Artigos
A vida como projeto: a pedagogia do homo economicus e as iniciativas de fomento ao “espírito do capitalismo” via educação pública 1
Life as a Project: The homo economicus Pedagogy and the Initiatives to Promote the “Spirit of Capitalism” through Public Education
A vida como projeto: a pedagogia do homo economicus e as iniciativas de fomento ao “espírito do capitalismo” via educação pública 1
Ciências Sociais Unisinos, vol. 55, núm. 3, pp. 302-314, 2019
Universidade do Vale do Rio dos Sinos Centro de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
Recepção: 30 Abril 2019
Aprovação: 12 Setembro 2019
Resumo: O artigo toma por objeto a matriz si mbólica que fundamenta um programa de “Educação Integral” idealizado por elites empresariais, que atualmente se dissemina pelo país por meio da atuação de organizações sem fins lucrativos ligadas ao universo corporativo, em “parceria” com diferentes instâncias estatais. Tal modelo de educação pública foi constituído com visões de mundo e valores próprios a agentes bem-sucedidos no universo econômico, os quais, a partir da autoridade simbólica conferida por seu “capital gerencial”, se outorgam um “papel pedagógico” no que enxergam como uma reforma das disposições à ação de estudantes de escolas públicas. A análise de tal pedagogia do homo economicus , assentada na noção de “projeto de vida”, trouxe elementos para esclarecer a agência da “filantropia corporativa” no modelo de “educação integral” em expansão. A concentração de capital econômico, político, social e simbólico de elites econômicas permite que elas transformem iniciativas ancoradas em suas visões de mundo em políticas públicas de escopo nacional. Elas buscam construir determinadas disposições econômicas via educação pública e, como atribuem o “sucesso” à vontade racionalmente executada, negligenciam as condições sociais do engendramento de tais disposições. Logo, se as iniciativas analisadas se inserem no contexto de uma racionalidade mais ampla - chamada, por concisão, de neoliberal -, elas têm artífices privilegiados e carregam as marcas de um ethos específico, que se quer, porém, como universal ou ao menos universalizável. Contudo, o homo economicus , se existe, é histórico e marcado por dinâmicas de classe, no seio das quais alguns agentes se atribuem o desenho e a consecução de políticas em que outros agentes são pensados como aprendizes de um ethos enquanto nomos.
Palavras-chave: homo economicus, elites empresariais, educação integral, sociologia econômica.
Abstract: The article focuses on the symbolic matrix that underlies an Integral Education Program idealized by business elites, which is currently disseminated throughout Brazil by the agency of nonprofit organizations linked to the corporate realm, in “partnership” with the State. Such a model of public education was constituted with conceptions, world views and values proper to economically successful agents. From the symbolic authority implied in their “managerial capital”, they assume a “pedagogical role” aiming the reform of the dispositions to action of public-school students. The analysis of the pedagogy of the homo economicus , based on the notion of “project of life”, brought elements to clarify the agency of “corporate philanthropy” in the expanding model of “integral education”. The concentration of economic, political, social, and symbolic capital of economic elites allows them to transform initiatives based on their visions and beliefs in national scope public policies. They seek, therefore, to construct certain economic dispositions through public education and, as they attribute “success” to the rationally executed will, they neglect the social conditions of the breeding of such dispositions. Therefore, if the initiatives analyzed exist within the context of a broader rationality – named neoliberal for conciseness - they have privileged artificers and bear the marks of a specific ethos , conceived, nevertheless, as universal or at least universalizable. However, the homo economicus , if there is one, is historical and marked by class dynamics, in which some agents self-impute the design of public policies within which other agents are thought of as apprentices of an ethos as a nomos.
Keywords: homo economicus, business elites, integral education, economic sociology.
Apresentação: iniciativas de reforma do “espírito do capitalismo” no Brasil
Todos haviam recebido um pedaço de papel em branco e uma caneta. Tinham que preenchê-lo com os seus sonhos e projetos. [...] Todos, de cabeça baixa escrevendo os seus sonhos, expressavam tanta esperança neste momento, como se o ato de escrever pudesse tornar os seus sonhos reais. ( Melo, 2010, p.15).
O trecho acima descreve uma “dinâmica” realizada no primeiro dia de aula pelos estudantes do Centro de Ensino Experimental Ginásio Pernambucano, instituição recifense que abrigou um programa de Ensino Médio Integral idealizado por elites empresariais, que se disseminou pelo país por meio da atuação do Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE) e de outras organizações ligadas ao universo corporativo, como os Institutos Natura e Sonho Grande, em “parceria” com diferentes instâncias do poder público. Tal modelo de educação pública foi tecido com concepções, valores e visões de mundo próprios a agentes bem-sucedidos no universo econômico. Essa matriz simbólica constituirá as premissas da iniciativa de reforma dos valores e disposições econômicas dos jovens de escolas públicas brasileiras.
O artigo se debruça sobre essa pedagogia do homo economicus, ente idealizado pelos agentes propulsores do modelo como capaz de se auto-organizar, auto-controlar, auto-empreender, de se adaptar a mudanças constantes, de enxergar e viver a vida como um projeto a ser executado de maneira racional e consciente. Para analisar essa empreitada de busca pelo aperfeiçoamento do “espírito do capitalismo” no Brasil, inicialmente estabelecemos os fundamentos teóricos centrais ao texto, mobilizando autores distintos que, com suas especificidades, sustentam que o homo economicus, longe de ser um universal, é um construto histórico atravessado por dinâmicas sociais. Baseados nesse pilar da sociologia econômica, adentramos o tema específico do artigo, apresentando a posição ocupada pela chamada “filantropia corporativa” nas recentes reformas na educação pública brasileira. Na sequência, chegamos ao cerne empírico da pesquisa, a saber, os programas de educação integral derivados do modelo criado pelo Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE). Após perpassarmos os condicionantes e a arquitetura institucional dos programas, discutimos os modelos empresariais para a educação pública baseados no “papel educativo” auto atribuído pelo empresariado. Em face disso, apontamos como a concentração de capitais permite que elites econômicas transformem suas iniciativas em políticas públicas de escopo nacional. Por fim, analisamos a prescrição da vida como projeto, central ao programa em análise, e concluímos com uma discussão sobre a busca de elites econômicas por produzir um país à sua imagem e semelhança, com atenção às contradições implicadas no intento.
Em termos metodológicos, realizamos análise documental de materiais diversos produzidos pelos agentes em questão: documentos públicos e legislação, livretos institucionais, livros sobre a experiência escritos tanto pelos idealizadores quanto por estudantes, entrevistas e depoimentos publicizados, websites, documentos com “diretrizes operacionais” do modelo de gestão e de ensino, “planos de ação” de secretarias estaduais, bem como outras cartilhas e planilhas de disseminação do modelo do ICE para outros Estados da federação. A partir desse extenso material, estabelecemos análise de discurso para apreender as recorrências e regularidades discursivas ( Foucault, 1969), mas considerando as posições sociais - no sentido bourdieusiano - a partir das quais a gramática da vida como projeto é enunciada.
Além disso, entre 2018 e 2019, a autora conversou com atores que trabalham na Secretaria de Educação do Estado da Paraíba, onde se ocupam da implantação e disseminação do modelo de ensino integral, atualmente em franca expansão 3. Tal aproximação foi de fundamental importância para a apreensão de tensões e conflitos que emergem no processo de implementação do programa em tela.
A sociologia econômica e o homo economicus como produção social
É inaugural à sociologia econômica a preocupação com a formação social das disposições econômicas. Em seu trabalho fundador, Weber (2004, p.47) já colocava que a “cultura capitalista” tem uma “ética social” cuja “apropriação subjetiva” por “portadores individuais” é uma “condição de sobrevivência para o capitalismo”. Para ele, só depois de formada é que a ordem econômica capitalista se torna “uma crosta”, um “cosmos” que “impõe ao indivíduo, preso nas redes do mercado, as normas da ação econômica”. É por “dominar de longa data a vida econômica” que “o capitalismo educa e cria para si mesmo, por via da seleção econômica, os sujeitos econômicos – empresários e operários – de que necessita”. (2004, p.48, itálico original, negrito adicionado). Contudo, o próprio autor destaca o limite do conceito de “seleção”, pois para que as “modalidades de conduta de vida e concepção de profissão pudessem ter sido ‘selecionadas’”, “elas tiveram primeiro que emergir”, “e não apenas em indivíduos singulares isolados, mas sim como um modo de ver portado por grupos de pessoas” (2004, p.48, destaque original). Weber sublinha ainda que a “disposição de executar o trabalho como se fosse um fim absoluto em si mesmo” “não está dada na natureza”, “só podendo ser o produto de um longo processo educativo” (2004, p.48, destaque adicionado).
