Servicios
Descargas
Buscar
Idiomas
P. Completa
As fronteiras da classificação racial no Brasil em perspectiva regional 1
Leonardo Souza Silveira
Leonardo Souza Silveira
As fronteiras da classificação racial no Brasil em perspectiva regional 1
The boundaries of racial classification in Brazil on reginal perspective
Ciências Sociais Unisinos, vol. 56, núm. 3, pp. 341-352, 2020
Universidade do Vale do Rio dos Sinos Centro de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: O artigo tem como objetivo analisar as variações regionais das fronteiras raciais no Brasil. A classificação foi, desde a década de 1950, alvo de disputas entre defensores e críticos de uma pretensa “harmonia racial” no país. Por sua vez, a questão regional surgiu devido ao recorte geográfico dos estudos e os conflitos entre as escolas “baiana” e “paulista”, que apresentavam diferenças ideológicas e interpretativas. Para sustentar o argumento de que há heterogeneidade das fronteiras raciais, recorrem-se a três abordagens: (a) os estudos das décadas 1950/1960, (b) estudos qualitativos, e (c) estudos quantitativos, as duas últimas em período posterior à década 1990. Apesar de um racismo persistente e difuso no país, conclui-se que, em termos classificatórios, as hipóteses dos primeiros estudos devam ser postas em perspectiva, sendo mais adequadas a algumas regiões que outras. Por fim, sugerem-se possibilidades analíticas e a necessidade de enfoques regionais das relações raciais no Brasil.

Palavras-chave: RaçaRaça,Classificação RacialClassificação Racial,Fronteiras raciaisFronteiras raciais.

Abstract: This article aims to analyze regional variation of racial boundaries in Brazil. From the 1950s on, classification was the subject of dispute between researchers both supporters and critics of an alleged “racial harmony” in the country. In turn, regional issues arose due to both the geographical framework of the studies and the conflicts between the “Bahia” and “São Paulo” schools, which had ideological and interpretative differences. In order to support the argument that there is heterogeneity in the classification of racial boundaries, three approaches were used: (a) the studies from the 1950s/1960s, (b) qualitative, and (c) quantitative studies, the last two being from the 1990s. Despite a persistent and spread racism, it is concluded that, in terms of classification, hypotheses from the first studies should be put into perspective, being more suitable to some regions than others. Finally, analytical possibilities and the need for regional frameworks are suggested for the study of race relations in Brazil.

Key Words: Race, Racial Classification, Racial Boundaries.

Carátula del artículo

Articles

As fronteiras da classificação racial no Brasil em perspectiva regional 1

The boundaries of racial classification in Brazil on reginal perspective

Leonardo Souza Silveira
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Brasil
Ciências Sociais Unisinos, vol. 56, núm. 3, pp. 341-352, 2020
Universidade do Vale do Rio dos Sinos Centro de Ciências Humanas Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais

Recepção: 28 Agosto 2020

Aprovação: 10 Dezembro 2020

Introdução

Em termos raciais, as regiões brasileiras apresentam diferenças marcantes. A composição negra é predominante nos estados do Norte e do Nordeste (76 e 73%, respectivamente, segundo o IBGE (2015)), enquanto nos estados do Sul e do Sudeste ela diminui em detrimento do aumento na proporção de brancos (composição negra de 22 e 49%, respectivamente). Isso reflete as histórias locais, com períodos de colonização, escravização e ocupação territorial específicos. Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo principal demonstrar que os processos históricos de cada região levaram à formação de fronteiras raciais distintas, que se refletem em variações classificatórias. Para sustentar esse argumento, apresentam-se três abordagens que trataram do tema direta ou indiretamente. A primeira é baseada em estudos de caso publicados nas décadas de 1950 e 1960 que sistematizaram grande parte das hipóteses sobre as relações raciais no Brasil. A segunda é posterior aos anos 1990, com trabalhos que, por meio de abordagem qualitativa, se dedicaram a explicar o vocabulário classificatório no Brasil; enquanto a terceira, também em anos mais recentes, se utilizou de estudos quantitativos para comparar as classificações por região. Por fim, o artigo sintetiza as conclusões, as lacunas e as possibilidades da comparação regional no país no que se refere à questão classificatória.

A regionalidade da raça no Brasil marca todo o processo acadêmico do tema. Primeiro, pelo fato de que os estudos pioneiros do campo de relações raciais foram realizados em cidades ou estados específicos – Casa Grande & Senzala ( Freyre, 1987) em Pernambuco, Brancos e Pretos na Bahia (Pierson, 1971), Relações Raciais entre Negros e Brancos em São Paulo ( Bastide e Fernandes, 1955), entre outros. Em segundo lugar, somam-se as diferenças das conclusões dos estudos realizados na Bahia e em São Paulo nas décadas de 1950 e 1960, em que Guimarães (1999a) pontuou serem devidas às “escolas” interpretativas e ideológicas. Em terceiro lugar, aponta-se também para as diferenças empíricas entre as regiões, sendo que, por um lado, o racismo é persistente 3 em todas elas, enquanto, por outro lado, há variações em termos de desigualdade (Campante et al., 2004), de formações políticas e expressões estéticas (Pinho, 2004; Moutinho, 2004) e, como será discutido, de formas de classificação (Monk, 2013; Muniz e Bastos, 2017).

A classificação racial no Brasil, por si só, é envolta por questionamentos desde, pelo menos, a década de 1950 – sem contar seus desdobramentos mais recentes no que se refere às ações afirmativas. A ela foram atribuídos adjetivos como volátil, ambígua, imprecisa ou fluida, principalmente em comparação ao sistema classificatório norte-americano. Donald Pierson e Marvin Harris, por exemplo, se basearam na classificação brasileira para sustentar o argumento que a questão no país era de classe, e não de raça (Pierson, 1971[1942]; Harris et al., 1993 ). Em contraponto, Oracy Nogueira (1998) estabeleceu os aspectos característicos do preconceito de marca ao invés do preconceito de origem para defender que o racismo brasileiro possui especificidades. Nesse sentido, a classificação ganha centralidade no debate racial brasileiro, seja em relação a questões identitárias ( Fry, 1996; Hordge-Freeman, 2016), seja em relação às medidas de desigualdade (Muniz, 2012; Bailey et al., 2013 ).

Dessa maneira, questiona-se sobre a medida em que as atribuições dadas à classificação racial no Brasil são perenes às variações regionais. Com base no argumento de Guimarães (1999b) de que as características das relações raciais no Brasil não são sempre um imperativo nacional, mas se adequam melhor a algumas regiões que outras, explora-se como a variação classificatória reflete as histórias locais na construção das fronteiras raciais, que já eram demarcadas desde os primeiros estudos e ganharam fôlego e comparabilidade por meio de estudos quantitativos. Sugere-se, portanto, que as histórias locais sejam incorporadas de maneira mais sistemática aos estudos de relações raciais, adicionadas aos esforços de comparação e descrição das características classificatórias existentes nas ciências sociais brasileiras até então.

Para isso, o artigo se divide em três seções, além dessa introdução. Na próxima seção, descrevem-se as características das fronteiras raciais no Brasil, seus dilemas e sua importância na compreensão da raça como uma construção social localizada no tempo e no espaço. Na seção seguinte, debate-se e apresenta-se a regionalidade da questão racial no Brasil, desde os estudos das décadas de 1950 e 1960 iniciados com o projeto financiado pela Unesco até os achados mais recentes com relação à classificação. Por fim, a quarta seção sintetiza os resultados obtidos até hoje sobre as diferenças classificatórias por região, e ressalta a necessidade de uma agenda de pesquisa em que se dê notoriedade para as descrições e reconstruções históricas das fronteiras raciais por meio de abordagens qualitativas, ao mesmo tempo em que elas dialoguem com as comparações e as possibilidades de experimentação das abordagens quantitativas.

A Construção das Fronteiras Raciais no Brasil

A raça, como objeto da ciência, se apresenta de duas maneiras, como conteúdo e como forma. Como conteúdo, espera-se que cada grupo racial tenha predisposições inatas. A essa concepção denomina-se racismo, e foi desencorajada pelas ciências biológicas e sociais logo após a Segunda Guerra ( Wieviorka, 1995; Maio e Santos, 2015). Como forma, porém, a raça representa uma realidade socialmente construída com consequências reais. Grupos sociais discriminam, unem-se em torno de pautas políticas, orientam gostos e preferências sociais e culturais levando em consideração tais fronteiras. Em termos sociológicos, trata-se de um marcador social que une e difere os indivíduos como grupos, pelos quais eles institucionalizam, difundem e produzem princípios de classificação ( Wacquant, 1997; Lamont e Mólnar, 2002).

