Resumo: O propósito do estudo relatado neste foi inventariar e discutir as teses que tiveram como objeto de estudo o processo educacional de estudante com deficiência visual no território brasileiro. Para tanto, foi realizada uma pesquisa de cunho bibliográfico, numa abordagem qualitativa, que teve como fonte de dados 50 resumos de teses, localizadas em bancos de teses disponíveis on-line, que abordavam questões relacionadas ao processo educacional de estudante com deficiência visual. Neste artigo apresentamos e discutimos alguns aspectos gerais dessas teses: instituições do curso de pós-graduação; nomes dos programas; abordagem da pesquisa; instrumentos de coletas de dados; objetivos das pesquisas; sujeitos envolvidos e áreas de conhecimento desses estudos. Contudo, nossos principais elementos de análise foram os focos temáticos de estudo dentro dos processos educacionais envolvendo estudante com deficiência visual e os resultados obtidos com tais pesquisas. Os aspectos investigados nos levaram a concluir que, apesar de os alunos com deficiência visual serem tão capazes como os demais, estes não estão vivenciando processos de inclusão eficientes, visto que lhes faltam livros didáticos em Braille, materiais didáticos adaptados, estruturas físicas adequadas às suas necessidades, professores que conheçam suas particularidades e planejem aulas utilizando recursos essenciais para a real inclusão. No entanto, apesar de algumas teses apresentarem ações exitosas na formação de professores e que há profissionais aptos para promover a inclusão de estudantes deficientes visuais, uma boa parte delas alerta para o fato de que a maioria dos professores não se mostra preparada para a inclusão de alunos com deficiência visual nas escolas da Educação Básica.
Palavras-chave: Deficiência visual Deficiência visual, Processo educacional Processo educacional, Inclusão Inclusão.
Abstract: The purpose of the study reported in this was to inventory and discuss the theses that had as object of study the student educational process with visual disabilities in Brazil. For this purpose, a bibliographical research was conducted in a qualitative approach that had as a data source 50 abstracts of theses, located in theses banks available online, which addressed issues related to student educational process visually impaired. In this article we present and discuss some general aspects of these theses: Courses institutions graduate; names of programs; approach to research; tools for data collection; objectives of the research; subjects involved; and knowledge areas of these studies. However, our main elements of analysis were the thematic focus of study within the educational processes involving student with visual impairment and the results of such research. The investigated aspects led us to conclude that although students with visual disabilities to be as capable as others are not experiencing efficient inclusion processes, as they lack textbooks in braille, adapted learning materials, adequate physical structures to their needs, teachers who know their particularities, and plan classes using essential resources for real inclusion. However, despite some theses present successful actions in the training of teachers able to favor the inclusion of visually impaired students, a good portion of them alert to the fact that most teachers show up unprepared for the inclusion of students with visual impairment in Basic Education schools.
Keywords: Visual impairment, Educational process, Inclusion.
Demanda Contínua
O processo educacional de estudante com deficiência visual: uma análise dos estudos de teses na temática
Recepção: 30 Outubro 2015
Aprovação: 19 Janeiro 2017
Visando compreender como vem ocorrendo o processo educacional de pessoas com deficiência visual no ensino formal brasileiro, quais são suas tendências e perspectivas, realizamos um inventário e uma análise descritivo-interpretativa das teses desenvolvidas sobre essa temática.
Apesar do grande número de monografias e dissertações feitas nesse campo de pesquisa, restringimos nosso estudo às teses por apresentarem estudos mais densos e aprofundados. Esperamos, dessa forma, trabalhar com dados e análises mais contundentes, apresentando um quadro mais confiável de como vem acontecendo o processo educacional de estudantes com deficiência visual. Cabe esclarecer que se entende por deficiência visual toda perda ou alteração orgânica que comprometa a visão, considerando classificações já estabelecidas sobre a intensidade dessa perda de acuidade visual. Conforme o Decreto de Lei no 5.296, de 2004, é considerado cego todo o indivíduo que possui acuidade visual igual ou inferior a 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica. Indivíduo com baixa visão, o que possui acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica ou quando a somatória da medida do campo visual de ambos os olhos for igual ou inferior a 60o ou que acumule a ocorrência de quaisquer das condições mencionadas.
