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Leitura após formação de classes de equivalência em crianças com implante coclear: Precisão e fluência em palavras e textos
Reading after equivalence class formation in children with cochlear implant: accuracy and fluency in words and texts
Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, vol. 25, núm. 3, pp. 307-327, 2017
Universidad Veracruzana



Recepção: 11 Dezembro 2016

Aprovação: 03 Abril 2017

Resumo: Esse estudo objetivou ensinar discriminações condicionais auditivo-visuais, testar a emergência de classes de equivalência, de leitura e nomeação em crianças com deficiência auditiva e implante coclear; também verificou os efeitos deste ensino sobre a leitura de livros infantis, considerando precisão e fluência. Participaram três meninos, idade cronológica entre 7-10 anos e idade verbal entre 3:4-3:8 anos (PPVT-IV). O procedimento avaliou a leitura de três pequenos livros e selecionou dois conjuntos de três estímulos para cada participante. Ensinou relações condicionais entre palavra ditada-palavra impressa e palavra ditada-figura por matching-to sample com cada conjunto. Testou-se: a formação de classes de equivalência entre figura e palavra escrita e vice-versa; leitura e nomeação; precisão e fluência na leitura dos livros. Os participantes aprenderam as relações ensinadas, atestaram a formação de classes de equivalência e aumentaram a acurácia em tarefas de vocalização, sobretudo em nomeação. Na leitura dos livros houve aumento da precisão da fala e leitura mais fluente. O delineamento de linha de base múltipla entre conjunto de palavras e entre livros atesta mudança após os procedimentos. Os resultados replicam, com implantados, a literatura sobre relações de equivalência e generalizações para leitura de livros em ouvintes com dificuldades de aprendizagem.

Palavras-chave: relações de equivalência, leitura, livros infantis, implante coclear.

Abstract: This study is a extension of paradigm equivalence relations to people with impaired hearing and cochlear implant. Previous studies showed that equivalence relations can be established among dictated stimuli, printed stimuli and pictures either with words or sentences. Before equivalence classes formation, the reading is more accurate than in the presence of pictures naming. After the equivalence classes formation, the oral production have been more accurate in the pictures naming by the transferring control from printed word to pictures. The extensions of reading word from discrete trial to continuous tasks such as reading of books, it had not yet been tested with cochlear implanted. This study aimed the teaching of auditory-visual conditional relations and verified both the emergency class equivalence and expressive verbal repertoire (e.g., naming and reading). Also, examined the effects of teaching of reading words about reading books with the same words set, from discrete tasks to continuous tasks, considering accuracy and fluency. Participated three boys, chronological age between 7-10 years old; receptive vocabulary equivalent to 3:4-3:8 years old (evaluates by Peabody Picture Vocabulary Test – PPVT - IV), everybody with hearing impaired and cochlear implant. The participant read three small books (with words without difficulty spelling) and were selected a list of words; the words were divided into two sets with three stimuli each; were teaching conditional relations between dictated word-printed word and dictated word-picture via matching to sample (MTS) with each set; were evaluated the formation of equivalence classes between picture and writing word and vice-versa; reading of words and pictures naming also were tested. Were analyzed the percentage of correct in selection response and oral production in tasks of teaching and tests. Reading books were analyzed by the accuracy and fluency. The percentages of correct answers in the pretests were much higher in printed words than pictures naming. The participants learned the conditional relations taught, demonstrated the formation classes emergency and improvement the accuracy of speech in oral production tasks, in pictures naming especially. In the post-test, the percentages of correct answers in words reading that were already good, were even better; and pictures naming reached reading levels. In the reading books they also improvement the accuracy; in fluency there was observed a tendency to reduce the time taken to read the book. The change in performance occurred according to multiple baseline design between sets of words and books. The results replicate and extend the results obtained with listening and learning disabilities children to children with cochlear implant. They showed that children with impaired hearing and cochlear implant learn to read words isolated and use book with the same words as well, demonstrating generalization.

Keywords: equivalence relations, reading, children’ book, cochlear implant.

Considerando a investigação comportamental do ouvir nos casos de deficiência auditiva e implante coclear, as primeiras pesquisas demonstraram a extensão do paradigma das relações de equivalência (Sidman & Tailby, 1982) no estudo de funções simbólicas assumidas pelos estímulos auditivos detectados pelo implante (Almeida-Verdu et al., 2008;da Silva, de Souza, Lopes Júnior, Bevilacqua, & MacIlvane, 2006).

As pesquisas subsequentes, sobretudo aquelas em que a estrutura de ensino baseava-se somente no treino de relações auditivo-visuais, identificaram as condições sob as quais o repertório de ouvinte pode ser expandido (Almeida-Verdu et al., 2008; Battaglini, Almeida-Verdu, & Bevilacqua, 2013) e estas estão de acordo com a literatura internacional mais recente (Messier & Mood, 2015). No entanto, os estudos revelaram que, embora os participantes demonstrassem a expansão de um repertório receptivo condizentes com um funcionamento simbólico, isto é, relacionassem como equivalentes dois estímulos visuais depois que estes foram relacionados via, matching-to-sample, a um estímulo auditivo comum, estes não nomeavam corretamente os estímulos visuais. Especificamente em Almeida-Verdu et al. e em Battaglini et al. as nomeações não estabeleciam correspondência ponto a ponto com as convenções definidas pela comunidade verbal. A demonstração de discrepância entre modos receptivos e expressivos nessa população também é verificada em outros estudos de caracterização (Conway, Pisoni, Anaya, Carpicke, & Henning, 2011; Ertmer & Goffman, 2011; Fortunato, Bevilacqua, & Costa, 2009; Melo, Moret, & Bevilacqua, 2008).

