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GOVERNANÇA PARA A SUSTENTABILIDADE DE DESTINOS TURÍSTICOS: ESTUDO DOS ATORES, AGENDA E DESEMPENHO DA CIDADE DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ
GOVERNANCE FOR THE SUSTAINABILITY OF TOURIST DESTINATIONS: STUDY OF ACTORS, AGENDA AND PERFORMANCE IN THE CITY OF BALNEÁRIO CAMBORIÚ
GOBERNANZA PARA LA SOSTENIBILIDAD DE LOS DESTINOS TURÍSTICOS: ESTUDIO DE ACTORES, AGENDA Y DESEMPEÑO EN LA CIUDAD DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ
Turismo - Visão e Ação, vol. 26, 2024
Universidade do Vale do Itajaí

Artigos



Recepción: 04 Junio 2023

Aprobación: 06 Julio 2024

DOI: https://doi.org/10.14210/tva.v26.19621

Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar os atores, a agenda e o desempenho da governança de turismo em Balneário Camboriú (SC), e como esses elementos se articulam com os desafios à sustentabilidade do destino turístico. Por meio de uma pesquisa predominantemente qualitativa, com coleta de dados documentais e entrevista semiestruturada com especialistas (2) foram analisados os atores, a agenda e o desempenho da governança. Foram identificados a presença de conselhos, planos e instâncias formalizados, além da realização de audiências públicas, espaços e instrumentos importantes para o processo de governança. No entanto, quando analisadas as nuances e o funcionamento dos espaços à luz da literatura, verificam-se desafios quanto à pluralização e à participação dos atores e quanto à diversidade da agenda. Sobre a sustentabilidade, identificou-se que o tema está presente nos planos, mas pouco se encontra nas atas dos espaços de governança. Como contribuições, este artigo apresenta uma síntese sobre a temática da governança de turismo em diálogo com a sustentabilidade e o desenho metodológico pode ser replicado para outros destinos turísticos e espaços de governança.

Palavras-chave: turismo sustentável, participação dos atores, agenda política, desempenho, Balneário Camboriú.

Abstract: This article aims to analyze the actors, agenda, and performance of tourism governance in Balneário Camboriú (SC), and how these elements interact with the challenges to the sustainability of the tourist destination. Through predominantly qualitative research, with documentary data collection and semi-structured interviews with experts (2), the actors, agenda, and performance of governance were analyzed. The presence of formalized councils, plans, and bodies, as well as the holding of public hearings, were identified as important elements and instruments for the governance process. However, when analyzing the nuances and functioning of these spaces in light of the literature, challenges were found regarding the pluralization and participation of actors and the diversity of the agenda. Regarding sustainability, it was identified that the theme is present in the plans but is scarcely found in the minutes of governance spaces. As contributions, this article presents a synthesis on the theme of tourism governance in dialogue with sustainability, and the methodological design can be replicated for other tourist destinations and governance spaces.

Keywords: sustainable tourism, actor participation, political agenda, performance, Balneário Camboriú.

Resumen: Este artículo tiene como objetivo analizar los actores, la agenda y el desempeño de la gobernanza del turismo en Balneário Camboriú (SC), y cómo estos elementos se articulan con los desafíos a la sostenibilidad del destino turístico. A través de una investigación predominantemente cualitativa, con la recopilación de datos documentales y entrevistas semiestructuradas con expertos (2), se analizaron los actores, la agenda y el desempeño de la gobernanza. Se identificaron la presencia de consejos, planes e instancias formalizados, además de la realización de audiencias públicas, espacios e instrumentos importantes para el proceso de gobernanza. Sin embargo, al analizar las particularidades y el funcionamiento de estos espacios a la luz de la literatura, se encuentran desafíos en cuanto a la pluralización y la participación de los actores y la diversidad de la agenda. En cuanto a la sostenibilidad, se identificó que el tema está presente en los planes, pero se encuentra poco en las actas de los espacios de gobernanza. Como contribuciones, este artículo presenta una síntesis sobre la temática de la gobernanza del turismo en diálogo con la sostenibilidad, y el diseño metodológico puede ser replicado para otros destinos turísticos y espacios de gobernanza.

Palabras clave: turismo sostenible, participación de actores, agenda política, desempeño, Balneário Camboriú.

INTRODUÇÃO

As complexas características relacionadas à sustentabilidade de destinos turísticos desafiam a reflexão em torno da governança do turismo (Dredge & Jamal, 2013; Graci, 2013; Coutinho & Nobrega, 2019). A governança, como uma forma de organizar e articular partes interessadas, tem sido proposta no campo do turismo como uma maneira de melhor gerir os desafios e consequências do setor, incluindo a administração pública, o setor empresarial e as comunidades com a finalidade de desenvolver o destino, de modo economicamente competitivo, orientado para a equidade e o progresso social e ambientalmente sustentável (Fernández-Tabales, Foronda-Robles, Galindo-Pérez-de-Azpillaga, & García-López, 2017).

De fato, o envolvimento e a colaboração entre as partes interessadas do destino, no planejamento e gestão, têm estado presentes na literatura sobre turismo. Embora existam desafios a serem superados, como disputas de poder, participação pública simbólica e forte influência da autoridade do governo local nas estruturas de governança (Ruhanen, 2013; Graci, 2013), evidências demonstram que o engajamento e as ações tomadas por uma variedade de atores podem contribuir com o sucesso do desenvolvimento sustentável do destino (Graci, 2013; Fernandez-Tabales et al. 2017; D’arco, Presti, Marino, & Maggiore, 2021; Wang, Zhang, & Qiu, 2022).

