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A Universidade deveestar ligada, exclusivamente, à autoridade da verdade
Leonardo Agostini Fernandes
Leonardo Agostini Fernandes
A Universidade deveestar ligada, exclusivamente, à autoridade da verdade
La Universidad debe estar vinculada exclusivamente a laautoridad de la verdad
TheUniversity should be linked exclusively to theauthority of truth
Franciscanum. Revista de las ciencias del espíritu, vol. LVIII, núm. 165, pp. 339-380, 2016
Universidad de San Buenaventura
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Resumo: O presente artigo de reflexão baseia-se na alocução que o Papa Bento XVI faria por ocasião da abertura do ano acadêmico na Universidade Sapienza de Roma. Nesta, o Pontífice disse que, por sua natureza, a Universidade deve estar ligada, exclusivamente, à autoridade da verdade. Esta é o maior anseio do ser humano, porque quer conhecer não somente a teoria (homo theoreticus), mas quer a verdade como base e suporte para conhecer e praticar o bem (homo ethicus). Aí está o que aproxima e fundamenta a relação entre teoriae práxis; entre conhecimento e comportamento. Tal relação ajuda a perceber e a compreender a célebre frase de Jesus Cristo: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará (Jo 8,32). Este artigo, partindo da alocução que seria pronunciada pelo Santo Padre, apresentará e discutirá alguns elementos que fazem parte da natureza e da missão da Universidade na busca e na promoção da verdade que liberta o ser humano.

Palavras-chave:BíbliaBíblia,conhecimentoconhecimento,éticaética,universidadeuniversidade,verdadeverdade.

Resumen: El presente artículo de reflexión se basa en la alocución que el Papa Benedicto XVI haría en la inauguración del año académico en la Universidad Sapienza de Roma. En esta, el Pontífice dice que, por su naturaleza, la Universidad debe estar vinculada exclusivamente a la autoridad de la verdad. Este es el mayor deseo del ser humano, porque él quiere conocer no solo la teoría (homo theoreticus), sino la verdad como base y soporte para conocer y practicar el bien (homo Ethicus). Esto es lo que acerca y fundamenta la relación entre teoría y praxis; entre conocimiento y comportamiento. Esta relación ayuda a percibir y a comprender la célebre frase de Jesucristo: Conoceréis la verdad y la verdad os hará libres (Jn 8, 32). Este artículo, partiendo de la alocución que iba a ser pronunciada por el Santo Padre, presentará y discutirá algunos de los elementos que hacen parte de la naturaleza y de la misión de la Universidad en la búsqueda y promoción de la verdad que liberta al ser humano.

Palabras clave: Biblia, conocimiento, ética, universidad, verdad.

Abstract: This reflection paper is based in the speech that Pope Benedict XVI would do, at the opening of the academic year in the University Sapienza of Rome. In this speech, he says that the University must be directly linked only to the authority of the truth. This is the greatest desire of the human being, because he wants to know, not only the theory (homo theoreticus), but he wants the truth as a foundation and support to learn and practice the good (homo ethicus). This is what approaches and justifies the relationship between theory and praxis; between knowledge and behavior. This relationship helps to perceive and understand a famous phrase of Jesus Christ: you will come to know the truth, and the truth shall set you free (John 8, 32). This paper, starting from the speech that would be pronounced by Holy Father, will present and discuss some elements that are part of the nature and mission of the University in the pursuit and promotion of the truth that releases the human being.

Keywords: Bible, knowledge, ethical, university, truth.

