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O sentido do acolhimento na hospitalidade. Entrevista com Conrad Lashley
Leandro Benedini Brusadin
Leandro Benedini Brusadin
O sentido do acolhimento na hospitalidade. Entrevista com Conrad Lashley
Caderno Virtual de Turismo, vol. 16, núm. 3, pp. 9-14, 2016
Universidade Federal do Rio de Janeiro
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O sentido do acolhimento na hospitalidade. Entrevista com Conrad Lashley

Leandro Benedini Brusadin
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Brasil
Caderno Virtual de Turismo, vol. 16, núm. 3, pp. 9-14, 2016
Universidade Federal do Rio de Janeiro
ENTREVISTA COM CONRAD LASHLEY[1]

Por que o senhor se interessou por estudos acerca da hospitalidade na perspectiva humana do anfitrião?

Por quê? Bem, eu creio que por uma série de razões. A primeira é que, se você simplesmente olha de uma perspectiva educacional, os cursos estão voltados a questões práticas, ao fazer, ao fazer plano de marketing, ao conselho gestor, esse tipo de coisa. E, se não tomamos cuidado, cria-se uma mentalidade inquestionável. Portanto, a partir de uma perspectiva educacional, temos de estimular os alunos a questionar sob uma visão crítica. E aí, com isso em mente, uma das coisas que o estudo sobre hospitalidade proporciona é abrir o campo para as Ciências Sociais para que possamos olhar para a Antropologia, para que possamos ver como as culturas diferentes recebem hóspedes, as obrigações com as quais precisamos lidar. Isso nos fornece, então, uma entrada para um pensamento mais crítico porque o que queremos que seja nosso modus operandi, podemos ver que é algo global, sabe, há obrigações mundiais para receber e acolher o novo. Então, de qualquer forma, esta é realmente minha perspectiva. É, primeiramente, um ponto de vista educacional, oferecer aos alunos algumas ferramentas para desenvolver o pensamento crítico, e então, por outro lado, as Ciências Sociais são o caminho adiante, penso eu, em última instância, que podemos criar pessoas que serão profissionais reflexivos denominado como “profissionais filosóficos”. Então temos essa forma de educar as pessoas porque, para mim, não é só preparar as pessoas para a indústria, é educá-las como seres humanos, dar-lhes certas ferramentas que permitam questionar, independentemente de onde possam estar trabalhando.

O que você pensa sobre os debates acadêmicos relativos ao acolhimento na atualidade?

Para começar o setor hoteleiro é apenas uma parte da indústria da hospitalidade se pensarmos na palavra “hospitalidade” como um substantivo coletivo para nos referirmos à prestação de serviços alimentícios, de bebidas e serviços de acomodação. Então, embora a maioria dos programas e até mesmo aqui [Stenden University of Applied Sciences em Leeuwarden na Holanda], tenham “hotel” no título, de fato, podemos nos remeter a boates, podemos nos remeter a grupos de bares, podemos nos remeter a contratos de buffet, podemos nos remeter a serviços hospitalares, negócios escolares e assim por diante. E, desse modo, a ideia é que o que a hospitalidade faz, de certa forma, é nos estimular a ver o mundo a partir dessa perspectiva amplamente aceita, de modo que não estejamos apenas nos remetendo a hotéis. Fizemos uma pesquisa no Reino Unido há alguns anos que analisou as trajetórias de carreira e um número muito grande de pessoas que começou a trabalhar em hotéis e que queria terminar seu curso, mas, em seguida, largou e passou a trabalhar em outras indústrias. Então, uma das coisas que eu fiz nos programas que coordenava na época era proporcionar estímulos às pessoas em relação a alguns desses outros setores porque acreditamos que o título “hotel”, se não tivermos cautela, limita as opções e acabamos não damos impulso o bastante para os alunos. Certamente esse outros setores podem oferecer melhores opções de carreira uma vez que se assume responsabilidades familiares em tempo integral. Diversas vezes eu pergunto às pessoas como lidam com as famílias, elas preferem horários regulares de trabalho, ou seja, 5 vezes na semana. Então, todas essas razões significam que não deveríamos estar tão ligados ao nome “hotel”.

Que dificuldades você ainda encontra para o desenvolvimento de debates acadêmicos sobre a hospitalidade no mundo?

É isso, novamente, devido a essa ligação com o mundo de trabalho, se não tivermos cuidado, tudo é julgado de acordo com a contribuição para o desenvolvimento dessas pessoas em seu trabalho futuramente. Então, a ideia é deslocar, se preferir, abrir o campo de estudo para que não estejamos tão suscetíveis a essa tirania da relevância e, de fato, começar a olhar para uma introdução de cursos ou módulos que, de fato, ajudem os alunos a pensar. Quero dizer, eu falei de Antropologia como uma opção, mas por que não avançar os estudos? Muito dos estudos sobre a hospitalidade tem a ver com performance. Então, talvez possamos aprender com as escolas de teatro. Talvez possamos aprender com a Arte. Uma das coisas que possuo e que mais me orgulham é um quadro que foi pintado para mim por meus alunos há muito tempo quando mudei da Educação Continuada porque lutei para que eles tivessem Arte em seu conteúdo de diploma, já que eu via a relevância da Arte na apresentação de uma mesa de comida, na decoração de restaurantes, etc.