Estudos mais recentes, que fizeram uma análise da produção bibliográfica com esses objetos de estudo (i.e., condições sob as quais comportamentos receptivos e expressivos são estabelecidos e entrelaçados), têm documentado, por um lado, a necessidade de investimento tecnológico em se instalar repertórios expressivos tal como a leitura (Cedro, Passareli, & Huziwara, 2014) e, por outro, demonstraram que a nomeação de figuras, outro tipo de repertório expressivo, pode ser obtida com maior precisão da produção oral quando a leitura é estabelecida ou fortalecia por equivalência de estímulos (Almeida-Verdu & Golfeto, 2016).

A nomeação de figuras consistente com um funcionamento simbólico, sobretudo a precisão da fala, passaram a ser problemas de pesquisa em estudos mais recentes. A precisão da fala, uma das propriedades da inteligibilidade, pode ser compreendida como o máximo de correspondência ponto a ponto com as convenções da comunidade verbal (Habib, Waltzman, Tajudeen, & Svirsky, 2010). Neste cenário, Anastácio-Pessan, Almeida-Verdu, Bevilacqua e de Souza (2015) conduziram um estudo cujo objetivo foi ensinar relações condicionais auditivo-visuais (entre palavra ditada, figura, palavra impressa e sílabas impressas), em tarefas de emparelhamento de acordo com o modelo, cuja resposta é baseada em seleção, de estímulos; e verificar se possibilitaria um aumento na precisão da fala de crianças com implante coclear leitoras, em tarefas de nomeação de figuras, cuja resposta é baseada na topografia vocal. Os resultados dos pré-testes iniciais verificaram que todos os participantes apresentavam resultados com porcentagens de acertos diferentes nas duas tarefas que envolvia produzir palavras vocalmente; os melhores resultados eram em leitura de palavras impressas do que em nomeação de figuras. A intervenção fortaleceu as relações entre palavra ditada e figuras, entre as mesmas palavras ditadas e palavras impressas e entre sílabas ditadas e sílabas impressas, com dois conjuntos compostos por três palavras cada. As tarefas de vocalização foram sistematicamente monitoradas por meio de testes de leitura de palavras impressas e de nomeação de figuras, após cada fase do delineamento. Essas sondas repetidas revelaram que a precisão da fala melhorou progressivamente nas tarefas de nomeação de figuras e a leitura, que já era boa, foi refinada para todos os participantes.

Os achados de Anastácio-Pessan et al. (2015) demonstraram que a precisão da fala em tarefas de nomeação de figuras pode ser obtida por meio do fortalecimento de relações de leitura previamente estabelecidas. O fortalecimento das relações de equivalência entre palavra ditada, figura e palavra escrita, aliado à leitura já bem estabelecida favoreceu o deslocamento do controle de estímulo exercido pelas palavras impressas para as figuras. Esse aspecto é particularmente interessante, pois muitos estudos conduzidos com crianças ouvintes têm demonstrado a transferência do controle de estímulos da figura para o texto impresso no processo de alfabetização, sendo esse o principal alvo, o controle exercido pela palavra impressa (de Souza et al. 1997; Felippe, Rocca, Postalli, & Domeniconi, 2011). Em crianças com deficiência auditiva e implante coclear, o alvo não tem sido a leitura, mas sim a nomeação de figuras que seja consistente com a formação de classes de equivalência e que guarde correspondência ponto a ponto com as convenções da comunidade verbal. Por esse motivo tem-se falado na transferência do controle da palavra impressa (que tende a ocorrer de forma mais precisa pelas pistas visuais fornecidas pelos grafemas), para a figura (que tende a ocorrer com mais incorreções na emissão dos fonemas, pela ausência de pistas fornecidas pelas figuras) (Almeida-Verdu & Golfeto, 2016; de Rose, 2005).

Outra explicação possível para a melhoria na precisão da produção oral pode ser pelas sucessivas oportunidades de nomear oferecidas pelas sondas de produção oral conduzidas no estudo de Anastácio-Pessan et al., (2015) podem ter favorecido a melhor precisão nas tarefas de nomeação. Partindo destas evidências, Lucchesi, Almeida-Verdu, Buffa e Bevilacqua (2015) avaliaram os efeitos de um programa de ensino individual e informatizado de repertórios básicos de leitura e escrita sobre as vocalizações em duas crianças não leitoras, com deficiência auditiva, pré-linguais e usuárias de implante coclear. O programa expôs os participantes a um ensino de três unidades do Módulo I do programa Aprendendo a Ler e Escrever em Pequenos Passos (Capobianco et al., 2009). Repetidas sondas de nomeação foram acrescentadas ao programa básico e foram intercaladas entre as unidades de ensino. Os resultados demonstraram que o ensino ofereceu condições para que o controle fonológico que o estímulo impresso exercia sobre a vocalização em leitura fosse transferido para a nomeação de figuras, aumentando a correspondência ponto a ponto com as convenções da comunidade verbal nesse repertório.

Evidências acerca da transferência desse controle (i.e., de palavras impressas para figuras) a partir do fortalecimento de relações de equivalência, porém com unidades linguísticas maiores (sentenças), foi demonstrada por Neves (2014). Competências receptivas e expressivas complexas, como as sentenças, são desenvolvidas a partir da aquisição de unidades mais simples, tais como palavras isoladas (Mackay, 2013; Sella & Bandini, 2013; Skinner, 1957).

A fim de investigar as extensões das competências iniciais de ouvinte e de falante Felippe et al. (2011) conduziram um estudo no qual se verificou os efeitos do ensino computadorizado de palavras isoladas, retiradas de histórias de livros infantis, sobre a leitura das mesmas palavras no contexto dos livros. Participaram seis crianças com dificuldades de aprendizagem com idade média de oito anos e um mês, matriculados nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Foram selecionados cinco livros da coleção “Gato e Rato” dos autores Mary França e Eliardo França, dos quais foram retiradas nove palavras cada, somando um total de 45 palavras. Destas, 36 palavras foram subdivididas em quatro conjuntos (separados por livros) e fizeram parte das rotinas de ensino, as nove restantes foram apenas testadas.