Carátula del artículo

A Universidade deveestar ligada, exclusivamente, à autoridade da verdade

La Universidad debe estar vinculada exclusivamente a laautoridad de la verdad

TheUniversity should be linked exclusively to theauthority of truth

Leonardo Agostini Fernandes
Universidade Católica do Rio de Janeiro, Brasil
Franciscanum. Revista de las ciencias del espíritu, vol. LVIII, núm. 165, pp. 339-380, 2016
Universidad de San Buenaventura

Recepção: 27 Maio 2015

Aprovação: 06 Julho 2015

Introdução

A alocução, que o Papa Bento XVI pronunciaria na UniversidadeSapienza de Roma (desse momento em diante usa-se a sigla usr), deveriater acontecido no dia 17 de janeiro de 2008, por ocasião da abertura do ano acadêmico 2008-2009. Entretanto, na tarde do dia 15 de janeiro de 2008, a Secretaria de Estado do Vaticano anunciou que a visita do Papa estava cancelada. Este cancelamento deveu-se, lamentavelmente, a um movimento de reação à pessoa do Papa e à Igreja Católica por parte de um grupo de aproximadamente 70 docentes, sobre um total de 4500, e de algumas dezenas de alunos, sobre umtotal de 135 mil alunos.

Tal fato provocou uma repercussão no mundo inteiro e as opiniões,de apoio ou de repulsa, se espalharam rapidamente. Assistiu-se, infelizmente, como o fechamento de poucos se sobrepôs à aberturae ao interesse de muitos. Revelou-se que na usr, que se define laica, existem também adeptos da ideologia favorável à intolerância, que fere a democracia, fomenta a prática da miopia intelectual, ofusca a mente e obscurece a razoabilidade à qual osacadêmicos estão chamados a ter, desenvolvere praticar.

Diga-se, logo de início, que o Papa não se ofereceu para proferir a aula magna, mas se dispôs a faze-la,aceitando o convite feito por Ruggero Guarini, Reitor da usr. Tal convitefora acolhido com grande alegria,visto que o Papa já tivera a oportunidade de se fazer presente no discurso de Regensburg1, na Alemanha, bem noinício do seu pontificado2. Nesta ocasião, o Papa acolhera o convite, comoacadêmico e como uma oportunidade, para falar e refletir com docentes e discentessobre a fé, a razão e a Universidade notocante à violência e à intolerância praticadas em âmbito religioso.

EmRegensburg, o Papa Bento XVI, com alegria, lembrou dos anos em que fizera partedo seu corpo docente e na sua reflexão colheu a oportunidade de mostrar que a Universidade é, sem dúvida, um espaço privilegiado, no qual a razão humana pode, devidamente,se interrogar não apenas sobre as realidades imanentes, mastambém sobre as realidades transcendentes, como a fé em Deus,o seu modo próprio de existir e de se revelar, na história, ao serhumano como o Amor que vence o ódio e as divisões3.

Contudo, um forte estímulo aconteceu com o cancelamento da visita à usr, pois originou, por assim dizer, a Fundação Vaticana Joseph Ratzinger - Bento XVI. Esta foi erigida no dia 01 de março de 2010, com a finalidade de promover o conhecimento e o estudo da teologia, organizar e desenvolver congressos de alto valor cultural e científico, e premiar estudiosos que se distinguissem por méritosparticulares na atividade de publicação e/ou na pesquisa científica4

Parafraseando Santo Ambrósio5 e aplicando à referida aula magna que não aconteceu na usr, poder-se-ia dizer: Ó felix culpa que nos deu tão grande ocasião para, pela promoção do diálogo entre fé e razão, fazer com que acadêmicos de boa vontade passem a se encontrar com certa frequência e juntos busquem a verdade mais íntima e profunda sobre o ser humano, sobre o sentido da vida e sobre Deus.

O conteúdodessa alocução não está disposto em partes, nem se desenvolve em tópicos ousubtópicos, mas está escrita em doze parágrafosdevidamente concatenados, seguindo umalógica metodológica muito pertinente: proposição – refutação – síntese. Tal conteúdo evolui em função do objetivo que o Papa Bento XVI desejou elucidar para os acadêmicos: mostrar em que sentido a Universidade,por sua natureza, está ligada, exclusivamente, à autoridade da verdade. Esta afirmação encontra-se no segundo parágrafo, no qual o Papa reconhece que é bom para aUniversidade poder exercer, de formalivre, o seu papel, isto é, sem pressão ouconstrangimentos6. É comoo Papa afirma: «Na sua liberdade dasautoridades políticas e eclesiásticas, a Universidade encontra a sua funçãoparticular, própria também para a sociedade moderna, que necessita de umainstituição desse modo»7.