No Brasil, a raça perpassa tanto por aspectos simbólicos, quanto por aspectos da vivência cotidiana nas experiências de privilégios e discriminação. Ela é central na identidade nacional e nos projetos de modernidade construídos desde o século XIX – como em vários países do mundo ( Sommer, 1991). Nesse período, a perspectiva eugenista considerava as sociedades latino-americanas como prováveis casos de decadência dada a grande miscigenação das raças. Em contraposição, a intelectualidade local respondeu de maneira a fundamentar os mitos de origem na pluralidade, ao invés da pureza, como uma maneira de assegurar a viabilidade dessas nações ( Schwarcz, 2012; Loveman, 2014).

Essa miscigenação é retratada nas categorias e fronteiras raciais. No Brasil, a classificação sempre contou com opções “intermediárias” (cabocla, parda, morena) entre os “extremos” preto e branco, o que foi interpretado como uma ausência de rigidez da linha racial em contraposição ao esquema norte-americano. Aos olhos estrangeiros, a fluidez das fronteiras raciais era reforçada pelo fato da ancestralidade não ser o critério principal de classificação, sendo, no máximo, um critério auxiliar aos traços estéticos 4 ( Guimarães, 2012). Essas divergências eram vistas “de fora” como uma evidência de que a questão racial no país era, na verdade, uma questão de sobreposição entre classe e raça 5 (Pierson, 1971).

Essas diferenças, porém, não fazem com que o sistema classificatório brasileiro seja dependente do esquema de classes ( Guimarães, 1999b; Silveira, 2019). Na prática, podem-se elencar três esquemas classificatórios que dialogam entre si: (i) a oficial, utilizada pelo IBGE, dividida entre brancos, pretos, pardos, indígenas e amarelos; (ii) a binária, estimulada por parte dos estudos em estratificação (Silva, 1979); (iii) e a cotidiana, que varia entre os extremos branco e preto, conforme o contexto ( Maggie, 1991; Sheriff, 2001), que conta ainda com uma variabilidade de termos utilizados popularmente, com destaque para a amplitude do termo moreno ( Harris et al., 1993 ; Silva, 1999).

Sobre esses três esquemas surgiram hipóteses e questionamentos acerca da coerência da classificação no Brasil. Harris (1970), por exemplo, defende que se trata de um sistema que combina raça e classe, não podendo atribuir a ele um caráter racial, comparado ao norte-americano. Outra hipótese, popularmente conhecida, é o embranquecimento via ascensão social, pela qual a posição social determinaria a classificação atribuída e autoidentificada dos indivíduos ( Fry, 1996; Schwartzman, 2007).

Dessa maneira, o sistema classificatório brasileiro se insere, por um lado, em uma perspectiva analítica estável ao longo do tempo, expressando os “tipos raciais” brasileiros: indígenas, pretos, brancos, amarelos e os miscigenados. Por outro lado, se tem uma grande amplitude de opções nativas, o que caracterizaria a raça como subsidiária da classe (Pierson, 1971; Harris, 1970). Além disso, outras dissemelhanças foram observadas ao longo do tempo em função de outras variáveis, como os termos e categorias (Muniz, 2012), o tempo ( Carvalho et al., 2004 ; Miranda, 2015) e o espaço (Monk, 2013; Muniz e Bastos, 2017; Silveira, 2019; Silveira e Tomás, 2019).

Essas variações da classificação indicam que as fronteiras, tidas como rígidas e naturais, são voláteis, sendo ora mais rígidas, ora mais fluidas, de acordo com tensões e recursos em disputa. Os estudos de Barth (1998 [1969]) e de Elias e Scotson (2000) são centrais para demonstrar que a emergência de fronteiras sociais ocorre em situações de contato social com desequilíbrios de poder, e não por diferenças objetivas biológicas, culturais ou morais. Zolberg e Woon (1999) indicam que as divisões são reestruturadas dependendo das tensões. Os autores demonstram que na década de 1990 houve o enrijecimento das categorias religiosas e étnicas na Europa e na Califórnia, em contextos de aumento da presença muçulmana e hispânica, respectivamente 6 . Assim, os critérios sobre quem é insider ou outsider se alteraram, em um processo de boundary shifting ( Zolberg e Woon, 1999).

O boundary shifting, processo de redefinição de fronteiras que altera quem passa a fazer parte de determinados grupos e quem passa a ser excluído ( Zolberg e Woon, 1999) é também demonstrado por Loveman e Muniz (2012) no contexto porto-riquenho no século XX. Entre os censos de 1910 e 1920, a população considerada branca naquele país aumentou devido à reclassificação, e não por processos demográficos. Segundo os autores, isso ocorreu em dois níveis: (i) individual, impulsionado por motivos de ascensão social, casamento inter-racial e miscigenação; (ii) coletivo, por um processo de boundary shifting, por meio do enfraquecimento dos critérios que seriam levados em consideração para se classificar racialmente.

Partindo desse debate, portanto, sustenta-se que as fronteiras raciais são elementos localizados no tempo e no espaço. Ou seja, historicamente se constroem narrativas que diferenciam grupos raciais, indicando quem está dentro, quem está fora de tais limites. Por exemplo, tanto Brasil como Estados Unidos, utilizam o termo raça ( race), e ambos têm, em seus territórios, grande influência de aspectos europeus, africanos e indígenas, além de outros fluxos migratórios. Contudo, os significados, as regras de pertencimento e os discursos construídos são sensivelmente distintos, e não podem ser simplesmente deslocados de seus contextos espaço-temporais.

Logo, ao analisar as variações regionais no Brasil, defende-se que há um boundary shifting regional. Não se trata de dizer que a raça é mais relevante em uma região que outra, mas que os esquemas raciais e as hipóteses sobre a sua fluidez foram construídas em recortes espaciais e temporais específicos, embora o termo seja tratado de maneira generalizada em todo o país. Sustenta-se que cada região do Brasil perpassou por processos históricos distintos com relação aos contatos entre os grupos raciais, de modo que foram construídas narrativas específicas para as suas fronteiras raciais – o que resulta em regras de pertencimento e composições raciais distintas em localidades diferentes.

A Regionalidade da Questão Racial

A visão regionalizada da questão racial no Brasil não é recente, porém, o que se busca demonstrar neste artigo é que alguns estudos realizados após os anos 2000 jogaram nova luz sobre a discussão. Devido, principalmente às evidências empíricas obtidas por estudos qualitativos e quantitativos, esses trabalhos atualizaram ou até refutaram hipóteses levantadas nas décadas de 1950 e 1960, período mais central para a sistematização das questões raciais no Brasil.

Guimarães (1999a) endereça as diferenças regionais brasileiras por meio de uma dualidade de escolas, os “baianos” e os “paulistas” das décadas de 1950 e 1960. Por baianos, o autor denomina aqueles autores, principalmente norte-americanos, que seguiram o estudo de Donald Pierson (1971 [1942]), enquanto a escola paulista é capitaneada por Florestan Fernandes. Para Guimarães (1999a), o mundo acadêmico sistematizou os achados dessas duas escolas de maneira confusa, ou por meio de dualidades inexistentes, que residiriam (i) na intensidade do racismo ao Norte e ao Sul do Brasil, (ii) a busca de uma democracia racial pelos norte-americanos, e (iii) o fato de que as evidências empíricas eram diferentes em cada região.

Para elucidar tais divergências, Guimarães (1999a) situou as abordagens das duas escolas em termos ideológicos, interpretativos e empíricos. Para ele, a escola baiana era marcada por uma perspectiva teórica mais próxima ao assimilacionismo oriundo da Escola de Chicago, baseada em uma visão ideológica que pressupunha uma democracia racial no Brasil. Dessa escola, Donald Pierson, Charles Wagley e Marvin Harris entendiam que o país contava com uma linha racial tênue, enquanto os limites de classe eram rígidos. Nesse sentido, a relação entre raça e opressão era espúria, havendo uma sobreposição da primeira pelas posições de classe. Por outro lado, Florestan Fernandes, bem como sua vasta lista de colaboradores e seguidores, inaugurou uma interpretação fundamentada na perspectiva estrutural--funcionalista que identifica no Brasil uma função específica do racismo, incompatível com a pretensa sociedade de classes que se iniciava no século XX.