No contexto brasileiro, a literatura sobre governança no turismo apresenta, sobretudo, estudos de caso que avaliam a estrutura e a atuação da governança em instâncias regionais (Alves & Souza, 2019; Bantim & Fratucci, 2019; Conceição, 2020; Xavier, Totti, & Raddatz, 2021) e municipais (Trindade, César, & Vianna, 2019; Maracajá & Pinheiro, 2020). São relatadas experiências em que se identifica uma forte articulação e cooperação dos atores locais no planejamento e na gestão (Trindade, César, & Vianna, 2019), bem como casos em que os desafios institucionais e organizacionais ficam evidentes (Coutinho & Nobrega, 2019), como problemas de comunicação, de integração e de articulação entre os diversos atores (Barbara, Leitão, & Fontes Filho, 2007).

Mediotte, Emmendoerfer e Oliveira (2020), a partir de uma análise sobre as formações discursivas em torno da governança pública no contexto do turismo, evidenciam uma inclinação gerencialista na perspectiva de governança na área, com ênfase em um paradigma econômico normativo e no estímulo a parcerias público-privadas, em detrimento de uma perspectiva mais plural que privilegie a coprodução e a atuação da sociedade civil no processo.

A cidade de Balneário Camboriú tem sido utilizada como locus analítico em artigos da área de governança (Novak & Polette, 2015; Bombana, Conde, & Polette, 2016), assim como a temática da sustentabilidade no setor (Zapater, Polette, & Vallarino, 2019; Tischer & Polette, 2019). Dentre os elementos que impulsionam a reflexão sobre a governança do turismo nesse território, destacam-se os desafios socioambientais nas zonas costeiras e seus modelos de desenvolvimento, além da reputação do destino e o possível diálogo com as pesquisas anteriores, empreendendo a possibilidade de uma reflexão longitudinal sobre a temática.

O estado de Santa Catarina foi tradicionalmente reconhecido por um estilo de desenvolvimento, como destacam Vieira, Cazella, Cerdan e Andion (2009), marcado pela riqueza das heranças culturais, pelas vantagens da pequena propriedade e pela busca de flexibilidade face às pressões nacionais. No entanto, a partir da década de 1980, essa trajetória apresentou sinais de esgotamento. Dentre os desafios socioambientais para zonas costeiras, Vieira et al. (2009) destacam os efeitos deletérios da especulação imobiliária e o perfil de ocupação e de turismo de verão e de lazer com impactos destrutivos ao ambiente biofísico e à qualidade de vida da população. Em estudo recente, Réus e Andion (2018) destacam a tendência de crescimento populacional e urbanização centralizadas em cidades-polo na última década, com destaque à migração de populações vizinhas. Portanto, em um contexto de crise e questionamento da democracia e seus espaços, faz-se necessário refletir sobre a capacidade, o modo e a qualidade da governança (Andion & Magalhães, 2021).

Diante desse panorama, esta pesquisa tem como objetivo analisar os atores, a agenda e o desempenho da governança de turismo em Balneário Camboriú (SC), e como esses elementos se articulam com o desafio à sustentabilidade do destino turístico.

Espera-se que este artigo contribua para o campo da governança do turismo ao oferecer uma análise da governança em um contexto específico. Isso envolve discutir os desafios e as oportunidades em torno do processo de governança em um destino turístico em particular, visando a fornecer insights práticos e teóricos que possam informar políticas e práticas de gestão em torno da sustentabilidade.

O artigo está dividido nesta introdução, seguida da fundamentação teórica na qual se abordam aspectos sobre sustentabilidade em destinos turísticos e a governança de turismo. Na sequência, são apresentados os caminhos metodológicos, os resultados da pesquisa e, por fim, as considerações finais com encaminhamentos para a continuidade de estudos sobre o tema.

REVISÃO TEÓRICA

Desde a década de 1990, tem havido uma grande preocupação nas pesquisas e nas políticas turísticas em relação aos impactos socioambientais nos destinos turísticos. Reconhece-se que o desenvolvimento do turismo está diretamente ligado a mudanças significativas no uso da terra e dos recursos naturais. Entre os impactos mais destacados estão a poluição da água, a perda da diversidade biológica, o desperdício de energia, o alto nível de geração de lixo, a poluição de praias e o desenvolvimento urbano descontrolado, causado pelo aumento de hotéis e conjuntos residenciais (Mao, Meng, & Wang, 2014; Muangasame & Mckercher, 2014; Fernandez-Tabales et al., 2017; Danish & Wang, 2018; D’arco et al., 2021). Um aspecto de especial atenção é a emissão de dióxido de carbono (CO2) pelo setor turístico, que, segundo Lenzen et al. (2018), é responsável por aproximadamente 8% das emissões globais de gases de efeito estufa.