Apesar de sabermos que as teses não representam toda a produção na temática delimitada, as produções dos programas de Pós-graduação strito sensu emergem dos elos entre pesquisadores experientes e iniciantes, que atuam em diversas instituições por todo o país. Com isso, investigam a temática em diferentes contextos e expressam uma diversidade de olhares (TEIXEIRA; MEGID NETO, 2002), constituindo, de certa forma, uma amostra representativa do que é pesquisado nessa temática e, consequentemente, esboçando um panorama do que tem sido feito nessa área no Brasil, como é objetivo desse trabalho.
No Brasil, o processo de inclusão de estudantes com deficiência no ensino regular ganhou maior dinamismo a partir da década de noventa do último século com o paradigma de Educação Inclusiva. Esse está alicerçado em uma série de leis e documentos, dentre os quais destacamos a Declaração de Salamanca de 1994, e a terceira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Lei no 9.394/96. Essas leis apontam para a necessidade de que a educação de todos os estudantes, sem qualquer distinção, deve acontecer na escola comum. Essas leis, apoiadas por diversos documentos oficiais, estabelecem inúmeras diretrizes para atender as demandas particulares dos estudantes com necessidades educativas especiais no processo educacional. Tais como os especificados no artigo 59 da Lei no 9.394/96:
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica, para atender às suas necessidades;
II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do Ensino Fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;
III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;
IV - Educação Especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. (BRASIL, 1996)
IV - Educação Especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. (BRASIL, 1996)
O expresso neste artigo de Lei são elementos contundentes para que o ensino inclusivo seja a prática da inclusão de todos – independentemente de seu talento, deficiência, origem socioeconômica ou origem cultural – ocorra em escolas e salas de aulas provedoras, onde todas as necessidades dos estudantes sejam satisfeitas (STAINBACK; STAINBACK, 1999). Todavia, há no Brasil um distanciamento alargado entre o que está prescrito nas leis e documentos e o que de fato é efetivado no cotidiano dos estabelecimentos de ensino (MAZZOTTA, 2011). Essa afirmação se confirma quando analisamos pesquisas que investigam esse fenômeno como a de Costa (2012), Pansini e Matos (2014), Menezes (2008), Duek (2011), Camargo (2008) e Urzêda (2012) as quais denunciam que muitos estudantes com deficiência não estão inclusos por falta de condições adequadas para a efetivação do processo educacional.
Diante do exposto, e com interesse de conhecer em específico sobre o processo educacional de estudantes com deficiência visual, desenvolvemos esse trabalho para inventariar e analisar os resultados das teses que tiveram como objeto de estudo o processo educacional de estudantes com deficiência visual no território brasileiro. Acreditávamos que assim obteríamos um panorama de como vem ocorrendo o processo educacional de estudantes com deficiência visual no país.
Tendo em vista os objetivos norteadores do presente estudo, realizamos um mapeamento das teses que abordam o processo educacional de pessoa com deficiência visual, configurando assim uma pesquisa bibliográfica com foco na análise dos dados por meio de uma abordagem qualitativa.
Inicialmente, como fonte de coleta dos dados, escolhemos o Banco de teses da Capes que, tradicionalmente, integraliza as produções dos diferentes programas de Pós-Graduação strito sensu do Brasil. No entanto, após percebemos que as teses defendidas nos últimos anos não estavam disponibilizadas, ampliamos nossas buscas para os bancos de dados das principais universidades brasileiras, além do site da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (IBICT). Em decorrência desses fatores não podemos afirmar que as produções apresentadas na sequência é o todo das teses produzidas na temática, mas acreditamos que é um número significativo e que apresenta um panorama nacional do que tem sido feito nessa área no Brasil.