A referida alocução parte de uma pergunta: Que coisa o Papapode e deve dizer no encontro com a Universidade da sua cidade? Esta se desdobra em outras duas questões: Qual é a natureza e amissão do papado? Qual é a natureza e a missão da Universidade? No fundo, em torno dessas questões, está o ponto de partida para que aconteça qualquer reflexão sobre alguém ou alguma coisa: abusca da verdade e como ser seu sinal no mundo.Parte-se da indagação sobre a identidade e a missão do sujeito e do objeto em foco, a fimde chegar a conclusões que sejam razoáveis e capazes de fazer refletir as partes interlocutoras. Nesse caso, o Papa e osacadêmicos da usr.

O presente artigo, partindo dessa alocução,apresentará e discutirá alguns dos seus argumentos e dos elementos que oPapa Bento XVI identifica como parte da natureza e da missão do Papa eda Universidade na busca e na promoção da verdade que liberta o ser humano. Dedica-se um espaço maior para a questão sobre a verdade e sobre o papel daUniversidade na qual, docentes e discentes, são chamados a se conformar à verdade. Enfim, faço uma proposta quanto à religação dossaberes e o papel da teologia.

1. Quem é o Papa e quala sua missão?

Bento XVI, inicialmente,«se apresenta», isto é, explica o que significa ser Papa, para, então, explicitar o seu papel na Igreja e nasociedade8. O argumento usado é denatureza filológica, evocando o sentidobíblico-catequético do termo episkopos:aquele que observa a realidade de um ponto de vista elevado para conduzir a comunidadecristã no caminho do bem, da justiça e da verdade9.

O epíscopo(bispo) é um pastor que tem o cuidado de conservar a comunidade dos fiéis unida e sobre o caminho que conduz a Deus.Esse caminho é Jesus Cristo, que se definiu «verdade e vida» (cf. Jo 14,6). A comunidade dos fiéis, porém, não vive isolada, mas inseridae atuante no mundo sem, contudo, ser do mundo (cf.Jo 15,19). Porisso, o Papa, por ser bispode Roma e presidir a Igreja Católica na caridade,reconhece que é um formador de opinião, pois as suas palavras repercutem,através dela, in toto orbe terrarum. Atento aomundo, à sua história e às mudanças, que nele ocorrem, a voz do Papa se torna uma voz da razão ética da humanidade e para a humanidade.

Nesse sentido, surgiria uma possível refutação: O que o Papa teria a dizer,como homem de fé, representante e condutor de pessoas de fé, possui validade para quem não professa a fé, mas segue, apenas, os critérios da razão que, porsua vez, influenciam, igualmente, no comportamento ético das demais pessoas apartir do saber que é produzido, ensinado e propagado através da Universidade?

Para responder a essa questão, outra se impõe: Que é a razão? Para os que têm fé, ela é um dom do Criador à sua sublime e amada criatura: o ser humano. É, igualmente, uma graça que torna o ser humano distinto e superior às demais criaturas. É uma aptidão que permite o ser humano adentrar e perscrutar a realidade de forma inteligível, a fim de conhece-la e dela extrair, com discernimento, o que é certo e o que é errado para a vida pessoal e social. Por esse dom, o ser humano trilha um caminho, encontra e se confronta com a verdade sobre si, sobre o próximo, sobre as demais criaturas e indaga sobre o que o circunda, elevando-se na indagação sobre Deus, o seu modo de ser, de existir e de agir. A definição da razão, como capacidade humana distintiva entre os demais seres vivos, é partilhada por qualquer ciência natural10.