Os estudos sobre capacidade de carga dos destinos turísticos têm sido apontados como instrumentos de planejamento para identificar os limites aceitáveis, em relação aos impactos sociais, econômicos, ambientais e culturais. No entanto, Neves e Eusébio (2021), por meio de uma revisão sistemática de literatura sobre o conceito, apontam a falta de estudos que relacionem a capacidade de carga às atividades de restauração, transporte, agências de viagem e operadoras. A maioria dos estudos analisa serviços culturais, de recreação e lazer, havendo apenas um único estudo identificado relacionado ao alojamento. Os autores destacam, portanto, a importância de considerar o alojamento e o transporte nesses estudos, especialmente diante da expansão das plataformas e aplicativos nessas atividades econômicas. Isso evidencia a importância de uma constante atualização dos possíveis impactos e das metodologias de mensuração diante das dinâmicas socioeconômicas do setor.

Em meio a essa discussão, a Organização Mundial do Turismo (OMT/UNWTO) e a Organização das Nações Unidas (ONU/UN) elaboraram diretrizes para a promoção de um turismo mais sustentável. O primeiro documento foi a Agenda 21 para a indústria das Viagens & Turismo, que integra a Agenda 21, elaborada na Conferência das Nações Unidas, em 1992. (UNWTO, 1993, tradução: Lima & Partidário, 2002).

Com base nesse documento, cada país desenvolveu sua própria Agenda. O Brasil, concluiu sua Agenda 21 em 2002, com direcionamentos voltados para informações e conhecimentos para o desenvolvimento sustentável, inclusão social, sustentabilidade urbana e rural, preservação de recursos naturais, governança e ética para a promoção da sustentabilidade (Brasil, 2004).

Em 2015, em um novo encontro com a presença de 193 Estados-membros da ONU, foi firmado o compromisso de seguir as medidas recomendadas no documento “Transformando o Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”, que contém 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e 169 metas para erradicar a pobreza extrema, combater a desigualdade, a injustiça e reparar as mudanças climáticas até 2030 (UNWTO, 2019, tradução: Ministério do Turismo, 2019).

De acordo com a OMT (2019, tradução: Ministério do Turismo, 2019), o turismo sustentável “tem o potencial de contribuir, direta ou indiretamente, para todos os objetivos. Em particular, foi incluído como meta nos Objetivos 8, 12 e 14”, os quais estão expostos na Figura 1.


Figura 1:
ODSs e metas
Fonte: elaborado pelos autores com base em UNWTO (2019, tradução: Ministério do Turismo, 2019).

As metas, portanto, implicam uma série de atores e instrumentos e esse esforço intergeracional e coletivo demanda novos caminhos de decisão e ação. Sheppard e Williams (2017) elencam o que seriam as pré-condições para uma implementação bem-sucedida do desenvolvimento sustentável do turismo: 1) desenvolvimento de um planejamento estratégico; 2) sistema desenvolvido para medir e monitorar o desenvolvimento; 3) relacionamento participativo das partes interessadas na gestão do destino; 4) estímulo ao meio ambiente e à governança local proativa; 5) engajamento da população local; e 6) educação das partes interessadas sobre a gestão e os princípios do desenvolvimento sustentável. As parcerias, a participação e a governança figuram entre as recomendações. A governança pode ser útil nesse sentido para o planejamento e gestão de ações ao propor metodologias mais participativas, que envolvam a população local e os atores na gestão do destino e por ter a capacidade de interagir diversas dimensões de negócios, institucionais, sociais e territoriais (Fernández-Tabales et al., 2017).

Lin e Simmons (2017) destacam a participação pública como a pedra angular do planejamento do turismo sustentável e sugerem que, para melhorar o planejamento e gerenciamento colaborativo no turismo, é necessário: (1) identificar as partes interessadas representativas; (2) entender a conexão que elas têm entre si, a natureza dessas interações e como podem influenciar o processo de planejamento; e (3) realizar avaliações críticas para entender os processos e impactos do envolvimento do governo no processo participativo.

Os atores no turismo englobam operadores turísticos, residentes e órgãos públicos. Pode-se levar em conta, ainda, atores de grupos de influência e com interesses específicos, como instituições educacionais, igrejas, associações e organizações da sociedade civil (Miočić, Razovič, & Klarin; 2016). Sobre a forma de interação entre os atores, Miočić, Razovič e Klarin (2016) destacam como aspectos importantes: a cooperação, a confiança e a coordenação entre eles. Além disso, a liderança e o poder são apontados na literatura como aspectos essenciais para dar conta da complexidade e da exigência de uma gestão com diversas partes envolvidas (Valente, Dredge, & Lohmann; 2015; Saito & Ruhanen, 2017).

A falta de condições adequadas para a colaboração, segundo McComb, Boyd e Boluk (2017), leva a muitos efeitos negativos e consequências de curto e longo prazos. Tais efeitos incluem desconfiança, falta de legitimidade, conflitos e desilusão entre as partes interessadas. Destacam, ainda, que seria ingênuo presumir que o resultado da colaboração das partes interessadas pode ser determinado como simplesmente eficaz ou ineficaz. Em vez disso, sugerem que essa colaboração tem vários graus de eficácia ao longo do processo.

Assim, para aprofundar a compreensão da dinâmica de governança, atores, estruturas, relações e processos de coordenação e de tomada de decisão, a subseção seguinte dialoga com estudos de governança do turismo no contexto brasileiro.