Foram utilizadas como descritores nas buscas as seguintes palavras/expressões: deficiência visual, acuidade visual, cego e cegueira. Cabe destacar que, durante a coleta, descartamos as teses que não tinham como objeto a questão da deficiência visual articulada, direta ou indiretamente, ao âmbito educacional.
Ao todo foram mapeados 50 estudos que resultaram em tese e abordam o processo educacional das pessoas com deficiência visual no Brasil. No entanto, o recorte temporal do mapeamento se definiu após o término da coleta do material, ficando entre 1990 e 2014, ano da defesa da tese mais antiga e das mais recentes. No Quadro 1 apresentamos a distribuição das teses mapeadas pelo ano de defesa.
Distribuição anual das teses
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesComo pode ser observar no Quadro 1, nos anos de 1991 a 2000 e em 2003 não encontramos nenhuma tese sobre a temática investigada. Os motivos podem ser a pouca ou ausência de produção na temática ou a dificuldade de concentrar/disponibilizar os trabalhos nos bancos das instituições na versão online. Isso porque na década se 1990 ainda era muito restrito o uso de computadores e não se tinha a preocupação de disponibilizar as produções em meio digital.
No que se refere às instituições nas quais os trabalhos foram desenvolvidos, percebemos que há grande concentração em algumas poucas instituições. Dos 50 trabalhos, 30 (60%) estão vinculadas a quatro instituições, as 20 demais produções são oriundas de 14 instituições diferentes. Conforme pode ser analisado nos dados apresentados no Quadro 2, as instituições com maior número de produção foram a Universidade Federal de São Paulo, a Universidade Estadual de Campinas, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Distribuição das teses por Região, Estado e Instituição - (1990/2014)
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesAs frequências das produções encontradas por instituição coadunam em parte com dados evidenciado por Bueno (2014) sobre as produções em Educação Especial no geral. No entanto, no que se refere à instituição com maior número de publicações aparece no estudo de Bueno (2014), a Universidade Federal de São Carlos, já neste estudo específico da deficiência visual essa instituição aparece na quinta posição, empatada com Universidade Estadual Paulista, com três produções. É intrigante a pouca produção desse programa nessa temática visto que essa instituição é tida como o “centro de referência em inclusão educacional no Brasil, pela qualidade e quantidade de produção científica” (SANTANA, 2011, p. 39). A instituição que contabilizou o maior número de teses foi a Universidade de São Paulo, 11 ao todo, o que representa 22% das produções mapeadas.
Ao visualizarmos os dados por região, verificamos outra disparidade: concentração de 72% das produções na região Sudeste; em segundo aparece a região Nordeste, com 12%; a região Sul com 8%; a região Centro-Oeste com 6% e, por último, a região Norte com 2%. Esses números vêm confirmar os resultados de outros mapeamentos como de Bueno (2014), Cerva Filho (2014) que também constataram que a grande maioria pesquisas é realizada por instituições localizadas na região Sudeste. Acredita-se que esse fenômeno ocorra devido a concentrações de pesquisadores e de programas de Mestrado e Doutorado no Sudeste.
Com relação ao tipo de pesquisa e à opção metodológica, verificou-se a predominância da abordagem qualitativa. Dos 50 estudos mapeados, 5 foram desenvolvidos na abordagem quantitativa/qualitativa; 2 na abordagem quantitativa; 41 na abordagem qualitativa e em 2 delas não nos foi possível identificar esse aspecto somente a partir da análise do resumo. Esses dados mapeados são condizentes com que dizem Lüdke e André (2003, p. 11) “é cada vez mais evidente o interesse que os pesquisadores da área de educação vêm demonstrando pelo uso das metodologias qualitativas”.
Dentre os estudos na abordagem qualitativa, encontramos 10 trabalhos que foram classificados como estudo de caso pelos próprios autores, sendo esse o tipo de pesquisa mais recorrente. Segundo Lüdke e André (2003, p. 19) o estudo de caso consiste em investigar um fenômeno de forma bem delimitada, com contornos definidos e “busca retratar a realidade de forma complexa e profunda”.
