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A busca pela identidade transnacional no pensamento de António Sardinha e Gilberto Freyre*
La búsqueda de la identidad transnacional en el pensamiento de António Sardinha y Gilberto Freyre
The search for a transnational identity in the thought of António Sardinha and Gilberto Freyre
La quête de l’identité transnationale dans la pensée d’António Sardinha et de Gilberto Freyre
安东尼奥·萨丁尼亚和吉尔伯托·弗莱烈的思想中对跨国身份的寻求
Passagens. Revista Internacional de História Política e Cultura Jurídica, vol. 12, núm. 1, pp. 84-105, 2020
Universidade Federal Fluminense

Artigos



Recepção: 06 Setembro 2019

Aprovação: 22 Dezembro 2019

DOI: https://doi.org/10.15175/1984-2503-202012105

Financiamento

Fonte: FAPEMIG

Resumo: O presente artigo tem por objetivo apresentar análises sobre as relações de continuidade e tensões existentes entre o hispanismo dos intelectuais ibéricos, com ênfase ao mentor do Integralismo Lusitano António Sardinha, e o lusotropicalismo de Gilberto Freyre. Deste modo, apresenta-se os diferentes projetos sustentados por portugueses (integralistas lusitanos e, posteriormente, do salazarismo) e Gilberto Freyre a partir das propostas de uma aliança ibero-americana e, além disso, a criação de uma narrativa de continuidade e herança civilizacional gerada pelos países ibéricos e perpetuada pelos latino-americanos, em destaque em nossas análises ao Brasil.

Palavras-chave: hispanismo, lusotropicalismo, transnacionalidade, salazarismo.

Resumen: El artículo tiene por objeto presentar análisis sobre las relaciones de continuidad y tensiones políticas e ideológicas existentes entre el hispanismo de los intelectuales ibéricos, con especial énfasis en el mentor del integralismo lusitano, António Sardinha, y el lusotropicalismo de Gilberto Freyre. Aborda los diferentes proyectos apoyados por portugueses (integralistas lusitanos y, posteriormente, miembros del movimiento salazarista) y Gilberto Freyre a partir de las propuestas de una alianza iberoamericana. Presenta así mismo el proceso de creación de una narrativa de continuidad y la herencia para la civilización generada por los países ibéricos y perpetuada por los países iberoamericanos, destacados en nuestros análisis de Brasil.

Palabras clave: hispanismo, lusotropicalismo, transnacionalidad, salazarismo.

Abstract: The following article aims to outline analyses on the relations of continuity and political and ideological tensions between the Hispanism of Iberian intellectuals, with an emphasis on the mentor of Luso-Integralism, António Sardinha, and the Lusotropicalism of Gilberto Freyre. To do so, it presents the various projects sustained by Portuguese scholars (Luso-Integralists, and later, members of the Salazarist movement) and Gilberto Freyre, based on proposals for an Ibero-American alliance. It also describes the process of creating a narrative of continuity and civilizational inheritance generated by the Iberian countries and perpetuated by the Ibero-American countries, of particular emphasis in our analyses of Brazil.

Keywords: Hispanism, Lusotropicalism, transnationality, Salazarism.

Résumé: Cet article a pour but de présenter des analyses relatives aux rapports de continuité et aux tensions politiques et idéologiques entre l’hispanisme des intellectuels ibériques, et plus particulièrement du mentor de l’Intégralisme lusitanien, António Sardinha, et le lusotropicalisme de Gilberto Freyre. Il s’agit ici de présenter les différents projets portés par les Portugais (les intégralistes lusitaniens et, ultérieurement, les membres du mouvement salazariste) et Gilberto Freyre à partir des propositions d’une alliance ibéro-américaine. On abordera en outre le processus de création d’un récit de continuité et d’héritage civilisationnel par les pays ibériques et sa perpétuation par les nations ibéro-américaines, et plus spécifiquement par le Brésil.

Mots clés: Hispanisme, lusotropicalisme, transnationalité, salazarisme.

摘要: 本文分析了葡萄牙知识分子和巴西知识分子之间的思想连续性与政治和意识形态张力之间的关系,研究重点是卢西塔诺整合主义(Integralismo Lusitano) 精神领袖安东尼奥·萨丁尼亚(António Sardinha)和卢索热带主义 (Lusotropicalism) 倡导者巴西学者吉尔伯托·弗莱烈(Gilberto Freyre)。它根据伊比利亚和南美一体同盟的理念,介绍了葡萄牙的整合主义者和后来的萨拉萨尔主义者(salazaristas)的思想并对照巴西学者吉尔伯托·弗莱烈的思想。它还介绍了由葡萄牙创造并引进到巴西的卢西塔诺文化在这个热带国家的延续和发展。这一点,作者在分析巴西文化时做了强调。

關鍵詞: 西葡裔主义, 卢索热带主义, 跨国性, 萨拉萨尔主义(Salazarism).

Dilemas políticos da Península Ibérica e intelectuais na virada para o século XX

O século XIX foi marcado pela consolidação da transição da hegemonia, antes pertencente à aristocracia proveniente do Antigo Regime, às camadas burguesas. Neste momento o capitalismo redefine suas bases e modelo de geração de lucros através da Revolução Industrial. Diante da dificuldade em inserir-se na modernidade, os países ibéricos mergulham em dilemas, entre os quais: manter o perfil de desenvolvimento interno, organização social e econômica que remetiam a transações pouco convencionais ao capitalismo contemporâneo e persistir na posição de declínio ou; acelerar a modernização, aproximando-se das potências europeias, sob o risco de romper com os vínculos identitários que caracterizavam as nacionalidades de Portugal e Espanha.

Tal encruzilhada remeteu a intelectualidade dos países ibéricos ao pessimismo em virtude da nitidez do papel periférico ocupado na redefinição do lugar na balança geopolítica mundial.1 O momento conturbado despertou o interesse na elaboração de projetos políticos transnacionais no intuito de conter o declínio de ambos os países. Propostas de colaboração mútua e reaproximação com as ex-colônias fomentaram o estreitamento de diálogos entre as duas margens do Atlântico. Em comum aos países da Península Ibérica e os ibero-americanos esteve a rejeição dos valores e influências anglo-saxãs, “[...] cuja impetuosa modernidade se impôs sobre a tradição humanista da cultura latina que esteve na base da cultura ibérica” (CAPELATO, 2003, p. 38). O “iberismo”, e posteriormente o .hispanismo”, surgem como reação e desconfiança à democracia liberal e ao modelo social e étnico de organização anglo-americana. Assim, nutria-se, em oposição ao modelo hegemônico, a concepção de colaboração intelectual, por enaltecimento do espírito ibérico comum aos países envolvidos (SCHNEIDER, 2012, p. 80).