Os Domínios Social, Privado e Comercial da Hospitalidade do qual você trata podem ser usados com efeito didático e como paradigma para o estudo de hospitalidade. Que importância você acredita que o seu estudo tem alcançado?

Eu creio que, obviamente, o aspecto o cultural faz pelo social, ou seja, o sociocultural, realmente faz é abrir o estudo das sociedades e buscar similaridades e diferenças. No setor privado a maioria das pessoas estaria vivenciando pontes propícias à hospitalidade, seja como anfitriãs seja como hóspedes. Então, novamente, como educadores, somos levados a isso. Como é nessas circunstâncias? Quais são as regras? Quais os limites? O que quero dizer, por exemplo, na Inglaterra, se vou à casa de alguém para jantar, normalmente eu levo umas duas garrafas de vinho, geralmente minha esposa leva chocolates, ou sobremesa ou flores, mas, em algumas culturas isso é um insulto. Então, é essa coisa de questões de código. Portanto, estudar a cultura privada nos dá formas de pensar mais criticamente sobre a cultura comercial. Mas, bem, deixe-me fazer isso, essa coisa de estudar por conta própria, nós, acadêmicos, não deveríamos ter receio de estudar as coisas de que precisamos, é necessário ampliar conhecimento. Por outro lado, quando se estuda essas áreas, podemos ver como há relevância para o setor comercial. Sabe, porque se começarmos a pensar em anfitriões e hóspedes e a hospitalidade e, talvez, em tirar vantagem competitiva fazendo os clientes se sentirem realmente bem-vindos. Então podemos ter essa vantagem competitiva dentre esses domínios. É um modelo bem simples.

Há somente um efeito didático baseado em um modelo?

Sim, é simplesmente um modo real de como ajudar a pensar, pensar mais, é bem simples. Mas te faz refletir sobre essas áreas que trazem informações sobre isso.

Como a hospitalidade poderia ser mais bem aproveitada no contextos privados e comerciais?

Bem, esta é outra questão bastante interessante porque claramente e eu tenho defendido “como se pode ajudar a própria hospitalidade quando se tem um preço? “Gostaria de outra taça de vinho, senhor? Sim, por favor. Bem, são 5 euros.” Isso cria uma coisa do tipo: “não disponho de 5 euros para uma taça de vinho”. Então cria-se uma coisa menos hospitaleira possível. Com isso dito, pessoas como Elizabeth Telfer[2] defendem e eu acredito que ela esteja certa é que, de fato, não é assim tão simples, que há pessoas que estarão designadas para o trabalho em dados setores como empresários ou como os que servem vinho que são hospitaleiras, que realmente sentem a vontade de querer agradar o hóspede porque é assim que elas são. E não é tão óbvio quanto eu inicialmente descrevia porque vejo que há possibilidades e que isso me faz refletir sobre minhas próprias experiências, sobre as pessoas com quem tive relações comerciais, e então, eu ofereceria mais por sua disposição para ser um bom anfitrião. Quero citar como exemplo quando fui para uma parte remota da Sardenha [Itália] pela primeira vez com minha esposa como turistas comuns. Naquele momento, eu falava um pouco de italiano, nada além do básico para me virar. Quando partimos, o cara veio do restaurante onde tínhamos feito uma refeição algumas vezes e trouxe-nos duas garrafas de azeite de oliva, o anfitrião em cujo apartamento nos hospedamos nos presenteou com duas garrafas de vinho. Sabe, esse tipo de coisa, não é uma fórmula, não é como uma barganha: “se você gastar, você ganha isto”. Foi tudo muito genuíno, sabe? Quero dizer que criou-se um sentido de acolhimento mais genuíno do que se teria no setor comercial e suas fórmulas.

Você acredita que as mulheres possuem mais vocação para a hospitalidade?