As escolas baiana e paulista se diferem, sobretudo, por aspectos teóricos e ideológicos. No que consiste às diferenças empíricas, porém, é necessário estabelecer um contraponto. Guimarães (1999a) sustenta que as diferenças nos critérios de classificação de raça ao Norte e ao Sul não são suficientes para determinar que as regiões possuem duas formas distintas de racismo. De fato, existem manifestações distintas em termos de expressões e símbolos políticos e culturais, dimensionamentos das desigualdades e, como será demonstrado, de fronteiras raciais por meio da classificação, não obstante o racismo que opera em ambas as regiões seja persistente.

A próxima subseção analisará a relação entre as evidências empíricas dos primeiros estudos das décadas de 1950 e 1960 e os resultados obtidos dos anos 1990 adiante. Com relação aos argumentos sobre as diferenças ideológicas e interpretativas apontadas por Guimarães (1999a), de fato, Florestan Fernandes altera o enfoque das análises posteriores, que guiam a discussão acadêmica brasileira desde então – sem perder de vista os marcos das evidências trazidas por Nelson do Valle Silva (1979) e Carlos Hasenbalg (2005 [1979). Contudo, com foco na classificação racial, novas abordagens qualitativas e quantitativas demonstram aspectos específicos entre as regiões Norte e Nordeste, e as regiões Sul e Sudeste do Brasil, que de maneira alguma diminuem a persistência do racismo, mas revelam heterogeneidades na formação histórica e social das fronteiras raciais.

As Primeiras Evidências Empíricas das Fronteiras Raciais no Brasil: Os Estudos da Unesco

Embora Casa Grande & Senzala, publicado em 1933, seja considerada a obra mais clássica, além do detalhado estudo de Donald Pierson de 1942, não é exagero apontar que a década de 1950 tenha sido a mais central em termos de sistematização das teorias e hipóteses sobre as relações raciais no Brasil. Logo após a Segunda Guerra, a Unesco passa a atuar com o objetivo de evitar que a ciência fosse novamente apropriada como instrumento político e ideológico. Nesse sentido, a raça ganha centralidade na discussão biológica e antropológica, sendo o Brasil um caso inicialmente paradigmático de harmonia racial.

Entre 1950 e 1960, a Unesco financia uma série de estudos de pesquisadores nacionais e internacionais e, inclusive, duas rodadas de pesquisa ( Maio e Santos, 2015). Essas pesquisas foram realizadas de maneira exploratória buscando apreender características da “democracia racial” no país. Contudo, o que se verificou foram diferentes mecanismos de um racismo distinto do norte-americano.

Logo no princípio, as regiões surgem como uma questão de estudo. Assim como as diferenças em termos de abordagens teóricas e metodológicas, os pesquisadores se distribuíram em diferentes regiões, ficando apenas o Centro-Oeste ausente de análises mais profundas. No Nordeste brasileiro, destacou-se em parte dos trabalhos a estrutura econômica e social deixada pela economia do açúcar. Os reflexos dessa estrutura iniciada no século XVI são observados ainda no século XX, tendo como legado a concentração de poder político e econômico, e uma grande concentração de descendentes dos escravizados que foram traficados por mais de 300 anos (Hutchinson, 1952).

Os autores que se debruçaram sobre as questões raciais no Estado da Bahia (Pierson, 1971; Hutchinson, 1952; Harris, 1952; 1964) destacam a correlação entre a posição socioeconômica e a cor da pele dos indivíduos em cada um dos grupos, especialmente os de elite, quase exclusivamente brancos. Em termos classificatórios, os pesquisadores apresentaram uma multiplicidade de termos, emergindo um sistema classificatório em que se combinam cor de pele, tipo de cabelo, formato da boca e do nariz, e posição socioeconômica. Segundo Hutchinson (1952), as terminologias mais utilizadas na comunidade de Minas Velhas na Bahia, eram “homens de cor” para os negros, e “caboclo” para aqueles com traços indígenas. Outros termos, porém, eram atribuídos aos indivíduos, como “branco da terra”, para pessoas de pele branca com ancestralidade africana; “preto retinto”, para pessoas de pele mais escura; além de “cabra”, “cabrocha”, “cabo verde”, e “escuro”, sendo esse último destinado a indivíduos de fora da comunidade. Hutchinson (1952) e Harris (1952) encontraram na Bahia termos permeados por aspectos sociais e estéticos, de maneira similar ao que foi descrito por Pierson aproximadamente 15 anos antes (Pierson, 1971) 7 . Aos olhos e ouvidos de pesquisadores norte-americanos é difícil que tal variedade não soasse, ora como falta de critérios, ora como uma ordem racial menos importante, o que fica evidente nos trabalhos de Marvin Harris realizados nas décadas seguintes ( Harris, 1964; 1970; Harris et al., 1993 ).

No Norte brasileiro, Wagley (1952) observou uma multiplicidade de termos para as diferentes características dos indivíduos, similarmente ao encontrado por Harris (1952) e Hutchinson (1952) no Nordeste. Contudo, na Vila de Itá (nome fictício), região amazônica, a maior presença de indígenas acrescenta outros indicativos de pertencimento a um ou outro grupo racial. Especialmente os homens com poucos pelos no corpo, como pouca barba, eram relacionados também aos grupos indígenas, enquanto no Nordeste, pessoas com características indígenas eram classificados como “caboclos” (Hutchinson, 1952). Ao descrever os casamentos, percebeu-se a predominância de uniões endogâmicas, sendo que as uniões exogâmicas não envolviam pessoas classificadas nos extremos do espectro racial. No caso dos clubes sociais, a prevalência branca é vista pelo autor como uma suspeita de associação entre raça e classe (Wagley, 1952).

Nos estados da região Sul e em São Paulo, os resultados revelaram um tipo específico de fronteiras raciais que possuem, por um lado, uma homogeneidade interna, e por outro, um contraponto àquelas encontradas no Norte e no Nordeste. Nesse momento, a equipe coordenada por Florestan Fernandes e Roger Bastide se distribuiu nesses estados, adotando abordagens e temas distintos, como Virgínia Bicudo e o racismo entre crianças ( Bicudo, 1955; Cruz et al., 2015 ; Santos, 2018), os efeitos do racismo na capital e no interior paulista de Bastide (1955) e Nogueira (1998) e as incursões de Cardoso e Ianni empreendidas no Sul do país (Cardoso e Ianni, 1960; Ianni, 1966). Nesse ponto, destaca-se que as abordagens teóricas e metodológicas são marcadamente distintas daquelas utilizadas no Nordeste, dada, por exemplo, a carga marxista empregada por esses pesquisadores nas interpretações sobre o processo de modernização do país, as análises ecológicas 8 e a aplicação de surveys em alguns casos.

Para além das diferenças teóricas, revelam-se também contextos marcadamente distintos. Em Santa Catarina, por exemplo, Cardoso e Ianni (1960) observaram um processo histórico que combina menor influência dos latifúndios, um mercado escravista menos atrativo e, em período mais recente, a chegada expressiva de imigrantes europeus 9 . Além disso, por meio de uma análise ecológica, Cardoso e Ianni (1960) revelaram uma intolerância considerável em Florianópolis. Segundo eles, a tolerância com os negros dependia do círculo social, sendo a escola o mais aberto e a família o mais fechado. Dos entrevistados, 18% disseram não tolerar a presença de negros na escola, enquanto na família esse valor era de 91% 10 ( Cardoso & Ianni, 1960). Ou seja, trata-se de uma hierarquia de até onde é aceita uma convivência mais harmônica, que se combina ainda com outra hierarquia, dados os elementos europeus chegados desde o final do século XIX, como reforçou Ianni (2004) anos depois:

No Paraná, por exemplo, a frequência de negros em Curitiba era relativamente pequena (entre 10 e 15% no máximo da população) e meus informantes da cidade afirmavam: “Aqui não há negros” e acrescentavam uma fala fatal: “o nosso negro é o polaco”. Isto é, inconscientemente, eles assimilaram o preconceito que os alemães desenvolveram na Europa contra os poloneses. O negro e o polonês eram colocados na escala mais baixa da discriminação; em segundo lugar vinham os italianos (com alguns outros, como os ucranianos); em terceiro, os brasileiros do povo e no topo da pirâmide os alemães. A acentuada valorização de alguns e a classificação diferenciada para outros. Logo, esse laboratório de etnias também funcionou como elemento fertilizante (Ianni, 2004, p. 12).

Essa passagem revela como naquele período, dos anos 1950 e 1960, a presença de imigrantes europeus continha um elemento a mais ao contexto racial. As diferenças observadas não eram apenas uma questão de perspectiva teórica, mas haviam elementos distintos que reordenavam as hierarquias raciais em comparação a outras regiões. Ainda assim, naquele momento, tanto Cardoso e Ianni (1960), quanto Fernandes (2008), viam o preconceito racial como uma etapa do desenvolvimento econômico e social do Brasil. Por uma veia parsoniana, eles acreditavam que acelerado o processo de industrialização as desigualdades raciais já não teriam mais função – pelo menos sob o viés econômico.