É válido sublinhar que o surgimento da concepção de iberismo se torna mais saliente entre os finais do século XIX e início do seguinte, embora não seja original deste período. Os argumentos de maior frequência para o fortalecimento da proposta de união ibérica, seja em modelo monárquico ou federado, eram os de natureza econômica e diplomática (FERREIRA, P., 2016, p. 43). No contexto de crise, a articulação, colaboração ou mesmo fusão foi disputada por espectros ideológicos variados, seja de esquerda seja de direita, conservadores ou progressistas.

O Integralismo Lusitano, surgido entre 1913 e 1914, foi um grupo monarquista de direita conservadora, que, dentre seus membros, contava com uma parcela que mantinha o projeto hispanista como polo de ascensão de Portugal e Espanha, através da conversão do Atlântico em um mare nostrum. O grupo utilizava os periódicos como mecanismo principal para difusão de suas concepções doutrinárias. Entre estes, destaca-se a Nação Portuguesa: revista de cultura nacionalista.

Este periódico teve sua publicação entre os anos de 1914 e 1938. No Brasil, sua recepção iniciou-se na década de 1920, e seus interlocutores foram intelectuais e escritores nacionais, entre eles, Gilberto Freyre, Oliveira Lima, Jackson de Figueiredo e Elysio de Carvalho (RELVAS, 2017, p. 1). Tal influência se fez sensível na comemoração do centenário de independência do Brasil, quando a Nação Portuguesa reservou boa parte de sua segunda série (1922-1923) para o estreitamento de relações.

Todavia, embora a revista buscasse o enaltecimento do Brasil, a visão positiva sempre perpassava pelo elogio das obras de Portugal. Na perspectiva histórica dos integralistas lusitanos, a relação entre os dois países foi dotada de linearidade e forte teleologia, de modo a compreender o sucesso contemporâneo do Brasil como consequência das obras dos portugueses dos séculos anteriores. O procedimento é similar com os demais países latino-americanos. Assim, se ascendia a Espanha e Portugal, juntamente, ao título de “nação fundadora de nacionalidades, tal como a Espanha, nossa irmã e nossa visinha [sic], [...]” (REDACÇÃO, 1922-1923, p. 97).

Tal perspectiva buscava estabelecer a oposição entre a “civilização” ibérica e a colonização anglo-saxã, ao destacar que o povoamento dos EUA foi acompanhado pelo extermínio sistemático dos indígenas, enquanto se negava a prática nas Américas portuguesa e espanhola, para enfatizar a característica de assimilação dos povos, e mestiçagem. Logo, valorizava-se o caldeamento, o ímpeto civilizacional e evangelizador com ênfase ao cristianismo como elemento de identificação, em detrimento do individualismo dos países de língua inglesa.

O hispanismo não supunha a anexação e a fusão de países em um Estado, porém a colaboração diplomática e a partilha intelectual. Para tanto, era necessário apresentar tal projeto como elemento inscrito na própria história dos países ibéricos, desde a formação de ambos. Ana Isabel Devignes (2016, p. 80) analisa que: “a questão hispanista, tal como Sardinha a definiu e não chegou a discutir na arena nacional, envolvia todo um programa de revisão histórica ou, antes, nas palavras do próprio autor, de retificação necessária”. Para António Sardinha (1930, p. 97), um dos mentores centrais do Integralismo Lusitano, a rejeição a uma União Peninsular seria respaldada apenas pela irracionalidade, pois se negaria assim todo o patrimônio da raça e da História portuguesa. A colaboração entre Portugal e Espanha surgiu, segundo o integralista, através dos laços matrimoniais dos Reis Católicos e das Guerras de Reconquista do século XV.

Por outro lado, tal aliança não seria incondicional. Para que se evitassem ímpetos anexionistas recíprocos exigia-se que os povos se mantivessem livres e com governos soberanos, embora unidos por acordos militares e diplomáticos para a defesa comum (SARDINHA, 1930, p. 113). O denominador partilhado deste supernacionalismo, como Sardinha o chamava, estacionar-se-ia sobre o cristianismo. Assim, o “gênio peninsular” seria ascendido à condição e categoria universal, diferente de qualquer outro projeto estabelecido, por não se estabelecer sobre imperativos materiais, nas palavras do integralista (SARDINHA, 1922-1923, p. 152).

Por outro lado, este foi um projeto encabeçado por Sardinha, como esforço pessoal, e de inserção complexa no movimento como um todo. No interior do Integralismo Lusitano, havia o receio de que a Espanha pudesse se lançar sobre Portugal e dissolver seus elementos identitários. Em A Monarquia expressava-se, ainda em 1919, a mesma desconfiança exposta em 1915, nas conferências sobre a “Questão Ibérica”:

Não discordamos duma política de aproximação com o País visinho, uma política tendente sobretudo á criação de um grande bloco latino-americano, que nos colocasse ao abrigo de perniciosas influencias externas, sejam inglesas, sejam germânicas. Mas que cuidados, de que melindrosas precauções não teremos de rodear nosso pobre paiz, aniquilado e exausto sob todos os pontos de vista, para podermos estabelecer esse acordo, em bases equitativas, com a poderosa Espanha, cheia de dinheiro e de energias, de força e combatividade. (REDACÇÃO, 1919, p. 1).

Embora possam se detectar as discussões referentes ao tema iniciadas pelo Integralismo Lusitano nas Conferências na Liga Naval, em 1915,2 é válido destacar que o projeto de Aliança Ibérica ou Ibero-americana ganha fôlego no pós-guerra. Sustenta também como proposta concorrer com a Itália fascista e a própria Ação Francesa, da qual os integralistas lusitanos são tributários, pelo título de representantes do mundo latino, conforme observa Devignes (2016, p. 95). Por outro lado, não se deve definir fronteiras impermeáveis, visto que, após o fechamento de sua Junta Central em 1922, a agremiação de António Sardinha teve participantes que passaram a se simpatizar pelas influências fascistas, e mantiveram, igualmente, diálogo com a doutrina do grupo de Charles Maurras na França, desde a formação do Integralismo Lusitano.

Em oposição à proposta anexionista do fascismo, a unidade do mundo hispânico se faria com a preservação da autonomia cultural e política, incorporando nestes projetos a América Latina com ênfase, e países da África e Ásia com o intuito de recuperar a posição perdida da Península perante o mundo, de acordo com Susana Relvas (2017, p. 3-4).