As sessões de ensino ocorreram em duas fases complementares e sequenciais: ensino de palavras e ensino silábico. Na primeira fase, após pré-testes das relações entre palavra ditada e palavra impressa, palavra ditada e figura e de nomeação de figuras, foram diretamente ensinadas relações condicionais por matching-to-sample (MTS) entre palavra ditada-palavra impressa; se atingido o critério de 83% de acertos nos pós-testes das relações entre palavra ditada-palavra impressa o participante seguia para a segunda fase; no ensino da primeira fase foi adotado o procedimento de ensino por exclusão (Dixon, 1977). A segunda fase foi composta por pré-teste, ensino e pós-testes. O pré-teste envolveu ditado de palavras e a topografia da resposta demandada foi de composição de palavras, a partir da seleção de sílabas na tela do computador. O ensino envolveu a apresentação da sílaba ditada como modelo e seleção da sílaba impressa como comparação; também foram intercaladas tentativas de contextualização, com a apresentação ora de palavra impressa, ora de palavra ditada ora de figura como modelos e as respostas demandas eram de composição. Os pós-testes de ditado foram conduzidos da mesma forma que no pré-teste. Após completar as duas fases de ensino, seguia-se para a leitura dos livros infantis que estavam em linha de base múltipla. Em seus resultados, cinco, das seis crianças que participaram do estudo, foram capazes de ler as palavras dos cinco livros no computador, em tentativas discretas, e também nos livros, consideradas em tarefas mais contínuas.

Apesar do estudo de Felippe et al. (2011) avaliar a leitura de livros de histórias infantis, a fluência da leitura ou compreensão do texto não foram alvos desta pesquisa. Entretanto, não se deve descartar a hipótese de mudanças nesta variável em decorrência do procedimento adotado. A hipótese de mudança na fluência da leitura após o procedimento de ensino foi verificada em Carvalho (2013), em um estudo que envolveu leitura de pequenos textos (sinopses de filmes) por uma criança diagnosticada com Transtorno de Asperger. Embora muitas propriedades estejam envolvidas na fluência em leitura, neste estudo foi considerado a razão entre o número de palavras para ler e tempo dispendido. O estudo Carvalho demonstrou que, após seguidas exposições aos textos com leitura e feedback (p. ex., correção imediata de palavras lidas incorretamente e antecipação e pistas para palavras cuja leitura não ocorria), o tempo dispendido na leitura dos textos diminuiu e a leitura das palavras de modo correto e sem interrupção aumentou. Carvalho também tomou algumas medidas de compreensão do texto, por meio de perguntas sobre o que foi lido ao participante. A pesquisadora notou que, após a leitura realizada durante o pré-teste, na qual não houve nenhum feedback, as respostas do participante estavam sob controle do filme e não do texto, entretanto, após as intervenções, o participante foi capaz de responder a perguntas pontuais sobre o texto, demonstrando estar sob controle deste. Outras pesquisas têm demonstrado que a fluência é uma propriedade da resposta de ler diretamente relacionada com a compreensão (Pinto & Navas, 2011; Puliezi & Maluf, 2014)

Considerando a extensão dos estudos com crianças com implante coclear para unidades mais extensas e complexas da língua e, tendo em vista os resultados de Felippe et al. (2011) e Carvalho (2013), questiona-se se a leitura (considerando as variáveis dependentes de precisão e de fluência) em crianças com implante coclear seria otimizada após a exposição a um treino de leitura e compreensão de palavras em tentativas discretas.

Método

Participantes

Participaram deste estudo três crianças, do sexo masculino, com idade cronológica entre 7 e 10 anos, com deficiência auditiva neurossensorial severa-profunda, usuárias de implante coclear há, pelo menos, 5 anos; todas com surdez pré-lingual, isto é, adquirida antes à aquisição da linguagem; estavam regularmente matriculadas no Ensino Fundamental I e, no contra turno escolar, frequentavam uma instituição de ensino especializado para crianças em reabilitação auditiva. De acordo com o Peabody Picture Vocabulary Test (PPVT™-4, Dunn & Dunn, 2007) a idade verbal era entre 3:4 e 3:8 (anos:meses). Os participantes apresentavam, no período da coleta, categorias de audição e de linguagem similares entre si e consideravelmente altas, de acordo com os dados dos prontuários fornecidos pela instituição educacional de ensino especializado. A categoria de audição varia de 1 a 6, e indica a capacidade dos participantes extraírem informações exclusivamente por meio da audição. Quanto à categoria de linguagem, que varia de 1 a 5, indica fluência na linguagem oral, avaliando diversas habilidades, tais como: construção de frases, o uso de elementos conectores e conjugação de verbos, entre outros (Pinto, Lacerda, & Porto, 2008).

Para a participação no estudo foi necessária assinatura em Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) dos responsáveis legais pelos participantes. Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa [HRAC-USP] sob o protocolo CAAE 19241613.8.0000.5441.

Instrumentos, Materiais e Estímulos

Neste estudo foi utilizado um microcomputador iBook G4 com o software MTS® (Dube, 1991). A apresentação dos estímulos visuais foi feita em janelas, de 5 cm de lado, localizadas no centro e nos vértices da tela do computador. Os estímulos auditivos foram apresentados por alto-falantes simultaneamente à apresentação dos estímulos visuais.

Para uma melhor caracterização dos participantes foi utilizado o Peabody Picture Vocabulary Test, Quarta Edição (PPVT™-4) (Dunn & Dunn, 2007), um instrumento que visa avaliar e mensurar a linguagem receptiva em crianças e adultos por idade e escolaridade.

Foram utilizados livros infantis “O macaco e a mola”, “O pato e o sapo” e “A foca famosa” da Coleção Estrelinha 1, de autoria de Sonia Junqueira (2007). Estas obras são indicadas a leitores em fase de alfabetização, uma vez que apresentam poucas sentenças com palavras que se repetem no decorrer da história. Destes livros, foram escolhidas 36 palavras para serem pré-testadas e, segundo o desempenho de cada participante durante o pré-teste, selecionar aquelas que deveriam compor os conjuntos de ensino. Foram selecionadas palavras passíveis de representação pictórica, independente de classe gramatical.