No entanto, também, constatamos pesquisas classificadas pelos próprios autores como sendo: exploratória, descritiva, etnográfica, participativa, colaborativa, interpretativa, pesquisa-ação, empírica e bibliográfica. Essas metodologias utilizadas são coerentes com a tendência contemporânea das pesquisas em educação (BOGDAN; BIKLEN, 1994; LÜDKE; ANDRÉ 2003; GIL, 2008).
Quanto aos instrumentos de coleta de dados, observamos que foram sempre utilizados mais que um em cada estudo. Algo também condescendente com as pesquisas nas Ciências Humanas (GIL, 2008). Entretanto, sobressaiu com maior frequência uso de questionários e entrevistas semiestruturadas. O uso de vários instrumentos de coleta de dados nos leva a inferir que houve nesses estudos a triangulação dos dados. Para Gil (2008, p. 131) triangulação “refere-se ao uso de dois ou mais métodos para verificar se os resultados obtidos são semelhantes, com vistas a reforçar a validade interna dos resultados”.
Apesar de a temática inventariada estar dentro de uma das subáreas da Educação, na Tabela de Área de Conhecimento da Capes, os 50 estudos mapeados foram realizados por 16 diferentes tipos de programas de doutoramento. Somente os programas de Doutorado em Educação e Educação Especial estão alocados na área de Educação, os quais contabilizaram juntos 46% das produções. Já 30% das teses foram realizadas por programas de doutoramento de áreas alheias que mantêm distância conceitual, filosófica e sociológica da educação. São eles os Programas strito sensu de Música, Oftalmologia, Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Elétrica, Psicologia, Distúrbio de Desenvolvimento e de Ciências Biomédicas. Os outros 24% das teses foram desenvolvidas em programas de outras áreas de conhecimento, mas, que possivelmente compreende uma interface com a área de educação, como os programas de Educação Matemática, Informática e Educação, Educação Física, Geografia, Ensino em Biociência e Saúde, Linguística e Química.
Cabe destacar que a concepção/compreensão do processo educacional de um pesquisador da área de Educação que está diretamente envolvido com o fenômeno é diferente de um pesquisador da área de Engenharia Elétrica, por exemplo. Sendo assim, ao mapearmos essas teses, mapeamos também uma diversidade de olhares de gente que atua em diferentes contextos do processo educacional de estudantes com deficiência visual. Isso porque, como abordam Lüdke e André (2003, p. 03), “a visão de mundo do pesquisador, os pontos de partida, os fundamentos para a compreensão e explicação desse mundo irão influenciar a maneira como ele propõe suas pesquisas”. Isso de certa forma corrobora para que tenhamos um melhor retrato do fenômeno do processo educacional da pessoa com deficiência visual, ou seja, uma visão holística.
No que ser refere aos sujeitos envolvidos nas pesquisas, percebemos que estudantes foram ouvidos e investigados em pelos menos 74% dos estudos mapeados. Os professores foram a segunda categoria de sujeitos mais investigados. Esses números fazem sentido porque estudantes e professores são os principais personagens no meio educacional. Conforme pode ser evidenciado na Tabela 1, em pelos menos 36% das pesquisas esses sujeitos, professores e estudantes foram ouvidos/investigados simultaneamente. Há também estudos como o de Faciola (2012) e Bazon (2006) que, além de estudantes e professores, envolveram também familiares dos estudantes.
Distribuição dos sujeitos das pesquisas mapeadas
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesNo entanto, grande parte dos estudos envolveu um número reduzido de sujeitos, algo condizente com a metodologia de pesquisa qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Nem todos os resumos analisados traziam o número de sujeitos da pesquisa. Dos que expressavam esse número, somente quatro trabalhos envolveram uma quantidade maior de sujeitos: uma pesquisa envolveu 115; outra, 102 e duas, 58 pessoas cada. Os demais estudos foram desenvolvidos com menos que dez sujeitos cada.
Para melhor explicitar/visualizar os conteúdos das pesquisas mapeadas, as organizamos no Quadro 3 por meio de focos e subfocos temáticos. Esses dados emergiram da confluência das subáreas da Educação num geral e da análise prévia dos resumos. Contudo, os trabalhos que contemplavam mais de uma discussão foram enquadrados na que se sobressaiu na análise da conjuntura dos elementos explicitados nos resumos pelos autores.