Era desejo de parcela do Integralismo Lusitano, adepta do hispanismo, portanto, “[...] construir no mundo, com a Espanha nossa irmã e a América das duas linguagens da Península madre, a Aliança fraternal e gigantesca – o novo ‘Quinto Império’ do nosso mito nacional” (VIEIRA, 1922-1923, p. 491). Com o hispanismo, o Brasil possuía grande destaque nos planos do Integralismo Lusitano, por ser apresentado como o continuador das tradições portuguesas e maior herdeiro da lusitanidade. Lemos (2017, p. 190) destaca que, através da exaltação da grandeza do país, os integralistas de modo geral e Sardinha especificamente afirmavam a importância de Portugal como difusor das bases da civilização, que, conforme visto, se fazia sobre os pilares do cristianismo e do corporativismo monárquico.

Para que o duplo elogio (ao Brasil e a si mesmos) ocorresse de forma bem-sucedida, a Nação Portuguesa definiu um processo de historicidade linear e teleológico, conforme já destacado, onde o Brasil seria consequência única dos direcionamentos oferecidos por Portugal durante o período colonial. Dizia o artigo não assinado “Glória ao Brasil”: “Na sua divisão em capitanias, D. João III lança efetivamente os fundamentos nacionais do Brasil que reaparecem na constituição federal do Estado, transmitida pelo império à República” (REDACÇÃO, 1922-1923, p. 97). Assim, a nação brasileira haveria sido propiciada através das ações de sua metrópole, Portugal.

Outra estratégia percebida é o enfraquecimento do ímpeto monárquico no estreitamento das relações proposto, com ênfase no modelo corporativista e na projeção do Brasil como o Portugal do futuro. Nestes termos, o investimento se faria no Estado centralizado e hierarquizado organicamente, tratando com moderada indiferença o regime de Estado adotado pelos futuros aliados, com o intuito de não repelir as repúblicas latino-americanas.

Estas concepções influenciaram as teorias de Freyre em seus horizontes de expectativa em relação ao Brasil e nas análises que fazia referentes ao Portugal salazarista e nas bases do lusotropicalismo. Nesta perspectiva, comum aos integralistas que investiram no hispanismo, Freyre concebia os portugueses como elementos de difusão da civilização, por meio da democracia racial, justamente em função da compreensão feita do catolicismo, como elemento de integração à vida comunitária. Deste modo, está próximo o sociólogo brasileiro de António Sardinha em vista da compreensão do português como elemento de aglutinação entre os negros e indígenas (SCHNEIDER, 2012, p. 85-86), tratando com indiferença as tensões derivadas deste contato. Assim, a democracia racial mantém vínculos com as concepções do hispanismo defendido por parte dos integralistas lusitanos.

Tais afirmações estão distantes de serem mera especulação. No Diário de Pernambuco, Freyre relata a experiência de exílio de António Sardinha na Espanha, em 1920 (RELVAS, 2017, p. 14). O contato por correspondências entre Sardinha e Freyre, embora efêmero em virtude da morte do integralista em janeiro de 1925, foi acompanhado de interesse de ambas as partes. George Manuel Gomes (2016, p. 100) acusa a troca de cartas a partir de 1923, iniciada por Freyre e respondida no fim do mesmo ano por Sardinha. Tal diálogo será correspondido duas vezes, em vista do desaparecimento do mentor do integralismo lusitano. Neste curto espaço de tempo, Sardinha oferece alguns números da revista Nação Portuguesa e suas publicações Ao Princípio era o Verbo . Aliança Peninsular. Tais obras foram acompanhadas de um convite para Gilberto Freyre participar da Nação Portuguesa, aceito através do artigo “O Sr. Oliveira Lima em Portugal” (FREYRE, 1922-1923, p. 523-525).

Portanto, são validadas as análises que vinculam o hispanismo do integralismo lusitano, e de Sardinha especificamente, ao lusotropicalismo de Gilberto Freyre, que foi difundido, com desconfiança inicial, durante a ditadura de Salazar. É interessante perceber que o diálogo de Freyre com intelectuais portugueses era bastante fluido e plural, por ocorrer com grupos de monarquistas constitucionais e republicanos, de integralistas lusitanos ao grupo da Seara Nova, opositores em concepções políticas e projetos de Estado. Com relação aos ensaios de Freyre sobre a trajetória dos dois países, as influências transnacionais são percebidas nas consonâncias de projetos políticos, nas formas como Portugal e Brasil são vistos tanto por Sardinha quanto por Freyre e, de forma evidente, na correspondência recíproca.

O lusotropicalismo de Gilberto Freyre: suporte teórico ao salazarismo

A convergência de Freyre com pensadores ibéricos de linha conservadora foi expressa por ele em diversas oportunidades. Em artigo de 1954, ele falava do “exemplo da Espanha de 98” a ser seguido pelos intelectuais brasileiros com vistas ao êxito do “esforço de reabilitação do Brasil”. Após a derrota para os EUA, a Espanha “achou forças dentro de si mesma para fazer-se respeitar pelo seu espírito ou pelo seu caráter e admirar pela sua inteligência, pela sua arte, pelo seu esforço, pela sua coragem de introspecção” (FREYRE, 1954b, p. 5).

É interessante pensar a teoria de Freyre conectada aos dilemas ibéricos da virada do século XIX para o XX. Tais polêmicas eram levantadas, igualmente, na Espanha por Angel Ganivet e Miguel de Unamuno, onde o primeiro defendia que: “Si España quiere recuperar su puesto ha de esforzarse para restablecer su propio prestigio intelectual y luego para llevarlo à América e implantarlo sin aspiraciones utilitarias”(GANIVET, 1897, p. 108). Logo, tais preocupações não eram lançadas isoladamente.

A partir de uma visão transnacional, Freyre identificava grandes blocos civilizacionais: uma unidade maior, a tropical, pouco estudada por ele; a hispanotropical, intermediária; e, dentro desta, a lusotropical, que recebeu maior atenção do autor (FREYRE, 2010, p. 65). O lusotropicalismo seria, então, um recorte que o autor faria dentro do hispanismo. Não satisfeito em “descobrir” essa nova civilização que Arnold Toynbee não incluíra em seu imenso trabalho, Freyre (2010) foi mais adiante e propôs uma nova ciência, a lusotropicologia, para dar conta deste objeto.

Este passo mais ousado se deu no início dos anos 1960, possivelmente o momento em que Freyre atingiu o ponto máximo de suas formulações sobre o lusotropicalismo. Mas essa história começa muito antes, atravessando décadas, desde sua formação, da qual participaram diversos nomes do hispanismo, como o próprio autor afirma.

Neste percurso, possivelmente, uma das maiores contribuições de Freyre (2010, p. 90) foi, como ele mesmo sugere em 1961, substituir o Estado Nacional como “unidade inteligível de estudo histórico” por outra dimensão, a “sociedade”, “portadora de cultura que seja adjetivada segundo sua extensão no espaço ou a sua projeção no tempo”. Efetivamente, pensar a própria obra de Freyre implica fazer essa imersão em diálogos e correntes culturais/intelectuais que emergiam e se transformavam ao longo do tempo e acima das fronteiras político-administrativas.