Por outro lado, é importante ressaltar que mesmo herdeiros intelectuais diretos ou indiretos de Florestan passaram a analisar a convivência e a persistência do racismo mesmo em setores modernos e em contextos de crescimento. Em Itapetininga, no interior do Estado de São Paulo, Nogueira (1998) demonstrou que a chegada de imigrantes europeus era almejada, mesmo havendo na cidade um excedente populacional negro. Identificou-se, portanto, um ambiente acolhedor aos brancos estrangeiros, que se traduzia em rápida ascensão social, em contraposição ao status dos negros, que permaneciam imóveis na base social (Nogueira, 1998).

Na capital, Borges Pereira (1967) demonstrou como o mercado radiofônico se tornou, não só uma opção de lazer e entretenimento para os negros paulistanos, como um ramo de atividade econômica. A ascensão de alguns locutores e técnicos negros, no entanto, não se refletia em ganhos para o grupo, uma vez que os brancos desenvolviam estratégias de pouca abertura para os negros nos canais de poder (Borges Pereira, 1967). Nesse sentido, se Fernandes (2008) e Cardoso e Ianni (1960), viam na modernização da sociedade a redução das desigualdades, Nogueira (1998) e Borges Pereira (1967) antecipavam que a fronteira racial não era apenas um arcaísmo da escravidão, no qual seria necessário substituir a ideologia da ascensão social pela reivindicação política.

O Rio de Janeiro, por sua vez, traz uma abordagem distinta nesse contexto. Seu histórico enquanto capital colonial e imperial levou a uma concentração maior de negros em relação ao Sul. Contudo, juntamente com o histórico escravocrata, a análise ecológica feita por Costa Pinto (1998 [1952]) é reveladora da formação, e principalmente, da manutenção das fronteiras. Remontando situações cotidianas, o autor apresenta um substrato do racismo e das fronteiras raciais naquela cidade.

Por meio de surveys aplicados em colégios da cidade, revelou-se que os pretos eram associados a características laboriosas, infantis, de uma bondade e humildade natural. Já os “mulatos” eram vistos como ameaça, tratados com hostilidade, e percebidos como um grupo de indivíduos presunçosos (Pinto, 1998). Reforçou-se, com isso, um lugar de dubiedade do mestiço - também conforme interpretação de Degler (1976) - em que, ao mesmo tempo em que ele possui “algo de branco”, e por isso uma circulação maior entre os grupos privilegiados, ele possui “algo de negro”, no qual se cola o estereótipo. Nesse sentido, Pinto (1998) demonstrou uma percepção de ameaça por parte dos brancos com relação a suas posições privilegiadas. Se Cardoso e Ianni (1960) dizem que a percepção no Sul é do mestiço como um “negro com privilégios”, Pinto (1998) aponta para o mulato como um “negro com ambições”, tornando-o uma ameaça ao privilégio branco.

Essa tensão e diferenciação entre os grupos raciais não evita que múltiplos termos classificatórios sejam utilizados. Segundo Pinto (1998), no Rio de Janeiro, a terminologia descritiva também varia conforme o contexto e a proximidade pessoal, com termos como “moreno”, “pardo”, “mulato”, “roxo”, “tira-teima”, entre outros. O seu uso depende da intenção de não “ferir o sentimento” do interlocutor, concedendo “menções honrosas” ao indivíduo que o desvincula das ideias que caracterizam o seu grupo racial, sem deixa-lo se esquecer que há “algo de negro” nele, mantendo-o em seu “devido lugar” (Pinto, 1998).

O que dizem os Estudos Qualitativos Recentes?

Os estudos da Unesco são importantes na definição das principais hipóteses que demarcam as características da classificação racial no Brasil, a saber, a ambiguidade dos termos e a variação socioeconômica da classificação. Paralelamente, contudo, é possível observar que esses trabalhos ressaltaram as diferenças regionais no país. Esta seção, tem como objetivo sublinhar como as hipóteses levantadas pelos estudos das décadas de 1950 e 1960 foram abordados em estudos posteriores, especialmente através de uma abordagem qualitativa, privilegiando os aspectos das fronteiras raciais nos estados.

É importante pontuar, inicialmente, que os estudos mais atuais remontam um contexto distinto, tanto inter-regional, quanto intra-regional. O Estado da Bahia, por exemplo, continua sendo privilegiado dentro dos estudos de relações raciais, apesar de seus movimentos culturais e políticos terem passado a sofrer com a repressão do regime militar na década de 1970, ocorreu a ressignificação da questão racial, principalmente em Salvador (Pinho, 2004). Com relação ao Rio de Janeiro e a São Paulo, a questão racial, nestes estudos, se mistura a temas urbanos, educacionais e do mercado de trabalho. Vale ressaltar que o Brasil possui uma produção vasta sobre relações raciais, e os trabalhos destacados são apresentados a fim de dialogar, tanto com as hipóteses colocadas anteriormente, quanto com novos temas que vão surgindo na pauta acadêmica e política.

De maneira geral, no intervalo entre 1950 e 2000, o mundo perpassou por bruscas alterações nos fluxos econômicos e informacionais, além das bases ideológicas terem se deslocado e se tornado mais dispersas. No que diz respeito às pautas raciais, o discurso em torno da diáspora se tornou transnacional, homogeneizando, em alguma medida, a formação de identidades racializadas globais ( Agier, 2001; Hordge-Freeman, 2016). Isso, porém, não é suficiente para desbancar aspectos regionais do racismo, das fronteiras e das classificações raciais no Brasil.

Salvador, nesse sentido, é um exemplo marcante. Desde o acirramento do regime militar no Brasil, os movimentos políticos e culturais passaram a ser um símbolo de resistência, reforçando aspectos específicos daquela cidade. Pinho (2004) aponta que, ao longo das últimas décadas, os movimentos culturais e os blocos de carnaval conseguiram se inserir em pautas governamentais, ao mesmo tempo em que seus apelos reverberavam no nível cotidiano, de maneira a ressignificar estereótipos raciais. Apesar dos blocos de carnaval, como o Ilê Aiyê, inserirem em seus cortejos símbolos considerados “afro” com a finalidade de “elevação terapêutica da autoestima”, a autora ressalta como a estratégia de contornar os estereótipos, acaba criando outros. Para invalidar um estereótipo negativo, criam-se outros estereótipos considerados positivos. Dessa forma, os indivíduos de um grupo permanecem sendo avaliados sob expectativas fixas e essencializadas. Citando Stuart Hall, a estereotipação “reduz, essencializa, naturaliza e fixa a diferença” ( in Pinho, 2004, p. 145). A autora ressalta a contradição de que, por um lado, símbolos afro-brasileiros sejam politicamente valorizados, e por outro, símbolos como turbantes e tranças não sejam tão bem aceitos em ambientes mais conservadores, como bancos e escritórios.

Tal ressignificação das categorias populares raciais é percebida em Salvador ao se contrastar as gerações. Sansone (2003) demonstra que o termo “negro”, visto como negativo, segundo Pierson (1971), na década de 1930, tem outro significado nos anos 1990, principalmente entre os mais jovens. Negro, para eles, não é apenas uma caracterização fenotípica, como também é uma autoafirmação política. Ou seja, embora haja uma multiplicidade de termos (Pierson, 1971), Sansone (2003) identifica um significado muito mais racializado da autoclassificação.

No Rio de Janeiro, Sheriff (2001) distingue essa variabilidade de termos e os seus usos políticos. Em sua etnografia em uma favela da cidade, a autora demonstra como os indivíduos lançam mão do “discurso de cor” em conversas informais com amigos ou de forma meramente descritiva. No âmbito político, ou em ambientes com alguma tensão, deixa-se de usar essa ampla gama de termos para se confrontar aspectos de negritude em oposição à branquitude – no sentido de “ quem passa de branco, negro é” (Sheriff, 2001).

Moraes Silva e Leão (2012) exploram, também no Rio de Janeiro, os sentidos do termo “pardo”. As autoras conduzem entrevistas semiestruturadas com pessoas que se classificam como pardas dentre as categorias do IBGE. Assim, a homogeneidade da categoria parda é desmembrada de acordo com os sentidos atribuídos pelos respondentes. Existem, por exemplo, os “pardos-negros”, que compreende uma parcela da classe média que reforça o aspecto ideológico do discurso racial, podendo estar relacionados a episódios de discriminação. Em contraponto, há a categoria dos “pardos-pardos”, mais ideologicamente vazia, em que são reforçados outros aspectos, como a estética e o fenótipo ou até mesmo a classe ( Moraes Silva e Leão, 2012).

