Resumo: O objetivo principal deste trabalho foi analisar a relação entre o nível de evidenciação dos relatórios contábeis das empresas brasileiras não financeiras listadas na NYSE (New York Stock Exchange) e a volatilidade no retorno de seus títulos. A análise proposta foi operacionalizada por meio da utilização de Modelagem por Equações Estruturais. No desenvolvimento dos testes, levaram-se em conta as potenciais diferenças na eficiência informacional dos mercados de capitais brasileiro e norte-americano (Fama, 1970, 1991). Foi observado que o tamanho das empresas apresentou relação positiva e significativa com o nível de evidenciação, indicando que mesmo as empresas analisadas possuindo melhores níveis de evidenciação, por emitirem ADRs níveis II ou III na NYSE, e, portanto, já tendendo a estar em um grupo de grandes empresas, o tamanho se mostrou positivamente e significativamente relacionado com a evidenciação. Para um nível de 5% de significância, confirmou-se também a hipótese de que empresas com maiores níveis de evidenciação apresentaram menor volatilidade nos retornos de seus títulos. Desta forma, empresas que evidenciaram informações mais detalhadas sobre instrumentos financeiros em seus relatórios contábeis apresentaram menor volatilidade nos retornos de seus títulos.
Palavras-chave:evidenciaçãoevidenciação, volatilidade volatilidade, instrumentos financeiros instrumentos financeiros.
Abstract: The aim of this paper was to analyze the relationship between the disclosure level of accounting reports of the Brazilian non-financial companies listed on the NYSE (New York Stock Exchange) and the volatility in the return of their titles. The proposed analysis was performed through the use of Structural Equation Modeling; in the development of the tests, we considered the potential differences in informational efficiency of capital markets in Brazil and in the U.S. (Fama, 1970, 1991). We observed that the size of the companies showed a positive and significant relationship with the disclosure level, indicating that even if the companies of the sample have the best levels of disclosure, because they emit ADRs levels II or III at NYSE, and thus tend to be in a group of large companies, size was positively and significantly related to disclosure. For a 5% level of significance, we also confirmed the hypothesis that firms with higher levels of disclosure had lower volatility in returns on their securities. Thus, companies with more detailed information about financial instruments in their financial reports showed less volatility in the returns of their shares.
Keywords: disclosure, volatility, financial instruments.
EVIDENCIAÇÃO E VOLATILIDADE: TESTES COM EQUAÇÕES ESTRUTURAIS
DISCLOSURE AND VOLATILITY: TESTS WITH STRUCTURAL EQUATIONS
Recepção: Agosto 10, 2012
Aprovação: Março 23, 2015
De acordo com Lopes e Martins (2005, p. 31), “os investidores não possuem o mesmo nível de informação que os gestores da empresa, de forma a necessitar de instrumentos independentes para avaliar sua real situação”. O nível de evidenciação fornecido pelas empresas em seus relatórios contábeis representa então um item importante a ser levado em consideração pelos investidores em suas tomadas de decisões. Desta forma, quando a empresa fornece informações de maneira incompleta em seus relatórios contábeis, os investidores terão acesso a um nível de risco que poderá ser bem menor ao que a empresa realmente está exposta. Como consequência, “a relação risco-retorno, que é componente-chave de todo o processo de movimentação de recursos na economia, fica sensivelmente prejudicada” (Lopes e Lima, 1998, p. 9). Contudo, uma consulta em alguns estudos anteriores permite se constatar que o nível de informações fornecido pelas empresas de capital aberto em seus relatórios contábeis precisa ainda ser melhorado (Murcia e Santos, 2009).
Tem-se que operações com instrumentos financeiros podem provocar sérios prejuízos financeiros às empresas (Aguiar e Hirano, 2003; Hernandez, 2003; Valor On-Line, 2011). “Uma operação de swap, por exemplo, pode oferecer mais riscos para uma corporação do que todas as suas atividades não financeiras somadas” (Lopes e Lima, 1998, p. 8). Mesmo assim, Costa Júnior (2003) e Murcia e Santos (2009) constataram que as informações presentes nos relatórios contábeis, sobre operações com instrumentos financeiros derivativos, não atendem plenamente ao que é exigido pelas normas da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
Tal fato leva a pensar que, em razão de não conhecerem a real situação de risco da empresa, novas notícias divulgadas que impliquem o aumento da percepção de seu risco podem fazer com que o preço de suas ações varie de uma forma diferente do que aconteceria se os relatórios contábeis estivessem mais completos e detalhados. Variações no preço das ações provocam a consequente variação do retorno das ações. Ou seja, empresas com informações incompletas em seus relatórios contábeis estariam sujeitas a uma maior volatilidade no retorno de suas ações, em razão do surgimento de notícias que não haviam sido informadas anteriormente para o mercado. Este raciocínio está coerente com os resultados apresentados por Malacrida e Yamamoto (2006), de que diferentes níveis de evidenciação influenciaram a volatilidade do retorno das ações, em que “as empresas que apresentam um maior nível de evidenciação possuem uma volatilidade média dos retornos de suas ações menor do que as empresas que apresentaram um menor nível de evidenciação” (Malacrida e Yamamoto, 2006, p. 78).