Desde então, a sociologia econômica se constrói sobre esses alicerces e se debruça sobre a produção social dos atores entendidos como economicamente “racionais”, buscando compreender como a ação e as instituições econômicas são “enraizadas” ou “embutidas” ( embedded) e (co)produzidas pelo contexto social ( Daoud e Larsson, 2011). A partir de diferentes perspectivas, o universo econômico é concebido em seus cruzamentos com contextos cognitivos, culturais, sociais e políticos ( Polanyi, 1980; Granovetter, 1985; Bourdieu, 2000a; DiMaggio, 1994; Zelizer, 1988; Steiner, 1995, 2001; Boltanski e Thévenot, 1991...).
Diante disso, a sociologia econômica critica a teoria econômica que toma o homo economicus como ponto de partida analítico e, além disso, afirma que, como disciplina, a Economia contribuiu historicamente para a construção dos atores econômicos que ela assume como premissa, por “ensiná-los” a pensar e agir economicamente ( Callon, 1998; Bourdieu, 2000a, 2017; Raud, 2007). Durkheim (2003) e Polanyi (1980) já tinham sugerido que a divulgação da “descoberta” das leis de funcionamento do mercado, apresentadas como tão verdadeiras e necessárias quanto os fenômenos naturais, concorreu para a aproximação entre o comportamento dos agentes e os pressupostos do homo economicus, assim como para a elaboração dos arranjos institucionais que permitem o funcionamento do mercado ( Raud, 2007). A esse fenômeno Bourdieu denominou de “efeitos de teoria” ( Garcia-Parpet, 2013).
Com Bourdieu e Steiner, Raud (2007, p.227-228) acrescenta que, às “representações espontâneas, decorrentes do próprio funcionamento da atividade econômica”, devem ser somadas as “representações construídas por uma instituição (como o sistema escolar) ou por organizações (onde operam os peritos) encarregadas de difundir o saber econômico junto aos produtores e aos consumidores”. Para ela, as práticas e disposições exigidas pelo sistema econômico seriam “adquiridas e assimiladas insensivelmente por meio da educação implícita e explícita”.
Ancorado em seus estudos empíricos sobre a produção das disposições econômicas ditas racionais, Bourdieu elabora uma crítica aos fundamentos da teoria da ação racional. Tanto nos trabalhos sobre a Argélia ( Bourdieu et al, 1963 ; Bourdieu e Sayad, 1964; Bourdieu, 2000b, Swedberg, 2011, Garcia-Parpet, 2005, 2014) quanto nos estudos sobre a crise da sociedade camponesa no interior da França ( Bourdieu, 2015), o autor busca historicizar as representações e condutas econômicas, bem como o processo de diferenciação ou separação da esfera econômica do restante da vida social. Dedica-se a mostrar como diferentes mercados são construções institucionais e permeados por relações sociais que nada têm de universais. Sustenta, assim, que “o mundo social inteiro está presente em cada ação econômica” ( Bourdieu, 2000b, p.13) e que a economia é enraizada em um sistema de crenças e valores, um ethos e uma visão moral do mundo, sistema que, de sua parte, é ligado a estruturas sociais e cognitivas de uma ordem social particular (2000a, p.23). A economia seria, assim, “um sistema de crenças incorporadas” ( Bourdieu, 2000b) e o espírito de cálculo e de previsão só apareceria como incontestável porque a “racionalização” é a atmosfera da qual se alimenta ( Bourdieu, 1979, p. 15).
Ao conceber a conduta econômica não como um dado ou um ponto de partida, mas uma construção histórica ( Bourdieu, 2017, p.12), o autor considera fundamental tomar por objeto “a economia das condições de produção e de reprodução dos agentes e das instituições de produção e de reprodução econômica, cultural e social” ( Bourdieu, 2000a, p.26). Na pesquisa sobre a Argélia, por exemplo, ele mostra que a atitude com relação ao futuro é muito diferente no que chama de “sociedade tradicional” e em sociedades capitalistas ( Swedberg, 2011, p.70). Para Bourdieu “A mira do futuro depende estritamente, em sua forma, e em sua modalidade, das potencialidades objetivas que são definidas para cada indivíduo por seu estatuto social e por suas condições materiais de existência”. Acrescenta, diante disso, que “O projeto mais individual nunca é senão um aspecto das esperanças estatísticas que estão associadas à classe” ( Bourdieu, 1979, p.81).
É com a noção de habitus que ele explica tal correlação entre probabilidades objetivas e esperanças subjetivas. Ela não seria destino cravado em pedra, nem resultado de um ajuste consciente das aspirações a uma avaliação exata das chances de sucesso, mas de disposições duráveis inculcadas pelas possibilidades e impossibilidades, liberdades e necessidades, facilidades e obstáculos inscritos nas condições objetivas, que engendram disposições objetivamente compatíveis com elas ( Bourdieu, 1980, p.90). À universalidade pressuposta das condutas racionais o autor opõe as “condutas razoáveis”, assim denominadas porque não seriam baseadas nem nas decisões da vontade consciente, nem nas determinações mecânicas de poderes exteriores, mas em disposições adquiridas através de aprendizagens sociais longamente confrontadas com as regularidades das condições objetivas ( Bourdieu, 2000a, p.20).
Sobre a crítica deste autor ao “economicismo”, Laval afirma que “a racionalidade supostamente universal da teoria da ação racional é apenas a teorização de uma racionalidade capitalista historicamente situada de um indivíduo socializado pelo mercado”. Em Bourdieu, continua Laval, “o capitalismo pressupõe uma ‘acumulação primitiva’ de crenças, virtudes e faculdades específicas que naturalizam e generalizam a maximização da conduta, que se torna então o verdadeiro princípio das práticas”. Em outras palavras, “o capitalismo supõe a acumulação original de disposições à acumulação”. Este “processo de inculcação” é “resultado de uma luta social e política cujo objetivo é justamente a construção de uma realidade social em que a acumulação é totalmente ‘antropologizada’, isto é, realizada no habitus” ( Laval, 2018, p.201-202, tradução livre).
Na mesma obra, Laval aproxima Bourdieu e Foucault - autores pensados mais frequentemente em suas diferenças que em suas semelhanças ou proximidades -, em um aspecto central à nossa argumentação: para ambos, a racionalidade e a economia capitalistas são frutos de uma construção política, institucional, normativa, simbólica e subjetiva ( Laval, 2018, p.252). Cada um à sua maneira, eles estabeleceram críticas às teorias econômicas criadas na Universidade de Chicago em meados do século XX. Enquanto, como vimos acima, Bourdieu se dedica à historicização das disposições econômicas que autores como Gary Becker considerariam universais, Foucault, colocando-se o desafio de “supor que os universais não existem” (2008, p.3), se debruça sobre a forma de governamentalidade implicada na noção de homo economicus subjacente à teoria do capital humano. Nela, a categoria “trabalho” seria substituída pela concepção de “capital-habilidade” ou “capital-competência” e o próprio trabalhador seria tido como o possuidor de um “capital”, aparecendo como uma espécie de empresa para si mesmo. Por ser ao mesmo tempo individualizante e globalizante, a governamentalidade neoliberal atrelaria a composição e o investimento em capital humano ao crescimento ou desenvolvimento dos países. Para Foucault, é para essa direção que se orientam as políticas econômicas, sociais, culturais e educacionais de todos os “países desenvolvidos”. Também é nos termos do “problema do capital humano” que “os problemas da economia do terceiro mundo” serão repensados ( Foucault, 2008, p.319).