O grupo pardo, muitas vezes chamado de ambíguo, pode ser uma das chaves para se compreender o sistema classificatório no Brasil, sugerem Moraes Silva e Leão (2012). Assim, os pardos têm posições distintas em diferentes regiões do Brasil. No Rio de Janeiro, por mais que eles estejam “no meio”, eles definitivamente não são brancos, sendo que em algumas situações eles encontram-se totalmente sobrepostos aos pretos – remontando aos estereótipos construídos por Pinto (1998), há uma distância maior entre os pardos e os brancos do que daqueles com relação aos pretos.

No Estado de São Paulo, a divisão entre brancos e negros (pardos e pretos) permanece marcadamente mais forte. Para isso, dialoga-se tanto com estudos históricos, quanto com análises com abordagens ecológicas. Nos primeiros estudos, Andrews (1998) remonta as tensas relações raciais no período pós-Abolição e pós-República no contexto do insurgente mundo fabril. O autor aponta que posicionamentos políticos eram sempre envoltos em conflitos raciais, em que a sociedade de classes não se descolou da sociedade estratificada por raça (Andrews, 1998).

No ambiente cotidiano, no século XXI, França (2010; 2016) demonstra que espaços urbanos e de trabalho são palcos contraditórios de ascensão e discriminação. Em uma abordagem macro, o autor ( França, 2010) 11 observa que, dentre os mais pobres, brancos e negros compartilham espaços de vizinhança, enquanto entre os mais ricos – que têm maior oportunidade de escolha – há maior segregação. O contato, porém, não significa um ambiente igualitário, uma vez que são os negros de classe média, em bairros de maior prestígio, aqueles que mais relatam episódios de discriminação. Ou seja, quando a classe não é um constrangimento à circulação, a raça volta à tona ( França, 2016).

Os trabalhos mais recentes, portanto, retomam grande parte dos achados dos primeiros trabalhos sobre relações raciais. É fato que outras camadas são acrescentadas, dado que os contextos se diferem. Em Salvador, cidade que já recebia atenção de pesquisadores, surgem outras características referentes ao intervalo que se inicia em 1970, que reforça a relevância do elemento político nas relações cotidianas e no vocabulário racial. No Sudeste e no Sul, há um fechamento maior por parte do grupo branco, com relação ao grupo negro. Contudo, é crucial destacar, conforme apontado por Guimarães (1999b), que Rio de Janeiro e Minas Gerais se diferem de São Paulo, tendo, este último, características mais próximas às apresentadas pelos estados do Sul, influenciados pela imigração europeia no final do século XIX.

Os Estudos Quantitativos na Comparação sobre Classificação Racial no Brasil

Nas duas seções anteriores, os estudos apresentados reconstroem, direta ou indiretamente, a fronteira classificatória no Brasil. Diretamente, apenas Harris (1964; 1970), Sansone (2003), Sheriff (2001) e Moraes Silva e Leão (2012) se debruçaram sobre questões classificatórias, enquanto em outros trabalhos, a questão classificatória foi abordada apenas de maneira transversal. Nesta seção, são apresentadas duas análises complementares. A primeira diz respeito às hipóteses levantadas pelos estudos qualitativos aplicados a desenhos quantitativos, que buscam responder se elas são pertinentes e valem para todas as regiões brasileiras. A segunda análise se propõe a apresentar achados de pesquisas quantitativas que extrapolam as hipóteses clássicas.

Sistematiza-se aqui os trabalhos que seguiram a crítica de Telles (2003), segundo o qual, poucos estudos comparavam de maneira sistemática os efeitos das características locais para a lógica classificatória. Ellis Monk (2013) vai além e afirma que quando submetidos a tais testes de comparação, as hipóteses de volatilidade se revelavam regionais, ao invés de serem aplicáveis para todo o Brasil – ou seja, como defendido por Guimarães (1999b) de que não se tratam de imperativos nacionais.

A principal hipótese que exemplifica esses achados é a popularmente conhecida como o dinheiro embranquece. Schwartzman (2007) testa a probabilidade de casais inter-raciais classificam seus filhos na categoria branca, sendo que seus resultados indiquem maiores chances de isso ocorrer dentre aqueles com maior escolaridade. Embora a autora não se aprofunde na discussão regional, observa-se que a chance de embranquecimento é maior nas regiões Sul e Sudeste, em comparação ao Norte e Nordeste.

Outra hipótese testada diz respeito ao uso da categoria moreno. Bailey e Telles (2006) analisam a probabilidade de uso dessa categoria em comparação àquelas utilizadas pelo IBGE. As chances de classificação morena em Salvador são 70 vezes maiores do que no Rio de Janeiro, e 125 vezes maiores do que em São Paulo. Petrucelli (2013), por sua vez, compara o uso da categoria morena entre os estados da federação. Primeiramente, o autor demonstra que essa categoria é mais utilizada para a autoclassificação do que para a heteroclassificação 12, sendo utilizada 21% das vezes no primeiro caso, e 8% no último. Entre os estados, o uso da categoria varia de 49% da população no Amazonas, 45% na Paraíba, 19% em São Paulo, até 12% no Rio Grande do Sul.

Por um lado, os achados de Bailey e Telles (2006) e de Petrucelli (2013) revelam que a probabilidade de se utilizar determinados termos não é a mesma dentre as regiões. Por outro lado, porém, poder-se-ia ressaltar que o maior uso do termo moreno adviria do fato de haver maior mestiçagem no Amazonas do que no Rio Grande do Sul, uma vez que se trata de uma análise descritiva. A esse ponto, Monk (2013), Muniz e Bastos (2017) e Silveira (2019) utilizaram desenhos de pesquisa longitudinais ou experimentais a fim de testar diferenças regionais.

Por meio de um desenho longitudinal, Muniz e Bastos (2017) analisaram as chances de pardos se reclassificarem em outras categorias. Com base na Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, aplicada em seis regiões metropolitanas do país, os autores encontraram que, respondendo a um mesmo questionário, uma parcela dos entrevistados (cerca de 23%) classificou a cor da própria pele de forma diferente em um intervalo de nove meses. Porém, isso não é constante por região, sendo, por exemplo, que em Porto Alegre, a probabilidade de um pardo se reclassificar como branco é de 40%, e como preto de 15%. Em contraposição, nas regiões metropolitanas de Salvador e Recife ambas as probabilidades não alcançam os 10%, evidenciando uma maior probabilidade das pessoas de permanecer na categoria parda ( Muniz e Bastos, 2017).

No que diz respeito à heteroclassificação, Silveira (2019) testou a associação da escolaridade, da renda e da região na reclassificação. Com base na Relação Anual de Informações Sociais feita entre 2008 e 2015, o autor encontrou que a relação entre as duas primeiras variáveis (escolaridade e renda) com a reclassificação é positiva, porém, pequena, aumentando em 3% a probabilidade de embranquecimento no decil mais alto de renda, e 7% entre aqueles com ensino superior completo. Porém, quando os indivíduos mudam de região de trabalho a reclassificação tende a ser maior. Indivíduos que vão para o Norte e para o Nordeste têm probabilidade de 67% de serem reclassificados como pardos, mesmo que em suas regiões de origem fossem vistos como brancos ou pretos. Já no Sul, a probabilidade de reclassificação parda era de apenas 18% e no Sudeste de 32%. Dessa forma, o fluxo de migrações e reclassificações evidencia que a reclassificação é mais provável de ocorrer por motivos de fluxo regional do que devido a características individuais, sejam físicas ou socioeconômicas ( Silveira, 2019). Esses resultados revelam que, mesmo que haja uma parcela significativa de reclassificação entre 2008 e 2015 - cerca de 10%, as medidas de desigualdade educacional e de renda não são alteradas de maneira significativa.

Por último, Monk (2013) se utiliza de uma metodologia experimental baseada em fotografias para testar a hipótese de que o mesmo indivíduo pode ser categorizado de diferentes maneiras dependendo da região. Com base na Pesquisa Social Brasileira de 2002, foram apresentadas fotografias de homens para os entrevistados, pedindo-lhes que atribuíssem uma categoria racial a cada indivíduo retratado. Seus resultados demonstram que uma mesma foto apresentada teve probabilidade de classificação branca de 90% no Rio de Janeiro, e 70% em Goiás. Na Bahia, essa mesma fotografia foi classificada como parda em 25% das vezes e apenas 10% no Rio de Janeiro. Em outro caso, um homem retratado foi considerado preto em 19% das vezes no Rio Grande do Sul, e apenas 7% no Rio de Janeiro. Assim, padrões foram sendo identificados pelo autor, como, de que na Bahia, o tipo de cabelo tem mais importância que em outros estados, ou que o Sul possui um padrão classificatório mais próximo ao binário branco-preto (Monk, 2013).