Distribuição das 50 teses em focos e subfocos temáticos
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesA seguir, considerando cada um dos focos e subfocos apresentados no Quadro 3, descreveremos, de forma concisa e analítica, a produção brasileira de teses relativas ao processo educacional de pessoas com deficiência visual.
Dentre os 50 estudos, 14 (28%) se voltaram a investigar o processo ensino e aprendizagem de estudantes com deficiência visual. A disciplina Matemática foi a mais recorrente nos estudos analisados, sendo que 4 estudos investigaram o seu ensino. No entanto, tivemos pesquisas que investigaram o processo ensino e aprendizagem de Física, Geografia, Inglês, Música, Educação Física, Literatura e três estudos que não se pautaram em uma única disciplina.
É interessante salientar que as disciplinas Matemática, Inglês, Geografia e Educação Física foram apontadas por professores e estudantes com deficiência visual, num estudo realizado por Costa (2012), como os componentes curriculares mais problemáticos à inclusão.
Dentre os 14 estudos mapeados neste foco temático, 11 são estudos de natureza empírica experimental, em que os pesquisadores propuseram materiais adaptados, metodologias diferenciadas e avaliaram a aprendizagem de estudantes com deficiência visual frente ao uso desses.
Já o estudo de Silva (2004b) se pautou em investigar como o estudante cego aprende, o que deve ser ensinado e como ensiná-lo. Essa pesquisadora concluiu, ao término da investigação, que os estudantes cegos aprendem como os demais e que o melhor para o desenvolvimento deles é frequentar a sala de aula do ensino regular. Esse trabalho também aponta que a escola precisa prover assistência técnica com recursos e materiais adaptados para que esses estudantes tenham sucesso no processo de aprendizagem.
Vilas Boas (2010) investigou a compreensão textual de estudantes cegos alfabetizados em Braille e verificou que “em vários momentos, eles demonstraram dificuldade em integrar os seus conhecimentos prévios às informações textuais para o estabelecimento das inferências”.
Motta (2004), por sua vez, analisou a maneira como uma professora aprendeu a ensinar Inglês para estudantes cegos e com baixa visão.
Ao analisar os resultados a que chegaram cada um dos 14 estudos, percebemos que há um consenso entre os mesmos: os estudantes com deficiência visual não têm maiores dificuldades de aprender os conteúdos das diversas disciplinas analisadas se a eles forem oferecidos materiais adaptados que permitam o acesso aos registros e representações dos conteúdos. Essa constatação já era defendida por Vygotski (1997) no início do século passado.
A criança cega e surda pode ter o mesmo desenvolvimento que a sem deficiência, mas para a criança com deficiência alcançar ela necessita de diferente modo, de um caminho diferente, com outros meios e para o professor é importante conhecer a particularidade do caminho que deve conduzir a criança” (VYGOTSKI, 1997, p. 17) [tradução nossa]1.
Outros pesquisadores, como Amarilian (2009), Costa (2012) e Camargo (2008), também apontam essa questão sobre a educação de estudante com deficiência visual.
Foram enquadrados neste foco 11 (22%) pesquisas que analisaram, de forma direta ou indireta, a formação de professores. As pesquisas de Baumel (1990); Gasparetto (2001); Gorgatti (2005); Mazzaro (2007) e Dorneles (2014) foram diagnósticas. Eles ouviram professores e profissionais de escolas apresentarem suas visões sobre o processo de inclusão de estudantes com deficiência visual. Apesar das pesquisas terem sido desenvolvidas em localidades e anos diferentes, as conclusões dos autores se convergiram à falta de preparação docente para a prática pedagógica com estudantes com deficiência visual e a escassez de material didático nas escolas para o ensino das diferentes disciplinas do currículo escolar.