Estudos sobre governança de turismo no Brasil

No Brasil, a ideia do desenvolvimento de políticas e planos relacionados ao turismo de forma descentralizada e com a participação da sociedade vem sendo aplicada desde a década de 1990, com destaque ao lançamento do “Programa Nacional de Municipalização do Turismo” (PNMT) no ano de 1993. O PNMT possibilitou o surgimento de novos destinos turísticos, a criação dos “Conselhos Municipais de Turismo” e criou oportunidades de treinamento para gestores públicos (Lohmann et al., 2022). Em 2004, foi criado o Programa de Regionalização do Turismo (PRT), que orienta a criação de instâncias de governança regionais (IGR) como espaços para gestão da atividade turística (Brasil, 2022).

O Quadro 1 apresenta alguns estudos realizados no Brasil, que apresentam diferentes instâncias de governança quanto ao locus e focus de análise, além dos principais resultados encontrados acerca da interação dos atores envolvidos na governança de turismo.


Quadro 1:
Estudos sobre governança no turismo realizados no Brasil
Fonte: elaborado pelos autores.

Diante do exposto, os estudos apresentam experiências de governança regionais e locais, e diferentes focus de análise, que abarcam tanto estrutura, instrumentos e desenho, quanto processos e relações entre atores e participação. Quanto aos desafios, os estudos corroboram a afirmação de Bantim e Fratucci (2019, p. 121) de que “embora no papel as instâncias de governança regionais existam com o propósito de administrar territórios regionais com a participação de diversificados agentes, na prática, esses são propósitos difíceis de serem alcançados”. A governança local também apresenta desafios, como a dependência de estímulos exógenos à região, a necessidade de coordenação e de uma comunidade ativa e participativa. Em diálogo com os estudos anteriores, a próxima seção apresenta os procedimentos metodológicos.

METODOLOGIA

Esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa com a utilização da estratégia de estudo de caso (Martins & Theóphilo, 2016). O estudo de caso é aplicado na cidade de Balneário Camboriú, localizada no Estado de Santa Catarina, na região Sul do Brasil. A cidade possui uma área de 46 km² e uma população estimada em 149 mil habitantes (IBGE, 2021), mas durante a alta temporada, com o fluxo de visitantes, esse número chega a 1,4 milhão de pessoas (Balneário Camboriú, 2021). O município ocupa o quarto lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro, entre cidades com menos de 500 mil habitantes (IBGE, 2020) e é classificado como categoria A na Categorização dos Municípios das Regiões Turísticas do Mapa do Turismo Brasileiro. Além disso, Balneário Camboriú é reconhecida pela Assembleia Legislativa como a “Capital Catarinense do Turismo” (Santa Catarina, 2015).

As primeiras casas de veraneio surgiram na cidade em 1926, e o crescimento do setor turístico, com foco no turismo de sol e mar, ocorreu principalmente na década de 1960. A partir de 1984, o município passou a receber turistas de todo o Brasil, bem como de países vizinhos, como Paraguai, Uruguai e principalmente Argentina (Bastos, 2012). Em 2022, Balneário Camboriú foi campeã no pilar “Sustentabilidade” entre as cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes no prêmio Band Cidades Excelentes e conquistou o primeiro lugar geral no Ranking Connected Smart Cities, na categoria meio ambiente. No âmbito dos municípios catarinenses, Balneário se destacou no Índice de Efetividade da Gestão Municipal (IEGM) do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE/SC) no exercício de 2021/2020, especialmente em relação às ações relacionadas ao meio ambiente.

Para análise da governança do turismo em Balneário Camboriú, foram utilizados dados primários e secundários para este estudo. Com relação aos dados secundários, realizou-se busca sobre a estrutura de governança em sites governamentais para localizar Leis, Decretos e Resoluções, Atas, Relatórios e Planos. Ao final, foram analisadas as Leis de criação dos espaços de governança e seus Regimentos Internos; o Plano Municipal do Turismo (PMT) 2015 - 2025; o Relatório de Acompanhamento das Ações do PMT; as Atas do Conselho Municipal de Turismo (COMTUR), Consórcio Intermunicipal de Turismo Costa Verde e Mar (CITMAR) e Conselho de Turismo da Região (COMVEMAR). Foi realizada a leitura de todas as Atas disponíveis no site dos Conselhos na data de 10 de março de 2022. No total foram 13 atas do COMTUR (anos de 2019 a 2021), 42 da CITMAR (anos de 2009 a 2022) e uma da CONVEMAR.

Para complementar a análise documental, foi realizada uma entrevista com dois especialistas do quadro de servidores efetivos do município que teve a duração de 45 minutos. A escolha foi intencional, em função da experiência dos entrevistados na política de turismo do município.

Vale destacar que a decisão de conduzir apenas uma entrevista com especialistas neste estudo foi baseada na importância de triangulação de fontes para dialogar sobre os achados. Primeiramente, destaca-se a representatividade dos atores e a importância do diálogo para a versão final. Além disso, considera-se importante a utilização das análises documentais (atas, planos, legislações) como fonte de informações sobre estruturas e práticas com o objetivo de aprofundar estudos comparados e desenvolvimento de desenhos metodológicos para outras localidades.

A entrevista, portanto, como procedimento complementar, permitiu obter insights sobre os achados a partir das análises dos documentos sobre a governança do turismo em Balneário Camboriú, dado o escopo do estudo de caso e a profundidade das discussões realizadas durante o encontro. Portanto, a combinação de entrevista e análise documental permitiu alcançar os objetivos da pesquisa, fornecendo uma compreensão abrangente e contextualizada da governança do turismo em Balneário Camboriú.