Assim, quem sustentar que não há razoabilidade nos argumentos da fé deverá demonstrar,também pela razão, que não existerazoabilidade nos argumentos de quem sustenta a fé e os seus argumentos. Em outras palavras, deverá demonstrar a contradição da razoabilidade da fé e dos seusargumentos. Não se pode negar que na expressão e nosconteúdos da fé, presente nas grandes tradições religiosas, reside uma sabedoria queproduziu um patrimôniohistórico que, fortemente, influiu e se tornou relevante para toda a humanidade11. Não se pode negar, igualmente, que as Universidades históricas surgiram marcadas, profundamente, pela presença docristianismo e pela contribuição racional que a fé cristã trouxe sobreo ser humano e sobre o sentido da vida.

A IgrejaCatólica, ao longo de quase dois milênios, herdou, elaborou, aperfeiçoou,conservou e propagou um conhecimento sapiencial judaico e greco-romano que fundamenta e representa uma razãoética, política e social na história da civilizaçãoocidental12. Este conhecimento, igualmente, imprimiu e propagou, no mundo,uma consciência moral. Assim, a fé professada pela Igreja Católicaé um conhecimento racional que não se escusa diante das crises e interrogações que lhe são suscitadas, principalmente diante da atualrealidade fragmentada, que sorrateiramente vai tomando conta davida e da missão das Universidades.

Por isso, o Papa, enquanto representante de umacomunidade religiosa, que possui e produz argumentos válidos e razoáveis, e quebusca se comportar de acordo com os ditames da razão, não se sente constrangido, mas pode se fazer presente e discursar, com liberdade, em uma Universidade que seprofessa laica.

2. Que é a Universidade?13

A resposta exigeum percurso e a consideração de que todo ser humano que vem ao mundo está dotado, segundo diferentes níveis, decapacidades sensitivas, intelectivas evolitivas. Por meio destas capacidades, ele entra em contatocom a realidade que o circunda, deixa-se afetar por ela e a perscruta com interesse, pois quer conhece-la em profundidade, a fim de obter a verdadeque reside em si e em cada coisa. Neste sentido, é próprio do ser humano inquietar-se diante darealidade e fazer dela o objeto desua atenção, de seu interesse e do seu estudo. Assim, a Universidadetorna-se um meio excelente para o ser humano desenvolver suas aptidões e, por elas, adentrar na realidade compropriedade de causa, isto é, com ciência e consciência doque está fazendo.

O ser humano,graças às suas capacidadesnaturais e aos aprimoramentos técnico-científicos, que estão sempre em evolução, percebe que tem em si a possibilidade de crescer oude decrescer, de se realizar ou de se frustrar, isto é, de se humanizar ou se desumanizar. Este dilema é uma crise positiva, pois ajuda o ser humano a reconhecer, a manter e a sempre promover a sua dignidade enquanto ser racional capaz de lutar contra a corrupção dos valorese da própria ciência.

A busca pelosentido real de tudo o que existe é algo próprio do ser humano, pois, dentre todas ascriaturas, é o único que pode refletir sobre as coisas e sobre si mesmo. Apenas o ser humano podeindagar, encontrar e oferecer um sentido para as suas ações. É assimque manifesta racionalidade, inteligibilidade e discernimento frente à realidade que tiver diante de sie que desejar investigar. É pelapalavra, isto é, pelo Logos, que o ser humano afirma a realidade einterpreta o que acontece consigo e à sua volta.

Se numa primeira fase, as realidades, presentes no mundo, foram explicadas pelo ser humano deforma mítica14, na medida, porém, emque passou a adquirir um maior domínio sobre a realidade pelo conhecimentoracional (filosofia), ele foi se libertando de antigas concepções e, pouco apouco, começou a dar, pela lógica da razão e pela razão da lógica, um novo e maisaprimorado sentido para a realidade circunstante, para si mesmo e para as suasinquietações. Este verdadeiro progresso, porém, não significou abandono, renúncia ou negaçãoda sua dimensão religiosa15.