Frente a estas considerações, este trabalho apresenta como objetivo principal analisar a relação entre a evidenciação contábil e a volatilidade no retorno dos títulos das empresas brasileiras não financeiras listadas na NYSE (New York Stock Exchange). Contudo, quando comparado com estudos anteriores, este trabalho visita a análise desta relação de uma forma diferenciada, conforme os pontos destacados a seguir:
(i) a volatilidade levada em conta na análise se refere a um período de curto prazo (máximo de 15 cotações), enquanto que trabalhos anteriores analisaram a volatilidade em períodos maiores, como Quinteiro e Medeiros (2005), para 17 e 29 meses, e Malacrida e Yamamoto (2006), com cotações diárias para 16 meses. A justificativa para a abordagem deste estudo seria de que, tal como em prazos maiores, a volatilidade no curto prazo poderia também ser explicada em parte pelo nível de evidenciação dos relatórios contábeis, em que empresas com uma maior tendência em apresentar relatórios com menores níveis de informação estariam sujeitas a uma maior variabilidade no retorno de seus títulos. Como nos estudos consultados a volatilidade não foi explorada para períodos menores, entende-se que esta seja uma das principais contribuições desta pesquisa;
(ii) a volatilidade foi medida tanto para o retorno das ações, negociadas na BM&FBOVESPA, quanto para o retorno de ADRs (American Depositary Receipts), negociados na NYSE. Como se pode argumentar que a Eficiência de Mercado ( Fama, 1970; 1991) relativa aos mercados de capitais brasileiro e norte-americano é diferenciada, o impacto das informações contábeis nos preços dos títulos pode-se dar com velocidade também diferente nestes dois mercados. Assim, no modelo proposto, há uma segregação entre a volatilidade das ações e a volatilidade dos ADRs, o que ameniza o impacto de os dois mercados de capitais possuírem potenciais níveis de eficiência informacional diferenciados. Apesar de os preços das ações e dos ADRs tenderem a serem equivalentes (quando considerados os custos de transação), o que naturalmente acaba eliminando possibilidades de arbitragem, a velocidade de incorporação das informações nos preços destes títulos pode não ser a mesma, ocasionando assim um comportamento diferente entre o disclosure e a volatilidade nos dois países;
(iii) levou-se em consideração a volatilidade dos retornos ocorrida imediatamente após a data de divulgação dos relatórios contábeis, enquanto que em outros trabalhos a volatilidade é medida para o mesmo período em relação a todas as empresas, independentemente da sua data de divulgação das demonstrações financeiras. Esse procedimento justifica a busca pela análise do impacto da volatilidade possivelmente decorrente das informações presentes nos relatórios contábeis publicados;
(iv) o nível de evidenciação é representado simultaneamente por duas variáveis: a evidenciação fornecida nos Form_20F, sendo estes os relatórios contábeis elaborados de acordo com as normas de contabilidade norte-americanas, e a evidenciação fornecida nas Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFP). Trabalhos anteriores, como Darós e Borba (2005), mostram que o conteúdo informacional dos dois relatórios é diferente, sendo os Form_20F mais completos que as DFP;
(v) considera-se na análise proposta que o tamanho das empresas é uma variável antecedente ao seu nível de evidenciação, e a análise por meio de Equações Estruturais permite que esta modelagem seja desenvolvida. Adicionalmente, o tamanho das empresas foi representado simultaneamente por três variáveis: Ativo Total Consolidado, Receita Bruta Anual Consolidada e Patrimônio Líquido Consolidado.
Quinteiro e Medeiros (2005) observaram uma relação negativa e estatisticamente significante entre a volatilidade das ações da amostra analisada e o nível de evidenciação, sugerindo que “maiores níveis de evidenciação implicam redução da percepção de risco pelo mercado, melhorando a relação risco versus retorno dos papéis negociados” (Quinteiro e Medeiros, 2005, p. 11). Segundo Baumann e Nier (2004), menor volatilidade no retorno de ações pode resultar em menor custo de capital para a empresa. Por outro lado, Alencar (2005, p. 11), levando em conta o impacto da evidenciação no custo de capital próprio, encontrou que “no mercado brasileiro, o nível de disclosure não afeta o custo de capital”. Para mensurar o custo de capital próprio, a autora se baseou no CAPM (Capital Asset Pricing Model), que considera o retorno das ações e o seu risco, sendo, portanto, também influenciado pela volatilidade.