Os estímulos foram organizados de acordo com a convenção da literatura em controle de estímulos. Os estímulos sonoros correspondiam ao conjunto A (palavras ditadas), os estímulos visuais correspondiam ao conjunto B (figuras) e conjunto C (palavras escritas). As produções orais correspondiam ao conjunto D (respostas de nomeação e de leitura). As sessões que envolviam produção oral, seja em tarefas de leitura ou de nomeação, foram gravadas em DVDs para o registro e análise das vocalizações. A Tabela 1 apresenta os conjuntos de estímulos sonoros e visuais e sua distribuição de acordo com os livros adotados com cada um dos participantes.

Tabela 1
Tabela 1

Estímulos sonoros e visuais adotados no estudo e sua distribuição nos conjuntos envolvendo os livros com cada um dos participantes.

Procedimento

O procedimento iniciou por um pré-treino seguido de pré-testes. A partir do desempenho do participante nos pré-testes foram selecionadas as palavras para compor o ensino das relações condicionais auditivo-visuais. Na etapa de ensino foram estabelecidas as relações condicionais auditivo-visuais (AC e AB), seguidos de testes de formação de classes (BC e CB) e testes de nomeação de figuras e leitura de palavras (BD e CD). Após o ensino e testes envolvendo palavras isoladas, o participante foi exposto ao pós-teste de livros para avaliar a extensão do ensino de palavras isoladas sobre a leitura destas em texto de livros infantis da Coleção “Estrelinha 1”. As etapas do procedimento adotado, relações entre estímulos envolvidas, materiais e estímulos adotados e critérios de avanço para a próxima etapa estão apresentadas na Tabela 2 e descritas em detalhes a seguir.

Tabela 2
Tabela 2

Principais etapas do procedimento adotado, relações envolvidas, material e estímulos adotados e critério de avanço para a etapa seguinte.

Pré-treino - Visou ensinar a criança a manusear o equipamento e a realizar as tarefas de matching-to-sample, isto é, selecionar um estímulo de comparação na presença de um modelo auditivo. Uma melhor descrição sobre este procedimento pode ser obtida em Almeida-Verdu et al. (2008).

Pré-teste - Avaliar o repertório verbal receptivo e expressivo dos participantes, bem como selecionar as palavras que fizeram parte da rotina de ensino e testes. Para tanto, o pré-teste foi subdividido em três etapas: (1) Aplicação do Peabody Picture Vocabulary Test, Quarta Edição (PPVT™-4). Este teste avaliou e mensurou o repertório verbal receptivo do participante, fornecendo uma medida padronizada e permitindo fazer comparações com os resultados obtidos na avaliação computadorizada das palavras retiradas dos livros infantis; (2) Leitura dos livros da Coleção “Estrelinha 1”. Nesta etapa o participante foi encorajado a realizar a leitura de três livros da Coleção “Estrelinha 1”. A leitura dos livros permitiu obter uma linha de base do repertório inicial de leitura dos livros, bem como averiguar se a criança seria indicada a participar deste estudo; (3) Avaliação computadorizada das palavras selecionadas dos livros. Referente a cada livro da Coleção “Estrelinha 1” foram apresentadas 36 palavras, organizadas em nove blocos de tarefas, cada bloco avaliava quatro palavras. Testou-se as topografias de vocalização (leitura de palavras, nomeação de figuras, ecoico) e respostas baseadas em seleção (relação entre palavra impressa e figura e entre figura e palavra impressa), todas randomizadas dentro dos blocos de avaliação, melhor descritos a seguir. Para esta etapa não foram programadas consequências para acerto ou erro.

A avaliação computadorizada testou as seguintes habilidades: Leitura (CD) - Foi apresentada uma palavra impressa no centro da tela do computador e era solicitado que o participante a lesse; era composto por 36 tentativas; Nomeação de Figuras (BD) - Uma figura foi apresentada no centro da tela do computador e era solicitado que o participante a nomeasse; era composto por 36 tentativas; Ecoico (AD) – Uma palavra era ditada pelo autofalante do microcomputador e o participante deveria repeti-la; era composto por 36 tentativas; Seleção de palavras impressas (BC) e de figuras (CB) - Estes testes foram realizados pelo procedimento de matching-to-sample (MTS) sucessivo e sem atraso, em que o estímulo modelo palavra impressa (C) ou figura (B) era exibido no centro da tela do computador. Após uma resposta de observação (clique, com o mouse, sobre o estímulo modelo), foram apresentados os estímulos de comparação nos vértices da tela e a criança deveria selecionar o estímulo definido experimentalmente como correto. Completada a caracterização dos participantes pelos procedimentos de avaliação, os participantes foram expostos ao ensino de palavras.

Ensino - O ensino foi realizado com pelo menos dois conjuntos de palavras para cada livro e, com pelo menos um livro para cada participante. A partir do pré-teste foram selecionadas palavras consideradas de linha de base nas quais o participante obteve acertos e palavras consideradas novas nas quais o participante obteve erro durante o pré-teste. O primeiro conjunto de cada livro era composto por três palavras e os demais conjuntos por duas ou três palavras a depender de cada caso. Para cada conjunto de palavras, o participante foi exposto primeiramente ao ensino das relações entre palavra ditada e palavra impressa (AC), depois ao ensino das relações entre palavra ditada e figura (AB). Após o ensino, foram testadas as relações de equivalência entre figura e palavra impressa (BC) e vice-versa (CB) e a vocalização em tarefas de nomeação (BD) e leitura (CD).