Sócrates(470-399 a.C.), que inaugura um novo períodona história da filosofia grega, indagou sobre aexistência de todas as coisas deforma racional e, nem por isso, deixou de lado a sua religiosidade, pois nelasencontrava a presença divina. Pode-se dizer que, com Sócrates, a filosofia deunovo alento religioso ao ser humano e permitiu-lhe conquistar uma grande vitória sobre o mito e o sofismo16. Pelo exercícioacadêmico e pelos seus escritos, Platão17, discípulo de Sócrates, procurou evidenciar o caminhoque leva ao progresso do pensamento: uma via de mão dupla, do ser humanona direção de Deus e este na direção do ser humano (é o princípio da duplanavegação)18.

A evolução do ser humano e do seu conhecimento sobre a realidade passou a exigir que, cada vez mais, as suas conclusões sobre a natureza, sobresi mesmo e sobre o seu papel no mundo sejamfundamentadas com critérios e argumentos válidos e razoáveis19.Conjuga-se identidadee missão do ser humano na busca pelo serdas coisas e seu sentido último. Assim, cada ato realizado por ele está repleto de sentido e tendepara um fim. Pode-se dizerque a assimilaçãodo que é temporal e passageiro provoca a esperança pelo que é eterno. O que é imanentedesponta orientado para o transcendente.

Este percurso de aceitação da plenitude do ser e do agir impedea alienação frente aos resultados obtidos pela ciência e, igualmente,impede que a fé seja descartada pela razão. Seria incoerente admitir aexistência de uma verdade total e sublime, mas sem identidade. Isso decorre deuma certeza: a razão humana sozinha é relativa e inapta para conduzir à verdade plena. Esta exige que o ser humano,a partir e para além de suas capacidades, se abra para o que, no fundo, reside em cada realidade: um mistério, isto é, algo transcendenteque aponta para uma Razão Absoluta.

A fé cristã, nessa argumentação, não compreende a Universidadecomo uma «religião racional» que só pode ser praticada por poucosdoutos e escolhidos que, necessariamente, descartem a fé20. A aceitação de uma Razão criadora permite que o ser humano, pelo seu modo própriode ser e de existir, aceite-a como Razão-Amor que se faz presente emtudo e a nada exclui de ser. Se, por um lado, o cristianismo herdou ariqueza do pensamento bíblico do Antigo Testamento, aprendeu tambéma se posicionar com abertura para o pensamento grego.

Desse encontro, gerou-se um diálogocultural, plural e universal, algo que já havia sido iniciado pelos judeus da diáspora egípcia21. Percebe-se, nessediálogo, o esforço em se demonstrar que a razãohumana, quanto mais aberta estiver à verdadeda realidade e à realidade da verdade, estará aberta ao Ser absoluto e ao conhecimento que advém da Revelação. Esse esforço, dentro do cristianismo, teve início com o período Patrístico, muito ligado ao neoplatonismo, e prosseguiu ao longo da Idade Média. Contudo, com o reingresso do aristotelismo na Europa, permitiu à escolástica não apenas aprofundar os campos do saber, mas mudar o paradigmado pensamento filosófico-teológico22.

Assim nasceu a Universidade, dentro de um contexto de grandeabertura e redescoberta do espaço intelectual e do espaço da fé, pelos quais a busca e apreensão da verdade relativa de todas as coisas eramorientadas para a Verdade Absoluta23. Disse «eram», porque com o cartesianismo ocorreu uma nova mudança de paradigma. Esse tópico será tratado mais adiante.