Em todos os estudos quantitativos apresentados, sem exceção, a comparação é uma característica que revela aspectos regionais relevantes. Variações de vocabulário ou regras de classificação são frequentemente destacadas. No caso de Bailey e Telles (2006) e Petrucelli (2013), demonstra-se uma fluidez terminológica – sintetizada pelo termo moreno –, em que não há a mesma adesão em todas as regiões. Quando restrito apenas às categorias do IBGE, isso fica evidente no maior uso do termo pardo nas regiões Norte e Nordeste do que no Sudeste e no Sul. Além disso, desenhos de pesquisa longitudinais ou experimentais demonstram que não se trata apenas de haver diferenças demográficas, mas que os critérios de classificação e a permeabilidade do uso de categorias associadas à ambiguidade variam de acordo com a região.

Discussão e Conclusão: Por um olhar regional das fronteiras raciais

A regionalidade perpassou toda a história do campo de relações raciais no Brasil. Embora em poucos momentos tenha sido central à discussão, foi por meio de estudos de caso localizados espacialmente que hipóteses e teorias foram construídas desde a década de 1950. A classificação, por outro lado, foi utilizada como disputa e conflitos entre as escolas assimilacionista e estrutural-funcionalista ( Guimarães, 1999a). A primeira escola se debruça sobre a classificação para defender que, se não há critérios objetivos de classificação, não há como assegurar uma linha que oponha negros e brancos no Brasil. Por outro lado, os esforços da segunda escola têm como objetivo, dentre outros, demarcar a existência de grupos raciais que entram em conflito por recursos em todas as regiões.

O desenrolar dos estudos raciais no Brasil demonstrou que independentemente da região, as divisões de raça são persistentes e o fato de existirem independe de classe ( Bastide e Fernandes, 1955; Nogueira, 1998; Hasenbalg, 2005; Telles, 2003; Sansone, 2003; Pinho, 2004). Isso, no entanto, não desmonta o argumento de que há diferenças nas fronteiras raciais por região. Desconsiderando as diferenças ideológicas dos estudos iniciados na década de 1950 e exploradas por Guimarães (1999a), o presente estudo pode sistematizar os achados de mais de 70 anos de pesquisa no que se refere à classificação racial como: (a) a volatilidade da classificação não exclui o fato de que há grupos raciais no Brasil em todas as regiões, que se orientam substancialmente por critérios adscritos por raça, e não por classe ou por outros tipos de agrupamentos econômicos; (b) a variação regional das fronteiras é relacionada às especificidades históricas locais de acordo com evidências empíricas – englobam escravidão, imigração europeia, movimentos políticos, permeabilidade da mestiçagem e seus mitos de origem, entre outros; (c) quando utilizados instrumentos padronizados de comparação, como estudos longitudinais, surveys ou experimentos, ficam destacadas as diferenças dos critérios classificatórios por região.

Na primeira fase das pesquisas abordadas nesse trabalho, destacou-se as divergências assinaladas entre as escolas assimilacionista e estrutural-funcionalista. Posteriormente, em estudos mais recentes, a divergência é superada de maneira que a variação contextual da classificação é analisada em busca da compreensão a respeito de quais situações a raça é mobilizada. Como exemplo, Sheriff (2001) ressalta a coexistência de um “ discurso de cor” descritivo mais fluido juntamente a um discurso politizado e binário “de raça”. Ou seja, o uso do primeiro não invalida o segundo. Moraes Silva e Leão (2012) destrincham os argumentos dos autoclassificados como pardos, e afirmam que não se trata de uma categoria vazia de significado, mas que abarca diferentes critérios e motivações.

Os estudos quantitativos, por sua vez, têm desenhos mais adequados para a comparação, com base em questionários padronizados e desenhos que permitem a generalização dos resultados. Nesse sentido, a análise do “cálculo cognitivo”, destacado por Harris ( et al., 1993 ), é realizada de maneira a destacar como, em certas regiões, determinadas categorias são mais utilizadas que outras, ou como características físicas e socioeconômicas são racializadas em umas e não em outras.

Estes estudos, no entanto, esbarram na necessidade de interlocução com os estudos mais aprofundados, localizados regionalmente. Por meio de seus resultados, pode-se levantar hipóteses sobre a influência de variantes históricas, demográficas, políticas e sociais que guiam as fronteiras e as “gramáticas” regionais.

Vale, nesse ponto, estabelecer duas ressalvas. A primeira de que não se assume um automatismo, nem uma homogeneidade das regiões geográficas por si sós. Os estados da região Nordeste, por exemplo, têm características econômicas e históricas mais semelhantes entre si, o que não significa que toda a carga política encontrada na Bahia, e mais especificamente em Salvador, seja replicada em seus vizinhos. A segunda ressalva é de que deve ser estimulado um maior diálogo entre os estudos comparativos e os estudos de caso, considerando as especificidades regionais em estudos futuros.

Dito isso, sugere-se, por fim, a integração dessas abordagens existentes e o uso de outras técnicas já aplicadas em outros contextos que não o brasileiro. Tanto por meio de estudos qualitativos, quanto quantitativos, é possível avançar com relação às hipóteses sobre variações regionais no Brasil. Qualitativamente, estudos etnográficos e históricos podem ajudar a compreender como indivíduos ou grupos mobilizam a classificação racial. Como Sansone (2003) que, por meio de etnografia, demonstra a variação situacional da classificação na cidade de Salvador; e Ignatiev (1995) que, a partir de um olhar historiográfico, reconstrói o boundary shifting dos irlandeses nos Estados Unidos com o intuito de se desvincularem dos negros no final do século XIX. Outras abordagens metodológicas, como entrevistas em profundidade podem desvelar quais são as justificativas dadas pelos indivíduos para optar por uma ou outra categoria, como feito por Khanna (2010), Roth (2010) e Moraes Silva e Leão (2012).

Os desenhos de pesquisa quantitativos são úteis para permitir a comparabilidade e a generalização. Além dos desenhos longitudinais e experimentais, a combinação de classificações (auto e heteroclassificação, por exemplo) também permite inferir em que medida entrevistado e entrevistador diferem na escolha de categorias (Muniz, 2012; Vargas, 2014; Costa Ribeiro, 2017; Silveira e Tomás, 2019). Ademais, ferramentas computacionais vêm sendo incorporadas com o intuito de perceber como aspectos inconscientes estão associados à classificação, e como a alteração de apenas um aspecto – característica física, classe social, roupa, entre outros – pode influenciar nas classificações ( Freeman et al., 2010 ; 2011; 2016; Cassidy et al., 2017 ).

A raça e a classificação racial não são sistemas rígidos, mas se constroem em processos sociais localizados no tempo e no espaço. Assim, eles são como uma função de diferentes níveis de influência, que podem ser compreendidas se bem mensuradas. Conclui-se pontuando que a pesquisa sociológica trouxe evidências suficientes para demonstrar que, em vários aspectos, a raça é vista de diferentes formas entre as regiões do país. Como tal, o próprio racismo tem características específicas, que devem ser investigadas. Desse modo, aprimorar as perguntas e os desenhos metodológicos pode aprofundar ainda mais o conhecimento sobre as fronteiras e as desigualdades no Brasil.