Na esteira dos trabalhos foucaultianos, em Dardot e Laval (2010), a forma-empresa, a concorrência generalizada e a acumulação ilimitada conformariam uma “razão do mundo”, uma lógica que organizaria coerentemente discursos, práticas e aparatos de poder. O neoliberalismo significaria a implantação da lógica de mercado como uma lógica normativa generalizada, perpassando instâncias que vão desde o Estado até a subjetividade. A concepção de sociedade como uma empresa feita de outras empresas implicaria em uma nova “norma subjetiva”. Ela seria uma resposta às novas regras do mundo do trabalho, de acordo com as quais o peso da complexidade e da concorrência é transferido para os indivíduos. Responsabilizados por seu próprio desenvolvimento e controle, eles constituiriam um microcosmo em harmonia com o universo da empresa e com o macrocosmo do mercado global.
Partindo igualmente de Foucault, Brown (2015) aponta que administração contemporânea das populações ocorreria através de diversas práticas de economicização, privatização e financialização, inclusive de âmbitos não pensados anteriormente como econômicos. A autora sugere que
O objetivo constante e onipresente do capital humano, seja no tocante a estudar, fazer estágio, trabalhar, planejar a aposentadoria ou se reinventar em uma nova vida, é empreender, valorizar e aumentar sua classificação ou ranking. Nisto, ele espelha a mesma ordem existente para empresas, países, departamentos acadêmicos ou periódicos, universidades, mídias ou websites contemporâneos: empreendedorizar iniciativas, melhorar o posicionamento e o valor competitivo, maximizar classificações ou rankings. ( Brown, 2015, p.36, tradução livre).
A esse processo a autora associa ainda a ideia de “responsabilização”, também implicada na concepção do humano como capital. Especialmente como política social, a responsibilização aparece como “o ônus moral” do indivíduo, responsabilizado então por discernir e empreender as estratégias corretas de auto-investimento e empreendedorismo para prosperar e sobreviver. Ao condenar discursivamente a “dependência” e a “provisão coletiva da existência”, a “responsabilização” deixa o indivíduo como o único ator responsável. ( Brown, 2015, p.132).
Na análise do que chamam de “novo espírito do capitalismo”, Luc Boltanski e Éve Chiapello (2011) também apontam a ligação, a partir do final do século XX, entre a emergência de uma “sociedade por projetos” e um tipo de sujeito. As pessoas valorizadas no universo econômico (ou “selecionáveis”, para lembrarmos Weber) seriam aquelas que “se mostram abertas e flexíveis sempre que se trate de mudar de projeto e que conseguem adaptar-se permanentemente a novas circunstâncias” por meio do “capital pessoal, constituído pela soma de suas competências mobilizáveis” ( Boltanski e Chiapello, 2011, p.154). Auto-responsabilidade, auto-empreendedorismo, flexibilidade, autonomia, adaptação, empregabilidade e capacidade de conexão - por oposição à rigidez, falta de polivalência, busca por segurança ou autoridade - são os valores da “cidade por projetos”. É nesse novo sistema de valores e princípios que as pessoas se apoiariam para “fazer julgamentos, distinguir comportamentos, legitimar e preencher posições de poder ( Boltanski e Chiapello, 2011, p.153).
Há várias diferenças, algumas inconciliáveis, entre as obras desses heterogêneos legatários de Weber. Contudo, para os propósitos desse artigo, trabalharemos com o que eles têm em comum no que diz respeito à nossa problemática. Todas eles sustentam que o homo economicus, o sujeito do capital humano ou pessoa que se orienta por projetos são construtos históricos, que nada têm de universais. Enquanto Foucault e Boltanski sustentam a historicidade das formas de subjetivação, percebendo-a como uma injunção ou racionalidade generalizada do contexto contemporâneo, Bourdieu, ao mesmo tempo que historiciza as disposições ao cálculo concebido como racional, o percebe como atributo diferencial de classes sociais. Nesse sentido específico, esses entendimentos podem ser coadunados e serão úteis na sequência 4.
“Filantropia corporativa” e reformas na educação pública brasileira
O último censo do Grupo de Institutos e Fundações Empresariais (GIFE) – organização que reúne as mais importantes fundações e “institutos” empresariais no país – mostra que a educação constitui-se como o principal alvo de “investimento social privado” no Brasil: 84% das organizações respondentes investem na área de educação, número que chega a 91,7% entre as que “investiram” mais de 50 milhões de reais em 2016 ( GIFE, 2017). Esse fenômeno não é especificidade brasileira. Existe um corpo substancial de literatura que indica que a chamada “corporate philanthropy” assume hoje posição crucial na definição de políticas e reformas educacionais tanto nacional quanto globalmente ( Saltman, 2009; Ball, 2008, 2010, 2012, Reckhow, 2013; Reckhow e Snyder, 2014; Au e Ferrare, 2015; Hess e Henig, 2015, Freitas, 2012; Peroni e Caetano, 2015; Tompkins-Stange, 2016; Gunter et al, 2017 ).
Por aqui, tais agentes participam de um conjunto recente de mudanças, como a instituição da “Base Nacional Comum Curricular” ( Michetti, no prelo), a “Reformulação do Ensino Médio” e a criação de programas de “Educação Integral”, os quais nos interessam centralmente nesse artigo. Embora a atuação pública de elites econômicas também seja realizada de forma independente, com iniciativas pontuais, o mais comum hoje é que organizações familiares e empresariais ajam em “parceria” com a administração pública. Junto a instâncias legislativas e executivas do governo federal, buscam direcionar reformas educacionais de âmbito nacional, mas também atuam no bojo de secretarias estaduais e municipais de educação. Através de várias frentes, influenciam a agenda pública, tomam parte na formulação de leis e políticas e, ainda, participam da implementação das políticas, inclusive daquelas de cuja formulação se ocupam.
Uma dessas frentes são os programas de “Educação Integral”, implementados no país há anos por entes públicos e organizações privadas em conjunto ( Urbini, 2015), dando a ver aspectos importantes das relações entre esses tipos de atores, assim como as disputas e oposições que emergem em face dessas relações. Embora já ocorressem anteriormente de forma circunscrita, um condicionante da ampliação de tais programas é o Plano Nacional de Educação (2014-2024) (Lei nº 13.005/2014), que estatuiu como uma de suas metas “oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, cinquenta por cento das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, vinte e cinco por cento dos(as) alunos(as) da educação básica” ( BRASIL, 2014, p.59). Sublinhe-se que a construção do Plano já contou, entre outros atores, com “organizações da sociedade civil e think thanks” vinculados ao “setor privado na área educacional” ( BRASIL, 2014, p.19).
Conforme a distribuição federativa da educação no Brasil, municípios e Estados dividem a responsabilidade pelas duas etapas do Ensino Fundamental, os Estados respondem pelo Ensino Médio e a União pelo Ensino Superior, seja diretamente, no caso das universidades públicas federais, seja no papel de regu- lação. Logo, o PNE e suas prescrições para a educação integral incidirão sobre secretarias municipais e estaduais de educação. No entanto, como a aprovação da lei não garante as condições de sua implementação pelos entes federativos, as organizações privadas galgam uma posição de destaque no processo. Elas contam com o que poderíamos chamar, com Wagner (2011), de “capital gerencial”, tendo “benchmarks”, “boas práticas”, “modelos”, “pilotos”, “cartilhas”, “consultorias”, “tecnologias”, “assessorias”, “formação”, “treinamentos”, “capacitação” a oferecer a órgãos públicos que precisam se adequar à lei sem necessariamente ter meios suficientes para isso. Como também é apontado por Ball (2009) sobre outros países, essa é uma das principais portas de entrada para a “filantropia corporativa” no espaço da educação pública.
Educação integral e o caso do Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE)
No Brasil, a ideia de “educação integral” acumula um histórico de discussões permeado por diferentes concepções e projetos ( Cavalieri, 2002, 2010; Coelho, 2009; Silva, 2014; Brandão, 2009; Brasil, 2009). Conforme sumariza Cavalieri (2009, p.51), “Na sociedade brasileira, as justificativas correntes para a ampliação do tempo escolar estão baseadas tanto em concepções autoritárias ou assistencialistas como em concepções democráticas ou que se pretendem emancipatórias”. Gramáticas distintas se entremeiam na teia discursiva da educação integral, como a linguagem do “direito” a mais tempo de escola, a ideia de redução de desigualdades e o argumento que vincula educação a desenvolvimento econômico, dado que, a partir do final do século XX, diretrizes de organismos internacionais atribuem ao âmbito educacional uma posição estratégica na competitividade de países ( Miranda e Santos, 2012). Com isso, a temática suscita a discussão sobre papel social da escola e o significado da ação educativa. Questiona-se a incorporação, pela escola, da “função de assistência social”, pois o “contraturno” teria lugar na reprodução das famílias de classe trabalhadora, cujos filhos precisam ficar na escola durante toda a jornada de trabalho, sendo associado inclusive à “prevenção de risco social” (Miranda e Santos, 2012). Discute-se também se o objetivo primordial é a preparação para o mercado de trabalho ou a formação para a cidadania ( Fonseca, 2009).