Princípios fundamentais do lusotropicalismo aparecem já em Casa-Grande & Senzala, como observa Cláudia Castelo (1999), embora o termo ainda não fosse usado. De fato, em 1933, o autor exaltava a obra colonizadora portuguesa, atribuindo seu êxito nos trópicos às propriedades específicas do português.

Freyre descreve as dificuldades oferecidas ao europeu no trópico, a exemplo do solo e da temperatura e da falta de braços para o trabalho, para então ressaltar as qualidades do português para levar a bom termo o projeto colonial: sua história bicontinental, a experiência prévia da mestiçagem, o aprendizado com muçulmanos e judeus, uma trajetória cultural, reunindo Europa e África, as matrizes culturais católica e maometana, “a dinâmica e a fatalista encontrando-se no português, fazendo dele, de sua vida, de sua moral, de sua economia, de sua arte um regime de influências que se alternam, se equilibram ou se hostilizam” (FREYRE, 2003, p. 69), que resultou num povo com raras habilidades: a mobilidade, aclimatabilidade, miscibilidade, enfim, a plasticidade social (FREYRE, 2003, p. 69-71).

Apesar do tom elogioso, em Casa-Grande & Senzala, o autor registrou também diversas críticas. A própria plasticidade é, via de regra, destacada na comparação com outros colonizadores, como ingleses e holandeses. As condições subumanas do tráfico, a violência e abusos praticados por senhores e suas esposas que chegavam a mandar queimar vivas escravas grávidas e outras atrocidades estão presentes na obra.

Além disso, o autor censurou os exageros dos portugueses quando versavam sobre sua própria história. “Há muito que descontar nas pretensões de grandeza do português. Desde fins do século XVI ele vive parasitariamente de um passado cujo esplendor exagera. Supondo-se diminuído ou negado pela crítica estrangeira, artificializou-se em um português-para-inglês ver” (FREYRE, 2003, p. 267).

Contudo, prevalece em Casa-Grande & Senzala uma visão francamente positiva da colonização portuguesa. Se no Brasil a obra de Freyre foi importante para dissipar as dúvidas sobre a viabilidade da nação em virtude do legado da miscigenação, em Portugal ela poderia ser aplaudida também porque, no geral, o que sobressai é um grande elogio ao português e sua obra histórica. No entanto, o pensamento racista muito difundido nos anos 1930 e 1940 também afetava Portugal, criando barreiras para as teses freyreanas (CASTELO, 1999).

Se as teses fundamentais que dariam suporte ao lusotropicalismo já estavam presentes em Casa-Grande & Senzala, a criticidade presente nesta obra, embora não fosse o aspecto prevalecente, praticamente desaparece nos escritos seguintes em que o autor trata do “mundo que o português criou”. Como observa Jessé de Souza (2000), a trajetória de Freyre é distinta da maioria dos intelectuais que, via de regra, produzem, na maturidade, beneficiados pelo acúmulo e consolidação de leitura e pesquisa, reflexões mais consolidadas e coerentes. Os trabalhos de Freyre caminham para se tornar cada vez mais políticos e menos criteriosos (SOUZA, 2000, p. 69-70).

Em 1937, Freyre preparou algumas conferências para apresentar em universidades portuguesas e no Kings’s College, em Londres. Um problema de saúde na família obrigou o sociólogo a retornar ao Brasil e delegar a amigos seus a tarefa de ler os textos das conferências. Três anos depois, os textos foram publicados em forma de livro com o sugestivo título de O mundo que o português criou (FREYRE, 1940), tendo como prefaciador o ensaísta português António Sérgio, um dos mais influentes intelectuais lusos.

Como destacam Cláudia Castelo (1999, p. 24-25) e Alberto Luiz Schneider (2012), nessa obra Freyre generaliza para as outras colônias portuguesas as afirmações que já fizera para o Brasil. Efetivamente, as teses de Casa-Grande & Senzala, especialmente a centralidade da miscigenação e suas implicações democratizantes, estão presentes nas conferências que compõem o livro, apontando sempre para uma grande “unidade de sentimento e cultura” reunindo Portugal, Brasil, a África e Índia Portuguesa, Açores, Cabo Verde e Madeira (FREYRE, 1940, p. 42).

A ênfase na mestiçagem permite a Freyre relativizar todos os demais aspectos. A violência e a desigualdade social aparecem muito mais levemente do que na obra de 1933 e aqui a sua suavização é mais explícita. A menção ao abuso dos homens brancos contra mulheres negras e indígenas, por exemplo, é imediatamente temperado pelo destaque ao “amor sem preconceitos de raças e convenções de classe, do branco pela cabocla, pela cunhã, pela índia” (FREYRE, 1940, p. 45).

A mestiçagem afetou positivamente todo o processo histórico do mundo português, “amolecendo o que o systema econômico de trabalho escravo prometia levantar ali de hirto, talvez até de cruel e de deshumano. Nunca houve maior victoria do humano, do demasiadamente humano, sobre o econômico” (FREYRE, 1940, p. 45).

A colonização portuguesa, especialmente através da mestiçagem, teria forjado uma unidade “éthica e esthética”, entre os diversos povos onde esteve presente porque esses povos se sentem “espantosamente semelhantes”, na cultura, nas expressões artísticas, nas “inclinações sentimentais e de aspirações sociais e políticas” (FREYRE, 1940, p. 47).

A menção às aspirações políticas comuns é intrigante e quase surpreendente porque, nos escritos lusotropicalistas, Freyre, via de regra, evita o tema ou o ressignifica. Voltaremos a isso.

Após essa declaração enfática quanto à unidade ou “consciência de espécie” transnacional (FREYRE, 1940, p. 49), o texto começa a revelar ambiguidades. Ora exalta a unidade existente, ora diz que ela precisa ser construída e critica os adeptos do “nacionalismo estreito” que há em Portugal, gente contrária a qualquer mestiçagem cultural ou linguística e, no Brasil, os lusófobos que preferem a influência holandesa e italiana em detrimento da portuguesa (FREYRE, 1940, p. 51-54).

Interrogando Freyre com cuidado, infere-se que a unidade existe em potencial, carecendo ser articulada, organizada, para o que é necessário uma “interpretação ampla e ao mesmo tempo segura dos vários aspectos da obra colonizadora dos portugueses”. A quem cabe interpretar? Aos intelectuais, escritores, artistas, pesquisadores, cientistas, estudiosos e poetas (FREYRE, 1940, p. 48). Isto estabelecido, Freyre toca adiante seu texto e argumentos. Ou seja, coloca-se como um dos agentes da unidade, propondo a sua interpretação e articulação.