Lopes e Alencar (2010) constataram que o disclosure voluntário de informações não financeiras apresentou uma correlação positiva com o custo de capital próprio. Uma explicação alternativa, apontada pelos autores, é de que informações não financeiras são evidenciadas com maior frequência e, consequentemente, são mais usadas por especuladores, o que induz a volatilidade nos retornos dos títulos, aumentando, assim, o custo de capital próprio. No que se refere a informações financeiras, Lopes e Alencar (2010) observaram que sua associação foi negativa com o custo de capital próprio. Em se tratando da relação entre indicadores de transparência e a volatilidade, Monte et al. (2010) encontraram que, para as empresas listadas em níveis de Governança Corporativa, maiores níveis de transparência estiveram relacionados com menores níveis de risco, medido pela volatilidade dos retornos.
Fundamentado nestes estudos, e também no raciocínio apresentado no início da introdução deste trabalho, a primeira hipótese nula deste trabalho foi: o nível de evidenciação fornecido pelas empresas brasileiras em seus relatórios contábeis não está relacionado com a volatilidade no retorno de seus títulos. A hipótese alternativa (H1) foi de que o nível de evidenciação e a volatilidade apresentam relação estatisticamente significante.
Como o modelo utilizado leva em consideração a variável tamanho como antecedente à evidenciação, a segunda hipótese nula do estudo foi: o nível de evidenciação fornecido pelas empresas brasileiras em seus relatórios contábeis não está relacionado com o seu tamanho. A respectiva hipótese alternativa (H2) foi de que o tamanho das empresas e o seu nível de evidenciação estão significativamente relacionados. A relação entre o tamanho das empresas e o seu nível de evidenciação já foi um assunto apresentado em trabalhos como o de Horngren (1957). Uma relação positiva e significativa, que envolve H2, já foi constatada em estudos como Lopes e Rodrigues (2007), com o argumento de que empresas maiores teriam menores custos para a geração de informações mais detalhadas do que empresas menores, o que também é coerente com o que se encontra nos trabalhos de Falkenstein (1996), Leuz e Verrecchia (2000) e Alsaeed (2006). A Figura 1 apresenta o modelo e as hipóteses analisadas.
Notas: Leia-se: o Tamanho das empresas, representado simultaneamente pelo Patrimônio Líquido, pela Receita Bruta e pelo Ativo Total, apresenta um impacto positivo no nível de Evidenciação que, por sua vez, é representado simultaneamente pelo disclosure das DFP e dos Form_20F. A Evidenciação está negativamente relacionada com a Volatilidade do retorno dos títulos das empresas e, para este modelo, a Volatilidade é representada simultaneamente pela volatilidade dos ADRs negociados na NYSE e das ações negociadas na BM&FBOVESPA. A volatilidade dos ADRs é medida simultaneamente pela volatilidade dos retornos das 5, 10 e 15 primeiras cotações imediatamente ocorridas após a data de divulgação dos relatórios contábeis na NYSE; a volatilidade das ações é medida simultaneamente pela volatilidade dos retornos das 5, 10 e 15 primeiras cotações imediatamente ocorridas após a data de divulgação dos relatórios contábeis na BM&FBOVESPA.
O modelo proposto na Figura 1 considera a volatilidade representada simultaneamente pela volatilidade do retorno das ações e pela volatilidade do retorno dos ADRs. Contudo, foram testados também outros dois modelos, levando em consideração: (i) apenas a volatilidade dos retornos dos ADRs (títulos negociados na NYSE); e (ii) apenas a volatilidade dos retornos das ações (títulos negociados na BM&FBOVESPA). Destaca-se que, como proxy para representar o nível de evidenciação das DFP e dos Form_20F, foi observado o nível de evidenciação de instrumentos financeiros, de acordo com o que é requerido pelas normas internacionais de contabilidade, as IFRS (International Financial Reporting Standards). Em razão dos riscos que as operações com instrumentos financeiros podem apresentar para as empresas, conforme já comentado, entende-se que esta medida possa ser uma estimativa para o nível de evidenciação geral das empresas, levando-se em conta que empresas que fornecem poucas informações sobre este assunto em seus relatórios contábeis também forneceriam menores níveis de informações sobre outros aspectos. Na próxima seção são apresentados os procedimentos metodológicos do estudo.