A coleta de dados, tanto por meio da entrevista quanto da pesquisa documental, foi norteada por três grandes categorias e oito dimensões de análise, estruturadas a partir do diálogo com pesquisas anteriores. O Quadro 2 detalha cada categoria, expondo as dimensões, referências e questões norteadoras.


Quadro 2:
Categorias de Análise
Fonte: elaborado pelos autores.

Os dados foram analisados com base nas categorias e dimensões expostas no quadro de análise e as entrevistas foram tratadas no Iramuteq para análise de similitude e exploração dos dados. Os resultados, as discussões e as considerações finais são apresentados nas próximas duas seções.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Esta seção está organizada em três subseções, a partir das categorias de análise. Na subseção “Atores, relações, coordenação e processo decisório” dialoga-se sobre a representatividade, as responsabilidades e os papeis, as relações e a tomada de decisão, enquanto a subseção “Agenda” procura dar destaque aos temas e assuntos discutidos nos espaços da governança e em “Desempenho” apresentam-se as ações e a transparência.

Atores, relações, coordenação e processo decisório

A cidade de Balneário Camboriú tornou-se Distrito no ano de 1959 e município em 1964 (IBGE, 2022). O Departamento de Turismo do Município foi criado no ano de 1970, como órgão subordinado ao Prefeito Municipal e que contava com a assistência da COATUR - Comissão de Assessoramento e Turismo da Prefeitura Municipal (Balneário Camboriú, 1970).

A COATUR logo foi extinta e, em 1972, foi criada o COMUTUR - Conselho Municipal de Turismo. Desde então, a cidade conta com um órgão da administração municipal e com um Conselho para as discussões acerca do setor de turismo. Com o passar dos anos, outros atores e instâncias foram sendo inseridos no cenário. A Figura 2 apresenta um retrato dos atores que compõem o atual desenho da governança do turismo de Balneário Camboriú e suas interlocuções com as instâncias regionais.


Figura 2:
Atores da Governança de Turismo de Balneário Camboriú
Fonte: elaborado pelos autores.

A nível regional, identificou-se como espaço de governança o CITMAR e a IGR Convemar. O CITMAR foi criado em 2007 e é formado por nove cidades da região que contribuem financeiramente para as realizações das ações definidas em assembleia e a IGR é formada pelo Conselho de Turismo da Região Costa Verde & Mar (Convemar), constituído conforme normativas do Programa de Regionalização do Ministério do Turismo.

A governança em nível municipal é formada pelo COMTUR, pela Sectur, pelo Conselho Gestor BC Criativo e pela Comissão Permanente de Análise, Acompanhamento e Aplicação do Plano Municipal do Turismo (PMT).

O COMTUR é composto por nove representantes do Poder Executivo; três da Segurança Pública; seis representantes de Entidades Empresariais; cinco de Sindicatos e um de Instituição de Ensino. Sendo, portanto, 12 representantes de órgãos públicos e 12 representantes da sociedade civil.

O Conselho Gestor do BC Criativo, instituído pela Lei n. 4.176 (Balneário Camboriú, 2018a), está vinculado à Sectur e é responsável pelo Balneário Camboriú Criativo (BC Criativo): “rede colaborativa com o objetivo de articular e acompanhar a implantação de políticas públicas, para o fortalecimento da economia criativa, diversificando a matriz econômica de Balneário Camboriú, em prol do desenvolvimento sustentável (...)”. O conselho tem participado de ações, como, por exemplo, a construção da Lei de Inovação e Marco Legal para o fomento da economia criativa (Ata BC Criativo 06/2019).

A Comissão Permanente de Análise, Acompanhamento e Aplicação do Plano Nacional do Turismo - criada em 2019 pela Lei n. 4224 (Balneário Camboriú, 2018b) - é formada por três profissionais, turismólogos da Sectur, que se reúnem mensalmente para avaliar o status das ações definidas no PMT e elaborar um relatório com o resultado deste acompanhamento.

Na entrevista, os especialistas destacaram a importância do CITMAR para o desenvolvimento do turismo no município, descreveram-no como um espaço em que as ações são discutidas e que a presença de secretários e gestores com formação e experiência na área do turismo contribui positivamente para os debates e as decisões do grupo. As definições de ações em nível regional pelo Consórcio também são importantes para dar subsídio à continuidade de ações em nível municipal.

A nuvem de palavras criada a partir da entrevista, utilizando o Iramuteq, evidencia a centralidade do conselho, das comissões e da secretaria, apontando para diferentes instâncias (municipal e regional), diferentes atores (hotelaria, lideranças políticas, técnicos e sociedade) e instrumentos (regimento, relatório, plano).


Figura 3:
Nuvem de palavras da entrevista
Fonte: elaborada pelos autores com Iramuteq.

Com a verificação da lista de presença das Atas da Comtur, constatou-se que houve faltas frequentes de conselheiros nas reuniões e que há baixa diversidade de assuntos nas pautas. Esta situação também ocorre na IGR Convemar, em que as reuniões são esparsas, uma ou duas vezes no ano, e os assuntos são limitados àqueles já debatidos e definidos no CITMAR.