O raciocínio de Freyre é coerente com sua visão acerca dos intelectuais, conforme ele expressa em outros escritos. Logo na abertura de Casa-Grande & Senzala, ele registra que, ao conhecer os ensinamentos de Franz Boas, teve a sensação de que, no Brasil, “tudo dependesse de mim e dos de minha geração” no início dos anos 1930 (FREYRE, 2003, p. 31). Como se vê no livro de 1940, para o autor, não apenas o Brasil, mas todo “O mundo que o Português criou” carecia dele...

Toda a história de Portugal teria sido marcada pelas “eminências pardas”, figuras ilustres, não políticos: “Sem esses doutos não se compreende o desenvolvimento português nem na América nem na África nem no Ocidente. Não se compreendem os descobrimentos ou as explorações marítimas dos portugueses” (FREYRE, 1954a, p. 5). O Padre Vieira seria um “exemplo de intelectual a serviço não só da Igreja e do Estado, como de toda uma cultura: a luso-brasileira. Ou a luso-tropical” (FREYRE, 1954a, p. 5).

Outras eminências nada pardas também são destacadas por Freyre. São os “indivíduos criadores” como D. Henrique, Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Anchieta, Luís de Camões, Alexandre Gusmão e muitos outros. Estes “homens de gênio” são “mais capazes que os comuns de serem reveladores e intérpretes dos extremos de profundidade e intensidade da natureza humana”. Eles apresentam “antecipações de sínteses que só anos e até séculos depois se tem realizado entre grupos ou culturas inteiras” (FREYRE, 2010, p. 100-101).

Para Freyre, o intelectual, especialmente aquele com formação científica, sociólogo, no caso, é capaz de “perceber o movimento e os interesses sociais” e “colocar-se acima de sua própria condição”. É tal possibilidade que lhe permite a aproximação e distanciamento da realidade, a imperturbabilidade diante dos acontecimentos: o intelectual é o único capacitado a despir-se de sua condição de classe e de sua inserção histórica” (BASTOS, 1986, p. 71). Não por acaso Freyre (1954c, p. 109, 133, 163, 185, 191, 197, 199, 223), de forma constante, afirma sua condição de escritor independente, ainda que sua vinculação político social fosse tão explícita, como no início dos anos 1950 quando trabalha expressamente para o regime salazarista ou, talvez, exatamente por isso.

Quando se diz independente, Freyre se refere de forma especial à arena política. Além de se dizer livre de condicionamentos políticos, podem-se identificar três movimentos do autor neste tema: a) separar artificialmente as esferas da cultura e da política; b) concentrar-se na abordagem do cultural e, firmado sobre a ideia de que é independente, apresentar propostas com fortes implicações políticas; c) esvaziar ou ressignificar a política, reduzindo sua importância histórica.

No livro de 1940, é o terceiro movimento o mais presente. Apesar de falar em aspirações políticas comuns dos povos lusodescendentes, Freyre não aprofunda essa ideia. Na realidade, diz-se pouco interessado em questões dessa ordem porque o mais importante é a “Democracia social, essencial, humana, quero dizer; pouco me preocupa a política” (FREYRE, 1940, p. 51). A abertura e plasticidade cultural portuguesa aproxima-se da democracia social muito mais do que outros povos aferrados à democracia política, “tantas vezes ineficiente e injusta” (FREYRE, 1940, p. 54).

O esvaziamento da política é também promovido quando o autor trata da historiografia. Para ele, os estudos da história política, militar e dinástica afastam os povos enquanto os estudos da história cultural os aproximam, porque focam no que é “mais profundamente humano”. São esses estudos do social e cultural que serão a “base de uma política de verdadeira aproximação entre o Brasil e Portugal e os povos da África, da Ásia e das ilhas colonizadas pela gente portuguesa” (FREYRE, 1940, p. 92-93).

Os três movimentos de Freyre – separar a política da cultura, focar na segunda e ressignificar a primeira – reaparecerão com vigor nos anos 1950. Antes, porém, vale um rápido exame dos anexos que o livro de 1940 contém, nos quais se registra a repercussão das ideias de Freyre em Portugal e no Brasil.

A escritora Maria Archer comenta sobre Angola, apontando suas diferenças para o restante das terras colonizadas por Portugal. Em Angola não teria se fixado característica própria alguma. Seria apenas um fornecedor de homens para tráfico, um lugar de passagem para degredados. Não se marcaria pela fixidez (ARCHER, 1940, p. 127-139). No geral, Angola contraria a tese de Freyre sobre a cultura comum lusa, mas Archer parece ver Angola como uma exceção à regra freyreana.

Por sua vez, João de Barros (1940, p. 146) faz coro à tese de Freyre de que “não se encontra em Portugal o menor preconceito de raça, nem vestígio dele”, assim como no Brasil.

Artigo de Arnon de Mello concorda com Freyre quanto à “unidade de sentimento” que une portugueses e lusodescendentes e exalta a atração exercida pelo Brasil sobre povos da metrópole das outras colônias que querem emigrar para o Brasil. Para ele, o Brasil deveria ser o centro do novo mundo criado pela miscigenação (MELLO, 1940, p. 153).

Entre tantos elogios, aparece uma observação instrutiva de Vitorino Nemésio. Ele é cauteloso com a ideia freyreana da unidade. O tal “bloco de sentimento e de cultura”, a “pátria maior” de que fala Freyre é, para Nemésio (1940, p. 162), uma “these de fecundas perspectivas e que conforta e robustece o sentimento português”, apesar de advertir de que seja algo difícil de sustentar esse “pan-lusismo”.

A leitura de Nemésio se mostraria certeira na década de 1950. A grande contribuição de Freyre seria fortalecer o nacionalismo português em solo europeu e assegurar a continuidade de seu domínio no além-mar.

Os ventos liberalizantes e em favor da descolonização no pós-Segunda Guerra Mundial incidiram sobre as potências coloniais, demandando-lhes algum tipo de mudança. Valentin Alexandre (2006, p. 44) resume o processo:

Simplificando muito a realidade [...] podemos discernir nas políticas seguidas pela Grã-Bretanha e pela França nos dez anos posteriores à 2.ª Guerra Mundial uma linha de fundo de sentido reformista, que visava a conservação do domínio colonial como base para o exercício de um poder autónomo a nível mundial (com uma ligação mais ou menos forte aos Estados Unidos), através da integração política das populações do ultramar, e não de um simples controle administrativo.

Servindo-se das brechas abertas pelo aggiornamento levado a efeito pelos ingleses e franceses, os movimentos de independência foram ser fortalecendo, consumando a descolonização afro-asiática. Em contraste, “o mundo que o português criou” permanecia intacto. As pressões sobre o governo português, no entanto, não tardaram, especialmente no âmbito das Nações Unidas, nova arena importante na geopolítica internacional.