O que define uma Universidade não é a repetição de experimentos pelo domínio e conhecimento de métodos científicos. Uma Universidade se define pela promoção do respeito e da integralidade do ser humano, das suasdimensões e dos seus potenciais na sua busca, pelo saber, da verdade que liberta de todas as formas de preconceitos e de intolerâncias. A Universidade é o local da aberturae expansão da razão, no qual o ser humano aprende a dialogarcom realidade em sua pluralidade, sem exclusão do que, além doseu alcance, se pode admitir pela fé. Porque a Razão criadora é aRazão-Amor, a espiritualidade não é compatível apenas com a fé,mas principalmente com a razão24. Numa autêntica Universidade, a razão e a fé não são ações humanas rivais, mas potencialidades que se complementam, pois são «as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade»25.

3. Mas, que é a verdade?

Esta pergunta inquietou e tomou conta dos «amantes da sabedoria», isto é, dos filósofos quefizeram da verdade o motivo e o objetivo de todas as suas especulações e a razão do seu viver. A busca pela ἀλήθεια (de ἀληθής que significa não dissimular e não estar oculto) caracterizou o ser humano em confronto com a realidade eanimou o pensamento grego26.

Aἀλήθεια foi concebida: a) como a correspondência entre uma ideia(uma proposição que a expressa) e a coisa à qual se refere; b) como o quecaracteriza cada coisa em sua essência, mas que, para alcançá-la, precisaadentrar na aparência de cada coisa; c) como o caráter próprio das ideias, que possuem validade em si mesmas,independentemente da sua relação com as coisas (por exemplo, as ideias matemáticas). A verdade tornou-se, também, uma doutrina queo ser humano deve conhecer, aprender, apreender e que deve se tornar a sua normade conduta e vida para que possa se realizar em plenitude. Por conseguinte, a verdade pode também ser atribuída às afirmações formuladasenquanto essas coincidem com o Logospresente em todas as coisas.

A questão sobre a verdade é uma indagação que se desdobra em três perguntas: Na realidade existe uma identidade estável? Se existe, esta pode ser individuada? E a razão humana consegue definir, com certeza e clareza, a realidade?Assim, a verdade é uma questão de identidade e de identificação que diz respeitotanto ao objeto como ao sujeito do conhecimento.

Nesse sentido, o real problema quanto à verdade para os antigos filósofos residia na relação entre o ser das coisas, a formulação do sabersobre o ser das coisas e o comportamento humano condizente com esse saber27. As implicações que resultam dessa relaçãosão epistemológicas e éticas.

Isso foi umpasso decisivo para a concepção de verdade comoadequação à realidade: veritas est adaequatio rei et intellectus28. Dessaadequação resulta a razão ética do ser humano, queé verdadeiro se o seu comportamento condiz com a verdade conhecida. Na adequação está a virtude,porque, por esta, honra a verdade eaceita que a ciência é verdadeira se conduz ao reto agir, isto é, em conformidade com o bem e a justiça. Naantiguidade, então, o problema da verdade estava colocado em relação ao ser, ao fato, à realidade objetiva, àretidão e à integridade da conduta humana.

No AntigoTestamento, a concepção de verdade encontra-se ligada ao substantivo ’ĕmet, derivado do verbo ’āman, que caracteriza um objeto ou uma pessoa e equivale a ser firme, ser capaz de suportarum peso, ser fiel. Do verbo ’āman deriva «amém»29. Dessa concepção veterotestamentária resulta que: quanto à realidade, não se pensa averdade de forma abstrata, mas realizada em cada realidade. Quanto ao ser humano, a verdade é vista comocomportamento sólido, consistente, íntegro e reto. «Deste modo a fé em Deussurge como um apoiar-se em Deus, mediante o qual ohomem consegue base sólida para a sua vida»30. Deus é verdade porque é fiel e vice-versa; nele não há possibilidade de mudança, pois a fé não podenegar a verdade: «Ter fé em Deus, apoiar-se em Deus,confiar em Deus, significa ganhar fundamento e consistência na vida»31.