Ensino de reconhecimento de palavras (AC) e de figuras (AB) - Nesta etapa, o participante foi ensinado a selecionar palavras impressas e figuras sob controle da palavra ditada, com cada um dos conjuntos de estímulos selecionados do pré-teste. O ensino iniciava com as relações entre palavra ditada e palavra impressa (AC), com a exposição do participante a um bloco composto por 30 tentativas, arranjadas segundo o procedimento de ensino por exclusão (Dixon, 1977)1. As tentativas de ensino foram organizadas em tentativas de linha de base (três tentativas), de exclusão (nove tentativas), controle da novidade (nove tentativas) e de aprendizagem (nove tentativas). Uma tentativa era iniciada com uma palavra ditada e, após a apresentação desta, era solicitada uma resposta de observação (clique com o mouse em um quadrado azul no centro da tela); a resposta de observação produzia os estímulos de comparação, distribuídos aleatoriamente em três dos quatro vértices da tela.

Respostas condizentes com acertos e erros tiveram consequências diferenciais. No caso de acerto, após a seleção do estímulo correto foi exibida estrelas coloridas acompanhadas por uma sequência de sons que duravam aproximadamente 2 s na tela e no autofalante do computador. No caso de erro, logo após a seleção do estímulo incorreto foi apresentada uma tela preta por 1 s, seguida por uma nova tentativa.

O ensino iniciou-se pelas três tentativas de linha de base. Foram selecionadas aquelas que o participante obteve bom desempenho na etapa pré-teste (A1C1, A2C2 e A3C3). Após as primeiras tentativas de linha de base, uma relação entre estímulos novos foi ensinada por exclusão. Diante do modelo novo (A4, A5 ou A6) foram apresentados, como estímulos de comparação dois estímulos de linha de base (C1, C2 ou C3) convencionados experimentalmente como SΔ e um estímulo novo (C4, C5 ou C6), correspondente ao modelo apresentado e convencionados experimentalmente como estímulo discriminativo ou Sd. Foram apresentadas três tentativas de exclusão de uma nova relação. As tentativas de exclusão eram seguidas por três tentativas de controle pela novidade de mesma relação em que, novamente, um estímulo da linha de base aparecia como modelo (A1, A2 ou A3), porém dentre os estímulos de comparação eram exibidos, além dos estímulos da linha de base (C1, C2 ou C3) um dos estímulos novos (C4, C5 ou C6), anteriormente ensinado nas tentativas de exclusão, porém desta vez como comparação a ser rejeitada (SΔ). Após o ensino por exclusão e das relações controle das três novas relações a serem estabelecidas (A4C4, A5C5 e A6C6) foram exibidas nove tentativas de aprendizagem constituídas pelos estímulos modelo apenas por relações entre palavra ditada e palavras impressas ensinadas anteriormente (A4, A5 e A6) e, enquanto comparação, apenas os estímulos das novas relações (C4, C5 e C6) em vez de misturar com estímulos de comparação da linha de base (C1, C2 e C3). Se o participante obtivesse 100% de acertos nesse bloco de tentativas das relações entre palavra ditada e palavra impressa (AC) seria exposto ao ensino das relações entre palavra ditada e figura (AB) segundo as mesmas condições e critérios. Caso o resultado fosse diferente de 100% de acertos, era exposto novamente a um bloco de ensino semelhante.

Teste de equivalência entre figura e palavra escrita (BC) e palavra escrita e figura (CB) – Esses testes foram compostos por 18 tentativas, sendo seis das relações BC (sendo três do conjunto 1 e três do conjunto 2), seis das relações CB (sendo três do conjunto 1 e três do conjunto) de acordo com um delineamento de linha de base múltipla entre conjuntos. As tentativas das relações testadas eram intercaladas com seis das relações ensinadas AC (A4C4, A5C5 e A6C6) e AB (A4B4, A5B5 e A6B6). As tentativas foram apresentadas randomizadas em um mesmo bloco; foram programadas consequências apenas para as relações AC e AB.

Pós-teste de Nomeação de Figura (BD) e Leitura de Palavras (CD) - Avaliou-se a vocalização do participante na presença dos estímulos dos dois conjuntos, de acordo com o delineamento de linha de base múltipla entre conjuntos. Foi apresentado em blocos compostos por seis tentativas de avaliação da relação (BD), sendo três para cada conjunto de estímulos; e também seis tentativas da avaliação da relação (CD), sendo três tentativas para cada conjunto de estímulos. No total, os participantes eram avaliados em 12 tentativas, em ordem definida por sorteio.

Delineamento

Foi adotado um delineamento experimental de linha de base múltipla (Cozby, 2001) entre conjuntos de estímulos e entre livros. O delineamento de linha de base múltipla entre conjuntos de estímulos teve como objetivo averiguar os efeitos do fortalecimento das relações auditivo-visuais (AC e AB) e formação de classes sobre a leitura (CD) e nomeação (BD). Deste modo foram ensinadas as relações entre palavra ditada-palavra impressa e palavra ditada-figura com os estímulos do conjunto 1 e testadas as relações de leitura (CD) e de nomeação (BD) com os estímulos dos conjuntos 1 e 2. Posteriormente, foram ensinadas as relações com estímulos do conjunto 2 e avaliadas as relações com estímulos dos conjuntos 1 e 2, novamente. Este arranjo de ensino e testes foi adotado em todos os conjuntos de estímulos (conjunto 1 e conjunto 2) de cada livro.

O delineamento de linha de base múltipla entre leitura de livros visou verificar os efeitos do ensino e testes dos conjuntos de palavras de um livro sobre ele mesmo e sobre os demais livros. Para isso, a exposição do participante ao ensino dos conjuntos de palavras de cada livro se deu de forma controlada. Inicialmente, o participante era exposto ao ensino dos conjuntos de palavras do livro 1 e, após esse ensino, a leitura do livro alvo (livro 1) e não alvo de ensino (livro 2 e livro 3) era testada. O mesmo procedimento de avaliação foi adotado após o ensino de palavras com conjuntos dos livros 2 e 3.

Procedimento de análise dos resultados

Tarefas de seleção (AC, AB, BC e CB) - Foi computado o número de acertos e a porcentagem de acertos foi calculada de acordo com o número de tentativas no bloco.