Eu penso que ser anfitrião está além de uma questão de gênero, independe de gênero porque tem a ver com fazer o outro se sentir bem-vindo. Agora, eu sei que em algumas culturas acontece muito de ser conduzido pelo homem da casa e, mesmo na Inglaterra, tem-se uma situação – se você vai à casa de alguém, em muitos casos com que me deparei, não é sempre, mas na maioria dos casos, você vê que o homem serve a bebidas e a mulher cuida da comida. No entanto, há exemplos em que os homens frequentemente cuidam da comida. Eu mesmo costumava fazer isso, sabe? Então, quando tenho hóspedes, faço a comida. Agora eu simplesmente como fora e deixo alguém cuidar da louça. Então eu acho que esses papeis de gênero são interessantes e, de fato, algo para se observar e para se ter consciência de expectativas culturais diferentes. Estamos trabalhando com autoridades locais porque em 2018 Leeuwarden [Holanda] será a Capital Europeia da Cultura e há uma série de questões sobre como recebermos as pessoas, particularmente de herança confuciana. Então, se recebemos chineses, como eles esperam ser tratados? Devemos disponibilizar hashi? Como eles esperar sem tratados, por quem esperam? Todas essas coisas que precisamos desvendar para que, quando eles vierem, se sintam bem recebidos em seus termos, não em nossos termos.

O mercado usa a virtude da hospitalidade para se reproduzir. Isso pode ser considerado um processo ético?

Bem, só se for genuíno. Acho que este é o ponto sobre as pessoas: será que elas são genuinamente hospitaleiras? Quero dizer, em nossa pesquisa, um de meus alunos de pós-doutorado desenvolveu esse instrumento de mensuração, identificando as pessoas que pareciam ser genuinamente hospitaleiras. Então, elas responderam um elenco de 13 perguntas. Pensamos que é uma minoria, mas não sabemos. Achamos que, como essas pessoas parecem ser genuinamente hospitaleiras poderiam treinar outras pessoas. Então esse negócio todo de como você passa isso adiante que depende de mais pesquisa, mas, precisa de treinamento e umas das coisas que observamos é preparar um programa, provavelmente de meio período e dar certificado aos participantes e algum tipo de bottom. Por exemplo, pode ser de um hotel, dizendo “anfitrião de Leeuwarden ou Friesland”, e aí você, de repente, tem um adesivo num taxi que diz “anfitrião de Friesland”, camisetas dizendo “anfitrião de Friesland”, esse tipo de coisa. A ideia é tentar fazer disso um elemento de respeito porque a ideia do projeto de 2018 [em Leeuwarden] é fazer as pessoas se sentirem bem-vindas em seus próprios para que não vejamos um ao outro como uma ameaça .Você pode soar diferente para mim, você pode parecer diferente para mim, mas, na verdade, somos todos uma grande humanidade, é isso. E isso se adapta muito bem aos meus instintos comunistas.

É de fato possível associar a administração de hospitalidade com os estudos sociais e antropológicos do sistema de trocas de Marcel Mauss?

Eu acho que é possível e penso que, obviamente, os sistemas de doação geralmente têm a ver com hospitabilidade por vocação e se manifestam de formas diferentes, mas, no fim das contas, se você observa a hospitabilidade genuína, ela tem a ver com generosidade. Derrida falou sobre hospitalidade radical, eu falei de hospitalidade altruísta e todos estamos basicamente dizendo a mesma coisa que se trata de dar sem qualquer pensamento de ter algo de volta. Fazemos isso porque isso é o que fazemos.

Mas você acredita que haja algum sacrifício de qualquer uma das partes – hóspedes ou anfitriões – nesse processo?

De certa forma você sempre se sensibiliza com as necessidades do outro de modo que, em alguns casos, você tem de adaptar o comportamento de anfitrião para suprir as expectativas do hóspede e, em contrapartida, o hóspede tem de adaptar seu comportamento. Quero dizer que há um belo ditado italiano que fala que as visitas são como peixe – começam a feder depois de três dias. Sugere-se que não se trata de dar de forma desprendida. Que aquele anfitrião tem a obrigação de não dizer “fique”.

Eu estive na França e entrevistei Anne Gotman[3]. O que o senhor pensa a respeito desses estudos na abordagem dos estudiosos franceses?

Ah, muito bom! Bem, eu digo que é o caminho, estamos dizendo basicamente as mesmas coisas, podemos estar usando modelos e linguagem levemente diferentes, mas, em última instância, estamos dizendo coisas muito parecidas. Então, há sempre essa tendência a partir de um ponto de vista sócio-psicológico de rejeitar o estranho. Por outro lado, depende de como você enxerga os limites. Mas estas são ideias muito similares, de fato a hospitabilidade nos fornece uma maneira de pensar especificamente sobre o visitante, o estranho, mas, em última instância, esses ângulos são vistos na perspectiva de sexos e raças.

Material suplementar
Notas
Notas
[1] Entrevista realizada na Stenden University of Applied Sciences, em 03/06/2015, como etapa da pesquisa de Pós-Doutorado concluído na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP) com utilização de recursos tipo custeio do CNPq.
[2] Elizabeth Telfer é professora da Escola de Humanidades da Universidade de Glasgow e autora de estudos de hospitalidade em interface com a filosofia.
[3] Anne Gotman é Professora da Universidade de Paris V e autora de trabalhos de hospitalidade na ótica urbana e imigratória sob a matriz da dádiva.
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