As outras duas pesquisas do subfoco Pensamento e Prática Docente são: Artioli (2008) que investigou a afetividade de professores com os estudantes com deficiência visual; e Fernandes (2011) que analisou a criatividade de um professor de Artes na docência em sala de aula que tinha estudantes com deficiência visual.
No subfoco Formação para a Prática Docente encontramos os trabalhos de Oliveira (2001), Chicon (2005) e Field`s (2014) que promoveram e avaliaram ações formativas para professores, no que se refere à prática pedagógica em contexto inclusivo que possuíam estudantes com deficiência visual. Nos três estudos é relatado o envolvimento direto dos pesquisadores com a pesquisa, já que essas se configuraram como pesquisa-ação/participantes. No entanto, os estudos de Oliveira (2001) e Chicon (2005) efetivaram intervenção formativa com professores em atividade, já o estudo de Field`s (2014), com professores em formação inicial.
Contudo, os três estudos chegaram a conclusões similares: intervenções formativas com foco pontuais como o caso de inclusão de estudantes com deficiência visual acarreta aprendizagem docente significativa para a atuação num contexto escolar inclusivo.
Neste foco temático foram enquadradas as produções que tiveram como objetivo maior o diagnóstico sobre o processo educacional de estudantes com deficiência visual e diferentes níveis e instituições de ensino, 21 (42%) tinham essa performance. Dentre as 21 teses, 15 tiveram como locus de investigação a Educação Básica e foram ouvidos e investigados professores, estudantes, profissionais de educação e alguns familiares, a fim de se buscar uma melhor compreensão desse fenômeno. Observa-se certo consenso nos resultados apurados, mesmo em estudos mais recentes, indicando que o processo de inclusão de estudantes com deficiência visual, por uma série de fatores, ainda não se tornou realidade na Educação Básica. Falta de material didático adaptado, salas de apoio que não estão atuando conforme a finalidade para que foi criada, professores que não conduzem suas aulas com metodologias que permitam a esses estudantes participarem ativamente do processo, livros de didático que não são impressos em Braille, além do descaso por parte de algumas escolas e professores com esses estudantes.
Já as pesquisas de Vieira (2006) e Pereira (2010) analisam instituições de ensino especial. Vieira (2006) analisou o que estudantes com deficiência visual, egressos do Instituto Benjamim Constant, tinham a dizer sobre suas experiências de viver a deficiência visual e investigou também o papel a Educação Especial recebida no Instituto. Pereira (2010) analisou os impactos dos serviços prestados pelo Centro de Apoio Pedagógico do Maranhão na vida educacional de pessoas deficientes visuais.
Já os estudos de Soares (2010), Guerreiro (2011), Passos (2012) e Morejon (2009) tiveram como locus de investigação instituições de Ensino Superior. Esses estudos analisaram as políticas de acessibilidade de estudantes com deficiência visual no Nível Superior e os meandros do processo educacional vivenciado por acadêmicos com tal deficiência. Uma fala de Morejon (2009) sintetiza o resultado da sua pesquisa e dos outros três pesquisadores: “muito ainda precisa ser feito para que as instituições educacionais oportunizem e incentivem uma educação para todos e o estudante com deficiência possa ter um projeto de vida concretizado na sociedade”.
Ficaram organizados neste foco 4 (8%) estudos, os quais investigaram o uso de tecnologias no processo educacional de estudantes com deficiência visual. Sonza (2008), Carvalho (2001), Rodrigues (2007) e Monteiro (2010) discutiram a viabilidade do uso do computador no processo de educação de aprendiz com deficiência visual, sobre diferentes aspectos.
O estudo de Carvalho (2001) abordou possíveis adequações na Educação a Distância para que estudantes com deficiência visual possam ter acesso a todo o conteúdo das aulas. Já Monteiro (2010) analisou a viabilidade da internet como programa de disseminação de informações a respeito do uso de auxílios ópticos para baixa visão. Sonza (2008) investigou aspectos fundamentais em Ambientes Virtuais para que atendam à Acessibilidade, Usabilidade e Comunicabilidade para com deficientes visuais no contexto do Desenho Universal. Já o estudo de Rodrigues (2007) se pautou na construção de Centro de Apoio Pedagógico Virtual (CAP), estruturado em um portal Web para que possa servir como recurso auxiliar no apoio aos professores, no processo de inclusão de pessoas cm deficiência.