As empresas selecionadas para compor a amostra foram aquelas brasileiras não financeiras e que, no período de 2002 a 2006, possuíam ADRs níveis II ou III na NYSE, pois a emissão de tais tipos de títulos vincula as empresas à obrigatoriedade de elaborar os Form_20F, relatório este que também foi utilizado para mensurar o nível de evidenciação das empresas. Na mesma linha que Lopes e Alencar (2010), entende-se que a análise da evidenciação de empresas brasileiras seria adequada em razão de melhores possibilidades de variações cross-section nos níveis de evidenciação, realidade que seria diferente no mercado norte-americano, por exemplo. Se a variação no disclosure cross-section for pequena, as relações obtidas na análise multivariada podem mostrar a ausência de relação quando, na verdade, houve poucas variações na variável independente (Lopes e Alencar, 2010). A Tabela 1, a seguir, apresenta as 24 empresas selecionadas para a amostra. Foram escolhidas para o estudo empresas não financeiras porque a negociação de certos instrumentos financeiros, como os derivativos, não faz parte do seu contexto operacional, o que é coerente com estudos como Alsaeed (2006) e Moreira et al. (2006).
O download das DFPs foi realizado na CVM (2008) e, quando não disponíveis na citada fonte, foram buscadas no site das empresas; já os Form_20F foram acessados na NYSE (2008) e na SEC (2008) e, quando não disponíveis nestas fontes, foram buscados também no site das empresas. Este procedimento resultou na coleta de 120 DFP (correspondendo a uma DFP para cada uma das 24 empresas, em cada um dos 5 períodos de análise, sendo de 2002 a 2006) e 120 Form_20F (correspondendo também a um Form_20F para cada uma das 24 empresas, em cada um dos 5 períodos de análise).
A evidenciação de instrumentos financeiros, presentes nestes relatórios contábeis, foi mensurada utilizando-se por base o instrumento de coleta de dados desenvolvido por Lopes e Rodrigues (2007) e aplicado a empresas portuguesas. Contudo, como o instrumento desenvolvido pelas citadas autoras se baseava nas normas internacionais de contabilidade para evidenciação de instrumentos financeiros que já tinham sido atualizadas (pois suas questões se baseavam nas normas do ano de 2000: IAS 32 e 39 – International Accounting Standards nº 32 e nº 39), fez-se necessária a atualização dos 54 itens de seu instrumento de coleta de dados, de acordo com o exigido pelas IFRS 7 (International Financial Reporting Standards nº 7), que são as normas internacionais de contabilidade para evidenciação de instrumentos financeiros. O instrumento de coleta de dados adaptado compõe o Apêndice A deste trabalho, contendo 45 questões.
Tal instrumento foi aplicado aos relatórios contábeis, utilizando-se a técnica de análise de conteúdo. Para todas as questões, assumiu-se peso igual e todas foram consideradas como variáveis dicotômicas, recebendo a nota 1 quando evidenciadas, e a nota 0 quando não evidenciadas. O score com a nota total foi então dividido pelo total de questões aplicáveis a cada empresa, com o objetivo de não se penalizar alguma empresa por não ter evidenciado um item que não necessariamente seria a ela obrigatório. Por exemplo, quando uma empresa divulgou que não utilizava instrumentos financeiros para fins de hedge, as questões do instrumento de coleta de dados relativas a operações de hedge não foram consideradas no denominador do índice. Procedimentos semelhantes foram adotados também por Lopes e Rodrigues (2007) e Khanna et al. (2004). A divisão do score total pelo número de questões aplicáveis resulta no índice de evidenciação, que pode variar de 0 a 1, também podendo ser tratado na forma de percentual.
Foram coletadas do Banco de Dados Economática as cotações diárias de fechamento das ações e dos ADRs das empresas componentes da amostra, priorizando-se cotações de ações ordinárias, ajustadas por proventos, referentes ao período de 01 de janeiro de 2002 a 31 de dezembro de 2007 (pois o relatório contábil que se refere ao período de análise, 2006, foi publicado em 2007). Em relação a este assunto, vale destacar o estudo de Sarlo Neto et al. (2005, p. 56), que analisou o impacto das informações contábeis no retorno de ações de tipos diferentes (ordinárias ou preferenciais), encontrando evidências de que: (i) para as ações ordinárias, “a informação contábil foi relevante somente nos casos de lucros anormais negativos”, indicando que, para os casos de lucros anormais positivos, outras fontes de informações parecem ser priorizadas; e (ii) para as ações preferenciais, “os resultados contábeis divulgados representaram uma fonte importante de informação para o investidor”. Assim, como estão sendo analisadas neste trabalho as informações dos relatórios contábeis sobre instrumentos financeiros, e não o resultado sobre os retornos anormais das empresas, em si (que são dois tipos de informações diferentes), considerou-se adequado priorizar as cotações de ações ordinárias, que são influenciadas por fatores além dos resultados contábeis divulgados pelas empresas, podendo estes fatores estarem relacionados com o nível de evidenciação.