As atribuições e as competências dos atores estão definidas nas Leis e Decretos que instituem cada espaço de governança e percebeu-se a preocupação da parte técnica da Sectur em reforçar essas informações para os atores. Encontra-se em ata a necessidade de atividades de formação de conselheiros, conforme fala de especialista “devido à presença dos novos conselheiros se faz necessário uma chamada de reunião extraordinária para que os conselheiros entendam qual seu papel dentro do conselho, qual a importância desse conselho e num segundo momento sobre as ações feitas em prol do turismo e plano municipal do turismo e é importante que os conselheiros tenham ciência dessas ações.” (Ata COMTUR, 03/2020).

Das atas analisadas, foram constatados poucos episódios de divergências entre atores. Observou-se a ocorrência de um debate mais aflorado quando trataram do empreendimento do centro de eventos. Nesse episódio, houve divergências entre o Poder Público Municipal e o Poder Público Estadual. Um dos conselheiros “relata sobre sua insatisfação com o andamento do centro de eventos, diz que já conversou com o prefeito e diz que o presidente da Santur visita e promete coisas que não está cumprindo. Fala que as demandas feitas ao governo do Estado não foram atendidas no processo licitatório.” (Ata COMTUR, 01/2021).

Acerca da tomada de decisões, constatou-se uma carência de dados para subsidiar as deliberações. Apesar de haver o setor de Planejamento e Pesquisa, como constatado pela análise documental e depois confirmado na entrevista, faltam informações e indicadores de acompanhamento, a partir de pesquisas, para avaliação do cenário do turismo ao longo do ano.

Sobre a participação dos cidadãos verificou-se por meios das atas que são realizadas audiências públicas para casos específicos, como o caso do processo de concessão do centro de eventos, mas que não há garantia de representatividade na estrutura da governança, por exemplo, por meio de associação de moradores. Este fato vai de encontro à literatura quando apontado que os residentes são atores fundamentais dentro dos espaços de governança, principalmente quando se propõe discutir sobre sustentabilidade (Graci, 2013; Ruhanen, 2008).

Já a classe empresarial possui maior representação nos Conselhos e acesso à gestão municipal. O trecho extraído da Ata do Conselho demostra essa proximidade: “Representante da ACIBALC diz sobre reunião com o Prefeito e destaca já haver sido iniciado um estudo de projeto de Natal, já apresentado ao prefeito, que solicitou mudanças, as quais serão feitas. (...) Representante da ACIBALC afirma que enquanto segunda parte, entidades como CDL e SINDUSCON serão chamadas para fazer parte do projeto.”. Foi possível perceber em relatos que alguns diálogos são realizados previamente em espaços distintos dos formalmente constituídos. Esse é um aspecto sensível e que precisa ser mais bem explorado em pesquisas futuras, dialogando com a dimensão das relações de poder nas estruturas de governança e da accountability, visto que o debate público e a transparência são características elementares para uma governança democrática e participativa.

Em suma, embora a estrutura de governança apresentada inclua diversos órgãos e conselhos, a frequência irregular e a baixa diversidade de assuntos discutidos em reuniões do COMTUR e da IGR Convemar sugerem uma possível falta de efetividade e de engajamento, a serem aprofundados em pesquisas futuras com os atores. Isso fica evidente, ainda, pela necessidade de dialogar com frequência nos espaços sobre as responsabilidades e atribuições. Além disso, a carência de dados e indicadores para subsidiar as tomadas de decisão revela uma deficiência no embasamento técnico das deliberações, o que pode comprometer a eficácia das políticas e ações implementadas.

Outro ponto crítico diz respeito à representatividade e participação dos cidadãos na governança, especialmente através de associações de moradores, que se contrapõe aos princípios de uma governança democrática e participativa, conforme a literatura. Cabe, por fim, destacar a importância de pluralizar os atores que participam dos espaços de governança, avaliando e considerando as assimetrias de poder e de incidência das políticas, para que os interesses e necessidades sejam apresentados, discutidos e mediados nos espaços.

Agenda

Para aprofundar a compreensão da agenda, são apresentados os temas discutidos nos instrumentos e nos espaços de governança. O principal instrumento que orienta os assuntos debatidos nos espaços de governança do município é o Plano Municipal de Turismo de Balneário Camboriú. Conforme exposto no PMT, constitui a visão do Turismo na cidade “Ser referência mundial em turismo sustentável através da oferta de produtos e serviços de excelência para todos”; com a missão de “Encantar o turista pela diversidade da oferta de produtos e serviços de excelência, através do fortalecimento econômico com qualidade de vida da comunidade e visitantes”; tendo em vista os seguintes valores: hospitalidade; qualidade de vida; inovação e respeito (Balneário Camboriú, 2018b). As diretrizes do Plano Municipal de Turismo estão apresentadas na Figura 4.


Figura 4:
Diretrizes do Plano Municipal de Turismo
Fonte: Adaptado de Oficina participativa - Balneário Camboriú (2015).

O PMT coloca como direção um turismo sustentável, em sentido amplo, que procura equilibrar as dimensões econômica, social e ambiental e, conforme identificado por Mafra (2019, p. 111), “as diretrizes apresentadas são semelhantes às encontradas nos planos nacional e estadual de turismo”.