“Tema intermitente” entre nós, ele se faz presente de forma “espasmódica” em experiências como o Centro Educacional Carneiro Ribeiro, implantado por Anísio Teixeira em Salvador nos anos 1950, e os Cieps instituídos por Darcy Ribeiro nos anos 1980 e 1990, no Rio de Janeiro ( Coelho, 2009). O aumento do tempo de escola apareceu como intenção no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº9.394/96) e, nos anos 2000, surgiram programas como o “Mais Educação”, cuja concepção envolvia os ministérios da Educação, da Cultura, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Esporte, com vistas a “fomentar a educação integral de crianças, adolescentes e jovens, por meio de atividades sócio-educativas no contraturno escolar” (Cavalieri, 2010). Além disso, alguns governos estaduais e municipais já incorporavam o conceito de educação integral em iniciativas pontuais, o que ocorre também em ações isoladas ligadas a organizações de assistência social de base territorial, em especial na periferia de grandes cidades. Sublinhe-se ainda que muitas escolas privadas também oferecem o serviço de educação em tempo integral no país. Contudo, é quando aparece como meta no PNE que ela adquire preeminência no sistema de ensino nacional, o que tem sido estimulado pelas demais reformas em andamento. Institutos e fundações privados atuantes no âmbito da educação pública brasileira aparecerão como atores centrais nesse processo.
O caso do programa de “educação integral” fomentado pelo Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE) é heurístico para a compreensão de como agentes oriundos da esfera econômica privada se transformam em atores públicos que, com suas concepções de mundo, buscam reformar a educação no país com vistas a adequar o ethos e as disposições de gerações futuras ao que concebem como sucesso econômico.
Sediado em Recife-PE, o ICE se estatui como “uma entidade sem fins econômicos”, criada em 2003 “por um grupo de empresários motivados a conceber um novo modelo de escola”. Trata-se de uma organização privada que transformou um projeto específico de ensino em tempo integral em uma política pública que se espalha pelo país por meio de “novos arranjos institucionais” ou “parcerias” entre agentes privados e públicos. A narrativa de origem da instituição dá a ver a importância do acúmulo de capital econômico, social e político de seus fundadores para a implementação e disseminação do modelo. De acordo com tal narrativa, Marcos Magalhães, ex-presidente da Philips América Latina, resolveu restaurar a escola que havia frequentado, o “Colégio Pernambucano”, estabelecimento em que estudaram figuras como Ariano Suassuna, Assis Chateaubriand, Clarice Lispector, Celso Furtado e Epitácio Pessoa. Depois da reforma do prédio, quando “o corpo estava cuidado”, “fazia-se necessário, então, cuidar da alma da escola”. Tal iniciativa constituiria “uma nova forma de atuação do setor privado, incluindo os aspectos pedagógicos e de gestão, além de uma co-participação financeira junto ao Governo do Estado” 5.
Como é comum na auto apresentação de organizações desse tipo, divulga-se uma “linha do tempo”. Ela nos informa sobre a celeridade com que uma ideia “entre amigos” se transforma em uma política pública dentro da secretaria estadual de educação de Pernambuco (SEDUC) e, na sequência, em um modelo em disseminação pelo país. A mobilização dos “colegas empresários” teria começado em 2002. No mesmo ano “nasce o PROCENTRO - organismo criado dentro da SEDUC para conceber e gerenciar a política pública relativa à criação dos CEE - Centros de Ensino Experimental de Pernambuco”. Em 2003, “São criados o PROCENTRO, por decreto, e o ICE e seu estatuto”. Em 2004, “Foi concebida a Avaliação de Desempenho e realizada sua primeira aplicação junto aos professores e concessão do bônus por produtividade”. Em 2005 foi “publicada a Lei que institui o Programa como política pública em PE” 6. Nas palavras do fundador e presidente do ICE,
Do ponto de vista institucional, o PROCENTRO surge de uma parceria entre o setor público e o setor privado, em regime de colaboração e co-responsabilidade. O setor privado, por meio do ICE, aporta uma filosofia de trabalho, uma proposta pedagógica, uma estratégia gerencial e de recursos para o co-financiamento parcial de cada escola – denominada de Centro de Ensino Experimental. O estado, por sua vez, cria uma instituição, o PROCENTRO, para expandir a proposta e gerenciar as escolas. Para viabilizar o novo empreendimento e assegurar a sua sustentação em longo prazo, foram necessárias alterações de caráter legal e normativo. Isso garante não apenas segurança jurídica para a parceria e para os atores, mas dá uma base maior que permite a estabilidade e a continuidade do Programa com a mudança de governos. ( Magalhães, 2008, p.19).
Com a arquitetura institucional e legal rapidamente montada, o processo de expansão do programa se acelera e teria sido mantido a despeito da troca de governos, supostamente em razão do “reconhecimento ao papel de benchmarking” das escolas, transformadas em “escolas-tutoras na expansão do Programa e na transferência do conhecimento produzido pelo ICE nas escolas em Pernambuco”. Surgem então publicações sobre a “experiência”, bem como os primeiros “Manuais Operacionais do Modelo Escolas em Tempo Integral do ICE”.
A partir de 2009, a expansão alcança outros Estados e, entre 2004 e 2018, o modelo passa a incluir Ensino fundamental I, fundamental II, médio e profissionalizante 7. “Parcerias institucionais” com organizações empresariais são formalizadas e atualmente, os “parceiros estratégicos” são o Instituto Natura e o Instituto Sonho Grande. Os “investidores” são Instituto Natura, Instituto Sonho Grande, Espírito Santo em Ação, Itaú BBA, Fiat Chrysler, Jeep, Trevo Tecnologia Social e EMS. Os “parceiros técnicos” são o Instituto Qualidade no Ensino (IQE), presidido pelo próprio Marcos Magalhães, e o STEMBrasil, subsidiária do World Fund for Education no país. Por meio da atuação dessa rede multiescalar 8, no momento de escrita desse artigo, o modelo oriundo do Recife se fazia presente em 19 estados da federação 9.
O projeto ganha força ao concatenar-se com as exigências colocadas pelo PNE a partir de 2014, como apontamos acima, e o próprio ICE mobiliza o Plano como suporte de sua atuação pública: “Alinhado à Meta 6º do Plano Nacional de Educação – PNE, o ICE apoia os governos, nos âmbitos estadual e municipal, na constituição de redes de ensino para oferta de escolas em tempo integral 10.
Embora a organização continue ativa, sua “linha do tempo” divulgada vai até 2015. Em 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT), a cúpula dos ministérios foi alterada. Ao assumir a presidência, Michel Temer (PMDB) indicou como Ministro da Educação o até então coordenador do “Comitê Impeachment Já”, José Mendonça Filho (DEM), ex-governador de Pernambuco. O MEC passa a ser encabeçado por um político próximo ao grupo propulsor do “ensino integral” e em sua gestão foram instituídas as controversas Base Nacional Comum Curricular do ensino fundamental e Reformulação do Ensino Médio.
Assim, o desenho dos programas de educação integral é composto por organizações privadas locais/nacionais (especialmente ICE, Instituto Sonho Grande, Instituto Natura, bem como entidades anexas menores) e por instâncias do poder executivo (MEC, secretarias estaduais e municipais) 11. Nessas composições multiescalares, profissionais recrutados e treinados por tais institutos e organizações privadas anexas passam a integrar as secretarias de educação, frequentemente em “comissões especiais de educação integral”. A elas cabe adequar as escolas que passam a ser “integrais” aos modelos derivados do ICE 12. Embora o arranjo inicial do programa previsse “coparticipação” financeira pública e privada, o custeio é em grande parte público. Entretanto, o modelo disseminado pelo país por meio da atuação dos “parceiros técnicos” e “investidores” é derivado do “benchmark” do ICE.