A estratégia portuguesa consistiu em negar o caráter colonial de suas possessões no ultramar. No entanto, a própria legislação vigente dizia o contrário. O Ato Colonial de 1930 era inequívoco:

Art. 2 – É da essência orgânica da Nação Portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações indígenas que neles se compreendam, exercendo também a influência moral que lhe é adstrita pelo Padroado do Oriente.

Art. 3 – Os domínios ultramarinos de Portugal denominam-se colônias e constituem o Império Colonial Português (PORTUGAL, 1933, p. 35).3

Esta lei demarcava uma fase de forte teor nacionalista e centralizador na prática imperialista lusa: “a autonomia é substituída pela centralização; a abertura ao capital estrangeiro cede lugar à nacionalização; o desenvolvimento autônomo é preterido em favor da integração econômica imperial” (CASTELO, 1999, p. 46).

Os tempos eram outros nos anos 1950. Em junho de 1951, após longos debates, foi extinto o Ato Colonial. Mudou-se também a nomenclatura. Não haveria mais colônias, mas sim províncias de uma nação pluricontinental. A medida se inseria em uma longa tradição portuguesa de “integração das colônias”, ideia sempre aventada ou proposta quando as possessões estavam em risco, remontando ao debate por ocasião da independência do Brasil (ALEXANDRE, 2006, p. 53-54).

Foi nesta conjuntura que Gilberto Freyre desembarcou em Lisboa, como um “hóspede do Estado” (FREYRE, 1953, p. 20), em agosto de 1951. Começava o tempo áureo do lusotropicalismo.

Freyre fora convidado pelo Ministro do Ultramar Sarmento Rodrigues a fazer um périplo pelas províncias portuguesas. Segundo Freyre, o ministro lhe dera “inteira independência” para percorrer “o Ultramar Português com olhos de homem de estudo. Com olhos livremente críticos e não apologéticos. Que veja da África, do Oriente, das ilhas os defeitos e não apenas as virtudes” (FREYRE, 1953, p. 15).

Segundo Cláudia Castelo, o governo português planejou cada detalhe da viagem de Freyre. Dali deveria sair a sustentação sociológica para o discurso oficial de que Portugal não tinha colônias, mas era uma só nação com território em três continentes. Talvez nem fosse necessário tanto cuidado porque era grande a convergência entre as ideias de Freyre e as demandas do regime naquele momento.

A aventura do sociólogo brasileiro era notícia em Portugal e no Brasil. No final de setembro, o Jornal do Brasil republica o artigo “Gilberto Freyre e Portugal” que João de Barros, da Academia de Letras de Lisboa e ex-ministro do Exterior, publicara no Diário de Lisboa. O artigo informa que Freyre começara, a convite do governo português, viagem pela Ásia e África e que depois contaria o que vira. O autor exalta Freyre e diz, expressamente, que aceitará de antemão tudo o que ele disser (BARROS, 1951, p. 6).

O que Freyre disse se tornou a base de sustentação do discurso português para resistir às pressões pela descolonização, incluindo as lutas no campo diplomático. Livros de Freyre eram distribuídos nas embaixadas em Lisboa e em Consulados no exterior (CASTELO, 1999, p. 98-99).

Em síntese, Freyre (1954c, 2010), afirma ter comprovado com seus próprios olhos o que afirmava desde os anos 1930: Portugal havia criado, na Europa, Ásia, África e América, uma nova civilização, a lusotropical, termo que aparece pela primeira vez nos livros produzidos durante a viagem – O luso e o trópico e Um brasileiro em terras portuguesas.

Na história e na atualidade, o mundo lusotropical foi forjado pelo “modo português de estar no mundo”, marcado pela mobilidade, miscigenação e aclimatabilidade. A experiência prévia de contato com povos diversos, especialmente os negros e os maometanos, fizera do português um povo já miscigenado racial e culturalmente antes da chegada ao mundo tropical. A ação colonial lusa foi “pacífica” e a escravidão com “doçura” e “flexibilidade” (FREYRE, 1954c, p. 34). Nos seus termos: “a marca das terras descobertas e colonizadas por Portugal é esta: ‘não são terras violadas ou conquistadas à força bruta, mas sim docemente assimiladas’” (FREYRE, 1954c, p. 177). Em decorrência disso, não há colônias, mas sim uma civilização que atravessa fronteiras e mares. A própria nação seria incorreta. No seu lugar, o correto seria dizer “unidade transnacional de cultura” (FREYRE, 1954c, p. 102).

Nem imperialismo, nem colônias, sem violência e, logo, sem razão para se pensar ou exigir independência:

Devemos crescer juntos, todos os luso-tropicais: juntos uns dos outros e próximos das fontes, não sei se diga europeias, da nossa cultura, que são principalmente as portuguesas. E quem diz cultura portuguesa diz uma cultura que nunca se contentou em ser apenas europeia, tendo com que nascido com a vocação de ser mais tropical que europeia: de harmonizar a Europa com os trópicos, sem imperialismo nem violência. (FREYRE, 1954c, p. 103).

Os relatos da viagem de Freyre (1954c, 2010), em O luso e o trópico e as conferências publicadas em Um brasileiro em terras portuguesas não trazem inovações teóricas aos escritos precedentes. O que sobressai é o enfoque fortemente político, precisamente o que era negado pelo autor. A estratégia do sociólogo era, como apontamos, separar a cultura da política, fazer um longo ensaio sobre questões culturais e, no fim, às vezes de forma explícita, outras vezes de forma sutil, estribado na sua pretensa isenção, apresentar propostas com fortes implicações políticas. Trata-se de algo recorrente na obra lusotropicalista. Destacamos, na sequência, algumas circunstâncias em que Freyre recorreu a este procedimento.

Antes de se deslocar para África e Ásia, Freyre viajou pelo Alentejo. Em setembro de 1951 passou por Sagres. Fascinado com o lugar, exalta as lutas ali travadas contra o mar, louva as conquistas portuguesas, a ciência, a técnica, a pesquisa (FREYRE, 1953, p. 135) e sugere a criação de uma revista literária, reunindo produções lusotropicais, com “um mínimo de independência de ideologias políticas”, expressando as particularidades provincianas, locais e a cultura comum “não só a Portugal e ao Brasil como a toda uma constelação de províncias que já não se denominando ‘colonias’ são tão ‘províncias’ ou ‘regioes’ do mundo português como o são o Algarve ou Trás-os-Montes, São Paulo ou o Nordeste do Brasil” (FREYRE, 1953, p. 138-139). No final do argumento, Freyre condena os nacionalismos políticos (FREYRE, 1953, p. 138-139). Este era o programa da revista que deveria ter um “mínimo de independência política”...