O retorno das ações foi calculado dividindo-se a cotação do título na data t pela cotação do título em t-1, subtraindo-se 1 do resultado. Conforme procedimento já adotado em estudos anteriores, como Malacrida e Yamamoto (2006), a volatilidade dos retornos foi mensurada com base no seu desvio-padrão, de acordo com o período de análise a ser considerado na volatilidade (5, 10 e 15 cotações imediatamente seguintes à data de divulgação dos relatórios contábeis em cada um dos dois mercados de capitais considerados). Nestes termos, a data que serviu de base para a seleção do início do cálculo da volatilidade foi a data em que cada uma das empresas disponibilizou os seus relatórios contábeis nos órgãos reguladores competentes. Para a análise da volatilidade das ações, as datas foram coletadas da CVM (2008). Partindo-se do pressuposto de que os ADRs seriam influenciados pelas notícias disponíveis nos relatórios publicados para o mercado norte-americano (os Form_20F), para a análise da volatilidade dos ADRs, as datas de publicação dos relatórios foram coletadas da NYSE (2008). A utilização de planilhas eletrônicas foi fundamental para organização destas informações.
Os dados para representar o tamanho das empresas (Receita Bruta Anual Consolidada, Ativo Total Consolidado e Patrimônio Líquido Total Consolidado) foram obtidos também junto à base de dados Economática, totalizando 120 observações (24 empresas x 5 períodos de análise). Como tais variáveis são representadas em R$ mil, e a evidenciação em valores de 0 a 1, calculou-se o Logaritmo Neperiano das variáveis que representam o tamanho, para minimizar os efeitos decorrentes de diferenças nas escalas. Para a análise dos dados, inicialmente foram feitos os testes de normalidade das variáveis, acompanhado da Análise Fatorial com extração pelo Método dos Componentes Principais. O teste das hipóteses foi feito considerando-se a Análise por Equações Estruturais, no software AMOS.
O primeiro teste realizado foi o de normalidade na distribuição de frequência das variáveis. Em razão de uma das empresas ter apresentado o valor de seu Ativo Total Consolidado como um outlier em relação às demais, tal valor foi substituído pelo segundo menor valor de Ativo Total Consolidado, para se contornar o problema de não normalidade da distribuição de frequência de tal variável, mantendo-se ainda a característica da empresa como uma das menores da amostra. A Tabela 2 mostra a estatística descritiva das variáveis e vale destacar que, apesar de os índices de evidenciação dos Form_20F e das DFP serem diferentes, a correlação entre eles foi positiva e estatisticamente significativa a 1%.
Considerando-se um nível de 5% de significância, a Tabela 2 mostra que a hipótese nula de distribuição normal das variáveis seria rejeitada apenas para aquelas que representam a volatilidade dos retornos dos ADRs. Contudo, decidiu-se por não se fazer algum ajuste nestas variáveis e se proceder à próxima etapa do trabalho, que consistiu na Análise Fatorial. Assim, buscando-se verificar se as variáveis que foram consideradas latentes na Figura 1 (tamanho, evidenciação e volatilidade) seriam adequadamente representadas pelas variáveis observáveis destacadas (disponíveis na Tabela 2), realizou-se a Análise Fatorial relativa às citadas variáveis observáveis, em que a extração foi feita pelo Método dos Componentes Principais, com Rotação Varimax, considerando-se um Eigenvalue de Corte igual a 1,0. A Tabela 3 resume os resultados obtidos, já para a matriz rotacionada.
Para os testes de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e de Esfericidade de Barlett, que indicaram ajustes muito bons dos dados à Análise Fatorial, o KMO foi de 0,729, e o teste de Esfericidade foi significativo a 0,1%. As comunalidades variaram de 0,845 a 0,965 e a variância total explicada pelos quatro componentes foi de aproximadamente 91%. Observando-se a Figura 1 em conjunto com a Tabela 3, pode-se constatar que os componentes identificados podem ser denominados de:
(i) componente 1 – Volatilidade dos retornos dos ADRs (NY5, NY10 e NY15);
(ii) componente 2 – Tamanho das Empresas (AT, PL e RB);
(iii) componente 3 – Volatilidade dos retornos das ações (BV5, BV10 e BV15); e
(iv) componente 4 – Nível de Evidenciação (Evid20F e EvidDFP).