A mesma pergunta – Que é a verdade? – tornou-se célebre noslábios de Pôncio Pilatos, durante o interrogatório de Jesus, que sedefiniu como mártir da verdade (cf. Jo 18,37-38)32. Jesus pregoua verdade e não morreu por uma causa, mas pelo reino de Deus,cujo centro é a verdade, porque pela verdade vale a pena morrer33.A verdade de Jesus não faz mal ao ser humano, o liberta e para ele«não se impõe senão por força da própria verdade, que penetra demodo suave e ao mesmo tempo forte nas mentes»34.

Assim confirmou-se, por um lado, a coragem de Jesus e, poroutro lado, a chance que deu a Pilatos, revelando o seu despropósito:«Quem é da verdade escuta minha voz». Em Jesus, a verdade divinatorna-se acessível por meio do seu testemunho-martírio, porque Ele éa auto-manifestação da realidade divina, isto é, da Verdade Absoluta que, por Ele e n’Ele, entra no mundo35. Disso resulta que o sentido último de toda a realidade que existe é a Pessoa Divina Encarnada,Jesus de Nazaré, presença viva do Eterno Deus em cada pessoa eem cada coisa que há no mundo (cf. Jo 1,1-4; Cl 1,15-20). Pode-secitar a resposta de Pedro frente à incompreensão do discurso de Jesussobre o pão da vida: «Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras devida eterna, e nós temos acreditado e reconhecido que tu és o Cristo,o Filho de Deus» (Jo 6,68-69).

A pergunta docético e pragmático Pilatos representava, ao contrário da afirmação crente de Pedro, a concepção grega sobre a verdade, enquanto conhecimento de uma coisa objetiva36. Por isso, ele não se deu conta de que estava diante da possibilidade da verdade se revelar enquanto Pessoa, embora pudesse ter sentido medoquanto à possibilidade de uma divindade estar se manifestando em forma humana (cf. Jo 19,8).

Muitascontemporâneos, como Pilatos, enfrentam a dificuldadepara reconhecer e aderir à verdade, pois ela é exigente com todos os que dela se aproximam37. Por isso, em tantaspessoas e nas instâncias sócio-políticas instaurou-se a covardia diante da verdade. E aausência de bem, que denominamos de mal, «encarnou-se», por assim dizer, em estruturas sociais através depensadores cheios de determinismos e tirânicos, que distorcem e disfarçam a verdade38.

Apesar de tudo, no ser humano, que deseja a verdade, há uma correspondência entre o que impulsiona, o impulso eo impulsionado, porque ele querconhecer e quer a verdade. As pessoas, por sua dignidade, são dotadas de razãoe de livre arbítrio, mas isso não significaque estão preparadas e dispostas para conhecer e aderir à verdade,de modo que a veracidade torne-se o empenho por vivera verdade que liberta. Há um paradoxo: muitos ao conhecerem a verdade, próprio porque é verdade, não querem se unir a ela pela formade viver. Assim, o conhecimento não determina o comportamento.

A razão dissoestá em que todo ser humano é responsável por suas ações e, como tal, está moralmente obrigado, em consciência, a procurar a verdade e a ela se adequar, permitindo que ela oriente a sua vida segundo as suas próprias exigências39. Quem encontra a verdade e a ela se adéqua, descobre que não é autônomo para estabelecer os seus próprios critérios ou para definir o que é certo e o que é errado, o que é bem e o que é mal. Oconhecimento da verdade gera uma ruptura em todos os âmbitos da vida que não estejam conformados a ela. É assim que se nota o drama nas diferentes vertentes da ciência, cuja culpa não é da ciência emsi, mas reside em cada pessoa que se encontra dividida entre a verdade queconhece e o bem que deve fazer, masnão se adéqua a essa verdade e não pratica o bem.

A verdade está presente em tudo que existe e concede existência a tudo que existe, mas sem receber existência de nada que existe. A verdade é acausa não causada que origina a verdade em todas as coisas40. Por estarelação se estabelece o conhecimento de cada coisa que ultrapassa a sua definição meramente teórica, pois passa a exigir, como seu escopo, a busca, oconhecimento do bem, a adesão à verdade e a sua execução.