Tarefas de produção oral (BD e CD) - Em tentativas discretas (palavras ou figuras apresentadas sucessivamente para leitura ou nomeação) foi realizada uma análise da correspondência ponto a ponto que a produção oral compartilhava com as convenções da comunidade verbal, a partir do total de fonemas corretos dentro do total de fonemas possíveis. Para as tarefas de vocalização dentro de um contínuo (durante a leitura dos livros), foram consideradas corretas as palavras lidas totalmente com correspondência ponto a ponto e relação ao total de palavras de cada livro, bem como o tempo total de leitura em segundos.

Análise de erros - A análise dos erros foi realizada sobre a produção oral, de acordo com Lucchesi et al. (2015), conforme descrição que segue: Omissão (O) - não vocalização de algum fonema ou sílaba da palavra (Ex: se_á, em vez de será); Troca (T) – emissão de outro fonema ou sílaba da palavra em vez do convencionado (Ex: bavalo, em vez de cavalo); Distorção (D) – a palavra é lida com entonação não convencionada (Ex: môla, em vez de mola); Acréscimo (A) – adição de algum fonema à palavra convencionada (Ex: pulai, em vez de pula); Ausência de resposta (AR) - quando a palavra não foi lida ou foi dito “não sei”; Palavra sem sentido (PSS) – quando uma palavra sem sentido para a língua portuguesa é emitida (Ex: ozai laladu, em vez de mola pirada).

Resultados

Inicialmente serão apresentados os resultados do ensino de discriminações condicionais (AC e AB) e formação de classes (BC e CB) dos conjuntos de palavras selecionadas para o ensino, bem como os resultados nas tarefas de leitura de palavras (CD) e nomeação de figuras (BD) destes conjuntos (Figura 1). Posteriormente serão apresentados os resultados em fluência da leitura juntamente com as porcentagens de acertos na leitura dos livros (Figura 2). Finalmente será apresentada análise dos tipos de erros emitidos nas tarefas de produção oral (Figura 3). Os resultados, estão organizados de duas maneiras complementares. A primeira diz respeito aos tipos de tentativas (ensino ou testes) e tipos de respostas observadas (seleção de estímulos em tarefas de MTS, produção oral em tarefas de leitura e nomeação ou leitura dos livros). A segunda maneira considera uma análise cronológica dos dados destacando o momento em que a variável dependente foi inserida e comparando os desempenhos antes de depois da manipulação da variável independente, de acordo com o delineamento de linha de base múltipla.

Aquisição de relações condicionais, testes formação de classes e produção oral.

A Figura 1 apresenta as porcentagens de acertos dos participantes em cada uma das fases de ensino e teste do procedimento. São apresentados dois gráficos por livro; cada gráfico referente a um conjunto de palavras utilizadas. Na Figura 1, barras pretas representam respostas de nomeação de figuras e de leitura de palavras; barras cinza representam respostas de seleção em tarefas de MTS sendo cinza escuro de ensino e cinza claro de testes de equivalência. As linhas tracejadas indicam o momento no qual os participantes receberam o ensino com estímulos daquele conjunto.


Figura 1
Rique, Almeida-Verdu, Silva, Buffa, & Moret

Porcentagem de acertos nas relações ensinadas (AC e AB), testadas (BC e CB) e sondas de nomeação e leitura de palavras (CD e BD) de acordo com o delineamento de linha de base múltipla entre conjuntos.

Todos os participantes concluíram os blocos de ensino de relações auditivo-visuais com 100% de acertos. O número de exposições necessárias até o critério de aprendizagem variou, sendo necessárias, no máximo, três exposições aos blocos de ensino até obterem precisão nas relações condicionais auditivo-visuais.

BEN foi o participante com maior número de exposição aos blocos de ensino. No entanto, os erros ocorreram em tentativas de linha de base, exclusão ou controle pela novidade e não em tentativas de aprendizagem. O participante JAN concluiu todas as etapas de ensino com apenas uma exposição a cada um dos blocos, com exceção para o Conjunto 1 do Livro 1, o qual necessitou de duas exposições ao bloco com as relações AC. O participante GUI, para o Conjunto 1 do Livro 1 foram necessárias duas exposições aos blocos com as relações AC e AB. E, para o Conjunto 2 do mesmo livro, uma única exposição aos blocos foi o suficiente. Não há dados com os conjuntos selecionados dos outros livros com este participante, pois a coleta foi interrompida antes da finalização do procedimento, uma vez que sua família se mudou para outro Estado.

Todos os participantes demonstraram resultados condizentes com a formação de classes de equivalência de estímulos pelos testes das relações entre figura-palavra impressa (BC) e palavra impressa-figura (CB) (barras cinza-claras, Figura 1). Estes atingiram 100% de acertos com uma única exposição aos blocos com estas relações para todos os conjuntos dos três livros, com exceção de BEN, para o Conjunto 1 do Livro 2, o qual foram necessárias duas exposições.

Considerando a produção oral, no pré-teste os participantes demonstraram ser bons leitores com porcentagens de acertos acima dos 50% (CD); em nomeação de figuras (BD), no entanto, as porcentagens foram inferiores a 10% de acertos para a maioria das figuras de todos os conjuntos de ensino adotados. Após o ensino houve a manutenção ou refinamento da leitura e, nas relações de nomeação, as porcentagens de acertos aumentaram para todos os participantes, quer seja atingindo os níveis de leitura (na maioria dos casos) ou superando as porcentagens de acertos obtidas em leitura como no caso do participante BEN com palavras do Conjunto 1 do Livro 2.

Fluência da leitura

Nesta subseção foi analisado o tempo necessário para a leitura contínua e completa dos livros nas etapas de teste e estes dados foram comparados à porcentagem total de acertos das palavras de cada livro, conforme representado na Figura 2. Os pontos representam o tempo total despendido na leitura do livro em segundos, as barras cinzas representam as porcentagens de acertos na leitura total do livro e a linha tracejada indica o momento no qual houve o ensino e testes dos conjuntos de palavras referentes ao livro.