Desta forma, pode-se visualizar que as variáveis observáveis se agruparam em componentes alinhados com o que havia sido previsto no início do trabalho, e entende-se que a realização deste procedimento seja adequada, pois permite verificar se as variações de duas ou mais variáveis observáveis, não pertencentes à mesma variável latente, não estariam altamente correlacionadas (o que prejudicaria as análises posteriores). Com isso, não se observou uma alta correlação entre variáveis observáveis pertencentes a diferentes variáveis latentes. De posse destes resultados procedeu-se à Análise por Equações Estruturais, em que o modelo disponível na Figura 1 foi estruturado no software AMOS e os indicadores de robustez, para o citado modelo, estão apresentados na Tabela 4.
Quando se procede à Análise por Modelos de Equações Estruturais, busca-se a não rejeição da hipótese nula na estatística Qui-Quadrado (Hair et al., 2005). Contudo, como tal estatística pode ser sensível ao tamanho da amostra (que, neste caso, é de 120), então faz-se necessária a análise dos demais indicadores de ajuste. Os índices comparativos, normed fix index (NFI), comparative fit index (CFI), incremental index of fit (IFI) e Tucker-Lewis index (TLI), indicaram ótimos ajustes para o modelo, pois todos se mostraram acima de 0,95 ( Byrne, 2001). Os indicadores goodness-of-fit index (GFI), adjusted GFI (AGFI) indicaram ajustes bons para o modelo. A estatística root mean square error of aproximation (RMSEA) apresentou um valor de ajuste razoável, pois o recomendado é que ele seja inferior a 5% em modelos muito bem ajustados, ou inferior a 8% para análises com um pouco de cautela (Byrne, 2001). Já a estatística para standardized root mean square residual (standardized RMR) indicou também ótimos ajustes, pois se mostrou abaixo de 5% (Byrne, 2001).
Desta forma, entende-se que o modelo proposto pode ser considerado como válido, pois apenas dois dos testes de robustez analisados indicaram cautela na análise das hipóteses, não comprometendo significativamente a validade da análise proposta. A Tabela 5 mostra os resultados do teste de hipóteses e pode ser lida em conjunto com o Apêndice B, Painel A, que contém o modelo e os coeficientes encontrados.
De acordo com a Tabela 5, o tamanho das empresas apresentou impacto positivo e estatisticamente significativo no nível de evidenciação das empresas. Ou seja, para as empresas componentes da amostra, existe uma tendência para que as maiores tenham melhores níveis de evidenciação. Vale o destaque de que as companhias analisadas fazem parte das empresas brasileiras que já teriam indicativos positivos de níveis de evidenciação mais completos, pois possuem ADRs níveis II ou III na NYSE (Darós e Borba, 2005). Além disso, de certa forma, pode-se considerar que tais empresas já seriam grandes empresas, se comparadas com outras empresas que não possuem ações de tal nível no mercado norte-americano, mas isso não invalida os resultados apontados pela análise proposta. Os resultados obtidos para H2 indicam que, mesmo essas empresas possuindo melhores níveis de evidenciação, e já tendendo a estar em um grupo de grandes empresas, o tamanho se mostrou positiva e estatisticamente (ao nível de 0,1%) relacionado com a evidenciação. Em outras palavras, as maiores empresas foram aquelas que forneceram níveis de informações mais completos em seus relatórios contábeis, dentre o grupo de empresas estudadas. Quanto à análise de H1, considerando-se a volatilidade simultânea das Ações e dos ADRs, não se pode aceitar nem rejeitar a hipótese, pois a significância obtida está acima de 5%. Em outras palavras, com base nos testes realizados até este ponto, não há evidências de que a volatilidade foi influenciada pelo nível de evidenciação de instrumentos financeiros.
Conforme comentado no início do trabalho, pode-se questionar se a Eficiência Informacional dos mercados de capitais brasileiro e norte-americano é diferente, e se isso estaria influenciando os resultados, mesmo com os índices de ajustes apresentados para o modelo sendo favoráveis. Desta forma, procedeu-se a outra análise, considerando-se como variáveis dependentes somente um tipo de mercado para a volatilidade (porém continuou-se considerando duas variáveis observáveis para representar a evidenciação, conforme indicam os Painéis B e C do Apêndice B). Os ajustes destes dois novos modelos foram aproximados aos já apresentados pelo primeiro modelo testado (o que pode ser conferido com a comparação da Tabela 4 com a Tabela 6, coluna Evidenc. Geral). Da mesma forma que o teste de hipóteses para o primeiro modelo, observou-se que o tamanho apresentou influência positiva e estatisticamente significante no nível de evidenciação, observando-se também que a evidenciação não apresentou relação estatisticamente significante com a volatilidade, mesmo com a segregação proposta (conforme detalha a Tabela 7).