Os modelos empresariais para a educação pública e o “papel educativo do empresário”
De acordo com o modelo em disseminação, quando uma escola é convertida ao modelo, um “plano de gestão” e um “projeto pedagógico” são implantados simultaneamente. Ambos são derivados de formas de gestão empresariais já consolidadas, mas apresentadas como novidades para o serviço público 13. Segundo o fundador do ICE, “Do ponto de vista gerencial, tanto o PROCENTRO quanto os Centros adotam padrões gerenciais trazidos do mundo empresarial, mas que vêm se mostrando adequados ao funcionamento dos Centros” (Magalhães, 2008, p.19). Ele afirma ainda que
Uma vez criados, os Centros são orientados pelo PROCENTRO dentro de uma filosofia gerencial própria do Programa. O princípio básico é o do PDCA. Em uma forma mais elaborada, a filosofia se baseou, originalmente, na tecnologia de gestão desenvolvida pelo grupo Odebrecht – TEO. Na verdade, poucas mudanças foram necessárias à TEO, haja vista ser mais uma tomada de consciência do que um manual de métodos e técnicas. A tecnologia de gestão do PROCENTRO foi denominada de Tese – Tecnologia Empresarial Socioeducacional. A Tese é versátil. Trata-se de um instrumento de gestão eficaz à medida que o ciclo de planejamento é simples e a projeção dos resultados esperados e respectivos indicadores geram relatórios inteligentes, permitindo o acompanhamento por todos os parceiros internos e externos. (Magalhães, 2008, p.31).
Dada a “versatilidade” atribuída ao “instrumento de gestão”, ele serviria para escolas, “gestores”, professores e para cada um dos estudantes, os quais lidam com “planos, compromissos, metas, resultados, avaliação, incentivos, delegação de responsabilidade e responsabilização”, o que, estatui Magalhães (2008, p.20), “não é muito diferente do que se observa em escolas privadas”.
O ex-presidente da Philips pretende assim compartilhar seus valores, princípios e visões, de forma a estimular uma mesma “tomada de consciência”:
A Tese também constitui um excelente instrumento para desenvolver o protagonismo, sobretudo pela ênfase em princípios e valores, a visão correta de uma empresa e o papel educativo do empresário. Utilizando a Tese como ferramenta de planejamento, a elaboração do Projeto de Vida torna-se comparável à elaboração do Plano de Ação da própria escola: educandos, educadores e gestores utilizam-se da mesma linguagem e dos mesmos instrumentos para planejar, gerenciar e avaliar suas atividades. Os conceitos, instrumentos e operacionalização dessa tecnologia são visíveis nos documentos, na linguagem, nas posturas e nas formas de ação dos integrantes dos Centros, inclusive nos alunos. (Magalhães, 2008, p.31-32).
A busca por difundir entre estudantes de escolas públicas sua própria concepção de mundo é baseada, portanto, no “papel educativo” auto-atribuído ao empresariado:
Qual o nosso papel? É o que eu chamo de fazer para influir. Isso é o mote que me parece ser a melhor forma. Não apenas fazermos reuniões e discussões. O que nós sabemos fazer como empresários é gestão, nós sabemos gerir processos. Sabemos o ciclo PDCA. A gente faz isso todos os dias. No setor público, com as poucas exceções, de praxe, o planejamento é ruim, a execução é terrível, não se age em cima do valor medido para melhorar, não se tem plano de ação. O papel empresarial, portanto, dentro da Ética da Co-responsabilidade, vai muito além de apenas contribuir financeiramente. É, na realidade, um agente da transformação, desafiando paradigmas e trazendo para o setor público mais eficiência na gestão dos processos. (Magalhães, 2008, p.19-20).
Nessa perspectiva, a tal agente transformador caberia ensinar um modo de encarar a vida imaginado como bem-sucedido, apto ao sucesso.
O bom desempenho no mundo econômico aparece como o lastro da iniciativa pedagógica (auto) imputada à figura do empresário. O capital gerencial é operado como capital simbólico. Nos programas de educação integral em análise, ele aparece tanto como um recurso que elites empresariais teriam a compartilhar com estudantes do ensino público quanto como o fundamento da legitimidade do lugar pedagógico do empresariado. Conforme também aponta Ball ao analisar processo semelhante em outros lugares do mundo, o sucesso financeiro de alguns empresários é uma fonte de autoridade e legitimidade nesse processo, no qual novos valores e modos de ação são justificados e legitimados e novas formas de autoridade moral são estabelecidas, em detrimento de outras ( Ball, 2008). Novas narrativas sobre o que conta como “boa educação” são articuladas e validadas, em especial narrativas de soluções empresariais e empreendedoras para problemas sociais e educacionais ( Ball, 2010).
A prescrição da vida como projeto
No modelo de educação integral em expansão pelo país, tais concepções sobre o “sucesso” se opõem a diagnósticos sobre o “fracasso”. A partir de “constatações possíveis sobre a infância e juventude”, a saber, “baixos níveis de aprendizado”, de “ambição em relação ao futuro” e “de autoestima, autocontrole e autoconfiança”, além de “limitado repertório cultural” e “repertório moral permeado pela imposição da sobrevivência física”, o ICE propõe um “novo jeito de ver, entender e cuidar da educação”. Para fazer frente ao “quadro dramático” 14, propõe-se:
Do ponto de vista pedagógico, as principais inovações do programa incluem: A EPV – Educação para Valores, voltada para o aprimoramento do educando como pessoa humana, visando formar o jovem como fonte de iniciativa (ação), liberdade (opção) e compromisso (responsabilidade), de modo a capacitá-lo para o exercício da autonomia. O Protagonismo Juvenil, visando formar o jovem por meio de práticas e vivências, na escola e na comunidade, que o levem a atuar como parte da solução, e não como parte do problema, pelo exercício sistemático da cidadania ativa, construtiva, criativa e solidária. A Cultura da Trabalhabilidade, visando capacitar o jovem a compreender, inserir-se e atuar no novo mundo do trabalho, elaborando o plano de vida, plano de carreira e programa de ação para seu desenvolvimento acadêmico e profissional. O Empreendedorismo Juvenil, visando desenvolver sua capacidade de autogestão, co-gestão e heterogestão de seu potencial, na transformação de suas visões em realidade. O Associativismo Juvenil, visando proporcionar o surgimento de múltiplas e variadas formas de auto-organização entre os jovens com finalidades sociais, esportivas, ambientais, etc. A Presença Educativa, visando à ampliação e à qualificação das relações entre adultos e jovens na comunidade educativa e fora dela. A Educação Geral e Certificação Profissional, visando ao desenvolvimento de competências para continuar aprendendo, à preparação e à orientação básica para o mundo do trabalho. A Avaliação Sistemática como estratégia para adequar a prática pedagógica às reais necessidades do aluno. Práticas e Vivências que visam desenvolver valores e competências pessoais e sociais necessárias à integração do projeto individual ao projeto da sociedade em que atua. (Magalhães, 2008, p.21-22).
A noção de “projeto de vida” aparece como central na urdidura do modelo, como fica claro na própria definição de “educação integral” fornecida pelo fundador e presidente do ICE: “O conceito de educação integral é materializado pela presença de professores e alunos em horário integral (das 7h30 às 17 horas) no Centro, bem como pelo Projeto de Vida de cada aluno e pela ênfase no protagonismo e empreendedorismo”. (Magalhães, 2008, p.21). Nos termos do ICE,
O Projeto de Vida reside no “coração” do projeto escolar da Escola da Escolha. Ele é o seu eixo, sua centralidade e sua razão de existir. É fruto do foco e da conjugação de todos os esforços da equipe escolar. É nele que o currículo e a prática pedagógica realizam o seu sentido, no aspecto formativo e contributivo, na vida do jovem. Projeto de Vida é a solução central proposta pelo ICE para atribuir sentido e significado ao projeto escolar em resposta aos desafios advindos do mundo contemporâneo sob o ponto de vista da formação dos jovens. Na Escola da Escolha, os estudantes são levados a refletir sobre os seus sonhos, suas ambições e aquilo que desejam para as suas vidas, onde almejam chegar e que pessoas que pretendem ser 15.