Figura 2
Figura 2 – Rique, Almeida-Verdu, Silva, Buffa, & Moret

se múltipla entre conjuntos.

Figura 2 – Tempo de leitura despendido na leitura dos livros (segundos) e porcentagem de acertos obtidas nessa tarefa antes e após o ensino de cada livro.

De acordo com a Figura 2, são observadas variabilidade entre os participantes BEN e JAN, tanto no tempo dispendido (em segundos) quanto na porcentagem de acertos de leitura dos três livros. No entanto, também são observadas duas tendências após a inserção da variável de ensino (indicada pela linha tracejada); a primeira diz respeito à diminuição do tempo leitura (aceleração negativa da linha); a segunda está relacionada ao aumento da porcentagem de acertos na leitura dos livros.

Entretanto, uma exceção foram os resultados de BEN no Livro 1, o qual apresentou um aumento progressivo no tempo necessário para a leitura completa deste livro ao longos dos sucessivos testes (entre 207 e 242 segundos); no entanto, esse aumento veio acompanhado de um aumento progressivo nas porcentagens de acertos na leitura contínua deste livro.

Análise de erros

A Figura 3 apresenta os tipos de erros emitidos pelos participantes ao longo dos pré e pós testes realizados durante o procedimento experimental. Conforme mencionado na subseção de procedimento de análise dos resultados, os erros foram subdivididos em seis categorias, quais sejam, omissão (O), troca (T), ausência de resposta (AR), palavra sem sentido (PSS), distorção (D) e acréscimo (A). A Figura 3 apresenta a categorização dos erros dos participantes no pré-teste e pós-testes de leitura dos livros.


Figura 3
Figura 3 - Rique, Almeida-Verdu, Silva, Buffa, & Moret

Análise de erros na leitura geral dos livros no pré-teste e nas sucessivas sondas de leitura dos livros: O (omissão), T (troca), AR (ausência de resposta), PSS (palavra sem sentido), D (distorção) e Ac (Acréscimo).


Figura 3
Figura 3


Figura 3
Figura 3

Considerando a relação do tipo de erro com os resultados em fluência de acordo com a Figura 3, observa-se que BEN vocalizava palavras sem sentido nos pré-testes de leitura; ao longo dos sucessivos pós-testes, o participante passou a ler palavras com troca (silábica ou fonêmica) ou com acréscimos (silábico ou fonêmico), mudando o padrão de erros em termos qualitativos. O aumento no tempo da leitura pode estar relacionado à maior capacidade de decodificação das palavras, rastreando melhor cada um dos grafemas e emitindo fonemas com maior correspondência com o convencionado pela comunidade verbal.

Considerando a análise dos tipos de erros, de acordo a Figura 3 observa-se que a distribuição do tipo de erro dentro do total de respostas consideradas incorretas em leitura dos livros variou dentre os participantes. No caso do participante BEN, as alterações do tipo de erro ocorreram logo após as etapas de ensino de cada livro (marcadas pelas linhas tracejadas). Nota-se que “Palavra sem sentido” foi a categoria de erro emitida com maior porcentagem durante o pré-teste de todos os livros; após o ensino, deu lugar a novas categorias como “troca” ou “acréscimo” nos sucessivos pós-testes. Os outros dois participantes (GUI e JAN) mantiveram a predominância do tipo de erro dentro das respostas consideradas incorretas, no entanto, diminuíram a porcentagem desses erros e aumentaram a porcentagem de acertos; JAN, especificamente, apresentou predominantemente, mudança de erros de “troca” e “ausência de respostas” para a categoria “Distorção”; GUI mudou os erros de “acréscimos” e “palavras sem sentido” para “trocas” no livro 1, único livro avaliado. Os dados do participante GUI apresentam um pequeno aumento nas porcentagens de acerto na leitura do livro após o ensino e testes das palavras selecionadas do Livro 1, entretanto o tempo dispendido na leitura deste e dos outros livros que foram apenas testados se mantém estável, pois o procedimento com este participante não foi completamente concluído.

Discussão

Esse estudo atingiu o objetivo de verificar os efeitos do fortalecimento da rede de relações auditivo-visuais (palavra ditada-figura e palavra ditada-palavra impressa) e formação de classes de equivalência (palavra impressa-figura e figura-palavra impressa) sobre a produção oral em leitura, mas sobretudo, em nomeação de figuras comparando-se as porcentagens de acertos nos pré e pós-testes; também atingiu o objetivo de verificar a extensão da leitura das palavras em tentativas discretas para o contexto de livros e avaliar a fluência da leitura. Os participantes foram capazes de selecionar palavras impressas extraídas de livros infantis e respectivas figuras às suas respectivas palavras ditadas e, posteriormente, a relacionar as palavras impressas e figuras, de acordo com o modelo das relações de equivalência entre estímulos (Sidman & Tailby, 1982) e entre estímulos e respostas (Sidman, 2000). Também replicam os achados em estudos da área conduzidos com crianças com deficiência auditiva e usuárias de implante coclear de maneira particular, em que foram ensinadas relações condicionais auditivo-visuais e testadas formação de classes de equivalência com um (Almeida-Verdu et al., 2008; Battaglini et al., 2013), dois (Anastácio-Pessan et al., 2015) ou mais conjuntos de estímulos (Lucchesi et al., 2015).