Estes resultados levaram ao questionamento de se a Eficiência Informacional não poderia ser considerada de outra forma. Então, fizeram-se duas novas análises, em que, além de se segregar a volatilidade por tipos de mercado (brasileiro e norte-americano), segregou-se também a evidenciação por tipo de mercado (apesar de a correlação entre as duas medidas de evidenciação ser de 0,691, significativa ao nível de 5%). Em outras palavras, nesta nova análise, buscou-se relacionar a evidenciação das DFP com a volatilidade das ações, negociadas na BM&FBOVESPA, e a evidenciação dos Form_20F com a volatilidade dos ADRs, negociados na NYSE. Os novos modelos podem ser observados no Apêndice B, Painéis D e E. Inicialmente, imaginou-se que os resultados seriam similares aos já observados, pois a correlação existente entre as duas medidas de evidenciação é alta e estatisticamente significativa.
Nesta nova análise, os ajustes dos dois novos modelos já mostraram indicativos de significativas melhoras, pois, mesmo com uma amostra com mais de 100 observações, a hipótese nula do teste de Qui-Quadrado passou a ser não rejeitada ao nível de 5% em um dos modelos (com volatilidade dos ADRs como dependente) e de 1% em outro modelo (com volatilidade das ações como dependente). Todos os demais índices mostraram que os dois últimos modelos testados possuíam indicadores de ajustes bem superiores aos três modelos já desenvolvidos anteriormente. A Tabela 6 resume estes resultados e pode ser lida em conjunto com o Apêndice B, Painéis B, C, D e E.
Comparando os resultados dos cinco modelos testados, percebe-se que os indicadores NFI, CFI, IFI, TLI, GFI, AGFI e standardized RMR sustentam ajustes similares entre os três primeiros deles, sendo que os dois últimos modelos, dos cinco, seriam os mais adequados para o teste de hipóteses (conforme indicam as Tabelas 4 e 6), resumido na Tabela 7.
Em linha com os resultados presentes na Tabela 5, a Tabela 7 indica a aceitação de H2 para todos os modelos testados, apontando que o tamanho das empresas impactou positiva e significativamente, ao nível de 0,1%, o nível de evidenciação das empresas. Quanto ao impacto da evidenciação na volatilidade, não há resultados para fundamentar a aceitação ou rejeição de H1 quando não se segrega a volatilidade por mercados, juntamente com o relatório publicado em cada mercado, como é o caso dos modelos disponíveis nos Painéis B e C do Apêndice B. Contudo, H1 foi confirmada, ao nível de 5% de significância, quando a relação entre a evidenciação foi desmembrada por mercado e por tipo de relatório publicado em cada mercado, o que é coerente, embora não fosse o esperado no modelo inicialmente proposto. Nos modelos anteriormente analisados, o resultado do teste de H2, embora com mesmo sinal que o previsto, não era acompanhado de significância estatística, o que foi diferente para os dois últimos modelos testados (Painéis D e E do Apêndice B).
Desta forma, observou-se que, para empresas brasileiras não financeiras listadas na NYSE, o nível de evidenciação de instrumentos financeiros presentes em seus relatórios contábeis apresentou relação negativa com a volatilidade no retorno de seus títulos (sejam eles ações ou ADRs). Em outras palavras, quanto maior o nível de evidenciação, menor foi a volatilidade apresentada no período de 5 a 15 cotações posteriores à publicação dos relatórios contábeis, resultados estes que estão em linha com estudos anteriores, que, contudo, foram realizados considerando a volatilidade em períodos de médio a longo prazo. Destaca-se que para a obtenção do resultado apresentado por este estudo, no que se refere à análise de H1, foi fundamental que se considerasse a diferença entre o conteúdo informacional das DFP e dos Form_20F, apesar da correlação entre os índices de evidenciação destes dois relatórios ser positiva e significativa
Este trabalho foi desenvolvido com o objetivo geral de analisar o impacto do nível de evidenciação na volatilidade dos retornos de títulos de empresas brasileiras que negociam ADRs na NYSE. Considerou-se que a evidenciação de instrumentos financeiros seria uma proxy adequada para representar a evidenciação dos relatórios contábeis, de uma maneira geral, em razão da relevância que operações deste tipo podem apresentar para o contexto da empresa e para o seu nível de risco. Além disso, neste estudo a volatilidade foi representada por um período de curto prazo (de 5 a 15 cotações), o que pode representar uma vantagem, principalmente na ausência de dados que poderia ocorrer para períodos mais extensos.