São quatro os programas definidos no PMT: Qualificação Profissional, dos Serviços e da Produção Associada; Empreendedorismo e Políticas Públicas do Turismo; Informação ao Turista, Promoção e Divulgação do Destino Turístico; e Sustentabilidade. O PMT é sucinto na exposição dessas ações e o Quadro 3 apresenta todo o programa que trata da sustentabilidade.


Quadro 3:
Programa 4 - Sustentabilidade
Fonte: Adaptado de Oficina participativa - Balneário Camboriú (2015).

Com a análise do relatório de acompanhamento das metas do PMT verificou-se que muitos projetos, mesmo com a prioridade elencada como “alta”, não foram implementados até o fim da coleta de dados desta pesquisa (março/2022). A ação 1.1 da Figura 3 é um exemplo de ação que passou do prazo estabelecido e não foi atendida por completo. Verificou-se que a definição de quais dessas ações serão priorizadas e constituirão pauta de debate nos espaços de governança, normalmente é direcionada pelo responsável pela condução dos espaços de governança e pelo responsável da pasta no Poder Executivo.

Mafra (2019), ao analisar o PMT de Balneário Camboriú, chamou atenção para a ausência de políticas públicas que considerem a presença de um centro de eventos (empreendimento que estava em fase de finalização). Cabe, assim, refletir sobre as presenças e ausências temáticas na dinâmica de governança. A cidade está constantemente sendo campo de novas instalações e obras - alargamento da faixa de areia, roda gigante Big Wheel, aquário de BC, atracadouro e porto para recebimento de cruzeiros - e esse dinamismo necessita ser considerado nas ações e planejamentos turísticos, assim como circular em espaços amplos de discussão e governança.

Verificou-se, ainda, a ausência de outros temas que são elencados como prioridades na Agenda 21 do setor de Viagem & Turismo e que não entraram para a agenda: gerenciamento de resíduos, reutilização e reciclagem; gestão de energia, de recursos hídricos superficiais, de águas residuais e de substâncias perigosas; mobilidade; gestão e planejamento do uso do solo; e envolvimento dos recursos humanos das empresas, clientes e comunidades locais nas questões ambientais. Do mesmo modo, há uma baixa aderência às metas propostas pela Agenda 2030.

Ademais, há ausência de temas relacionados às mudanças climáticas, como mitigação das emissões de gases de efeito estufa e ações de adaptação climática, necessários para tornar os destinos resilientes e sustentáveis. Esses assuntos são amplamente debatidos nas agendas globais, diante dos impactos climáticos já percebidos, como o crescente aumento de inundações, ondas de calor e erosão, aos quais as regiões costeiras são particularmente sensíveis.

Portanto, apesar dos aspectos positivos como o compromisso expresso no PMT com a promoção do turismo sustentável, refletido na visão, missão e valores estabelecidos, há discrepância entre as diretrizes do PMT e a implementação efetiva das ações como visto nos documentos de acompanhamento. A análise revelou que alguns projetos, mesmo com prioridade alta, não foram implementados na íntegra, conforme planejado, indicando desafios ao monitoramento e à implementação das iniciativas propostas.

Dentre as pré-condições para o desenvolvimento sustentável do turismo, elencadas por Sheppard e Williams (2017), destacamos que, ainda que haja um planejamento estratégico desenvolvido por meio do diálogo com atores locais em oficinas e aprovado pelo conselho, existem desafios no monitoramento e engajamento da população local, ao relacionamento participativo entre atores, além dos desafios relacionados à educação das partes interessadas sobre a governança e a abordagem de temáticas emergentes, como desenvolvimento sustentável e mudanças climáticas.

Desempenho

O desempenho gerado com a estrutura de governança presente no município de Balneário Camboriú pode ser evidenciado pela avaliação das ações elencadas no PMT. A prestação de contas sobre estas ações passou a ser realizada por meio da Comissão formada pelas turismólogas do município. A partir de então, as ações começaram a ser formalmente monitoradas e acompanhadas. O Quadro 4, a seguir, apresenta as ações alcançadas e seu respectivo Programa.


Quadro 4:
Ações do PMT realizadas
Fonte: elaborado pelos autores.

Apesar de serem ações significativas para o turismo do município, como a articulação entre secretarias, o atendimento aos padrões internacionais, reuniões de integração e potencialidades com relação à observação de pássaros na rede de governança, verificou-se que as ações não abarcam todas as diretrizes do PMT, deixando de fora ações importantes para a sustentabilidade do destino, como aquelas apresentadas no Quadro 3. Além disso, temas relevantes que surgiram após o PMT, por exemplo o fato do fechamento de hotéis devido à pandemia, também não foi levado à discussão nos espaços de governança.

Sobre a prestação de contas e a transparência dos resultados, identificou-se que esses processos podem ser aprimorados. A CITMAR disponibiliza as prestações de contas em seu site, mas nas atas dos demais espaços não foram identificadas sessões para apresentação e prestação de contas. A divulgação dos relatórios, atas e demais documentos de forma centralizada também é recomendável. No PMT está indicada a criação do “Observatório do Turismo BC”, que, segundo os entrevistados, irá concentrar todos os dados e informações sobre o setor. Este instrumento, quando concretizado, será um passo importante para a tomada de decisão de gestores, assim como para transparência em torno das políticas e da agenda do turismo.