Por oposição ao “repertório moral” “limitado pela imposição da sobrevivência física”, aparecem noções como ambição, sonhos, escolhas... Na apresentação da “Escola da Escolha”, nome dado ao programa pelo ICE, afirma-se que
Não se trata de definir carreira. Trata-se, antes, de definir: quem eles querem ser; que valores querem construir e instituir em sua vida como fundamentais; que conhecimentos esperam ter constituído de maneira a ter ampliado e diversificado o seu repertório e que, no conjunto, o apoiarão na tomada de decisões sobre os diversos domínios de suas vidas. Trata-se portanto, de pensar sobre o homem/mulher que se deseja ser, com todas as suas escolhas, da qual também faz parte a profissional 16.
Querer ser, desejar ser, esperar ter, tomada de decisões, escolhas... O léxico da “escolha” dá o tom do programa iniciado com o ICE 17:
Protagonista de seu Projeto de Vida, é o jovem que escolhe o seu próprio caminho. A Escola da Escolha contextualiza as opções feitas pelo jovem quanto ao seu estilo de vida, sua participação na sociedade e sua carreira profissional. Porém, é papel da comunidade escolar e daquela do entorno da escola, incluindo a família, apoiar o estudante na sua atuação diante dos desafios advindos dessas escolhas. Este interesse coletivo se manifesta em uma relação de corresponsabilidade em sua implantação e desenvolvimento, onde o ICE mobiliza e potencializa diferentes atores. No Modelo em que acreditamos, a escola é o lugar onde são providas condições fundamentais para a formação do jovem: uma formação acadêmica de excelência, uma sólida formação em valores e um desenvolvimento de competências essenciais para atuar diante dos desafios trazidos pelo Século XXI. Para além das competências cognitivas, a formação integral é consequência de um currículo orientado e sustentado pelo aprendizado socioemocional. Para o ICE, a combinação entre conhecimento e atitude será decisiva no sucesso do jovem, nas distintas dimensões de sua vida. (ICE, s/d, p.9).
A gramática que perpassa as iniciativas reformadoras gira em torno do ideal de indivíduo da escolha racional, presente tanto em teorias econômicas quanto em uma espécie de senso comum economicizante. Os empresários reformadores parecem assumir a teoria do ator racional, donde a concentração na ideia de “projeto”, que aparece como uma pedagogia da racionalidade. Trata-se de uma racionalidade apropriada aos tempos do humano como capital, ou seja, baseada não apenas em “competências cognitivas”, mas também em “aprendizado socioemocional”, não apenas em “conhecimento”, mas também em “atitudes” e “valores”. Logo, o homo economicus não é visto por eles como um universal já realizado, mas como um universal potencial, a ser concretizado pela educação, concebida como veículo do nomos do sucesso. Crianças e jovens que frequentam a escola pública poderiam, assim, ser ensinados a se ocupar da gestão da própria vida como empreendimento.
As reformas que temos em tela se apresentam, portanto, como tentativas de adequar as subjetividades ao mundo do trabalho “flexível”, apresentado como inelutável. Se, em um registro, a noção de escolha é oposta à de necessidade, em outro ela é seu par correlato: autonomia e responsabilização são colocadas como “exigências” do presente, “competências essenciais para atuar diante dos desafios trazidos pelo Século XXI”. Ao endossar o vínculo entre educação e desenvolvimento econômico e social, o livreto institucional de apresentação do ICE ressalta a ideia de “demandas” e “exigências”:
As novas demandas da sociedade exigem o repensar da educação e das escolas. Os paradigmas que têm sustentado as práticas educacionais não dão conta de propiciar um desenvolvimento individual e social equânime. Por outro lado, a educação se confirma como fator de desenvolvimento econômico e social de um país, devendo estar atenta às exigências da sociedade do conhecimento, colocando-se lado a lado com o progresso, acompanhando os avanços científicos e tecnológicos. Seu objetivo deve ser formar pessoas dinâmicas, criativas, sensíveis, propositivas, colaborativas, que estejam devidamente habilitadas para enfrentar um mundo em processo acelerado de mudanças. (ICE, s/d, p.6).
Sobre isso, lembremos que Foucault (2008) aponta que a teoria do capital humano, baseada na premissa do ator racional, é um saber ligado a uma forma de exercício do poder ou de governamentalidade. Para o autor, o homo economicus é aquele que aceita a realidade, que a ela se adapta. Como acrescenta Laval (2018), o empreendedor de si é um ser eminentemente governável, pois se autogoverna pelas regras do jogo. Por isso, ele não precisaria de ajudas ou subvenções públicas, pois seria adaptável ao mercado concorrencial. É nesse panorama que a ideia da vida como projeto ganha centralidade.
A produção em escala de homo economicus?
O diagnóstico que embasa boa parte das reformas educacionais em andamento no Brasil é o de que as desigualdades escolares são um problema no país. A partir desse diagnóstico, elites empresariais têm atuado para aumentar a “qualidade da educação pública” e, com isso, a “equidade” da sociedade brasileira. Elas valorizam a educação porque a veem como uma representação da igualdade de oportunidades ( Reis, 2005). Nessa concepção, oportunidades educacionais semelhantes acertariam o terreno para a economia de mercado, de modo que o mérito poderia ser um elemento universalizante a lastrear a desigualdade dos resultados da disputa concorrencial, isto é, a sustentar a narrativa de sucesso ou a “teodicéia do privilégio” das classes dominantes (Weber apud Bourdieu, 2004, p.200). Contudo, se até a virada do século as elites brasileiras se mostravam reticentes ao papel das “organizações não-governamentais” em áreas ligadas ao combate à pobreza e à desigualdade, cuja responsabilidade era arrogada por elas ao Estado ( Reis, 2005), recentemente elites econômicas têm buscado, por meio de seus institutos e fundações, influir diretamente na educação pública no país, especialmente atuando junto ao Estado.
Em Boltanski (2009, p.216), o que define a classe dominante é o fato de que ela tem uma relação privilegiada com as possibilidades de ação. Ela congregaria os “responsáveis”, aqueles cuja posição possibilita colocar em curso uma grande gama de ações que podem modificar não apenas sua própria vida, mas também a de muita gente. Isso porque ela pode ter uma relação ao mesmo tempo ativa e flexível com as regras de construção e definição da realidade. Por sua vez, os dominados não tomariam parte na consecução das regras, que seriam fixas, rígidas e mandatórias para eles, uma vez que estariam apartados das instâncias de sua construção.
Assim, as elites se veem em uma posição de ação, como responsáveis pelos demais. Elas se atribuem a responsabilidade sobre a consecução das mudanças, que realizam a partir de condições objetivas de possibilidade e de determinado substrato simbólico. No caso que analisamos, agentes que concentram capitais dedicam-se a projetos de reforma das disposições dos estudantes de escolas públicas, que são vistos como desprovidos do “espírito do capitalismo” adequado tanto ao sucesso individual quanto ao desenvolvimento do país. Nessa direção, nosso corpus de análise apresenta novidades com relação ao estudo de Reis (2005, p.19) sobre a ausência, nas percepções de elites brasileiras, da conexão entre a qualidade da força de trabalho e as taxas de crescimento econômico do país.
Contudo, ainda que haja interesses econômicos em sua atuação - como recorrentemente denunciado em trabalhos sobre o tema -, eles são mediados por um conjunto de valores. As iniciativas reformadoras se dão pelo aumento da produtividade do trabalho no país e das transferências de recursos públicos para a gerência privada, mas também porque essas elites querem apresentar “soluções”, querem “fazer a diferença”. Suas propostas advêm, portanto, da “visão” de agentes bem posicionados no universo econômico, que atribuem o sucesso de seus empreendimentos e vidas antes a um tipo de racionalidade ou “consciência” do que a condições objetivas. As soluções que vislumbram para outros indivíduos e para o país - o termo “classe” raramente figura no léxico empregado - passam pela disseminação dessa matriz de administração da vida.
Com a noção de projeto de vida, os reformadores educacionais buscam dotar a escola pública de “sentido”. Já nas análises weberianas sobre o espírito do capitalismo aprendemos que sentido subjetivo se associa à motivação para o trabalho e à conduta econômica de forma mais geral. Os modelos empresariais de educação integral buscam incidir sobre o sentido da vida especialmente dos mais pobres, cuja pobreza é, em boa medida, pensada como consequência da falta de projeto de vida ou da suposta inabilidade de encarar a vida como projeto. No limite, trata-se de uma iniciativa de reforma das consciências para a criação de disposições próprias ao homo economicus, responsável por desenvolver a si mesmo e a sociedade em que vive.