Material suplementar
Referências
AGIER, Michel. 2001. “Distúrbios identitários em tempos de globalização”. Mana, 7, 2: 7-33. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-93132001000200001
ALMEIDA Alberto. 2007. A Cabeça do Brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2ª edição.
ANDREWS, George. 1998. Negros e brancos em São Paulo (1888-1988). Bauru: Edusc.
MOUTINHO, Laura. 2004. Razão, “cor” e desejo: uma análise comparativa sobre relacionamentos afetivos-sexuais no Brasil e na África do Sul. São Paulo: Unesp.
BAILEY, Stanley & TELLES, Edward. 2016. “Multiracial versus Collective Black Categories: Examining Census Classification Debates in Brazil”. Ethnicities, 6, 1, p. 74-101. DOI: https://doi.org/10.1177/1468796806061080
BAILEY Stanley; LOVEMAN, Mara & MUNIZ, Jerônimo. 2013. “Measures of ‘Race’ and the Analysis of Racial Inequality in Brazil”. Social Sciences Research, 42: 106-119. Disponível em: 10.1016/j.ssresearch.2012.06.006. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.2012.06.006
BARTH, Fredrik. 1998. “Grupos étnicos e suas fronteiras”, in, P. Poutignat & J. Streiff-Fenart (org.), Teorias da Etnicidade. São Paulo: Fundação Editora Unesp.
BASTIDE, Roger. 1955. “Manifestações do preconceito de cor”, In R. BASTIDE & F. FERNANDES (org.), Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo. São Paulo: Editora Anhembi/Unesco: 123-158.
BASTIDE, Roger & FERNANDES, Florestan. 1955. Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo. São Paulo: Editora Anhembi/Unesco.
BICUDO, Virgínia. 1955. “Atitudes dos alunos dos grupos escolares em relação com a cor dos seus colegas”, in R. BASTIDE & F. FERNANDES (org.), Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo. São Paulo: Editora Anhembi/Unesco: 227-310.
BORGES PEREIRA, João. 1967. Cor, Profissão e Mobilidade: O Negro e o Rádio em São Paulo. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
CAMPANTE, Filipe; CRESPO, Ana & LEITE, Phillippe. 2008. “Desigualdade salarial entre raças no mercado de trabalho brasileiro: aspectos regionais”. Revista Brasileira de Economia, 58, 2: 185-210. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71402004000200003
CARDOSO, Fernando; IANNI, Octávio. 1960. Cor e mobilidade social em Florianópolis. São Paulo: Companhia Editora Nacional.
CARVALHO, José; WOOD, Charles & ANDRADE, Flávia. 2004. “Estimating the stability of Census-Based Racial/Ethnic classifications: The Case of Brazil”. Population Studies, 58, 3: 331-343. DOI: https://doi.org/10.1080/0032472042000272375
CASSIDY, Brittany; SPROUT, Gregory; FREEMAN, Jonathan & KRENDL, Anne. 2017. “Looking the Part (to Me): Effects of Racial Prototypicality on Race Perception Vary by Prejudice”. Social Cognitive and Affective Neuroscience. Disponível em 10.1093/scan/nsw177. DOI: https://doi.org/10.1093/scan/nsw177
COSTA RIBEIRO, Carlos. 2017. “Continuo Racial, Mobilidade Social e ‘Embranquecimento’”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 32, 95: 1-25. DOI: https://doi.org/10.17666/329503/2017
CRUZ, Ana; ABRAMOWICZ, Anete & RODRIGUES, Tatiane. 2015. “A pesquisa sobre criança e infância no Projeto Unesco”. Revista Eletrônica de Educação, 9, 2: 321-345.
DEGLER, Carl. 1976. “As raízes da diferença”, In C. DEGLER, Nem preto, nem branco: escravidão e relações raciais no Brasil e nos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil.
ELIAS, Norbert & SCOTSON, John. 2000. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
FERNANDES, Florestan. 2008. A Integração do Negro na Sociedade de Classes. São Paulo: Globo.
FRANÇA, Danilo. 2010. Raça, Classe e Segregação Residencial no Município de São Paulo. Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo.
FRANÇA, Danilo. 2016. “Descrevendo segregação residencial no contexto brasileiro: uma proposta de pesquisa e interpretação a partir de dados da Região Metropolitana de São Paulo”. Anais do 40º Encontro da Anpocs, Caxambu/MG.
FREEMAN, Jonathan; PAUKER, Kristin; APFELBAUM, Evan & AMBADY, Nalini. 2010. “Continuous dynamics in the real-time perception of race”. Journal of Experimental Social Psychology, 46: 179-185. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jesp.2009.10.002.
FREEMAN, Jonathan; PAUKER, Kristin & SANCHEZ, Diana. 2016. “A perceptual pathway to bias: Interracial exposure reduces abrupt shifts in real-time race perception that predict mixed-race bias”. Psychological Science: 27, 4: 502–517. DOI: https://doi.org/10.1177/0956797615627418.
FREEMAN, Jonathan; PENNER, Andrew; SAPERSTEIN, Alyia; SCHEUTZ, Matthias & AMBADY, Nalini. 2011. “Looking the part: Social status cues shape race perception”. PLoS ONE, 6. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0025107.
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. Formação da família brasileira sob regime de economia patriarcal. 25 Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora. 1987.
FRY, Peter. 1996. “O que a Cinderela negra tem a dizer sobre a ‘política racial’ no Brasil”. Revista USP, 28: 122-135.
GUIMARÃES, Antônio. 2012. “The Brazilian system of racial classification”. Ethnic and Racial Studies, 35, 7: 1157-1162. DOI: https://doi.org/10.1080/01419870.2011.632022
GUIMARÃES, Antônio. 1999a. “Baianos e Paulistas: Duas “Escolas” de Relações Raciais?”. Tempo Social, 11, 1: 75-95. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-20701999000100004
GUIMARÃES Antônio. 1999b. Racismo e anti-racismo no Brasil. São Paulo: Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo; Ed. 34.
HASENBALG, Carlos. 2005. Discriminação e desigualdades raciais no Brasil. Belo Horizonte: Ed. UFMG.
HARRIS, Marvin. 1952. “Race Relations in Minas Velhas, a Community in the Moutain Region of Central Brazil”, In C. WAGLEY, Race and class in rural Brazil. Paris: Unesco.
HARRIS, Marvin. 1964. “Racial identity in Brazil”. Luso-Brazilian Review, 1, 2: 21-28.
HARRIS, Marvin. 1970. “Referential ambiguity in the calculus of Brazilian racial identity”. Southwestern Journal of Anthropology, 26, 1: 1-14.
HARRIS, Marvin; CONSORTE, Josildeth; LANG, Joseph & BYRNE, Bryan. 1993. “Who are the whites? Imposed census categories and the racial demography of Brazil”. Social Forces, 72, 2: 451-462.
HORDGE-FREEMAN, Elizabeth. 2016. “Brokering Black Brazil or Fostering Global Citizenship? Global Engagement that Empowers Black Brazilian Communities”, in G. MITCHELL-WALTHOUR & E. HORDGE-FREEMAN (org.), Race and the Politics of Knowledge Production: Diaspora and Black Transnational Scholarship in the United States and Brazil. Londres: Palgrave Macmillan.
HUTCHINSON, Harry. 1952. “Race relations in a rural Community of the Bahian Recôncavo”. WAGLEY, C. Race and class in rural Brazil. Paris: Unesco.
IANNI, Octávio. 1966. “A Situação Social do Polonês: Projeto de Estudo”, in O. IANNI, Raças e Classes Sociais no Brasil. São Paulo: Civilização Brasileira.
IANNI, Octávio. 2004. “Entrevista - Octávio Ianni: O Preconceito Racial no Brasil”. Estudos Avançados, 18, 50: 6-20.
IBGE. 2015. Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar 2015 – Microdados. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/educacao/9127-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios.html?=&t=downloads Acesso em 27 de novembro de 2020.
IGNATIEV, Noel. 1995. How Irish Became White. New York: Routledge.
KHANNA, Nikki. 2010. “’If you’re half black, you’re just black’: Reflected Appraisals and the Persistence of the One-Drop Rule”. The Sociological Quarterly, 51: 96-121. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1533-8525.2009.01162.x
KLEIN Herbert. 1999. “Migração internacional na história das Américas”. In: FAUSTO, Boris. (org.) Fazer a América: a imigração em massa para a América Latina. São Paulo: Edusp, p. 13-31.
LAMONT, M. & MÓLNAR, V. 2002. “The Study of Boundaries in the Social Sciences”. Annual Review of Sociology, 28: 167-195. DOI: https://doi.org/10.1146/annurev.soc.28.110601.141107
LOVEMAN M. 2014. National Colors. Nova Iorque: Oxford University Press.
LOVEMAN, Mara & MUNIZ, Jerônimo. 2007. “How Puerto Rico Became White: Boundary Dynamics and Intercensus Racial Reclassification”. American Sociological Review, 72: 915-939. DOI: https://doi.org/10.1177/000312240707200604