Em dezembro de 1951, passando por Angola, o autor diz que a escravidão portuguesa é de um outro tipo, é integradora e promove a ascensão social do negro que, sendo português, não se revolta contra Portugal como o fazem os pretos das colônias inglesas, belgas e francesas (FREYRE, 1953, p. 407). O sociólogo registra que havia ameaças imperialistas em Angola, Moçambique, Índia Portuguesa, Macau e Timor, e sugere que o Brasil poderia, “pela presença e pela ação de sua cultura portuguesa já experimentada nos trópicos e avigorada pela miscigenação, colaborar com Portugal” (FREYRE, 1953, p. 441). Qual a natureza da ação? Uma ação cultural, enfatiza o autor. Prosseguindo na sua dissertação, ele condena o nacionalismo linguístico de alguns brasileiros e, de passagem, condena também o separatismo de “alguns luso-angolanos”, “alguns luso-moçambicanos”, “alguns luso-indianos”. Freyre diz que o “nacionalismo de língua” (dos brasileiros) é “tão mesquinho” quanto o “separatismo político” desses povos e prega a união de todos pela defesa da “já esboçada civilização luso-tropical, em que se afirme a capacidade portuguesa de criar, como nenhum europeu, nos trópicos, dentro de uma democracia étnica, uma cultura tão vigorosamente europeia quanto tropical” (FREYRE, 1953, p. 442).

Escrevendo para o Jornal do Brasil, em abril de 1952, Freyre comenta o “contato de Portugal com o ultramar”, dizendo que o “Portugal ultramarino” é mais obra de “engenharia social” e “menos obra de arte política”. A primeira é “menos cenográfica” que a segunda, mas é mais sólida e duradoura. Segue-se uma longa consideração sobre as diferenças, explicitando a separação entres as dimensões sociocultural e a política, enfatizando a expertise lusa na primeira. Posteriormente, registra que o ministro Sarmento Rodrigues fizera uma visita às “províncias orientais de Portugal” com a seguinte justificativa:

Porque as obras de engenharia social precisam que a arte política avive ou refresque nelas, em momentos justos, aspectos porventura esquecidos. E é este o momento exato de saber-se, tanto no Oriente como no Ocidente, que as províncias ultramarinas de Portugal continuam todas – as do Oriente tanto quanto as da África – portuguesas no sentimento, nas predominâncias da cultura e no fato de pertencerem politicamente ao conjunto lusitano de províncias, irmãs do Brasil (FREYRE, 1952, p. 5).

Nessa passagem a política é vista positivamente. Em outras, quando ela significa qualquer questionamento à ordem imperialista lusa, ela é esvaziada ou mesmo condenada, especialmente quando se trata do regime democrático. Quando passa por Moçambique, em janeiro de 1952, Freyre tece vários elogios ao fato de a população local associar anglicismos e americanismos com elementos da cultura lusotropical. O lusotropical jamais significou “fechar-se a inovações de qualquer espécie”, explica (FREYRE, 1953, p. 489). Na sequência propõe uma comparação, afirmando que os negros cristãos de Moçambique se dizem “com a maior naturalidade deste mundo” que são portugueses, além de Católicos romanos, enquanto os negros de colônias belgas e inglesas não se dizem belgas ou ingleses. Qual a razão da diferença? Nas palavras de Freyre (1953, p. 491), os pretos das Áfricas inglesas e francesas vêm melhorando seu status político, mas não o status social que é “quase sempre bom entre os portugueses”. Nestes termos, diante dos efeitos positivos da “democracia social” proposta, a independência e adesão a uma democracia política perderiam qualquer validade.

Essa indiferença pela democracia não era uma novidade no pensamento de Freyre. Como o próprio diz, existem os “desencantados ou desinteressados na democracia simplesmente política – entre os quais me incluo desde a mocidade – mas não da social” (FREYRE, 1953, p. 127). A propósito, quando se referia aos países sul-americanos sempre usa aspas para “democracia” (FREYRE, 1953, p. 128).

É instrutiva a resistência freyreana ao regime democrático ao longo do tempo. Se nos seus tempos de moço a democracia no Brasil era fortemente limitada pelas conhecidas práticas políticas da Primeira República, outra é a conjuntura entre 1945 e 1964, com notáveis aperfeiçoamentos institucionais e inequívoco avanço das conquistas dos extratos socialmente inferiores, como destacado por diversos estudiosos do período, a exemplo de Angela de Castro Gomes (2005), Lucília de Almeida Neves Delgado (1989), Jorge Ferreira (2001) e também por autores cuja visão é fortemente crítica das relações políticas daquele tempo, mas que reconhecem haver, apesar dos percalços, um processo de democratização do Estado e da sociedade brasileira no pós-1930, como é o caso de Francisco Weffort (1978).

A visão de Freyre, inalterada com o tempo como ele mesmo dá a entender, parece se filiar a outro paradigma. É possível que seja a própria democratização o fato que o incomode e não exatamente a sua ineficiência ou limitação.

Considerações Finais

A elaboração de aportes teóricos assume perfil de trans-históricos, ênfase dada aos estudos sobre os intelectuais e da história intelectual propriamente. De outro modo, as análises não devem se restringir a recortes geográficos e temporais rigorosos sob o risco de obscurecer relações e influências nutridas pelos a(u)tores investigados. Segundo Gruzinski (2001, p. 176), a “tarefa do historiador pode ser a de exumar as ligações históricas, [...], o que implica que as histórias só podem ser múltiplas – ao invés de falar de uma história única e unificada com ‘h’ maiúsculo.”

O lusotropicalismo de Freyre revela suas raízes no hispanismo do Integralismo Lusitano. Seu contato com António Sardinha só não foi mais estreito pelo falecimento do português de maneira precoce, em 1925. Por outro lado, como apresentado, as influências intelectuais não são vias simples, de mão única, mas percursos complexos.

Salvo melhor juízo, não há referências a respeito do contato de Gilberto Freyre com a Ação Integralista Brasileira, porém, entre esta e o Integralismo Lusitano, há registros deixados pelos próprios integrantes da AIB. Gustavo Barroso (1937, p. 39-40), tal como Freyre, bebia nas influências de Sardinha os projetos de uma nova civilização concebida pelo hispanismo:

Judaísmo e maçonaria haviam impedido o desenvolvimento dum grande Imperio Unido que poderia alcançar as duas ribas do Atlântico, tornando-o o mare nostrum. Ficára um Reino para um lado e um Império para outro, destinados dentro de um século ou cousa que o valha, a Repúblicas positivoides e maçonizadas em marcha para o comunismo através da social-democracia.