Em relação produção oral, é possível afirmar que, no pré-teste, o desempenho dos participantes foi mais preciso quando o controle da fala era exercido pela palavra impressa, o que está em acordo com os achados em estudos anteriores com esta população (Anastácio-Pessan et al., 2015; Golfeto, 2010). Após o fortalecimento das redes de relações envolvendo palavra ditada, palavra impressa e figura, com cada um dos conjuntos, houve um refinamento na leitura dos participantes e aumento das porcentagens de acertos em nomeação, ao se comparar com os desempenhos da linha de base. Resultados semelhantes também foram obtidos por outras pesquisas conduzidas com crianças leitoras (Anastácio-Pessan et al., 2015) e com crianças que estavam em fase de aprendizagem de leitura (Lucchesi et al., 2015). No caso dos estudos anteriores assim como no presente estudo, porcentagem de acertos em nomeação de figuras de cada um dos conjuntos somente aumentou após a exposição ao ensino, como demonstra o delineamento de linha de base múltipla adotado. A discussão realizada por Anastácio-Pessan et al e Lucchesi et al se aplica no presente caso, replicando resultados anteriores. A discussão é apoiada em de Rose (2005) e afirma que a topografia da fala pode ser melhor controlada pelo estímulo textual, pois este fornece pistas de qual fonema deve ser emitido e o mesmo não ocorre quando a fala é controla pela figura. Assim como nos estudos anteriores, compreende-se que no presente trabalho, o controle exercido pelo estímulo textual foi transferido para a figura por equivalência de estímulos.

Em relação à verificação da leitura de palavras em tarefas contínuas, no contexto de livros infantis, os resultados obtidos foram condizentes com o planejado. Há na literatura outros estudos exitosos quanto à extensão do ensino de palavras em tentativas discretas para o contexto da leitura de pequenos textos, porém, com outras populações, como, por exemplo, crianças com dificuldades de aprendizagem (Postalli, de Almeida, de Souza, Canovas & de Souza, 2008; Felippe et al., 2011). O presente estudo, além de estender à população de implantados cocleares este fenômeno, soma na produção de conhecimento de condições relevantes para a extensão da leitura estabelecida em tentativas discretas para o contínuo do texto dos livros.

A análise dos erros tem sido adotada como uma forma de verificar, além da resposta correta, o deslocamento de controle de estímulos que ocorre na produção oral de uma palavra (Souza, Almeida-Verdu, & Bevilacqua, 2013;Lucchesi et al., 2015). No presente estudo, a análise das respostas incorretas durante a leitura dos livros demonstrou que, ainda que as palavras não fossem lidas com precisão, após o fortalecimento das redes de relações auditivo-visuais de palavras retiradas destas histórias, houve a diminuição das emissões de palavras sem sentido, omissões de fonemas ou sílabas e ausência de resposta. Os erros ficaram concentrados em distorções e trocas fonológicas.

Entretanto, algumas questões ainda estão em aberto. Tais como a necessidade de testar a generalidade desse fenômeno para mais participantes, a fim de verificar se tal procedimento é eficaz com crianças com repertórios de entrada mínimo ou ainda sua replicabilidade em implantados com repertório de entrada em comportamento verbal receptivo e expressivo mais restritos e comprometidos.

A fluência da leitura também sofreu alteração enquanto processo resultante. Neste trabalho, fluência em leitura foi compreendida enquanto o número total de palavras lidas pelo tempo total em leitura. O desempenho geral dos participantes (com exceção do desempenho de BEN no Livro 1) foi condizente com os resultados encontrados na literatura (Carvalho, 2013). Carvalho (2013), em seu programa de refinamento de leitura e escrita com um aluno com Transtorno de Asperger, também monitorou o tempo dispendido na leitura de pequenos textos e foi constatado que, após sua intervenção, que envolveu procedimentos de antecipação da palavra ou correção desta na iminência do erro, o tempo dispendido para ler os textos permaneceu estável ou diminuiu. Dentre todos os participantes, somente BEN apresentou aumento progressivo no tempo total de leitura do Livro 1, acompanhado do aumento nas porcentagens de acertos na leitura geral do livro e de leitura das palavras em tentativas discretas. Este fenômeno pode ser interpretado a partir das análises do tipo de erro cometido pelo participante na leitura do livro, em que se observou maior quantidade de palavras sem sentido e omissões durante o pré-teste inicial e, nos pós-testes de leitura, houve mais trocas (silábica ou fonêmica) ou, então, acréscimos (silábico ou fonêmico). Portanto, acredita-se que o participante utilizou maior tempo na leitura do livro porque passou a decodificar as palavras do texto.

A fluência da fala em crianças implantadas é uma área de investigação em potencial. Löfkvist, Almkvist, Lyxell e Tallberg (2012), investigaram a influência da idade e das condições de alfabetização às quais são expostas, sobre desempenho de fluência de palavras em crianças com implante coclear. Seus resultados indicaram que crianças com idade entre 6 e 7 anos não apresentam fluência da fala discrepante (no início da alfabetização) de seus pares ouvintes, porém crianças com idade entre 8 e 9 anos (em um estágio avançado de alfabetização) apresentam atrasos em relação aos seus pares ouvintes. Os resultados de Löfkvist et al. (2012) indicam que a exposição às condições de alfabetização tem um papel importante no estabelecimento da fluência da fala, por um lado e esse resultado é convergente com os dados obtidos por Lucchesi et al. (2015) embora a fluência da fala não tenha sido avaliada, somente a precisão. Por outro, os resultados do presente estudo demonstram que ensinar palavras isoladamente pode interferir positivamente sobre a leitura das mesmas em unidades textuais mais extensas.

Em resumo, o presente estudo além de expandir a amostra de crianças com deficiência auditiva bilateral, pré-lingual e usuárias de implante coclear em estudos que envolvem o ensino de relações condicionais auditivo-visuais, formação de classes de equivalência e inteligibilidade da fala, ampliou o rol de investigações ao avaliar os efeitos deste ensino para o contexto da leitura de livros avaliando não só a acurácia da leitura, mas também o tempo despendido nesta. Assim, novos estudos nesta área se fazem importantes a fim de consolidar estes achados.

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Notas

[1] Para uma descrição mais detalhada do ensino por exclusão com essas características, consultar (Anastácio-Pessan, et al., 2015;Battaglini, et al., 2013; Felippe, et al., 2011;McIlvane, Munson, & Stoddard, 1983.


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