MAGGIE, Y. 1991. A Ilusão do Concreto: Análise do Sistema de Classificação Racial no Brasil. Tese para Concurso de Professor Titular, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
MBEMBE, A. 2017. Crítica da Razão Negra. Lisboa: Antígona, 2 eds.
MAIO, Marcos & SANTOS, Ricardo. 2015. “Antiracism and the uses of Science in the post-World War II: An analysis of Unesco’s first statements on race (1950 and 1951)”. Vibrant, 12, 2: 1-26. Disponível em https:// www.scielo.br/scielo.php?pid=S1809-43412015000200001&script=sci_abstract
MIRANDA, Vitor. 2015. “A resurgence of black identity in Brazil? Evidence from analysis of recent census”. Demographic Research, 32: 1603-1630. Disponível em 10.4054/DemRes.2015.32.59. DOI: https://doi.org/10.4054/DemRes.2015.32.59
MONK, Ellis. 2013. Color, Bodily Capital, and Ethnoracial Division in the U.S. and Brazil. PhD Dissertation, University of California, Berkeley.
MORAES SILVA, Graziella & LEÃO, Luciana. 2012) “O paradoxo da mistura: identidades, desigualdades e percepção de discriminação entre brasileiros pardos”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 27, 80: 117-133. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-69092012000300007
MOUTINHO Laura. 2004. Razão, “cor” e desejo: uma análise comparativa sobre relacionamentos afetivos-sexuais no Brasil e na África do Sul. São Paulo: Unesp.
MUNIZ, Jerônimo. 2012. “Preto no Branco? Mensuração, relevância e concordância classificatória no país da incerteza racial”. Dados, 55, 1: 251-282. DOI: https://doi.org/10.1590/S0011-52582012000100007
MUNIZ, Jerônimo & BASTOS, João. 2017. “Classificatory volatility and (in)consistency of racial inequality”. Cadernos de Saúde Pública, v. 33, suplemento 1. DOI: https://doi.org/10.1590/0102-311x00082816
NOGUEIRA Oracy. 1998. Preconceito de marca: as relações raciais em Itapetininga. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.
PETRUCELLI, J. 2013. “Autoidentificação, identidade étnico-racial e heteroclassificação”, in J. PETRUCELLI & A. SABOIA, Características ÉtnicoRaciais da População: Classificações e Identidades. Brasília: IBGE. Disponível em https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv63405.pdf
PIERSON, Donald. 1971. Brancos e pretos na Bahia: estudos de contacto racial. São Paulo: Companhia Editora Nacional.
PINHO, Patrícia. 2004. Reinvenções da África na Bahia. São Paulo: Ed. Annablume.
PINTO, Luiz. 1998. O Negro no Rio de Janeiro: Relações de raças numa sociedade em mudança. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1998, 2ª edição, 308p.
ROTH, Wendy. 2010. “Racial mismatch: the divergence between form and function in data for monitoring racial discrimination of Hispanics”. Social Sciences Quarterly, 91, 5: 1288-1311. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1540-6237.2010.00732.x
SANSONE, Lívio. 2003. Negritude sem Etnicidade: o local e o global nas relações raciais e na produção cultural negra do Brasil. Salvador/ Rio de Janeiro: Edufba; Pallas.
SANTOS, Elisângela. 2018. “O Legado de Virgínia Leone Bicudo para a Sociologia da Infância no Brasil”. Cadernos de Pesquisa, 48, 170: 11941217.
SAPERSTEIN, Alyia & PENNER, Andrew. 2012) “Racial fluidity and Inequality in the United States”. American Journal of Sociology, 118, 3: 676-727.
SCHWARCZ, Lilia. 2012. O espetáculo das Raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras.
SCHWARTZMAN, Luiza. 2007. “Does money whitens? Intergenerational Changes in Racial Classification in Brazil”. American Sociological Review, 72: 940-963.
SEYFERTH, G. 1996. Construindo a Nação: Hierarquias Raciais e o Papel do Racismo na Política de Imigração e Colonização. In: MAIO, M.; SANTOS, R. Raça, Ciência e Sociedade. Ed. Fiocruz/CCBB.
SHERIFF, Robin. 2001. Dreaming equality: color, race and racism in urban Brazil. Rutgers University Press.
SILVA, Nelson. 1999. “Morenidade: modos de usar”, in C. HASENBALG; N. V. SILVA & M. LIMA, Cor e estratificação social. Rio de Janeiro: Contra Capa.
SILVA, Nelson. 1979. White-non-white Income Differentials: Brazil. Tese de doutorado em Sociologia, Universidade de Michigan, Ann Arbor.
SILVEIRA, Leonardo & TOMÁS, Maria. 2019. “Fluidez Racial na Região Metropolitana de Belo Horizonte: Características Individuais e Contexto Local na Construção da Raça”. Revista Brasileira de Estudos de População, 36: 1-20. DOI: https://doi.org/10.20947/s0102-3098a0081
SILVEIRA Leonardo. 2019. Reclassificação Racial e Desigualdade: Análise Longitudinal de Variações Socioeconômicas e Regionais no Brasil entre 2008 e 2015. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
SKIDMORE, T. 1976. Preto no Branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
SOMMER, Doris. 1991. Foundational Fictions: The National Romances of Latin America. Berkeley: University of California Press.
TELLES, Edward. 2003. Racismo à Brasileira: uma nova perspectiva sociológica. Rio de Janeiro: Delume Dumará; Fundação Ford.
TELLES, Edward. “The overlapping concepts of race and colour in Latin America”. Ethnic and Racial Studies, 35, 7: 1163-1168. DOI: https://doi.org/10.1080/01419870.2012.657209
VARGAS, Nicholas. 2014. “Off White: Colour-Blind Ideology at the Margins of Whiteness”. Ethnic and Racial Studies, 37, 13: 2281-2302. Disponível em 10.1080/01419870.2013.821147, consultado em 15/09/2017.
WACQUANT, Loïc. 1997. “For an analytic of racial domination”. Political Power and Social Theory, 11: 235-246.
WAGLEY, Charles. 1952. “Race relations in an Amazon Community”, in C. WAGLEY, Race and Class in Rural Brazil. Paris: Unesco.
WIEVIORKA, Michel. 1995. The Arena of Racism. Londres: Sage.
ZOLBERG, Aristide & WOON, Long. 1999. “Why Islam Is Like Spanish: Cultural Incoporation in Europe and the United States”. Politics & Society, 27, 1: 5-38.
Notas
Notas
3 Trata-se de um racismo difuso e difundido pelo colonialismo que exalta as características tidas como europeias ( Telles, 2012) e homogeneíza e estereotipa características africanas ( Mbembe, 2017) e indígenas.
4 Utiliza-se estética ao invés de fenótipo, seguindo indicação de Moutinho (2004), influenciada por escrito de Thales de Azevedo (1975), segundo o qual, estética reforça que os traços fenotípicos são “racializados” socialmente.
5 Pesquisas recentes, porém, têm revisado a pretensa rigidez classificatória norte-americana ( Saperstein; Penner, 2012).
6 Segundo Barth (1998), o cosmopolitismo não levou a uma supressão das fronteiras sociais, mas ao seu enrijecimento dado o aumento dos fluxos de pessoas. Ou seja, em situações de contato social é que as fronteiras são mobilizadas.
7 O campo de Donald Pierson foi realizado entre 1935 e 1937 em Salvador.
8 Por análises ecológicas, os autores se debruçam sobre aspectos relacionais e de convivência cotidiana, investigando, por meio de surveys, percepções e atitudes dos entrevistados.
9 Tal processo migratório mexeu com dinâmicas demográficas e simbólicas no Brasil, em especial nas regiões Sudeste, e mais especialmente, Sul. Demograficamente, houve um aumento da população de origem europeia que se instalou em zonas rurais e urbanas de ambas as regiões, alterando a participação proporcional dos grupos considerados brancos ( Klein, 1999). Simbolicamente, o impacto também é considerável, uma vez a recepção de imigrantes internacionais foi altamente seletiva, sendo conformada por comissões parlamentares que indicavam a predileção por países da Europa ocidental e Japão, e uma expressa recusa por outros países asiáticos e africanos ( Skidmore, 1976; Seyferth, 1996)
10 Esses dados parecem ser corroborados mais recentemente por Almeida (2007) que destacou as diferenças regionais, sendo o Sul mais favorável aos brancos, mesmo havendo controle pela cor dos respondentes (Almeida, 2007).
11 Embora o trabalho de França (2010) utilize uma abordagem quantitativa, sua problematização é restrita à cidade de São Paulo. O autor estabelece ainda interlocuções posteriores entre esse trabalho e outros achados (2016).
12 Classificação feita por meio da avaliação de outras pessoas, geralmente o entrevistador.
Autor notes
1 Trabalho desenvolvido durante o período de doutoramento (UFMG, 2015-2019) e pósdoutoramento (PUC Minas, 2020), ambos com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior (CAPES).

leosilveira.soc@gmail.com

Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por Redalyc