Confirmou-se a hipótese de que o tamanho das empresas apresenta impacto positivo e estatisticamente significante no nível de evidenciação das empresas, o que está alinhado com trabalhos anteriores sobre o assunto. Isso indica que, para a amostra do estudo, empresas maiores tenderam a apresentar relatórios com níveis de informações mais completos, mesmo se tratando de empresas que já teriam uma tendência a apresentar melhores níveis de evidenciação e também de serem maiores em relação àquelas que não emitem ADRs níveis II ou III na NYSE. Ao se analisar o impacto da evidenciação na volatilidade dos retornos, foram encontrados resultados indicando a aceitação da hipótese de uma relação negativa e estatisticamente significante entre as variáveis, porém tal relação só foi confirmada após se desmembrar o modelo inicialmente proposto, considerando-se principalmente que o conteúdo informacional das DFP e dos Form_20F, apesar de positivamente correlacionados, é diferente.
Esses resultados parecem indicar que informações sobre instrumentos financeiros, tal como previsto na introdução deste trabalho, são relevantes para o mercado. As implicações destes resultados se estendem aos estudos que analisam a evidenciação e o custo de capital, pois a volatilidade no retorno das ações pode influenciar o custo de capital próprio das empresas, conforme já citado. Pode-se considerar também que os resultados observados corroboram o já detectado por Sarlo Neto et al. (2005), de que investidores detentores de ações ordinárias (que foram as priorizadas neste trabalho) não levam em consideração, na data de publicação dos relatórios contábeis, somente o resultado líquido da empresa para a sua tomada de decisão, sendo que o nível de disclosure pode ser um importante indicativo para tais investidores e, para o caso deste estudo, o disclosure de instrumentos financeiros.
Entende-se que ainda há espaço para pesquisas posteriores sobre o mesmo tema abordado neste trabalho, pois a medida utilizada para evidenciação não segregou informações que poderiam ser “positivas” de informações que poderiam não ser “positivas”, e sim se as informações estiveram mais completas ou não em relação ao instrumento de coleta de dados. Uma nova visita a essa relação, considerando informações que seriam “positivas” ou “negativas” além de informações mais completas, poderia conferir maior significância estatística aos resultados obtidos por esta pesquisa.
Sugere-se também a realização de pesquisas futuras utilizando-se modelos de séries temporais (como os modelos GARCH) para estimar a volatilidade dos retornos dos ativos, uma vez que neste estudo foi empregado como medida de volatilidade o desvio-padrão. Há espaço também para a inclusão de novas variáveis ao se explorar a relação entre disclosure e volatilidade, pois não foi explorada neste estudo a relação da volatilidade com o endividamento das empresas, alavancagem financeira e operacional, exposição a riscos cambiais e de taxas de juros e o fato de a empresa pertencer ou não a setor regulamentado.
Cabe comentar que a Modelagem de Equações Estruturais se mostrou uma ferramenta multivariada adequada para a análise quantitativa deste trabalho, em razão dos ajustes apresentados pelos modelos, destacando-se a cautela a ser observada na seleção das variáveis observáveis para representar as variáveis latentes. Novos estudos também podem ser complementados por uma análise com variáveis instrumentais, buscando explorar uma potencial simultaneidade entre as variáveis disclosure e volatilidade.
Notas: AT = logaritmo neperiano do ativo total consolidado da empresa; RB = logaritmo neperiano da receita bruta anual consolidada da empresa; PL = logaritmo neperiano do patrimônio líquido total consolidado da empresa; Evid20F = nível de evidenciação de instrumentos financeiros dos Form_20F analisados; EvidDFP = nível de evidenciação de instrumentos financeiros das DFP analisadas; bv5, bv10 e bv15 = volatilidade dos retornos, respectivamente, das 5, 10 e 15 primeiras cotações de ações imediatamente posteriores à data de divulgação das DFP; ny5, ny10 e ny15 = volatilidade dos retornos, respectivamente, das 5, 10 e 15 primeiras cotações de ADRs imediatamente posteriores à data de divulgação dos Form_20F; Vol.NYSE = variável para representar a volatilidade do retorno dos ADRs; Vol.BOVS = variável para representar a volatilidade do retorno das ações; eRB, eAT, ePL, eVn, eN1, eN2, eN3, eB1, eB2, eB3, eVb, eVt, e20, eDF, eEV= representam os termos de erro associados às respectivas variáveis.