Por um lado, tal voluntarismo idealista entende que as disposições econômicas são oriundas de uma construção, donde suas tentativas de construí-las. Por outro, negligencia as condições sociais de seu engendramento, donde pretender transformar palavras em coisas, como se - para retomarmos o depoimento de abertura - o ato de escrever pudesse realizar sonhos e como se sonhos se escrevessem em tábula rasa. A expectativa de que a prescrição de uma mudança nas visões de mundo possa alterar as divisões do mundo ignora a vinculação entre realidade subjetiva e posição objetiva. Isso porque atribui o “sucesso” à vontade racionalmente executada, a ser estimulada pedagogicamente. É assim que “projeto de vida” pode ser mais uma disciplina da “parte diversificada” do currículo das escolas em tempo integral que se espalham pelo país. A sociologia econômica nos ensina, contudo, que as disposições são derivadas da congruência entre socialização cotidiana, formação escolar e condições objetivas de realização.
Logo, os programas de educação integral que temos em tela se inserem no contexto de uma racionalidade mais ampla, chamada de neoliberal na análise foucaultiana, que produziria, de forma generalizada, um certo tipo de sujeito, o empreendedor de si. Na mesma direção, Dardot e Laval (2010) denotam que a forma-empresa da acumulação ilimitada de capital é a norma geral da subjetivação neoliberal. Contudo, o próprio Laval (2018, p.125-126) indica que Foucault não teria atentado devidamente à produção neoliberal da desigualdade e ressalta que o modelo do empreendedor de si, colocado em situação de concorrência, é um fator principal das diferenças sociais. Sugere também que a competência de acumular capital humano liga-se a dispositivos múltiplos de formação e socialização, aventando ainda que as transformações ocorridas nos sistemas educativos nas últimas décadas são testemunha disso (2018, p.53-54).
Acrescentamos, com Bourdieu, que os próprios dispositivos de socialização podem estar ligados à produção de desigualdades. Nosso corpus permite perceber que os programas que analisamos carregam marcas de uma visão de mundo específica, que se quer, porém, como universal ou ao menos universalizante. Ainda que seja característica de uma época, ela também tem artífices privilegiados. Para estes, tal racionalidade é o espírito que dota de sentido a sua prática, a lente com a qual enxergam ou narram a própria vida. Trata-se de uma racionalidade permeada por valores morais que embasam percepções relacionais de classe, como apontado por Lamont e Molnar (2002).
Diante disso, é relevante lembrar, com Bourdieu (2000a), que o homo economicus, se existe, não é uma entidade universal. Além de histórico, ele é marcado também por dinâmicas de classe. Para o autor (2016, p.608), o nomos econômico é o discurso poderoso, o discurso dos poderosos, dos quem têm o poder de realizar suas visões, as quais são baseadas em divisões sociais reais. Na pedagogia do homo economicus que toma forma nos modelos empresariais de educação integral, há aqueles que se atribuem o desenho das políticas e dos currículos e aqueles que são pensados como aprendizes de um ethos enquanto nomos.
Se a economia é um sistema de crenças, ela pode ser tanto um “espírito” compartilhado quanto uma religião de conversão. Nossa análise mostrou que ela conta com agentes de conversão em busca de agentes a serem convertidos. Contudo, é curioso que os missionários queiram ensinar, a partir de sua posição de segurança objetiva e subjetiva, a flexibilidade e a capacidade de adaptação justamente em um país onde a “flexibilidade” dos mais vulneráveis diante das incertezas da vida é a regra. Talvez a ausência de “projeto” - se existe - se deva mais a uma postura razoável diante da configuração geral do mundo do trabalho atual e das situações reais de precariedade e vulnerabilidade do que a um suposto déficit de disposições econômicas racionais. De duas uma, ou a pedagogia do homo economicus aspira ao milagre da transubstanciação das disposições ou ensina a missa ao vigário.
Referências
AU, W. ; FERRARE, J. (eds). 2015. Mapping Corporate Education Reform. Power and Policy Networks in the Neoliberal State. New York, Routledge, 232p.
BALL, S. 2009. Privatising education, privatising education policy, privatising educational research: network governance and the ‘competition state’. Journal of Education Policy, 24 (1): 83-99. https://doi.org/10.1080/02680930802419474.
BALL, S. 2010. New states, new governance and new education policy. In: M. APPLE.; BALL, S. and L.A. GANDIN [eds]. The Routledge International Handbook of the Sociology of Education. London and New York, Routledge, 430p.
BALL, S. 2008. New Philanthropy, New Networks and New Governance in Education. Political Studies, 56: 747-765. https://doi.org/10.1111/j.1467-9248.2008.00722.x
BALL, S. 2012. Global Education Inc.: New Policy Networks and the Neoliberal Imaginary. New York, Routledge, 170p.
BENNETT, T. 2010. Culture, power, knowledge. Between Foucault and Bourdieu. In: SILVA, E.; WARDE, A. [eds]. Cultural Analysis and Bourdieu’s Legacy: Settling accounts and developing Alternatives. New York; Londres: Routledge, 182p.
BOLTANSKI, L. 2009. De la critique. Précis de sociologie de l’émancipation. Paris, Gallimard. 294p.
BOLTANSKI, L.; CHIAPELLO, É. 2011. Le nouvel esprit du capitalisme. Paris, Gallimard, 2011. 971p.
BOLTANSKI, L.; THÉVENOT, L. 1991. De la justification. Les économies de la grandeur. Paris, Gallimard, 496p.
BONNELL, V.; HUNT, L. 1999. Introduction. In: BONNELL, V.; HUNT, L (eds). Beyond the Cultural Turn: New Directions in the Study of Society and Culture. Berkeley: Los Angeles: University of California Press, 350p.
BOURDIEU, P. 2017. Anthropologie économique. Cours au Collège de France (1983-1984). Paris, Seuil, 352p.
BOURDIEU, P. 2004. A produção da crença. Contribuição para uma teoria dos bens simbólicos. São Paulo, Zouk, 219p.
BOURDIEU, P. 2000a. Les structures sociales de l’économie. Paris, Seuil, 289p.
BOURDIEU, P. 2016. Sociologie Générale. Cours au Collège de France (1983-1986). Vol.2. Paris, Seuil, 1216p.
BOURDIEU, P. 2015. Le bal des célibataires. La crise de la société paysanne en Béarn. Paris, Points, 288p.
BOURDIEU, P. 1980. Le sens pratique. Paris, Minuit, 475p.
BOURDIEU, P. 2000b. Making the economic habitus: Algerian workers revisited. Ethnography, 1 (1): 17-41.
BOURDIEU, P. 1979. O desencantamento do mundo. Estruturas econômicas e estruturas temporais. São Paulo, Perspectiva, 135p.
BOURDIEU, P. ; DARBEL, A. ; RIVET, J.P. ; SEIBEL, C. 1963. Travail et traveilleurs en Algérie. Paris, Mouton & Co, 566p.
BOURDIEU, P. ; SAYAD, A. 1964. Le déracinement: La crise de l’agriculture traditionelle en Algérie. Paris, Minuit, 220 p.
BRANDÃO, Z. 2009. Escola de tempo integral e cidadania escolar. Em Aberto, 22 (80): 97-108. : http://dx.doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.21i80.%25p.
BRASIL. 2009 . Educação integral: texto referência para o debate nacional. Brasília: MEC, SECAD, 52 p.
BRASIL. 2014 . Plano Nacional de Educação 2014-2024: Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. Brasília :Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 86 p.
BROWN, W. 2015. Undoing the Demos. Neoliberalism’s Stealth Revolution. New York, Zone Books, 296p.
CALLEWAERT, S. 2006. Bourdieu, Critic of Foucault The Case of Empirical Social Science against Double-Game-Philosophy. Theory, Culture & Society, 23(6): 73–98. https://doi.org/10.1177/0263276406069776.
CALLON, M. 1998. The Laws of the Markets. Oxford, Blackwell, 288p.
CAVALIERE, A. M. 2010. Anísio Teixeira e a Educação Integral. Paidéia, 20 (46): 249-259. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-863X2010000200012.