Em resumo, a análise do desempenho da governança do turismo em Balneário Camboriú aponta para a necessidade de aprimoramentos em diversas áreas, incluindo a implementação de políticas de sustentabilidade de modo intersetorial, a flexibilidade da agenda para lidar com questões emergentes, e a transparência e prestação de contas dos resultados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados apresentados podem ser relacionados com a literatura internacional e com os estudos de caso brasileiros. A falta de comprometimento dos atores (Alves & Souza, 2019); o baixo envolvimento dos atores no contexto do desenvolvimento socioambiental (Conceição, 2020) e a falta de participação (Bantim & Fratucci, 2019) foram encontradas no município estudado.

A IGR Convemar apresenta tanto dificuldades financeiras, quanto de engajamento como relatados nos estudos das Instância de Governança Regionais (Alves & Souza, 2019; Bantim & Fratucci, 2019; Xavier, Totti, & Raddatz, 2021). No entanto, o Consórcio Costa Verde & Mar faz as vezes de instância regional e é considerado efetivo por engajar atores do poder público dos municípios.

Sobre a análise da agenda e do desempenho da governança, constatou-se que a divulgação centralizada e organizada dos documentos, indicadores e relatórios sobre o turismo é um ponto a ser melhorado, sendo citado pelos especialistas e previsto por meio da criação de um Observatório. O detalhamento de cada ação proposta pelo PMT também irá contribuir para a transparência e acompanhamento pelas partes interessadas. Da mesma forma, o levantamento de dados estatísticos e indicadores da área para servir de subsídios para decisões nos espaços de governança pode contribuir para planejamento, avaliação e transparência no setor, num processo de aprendizagem colaborativa entre os atores.

Em relação à sustentabilidade, identificou-se que o tema está presente na agenda por meio do PMT, com objetivo de análise da capacidade de carga e promoção de ações e projetos específicos, mas a entrada dos temas em pauta depende dos atores, em especial, das lideranças dos espaços de governança. Os conteúdos emergentes da Agenda 2030, por exemplo, circulam pouco nos espaços, o que pode apontar para a não priorização dos temas.

Além disso, não foram encontradas discussões, nos espaços de governança do turismo, sobre os desafios socioambientais característicos da cidade, ligados à especulação imobiliária e ao modelo de ocupação do solo centrado na maximização do espaço construído. Esses aspectos são essenciais, pois interagem diretamente com temas emergentes como desenvolvimento sustentável e mudanças climáticas.

Como apontado pela literatura internacional, elementos como os atores e suas interações (Lin & Simmons, 2017) e as relações de poder (Saito & Ruhanen, 2017) são pontos críticos da governança para o desenvolvimento do turismo sustentável. A presença de residentes nos espaços de governança, por exemplo, é fundamental para discussões sobre sustentabilidade (Ruhanen, 2008; Graci, 2013). O presente estudo corrobora a relevância desses pontos e demonstra que a governança do caso estudado não conta com uma participação ativa dos residentes e apresenta limitações quanto à pluralidade de atores. Cabe, ainda, aprofundar desafios a respeito das relações de poder e da presença de outros espaços na configuração da agenda. A presença de poucas ações e debates voltados ao desenvolvimento do turismo sustentável, por exemplo, podem ser reflexos desta realidade.

Conclui-se, portanto, que o desenho da governança de turismo do município de Balneário Camboriú possui espaços e instrumentos importantes para um processo mais participativo, como a formalização de conselhos, instâncias e a realização de audiências públicas e o incentivo a estudos sobre capacidade de carga em atrativos naturais como um dos objetivos do plano. Porém, como relatado acima, uma série de desafios é evidenciada na dinâmica e nos processos.

Como um estudo de caso focado em Balneário Camboriú, as descobertas não são generalizáveis para outros destinos turísticos. A escolha de uma única entrevista como método primário de coleta de dados pode limitar a diversidade das percepções obtidas. Além disso, a análise documental se restringiu aos documentos disponíveis até a data de março de 2022, o que pode não refletir mudanças ou atualizações subsequentes nas práticas de governança.

Como contribuições, esta pesquisa oferece uma análise ampla da governança em um destino turístico específico, a partir do diálogo sobre a sustentabilidade. Destaca-se que o roteiro de entrevistas proposto pode ser útil para replicação e análise em outros destinos. Além disso, a pesquisa levantou pontos de melhoria e atenção sobre o caso estudado que poderá ser analisado e considerado por outras localidades. Ressalta-se que é oportuna a continuidade do estudo deste caso, aprofundando o diálogo com atores da estrutura de governança, visando à identificação dos espaços informais e das relações de poder. Futuras pesquisas podem explorar comparações com outros destinos, realizar estudos longitudinais e investigar se (e como) temas ausentes na agenda de governança do turismo, como mudanças climáticas, gerenciamento de resíduos sólidos, uso de energias renováveis e planejamento urbano sustentável, interagem em outros espaços de governança na cidade.

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Notas

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES: Bruna Teixeira Adriano: Conceitualização, Curadoria de dados, Análise de dados, Pesquisa, Metodologia, Design da apresentaçãode dados, Redação do manuscrito original. Danilo José Alano Melo: Conceitualização, Supervisão, Metodologia, Design da apresentação de dados, Redação – revisãoe edição. Hans Michael Van Bellen: Conceitualização, Supervisão, Redação – revisão e edição.
Editor de Seção: Sinval Pereira Júnior.


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