustentação do conflito com seus opositores (Tarrow, 2009; della Porta e Diani, 2006; Melucci, 1996); e (c) mobilização por redes sociais digitais e ação conectiva, na qual o compartilhamento de emoções, afetos, visões de mundo, em especial via TICs, são fundamentais para a formação dos blocos, como Castells (2009; 2012) e Bennett e Segerberg (2012), por exemplo, observaram em outras ocasiões em que pessoas tomaram as ruas.

Observações e entrevistas mostram traços comuns às três modalidades de mobilização: há uma centralidade da dimensão afetiva, crucial para o processo de engajamento nas ações e nestas “comunidades” frágeis e efêmeras. Os afetos atravessam e conformam a emergência de grupos de afinidade, bem como o planejamento dos grupos mais organizados. Servem, ainda, de gatilho à ação de sujeitos que compõem black blocs de primeira viagem, ou, ao contrário, a inibem. Ao mesmo tempo, nossas análises sugerem uma tensão entre a natureza enérgica do envolvimento em protestos específicos e a efemeridade identitária dos blocos - nessa direção, a formação de black blocs deve não somente ao importante compartilhamento, ainda que vago, de práticas, valores e visões de mundo, como também são fundamentais as relações interpessoais de confiança.

A particularidade do caso de que tratamos, todavia, demanda maiores esforços voltados para a pesquisa empírica, capaz de corroborar nossas análises ou impor-nos ajustes voltados para a melhor compreensão dessa espécie de ação coletiva, componente não negligenciável do cenário político brasileiro e mundial no século XXI.

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Notas

1 O primeiro autor agradece ao apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) e o segundo autor, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/Brasil) pelo apoio recebido através da Bolsa Produtividade em Pesquisa.
4 Em todas as citações de textos em língua estrangeira, a tradução é nossa.
5 O termo “amilitante” foi cunhado por Francis Dupuis-Déri (2014) para designar, a um só tempo, a negação da figura clássica do militante de esquerda e a importância das relações de confiança e amizade entre os grupos que compõem black blocs.
6 Fruto de uma articulação entre autonomistas e anarquistas organizados, a Assembleia Popular Horizontal (APH) surgia em junho de 2013, congregando partidos políticos de esquerda, movimentos sociais e ativistas “independentes”, isto é, que não tinham vinculação a nenhum tipo de organização formal. Segundo o que consta em uma página wiki criada por ativistas em 2013, a APH é “um fórum de diálogo horizontal e autônomo para a formulação de pautas e propostas para as próximas mobilizações”, de forma que “a ideia é criar um espaço comum a todos os mobilizados na web e na rua. Um espaço para organizados e independentes” (APH Online, 2013).
7 As transcrições apresentadas são literais, de modo que neste trabalho também analisamos e interpretamos suas expressões específicas, que, em parte, marcam identidades de grupo, camada social e posicionamento político ante questões por eles mesmos percebidas como relevantes.
8 Tomemos o cuidado de definir, de acordo com Melucci, “solidariedade” e “limites de compatibilidade”. Por solidariedade, Melucci entende “a habilidade de atores de se reconhecerem mutuamente como pertencentes à mesma unidade social” (Melucci, 1996, p. 23). Em outros casos, a ação coletiva emerge a partir da agregação de comportamentos mais ou menos individualizados, e não implica na formação de um movimento social. Por “limites de compatibilidade de determinado sistema de relações sociais”, Melucci entende a “amplitude de variabilidade em estados sistêmicos que permitem a manutenção de sua estrutura (ou o conjunto de elementos e relação que identificam o sistema enquanto tal)” (Melucci, 1996, p. 23).

Autor notes

vic.alvesfernandes@gmail.comyurijcastelfranchi@gmail.com



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