CAVALIERE, A. M. 2002. Educação integral: uma nova identidade para a escola brasileira? Educação e Sociedade. 23 (81): 247-270. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302002008100013.
CAVALIERE, A. M. 2009. Escolas de tempo integral versus alunos em tempo integral. Em Aberto, 22 (80): 51-63. http://dx.doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.21i80.2220
COELHO, L. M. 2009. História(s) da educação integral. Em Aberto, 22 (80): 83-96. http://dx.doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.21i80.2222
DAOUD, A.; LARSSON, B. 2011. Economic sociology – old and new. Int. J. Pluralism and Economics Education, 2 (3): 255-269. http://dx.doi.org/10.1504/IJPEE.2011.044270.
DARDOT, P.; LAVAL, C. 2010. La nouvelle raison du monde. Essai sur la société néolibérale. Paris, La Découverte, 498p.
DIMAGGIO, P. 1994. Culture and economy. In: N. SMELSER; R. SWEDBERG (Eds.): The Handbook of Economic Sociology. Princeton, Princeton University Press, 848p.
DURANTI, A.; GOODWIN, C. 1992. Rethinking Context. Language as an Interactive Phenomenon. Cambridge, Cambridge University Press, 363p.
DURKHEIM, É. 2003. As regras do método sociológico. São Paulo, Martins Fontes, 165p.
FOUCAULT, M. 2008. O Nascimento da biopolítica. Curso dado no Collège de France (1978-1979). São Paulo, Martins Fontes, 474p.
FOUCALT, M. 1969. L’archéologie du savoir. Paris, Gallimard, 288p.
FONSECA, M. 2009. Políticas públicas para a qualidade da educação brasileira: entre o utilitarismo econômico e a responsabilidade social. Cadernos Cedes, 29 (78): 153-177. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-32622009000200002.
FREITAS, L.C. 2012. Os reformadores empresariais da educação: da desmoralização do magistério à destruição do sistema público de educação. Educação e Sociedade, 33 (119): 379-404. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302012000200004.
GARCIA-PARPET, M. F. 2014. Marché, rationalité et faits sociaux totaux: Pierre Bourdieu et l’économie. Revue Française de Socio-Économie, 13 (1): 107-127.
GARCIA-PARPET, M. F. 2005. Des outsiders dans l’économie de marché : Pierre Bourdieu et les travaux sur l’Algérie. In : M. GÉRARD (dir.) Rencontres avec Pierre Bourdieu. Bellecombe-en-Bauges, Le Croquant, 684p.
GARCIA-PARPET, M. F. 2013. A sociologia da economia de Pierre Bourdieu. Sociologia & Antropologia, 03 (05): 91-117. http://dx.doi.org/10.1590/2238-38752013v364.
GRANOVETTER, M. 1985. Economic action and social structure: the problem of embeddedness. American Journal of Sociology, 91 (3): 481510.
GIFE, 2017. Censo GIFE 2016. São Paulo, GIFE, 258p.
GUNTER, H.; HALL, D.; APPLE, M. (eds) 2017. Corporate elites and the reform of public education. Chicago, Policy Press, 312p.
HANNUS, S.; SIMOLA, H. 2010. The Effects of Power Mechanisms in Education: bringing Foucault and Bourdieu together. Power and Education. 2 (7): 1-17. https://doi.org/10.2304/power.2010.2.1.1
HESS, F.; HENIG, J. [eds]. 2015. The New Education Philanthropy: Politics, Policy, and Reform. Cambridge, MA, Harvard Education Press, 248p.
ICE. Instituto de Corresponsabilidade pela Educação. Livreto Institucional. Disponível em http://icebrasil.org.br/wp-content/uploads/2017/05/ Livreto_Digital_Institucional.pdf. Acesso em 28/04/2019.
LAMONT, M. MOLNAR, V. 2002. The Study of Boundaries in the Social Sciences. Annual Review of Sociology, 28: 167-195. https://doi.org/10.1146/annurev.soc.28.110601.141107.
LAVAL, C. 2018. Bourdieu, Foucault et la question néolibérale. Paris, La Découverte, 262p.
LAVAL, C. 2017. Foucault and Bourdieu: to each his own neoliberalism? Sociologia & Antropologia. Rio de Janeiro, 7(1): 63-75. http://dx.doi.org/10.1590/2238-38752017v713.
MAGALHÃES, M. 2008. A juventude brasileira ganha uma nova escola de Ensino Médio: Pernambuco cria, experimenta e aprova. São Paulo, Albatroz, Loqüi, 136p.
MELO, I. V. 2010. Relatos de uma experiência. Os três anos que mudaram a história do Ginásio Pernambucano. Olinda/PE, Livro Rápido, 99p.
MICHETTI, M. Entre a legitimação e a crítica: as disputas acerca da Base Nacional Comum Curricular. Revista Brasileira de Ciências Sociais. No prelo.
MIRANDA, M.; SANTOS, S. 2012. Propostas de tempo integral: a que se destina a ampliação do tempo escolar? Perspectiva, 30 (3): 1073-1098. https://doi.org/10.5007/2175-795X.2012v30n3p1073.
PERONI, V.M.; CAETANO, M. R. 2015. O público e o privado na educação: Projetos em disputa? Revista Retratos da Escola, 9 (17): 337-352. http://dx.doi.org/10.22420/rde.v9i17.584.
POLANYI, K. 1980. A grande transformação: as origens de nossa época. Rio de Janeiro, Campus, 360 p.
RAUD, C. 2007. Bourdieu e a nova sociologia econômica. Tempo Social, 19 (2): 203-232. https://doi.org/10.1590/S0103-20702007000200008
RECKHOW, S.; 2013 . Follow the Money: How Foundation Dollars Change Public School Politics. New York, Oxford University Press, 240p.
RECKHOW, S.; SNYDER, J. 2014. The Expanding Role of Philanthropy in Education Politics. Educational Researcher, 43 (4): 186-195. https://doi.org/10.3102/0013189X14536607
REIS, E. 2005. Perceptions of Poverty and Inequality among Brazilian Elites. In: E. REIS; M. MOORE (eds). Elite perceptions of poverty and inequality. London, New York, Zed Books. 220p.
SALTMAN, K. 2009. The Rise of Venture Philanthropy and the Ongoing Neoliberal Assault on Public Education: The Case of the Eli and Edythe Broad Foundation. Workplace, 16: 53-72. https://doi.org/10.14288/workplace.v0i16.182244
SILVA, A.L. 2014. Políticas para a ampliação da jornada escolar: estratégia para a construção da educação integral? São Paulo/SP. Tese de Doutorado. USP, 257p.
STEINER, P. 1995. Economic sociology: a historical perspective. The European Journal of the History of Economic Thought. 2 (1): 175–195. https://doi.org/10.1080/10427719500000099
STEINER, P. 2001. The sociology of economic knowledge. European Journal of Social Theory. 4 (4): 443–458. https://doi.org/10.1177/13684310122225253
SWEDBERG, R. 2011. The Economic Sociologies of Pierre Bourdieu. Cultural Sociology, 5(1): 67–82. https://doi.org/10.1177/1749975510389712
TOMPKINS-STANGE, M. 2016. Policy Patrons: Philanthropy, Education Reform, and the Politics of Influence. Cambridge -MA, Harvard Education Press, 216p.
URBINI, L. 2015. Educação integral e capital financeiro: A participação do Itaú Unibanco nas políticas públicas de educação entre 2002 e 2014. Florianópolis, SC, Dissertação de Mestrado, UFSC, 269p.
SCHÄFER, H.W. 2015. HabitusAnalysis 1. Epistemology and Language. Wiesbaden, Springer, 390p.
WAGNER, A. C. 2011. Les classes dominantes à l’épreuve de la mondialisation. Actes de la recherche en sciences sociales, 190(5): 4-9. https://doi.org/10.3917/arss.190.0004
WEBER, M. 2004. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. São Paulo, Companhia das Letras, 335p.
ZELIZER, V. 1988. Repenser le marché. La construction sociale du ‘marché aux bébés’ aux Etats-Unis, 1870-1930. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, 94: 3-26. https://doi.org/10.3406/arss.1992.3023
Notas
Autor notes
miquelimichetti@gmail.com