O único estudo dentre os 50 que discute a avaliação é o de Bruno (2005). Nesse trabalho o autor relata a elaboração de instrumentos de avaliação pedagógica para serem utilizados na Educação Infantil com crianças com deficiência.
Contudo, a análise dos aspectos gerais dos resumos das 50 teses nos mostram que, ainda que sejam pesquisas realizadas numa mesma temática que apresentam características comuns, expressam, também, uma diversidade de olhares, particularidades e abordagem. Isso as torna únicas, mas, vistas de forma conjunta, permitem esboçar um panorama nacional do processo educacional do estudante com deficiência visual.
Cada uma das teses produzidas e aqui analisadas pode ser comparada a 50 peças de um mosaico. Cada peça possui diferente forma, configuração própria, originalidade, singularidade, identidade e materialidade. Entretanto, quando reunidas possibilitam formar desenhos diversos, com as quais uma peça se complementa na outra, sem perder sua essência. Ao analisarmos individualmente e numa conjuntura as 50 teses mapeadas, conseguimos interpretar o seguinte esboço: O processo educacional da pessoa com deficiência visual ainda representa um grande desafio para o sistema de ensino brasileiro.
Isso acontece porque a esmagadora maioria, se não a totalidade, de estudantes com essa deficiência está matriculada em escolas de ensino regular. No entanto, não estão inclusos nessas escolas por uma série de motivos.
Os principais motivos dessa exclusão são a falta de preparo dos professores para fazerem com que estudantes com deficiência visual participem das aulas, falta material impresso em Braille, escassez de material didático adaptado (materiais necessários no processo de ensino de várias disciplinas), estruturas física de escolas que não atendem as necessidades desses estudantes, profissionais do atendimento educacional complementar que não dominam o código de escrita em Braille e o manuseio do Sorobã para ensinar e estes estudantes e a, ainda, existência de preconceito de professores e profissionais da educação em relação à potencialidade desses estudantes.
Contudo, algumas peças desse desenho nos apontam pistas para podermos vencer o desafio de incluir estudantes com deficiência visual nas escolas de ensino regular: unir esforços e promover mudanças nos cursos de formação inicial de professores incorporando disciplinas que possibilitem discutir a temática, aproximar os professores em formação inicial da realidade do ensino inclusivo e oferecer cursos com estudos teóricos e instrumentalização para os professores que estão em sala de aula. A possibilidade de uso de tecnologias que têm mostrado caminhos plausíveis, tanto para serem utilizadas como tecnologia assistida para o estudante com deficiência visual, quanto para a promoção de formação de professores, como também para a divulgação de orientação referente à inclusão de estudantes deficiente visuais.
O que está bem nítido no grupo de peças do desenho em análise é que o estudante com deficiência visual não tem maiores dificuldades de aprendizado. Ele só necessita de condição de acesso na íntegra aos conteúdos. Para tanto, faz-se necessária à adaptação de materiais pedagógicos e diversificação da prática pedagógica.
Com isso, espera-se que os resultados deste mapeamento de teses possam propiciar e subsidiar reflexões, discussões e realização de novos estudos, quiçá, mudanças acerca da realidade do processo de in/exclusão que os estudantes com deficiência visual estão vivenciando nas escolas brasileiras.
Universidade Federal de Rondônia, Departamento de Matemática e Estatística. Rua Rio Amazonas - de 452/453 a 722/723, Jardim dos Migrantes. CEP: 76900633 – Ji-Paraná, Rondônia, Brasil
Distribuição anual das teses
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesDistribuição das teses por Região, Estado e Instituição - (1990/2014)
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesDistribuição dos sujeitos das pesquisas mapeadas
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de tesesDistribuição das 50 teses em focos e subfocos temáticos
Elaborado pelos autores a partir dos dados coletados nos bancos de teses