Destacado o antissemitismo tipicamente barrosiano, sobressaltam as referências às concepções hispanistas presentes nos textos do Integralismo Lusitano. Para análise é proveitosa a referência a Manuel Múrias (1922-1923, p. 179), membro de segunda geração do IL, diretor da Nação Portuguesa após a morte de Sardinha, que destacava em “Pão de Guerra”: “O Atlântico é naturalmente no futuro, o campo de acção de portugueses e brasileiros -, o mare nostrum”. De outro modo, Plínio Salgado (1955, p. 147-148) sustentava um conceito desajeitado de “Democracia Colonial”, o qual acreditamos não ser imprudente colocarmos próximo da “Democracia Racial” freyreana, quando o chefe integralista expunha:

Não se verificava na Colônia, nenhum sentimento de exclusivismo de casta, nenhum orgulho de origem. Misturavam se nobres e plebeus porque todos se uniam para a grande aventura da América. O caráter absorvente da autoridade local, que se alteava quase discricionária, escapando a vigilância dos capitães-generais e dos governadores-gerais, não era um índice antidemocrático. Pelo contrário, era um individualismo exacerbado, que se era o espírito que iria dominar mais tarde o século XVIII e XIX.

Não estamos afirmando que Freyre em um dado momento manteve contato com a AIB, no entanto é válido perceber que as referências ocorrem em múltiplos sentidos, e é razoável, portanto, perceber diálogos no sentido Freyre-Sardinha/ Ação Integralista Brasileira-Integralismo Lusitano/ AIB-Freyre. E, conforme já sublinhado, nada impede de existirem reciprocidades nesses contatos. Logo, tanto a história intelectual, quanto a história dos intelectuais, deve ser vista e analisada de forma descentralizada, no intuito de abranger o maior número de referências e diálogos possíveis e consolidados de forma comprovada.

A obra de pensadores portugueses, espanhóis e brasileiros de corte conservador continua a desafiar os pesquisadores. Talvez estejamos diante de uma outra matriz cultural, ibérica ou espanhola, como postula Richard Morse (1988), em que a racionalidade se combina mais profundamente com os elementos da tradição, em que se promovem integrações autoritárias e em que o mundo não foi totalmente desencantado como no restante do mundo ocidental. Obviamente, não precisamos celebrar essa eventual cultura política ibérica como faz o autor norte-americano em certas passagens. Antes, o tema requer mais questionamento, tempo e investimento em pesquisa e reflexão teórica para compreender essa experiência histórica que se parece mais profunda e fugidia quanto mais nos aproximamos dela.

Agradecimentos

Esse artigo resulta de duas pesquisas desenvolvidas pelos autores: 1) ”História intelectual em perspectiva conectada: as relações entre Brasil e Portugal na primeira metade do século XX” e 2) “Os intelectuais e a nação: uma análise da trajetória e pensamento de António Sérgio, Gilberto Freyre e Mário Soares”, projeto financiado pela FAPEMIG, a quem agradecemos o apoio financeiro.

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Notas

* Esse artigo resulta de duas pesquisas desenvolvidas pelos autores: 1) ”História intelectual em perspectiva conectada: as relações entre Brasil e Portugal na primeira metade do século XX” e 2) “Os intelectuais e a nação: uma análise da trajetória e pensamento de António Sérgio, Gilberto Freyre e Mário Soares”, projeto financiado pela FAPEMIG, a quem agradecemos o apoio financeiro.
1 Na segunda metade do século XIX, Portugal percebeu o fracasso do projeto do Mapa-Cor-de-Rosa na África, por ir contra os interesses inscritos no imperialismo inglês. Tal projeto era nutrido pelos anseios militares e mercantis de Portugal em relação aos territórios situados no centro-sul africano. No intuito de alcançar as costas Leste e Oeste da África, formando um cinturão com as possessões territoriais adquiridas, a metrópole portuguesa buscava acesso aos oceanos Atlântico e Índico. No entanto, tais aspirações chocavam-se com os anseios imperialistas ingleses, mote gerador do Ultimatum britânico. Este capítulo das relações entre as Coroas monárquicas de Portugal e Inglaterra provocou cicatrizes profundas na legitimidade real lusitana. Ao trazer à tona a fragilidade da soberania portuguesa, o Ultimatum acirrou a oposição interna à monarquia, inaugurando o ciclo de instabilidades políticas no país. Ocorridas entre os finais do século XIX e primeiras décadas do XX, estas convulsões político-institucionais culminaram no regicídio de D. Carlos I, em 1908. (cf.: CAZETTA, 2016, p. 41-42; VRBATA, 2006, p. 29). A Espanha, por sua vez, assistiu ao desmembramento das últimas possessões territoriais (Cuba, Porto Rico e Filipinas), conquistadas no período em que fora uma potência colonial, em vista das lutas de independência apoiadas pelos EUA. A perda destes territórios além-mar desencadeou a angústia e o estado de decadência em que o país se encontrava. O “Desastre”, como foi chamada a perda das colônias, foi a marca que caracterizou o surgimento da “geração de 1898”, da qual intelectuais como Ganivet e Ortega y Gasset fizeram parte (CAPELATO, 2003, p. 37-38).
2 Nesta, foi tratada a Questão Ibérica, ou seja, sobre os riscos a que Portugal estava submetido, pelo imperialismo espanhol. Apesar de haver distinções sobre os assuntos e áreas exploradas, as conclusões caminharam para o alerta da possível anexação de Portugal. Os palestrantes foram: António Sardinha (“Território e Raça”, em 7 de abril de 1915), Hipólito Raposo (“A Lingua e a Arte”, em 21 de abril de 1915); Luis de Freitas Branco (“Música e Intrumentos”, em 5 de maio de 1915); José Pequito Rebello (“Aspectos Economicos”); Ruy Ennes Ulrich (“Colonizações Ibéricas”); Vasco de Carvalho (“Aspectos Político-Militares”); Xavier Cordeiro (“Direito e Instituições”); Luis de Almeida Braga (“Lição dos Factos”). Nem todos tiveram oportunidade de apresentar suas palestras, em função do regresso do Partido Democrático ao poder, porém, os artigos foram publicados. Cf.: A Questão Ibérica (1916); Martins (2010).
3 A lei é de 1930. Aqui utilizamos a publicação de 1933.

Autor notes

** Professor da Universidade Estadual de Montes Claros. Doutor em História Social pela Universidade Federal Fluminense. E-mail: felipecazetta@yahoo.com.br. http://orcid.org/0000-0002-2110-7531
*** Professor da Universidade Estadual de Montes Claros. Doutor em História pela Universidade de São Paulo. E-mail: mekie1@hotmail.com. https://orcid.org/0000-0003-1318-1798

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