Para a fé cristã, a verdade coincide, então,com o ato de crer que«significa compreender a existência como resposta àpalavra, ao Logos que sustenta e conserva todas as coisas. Significa dizer sim,isto é, aceitar, o fato de ser-nos oferecido o sentido que não podemos criar,mas apenas receber, de tal modo que nos basta aceitá-lo e confiar-nos a ele»41. O ato de crer, portanto,não é uma ação cega, mas uma exigência profundamente racional de quem vê a realidadecom os olhos abertos.

O melhorexemplo de execução da verdade, que mudou o curso da história da humanidade,aconteceu em Maria42. Ao receber o anúncio da encarnação, aderindo ao plano divino, Maria fez a razãoda verdade e a verdade da razão agirem em sua vida: «Eis aqui a servado Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1,38) e Verbum veritatis factum est (cf. Jo 1,18). O sim de Maria atesta e demonstra que o ser humanoé imagem e semelhança de Deus quando faz uso da fé eda razão em plena sintonia com o Logos Criador43.

A aceitação do Logos pelo cristianismo foi uma basesólida para viabilizar o progresso doseu pensamento sobre a Verdade Encarnada em Jesus de Nazaré (cf. Jo17,17) e para não se tornar uma religiãoexotérica, gnósticae ausente do mundo.Deu-se o primado do Logos sobre o mito que,no fundo, favoreceu a experiência mística e salvífica44. Assim, crer em Deus éoptar pelo Logos Eterno, origem de toda arealidade, razão que imprimeverdade em tudo que existe, enquanto mediação que dá acesso aDeus. Renunciar a essa fé provocadanos imensos tanto para a ciência como para a religião.

«Entre o dizere o fazer, o mar está no meio». É umditado italiano que permite afirmar que muitos dizem e querem dizer a verdade,mas não conseguem porque não fazem a verdade. Esta inconsistência encontra-se na origem da dicotomia entre fé e razão. É o problema que o cristianismoenfrentou, em muitas das suas esferas, ao longo dos séculos e, em particular,na Modernidade, na Pós-modernidade e, principalmente, nessa mudança de épocaque não possui características claras que permitam defini-la e abarcá-la com teorias. se desenvolve, sem que já possamos ter uma visão geral da sua orientação, do que dele resultará»45.

O ser humano descobre que existe no íntimo da sua consciência uma lei imutável: «faze o bem, evita o mal». Esta lei, ele não a deu a si mesmo. É um imperativo ético que lhe confere sentido e dignidade.Por esta lei, cada ser humano serájulgado. «Se não temos respeito pela distinção entre verdadeiro e falso, podemos desde já nos despedirde nossa tão glorificada ‘racionalidade»46.

No mundohodierno, consegue-se dizer a verdade, mas não se consegue fazer a verdade, isto é, não se está conseguindo testemunhara verdade pela vida e pelas obras com a mesma convicção que os mártirese os santos fizeram no seu total e pleno seguimento de Jesus Cristo.

Por isso, a busca daverdade e a adequação a ela podem unir os seres humanos de todos os credos,de todas as ciências e os partidários de todo reto pensar. Quando a verdade é investigada e alcançada, vence-se aignorância e a reta consciência prevalece, o reto comportamento torna-se conforme as normas objetivas da moralidade e se superam os maus hábitos que cegam a consciência e maculam as ações47. Tudo com a verdade, nada sem a verdade e tudo pela verdade; não é uma utopia, mas é o sentido da vida de quem, em uma Universidade, busca o sentido último da realidade que percebe em si e à sua volta.

Então, é como afirma Bento XVI na alocução: «A verdade torna- nos bons e a bondade é verdadeira:este é o otimismo que vive a fé cristã, porque a ela foi concedida a visão do Logos, da Razão criadora que, na encarnação de Deus, se revelou como o Bem, como a própriaBondade»48.

Esta afirmação encontra uma forte fundamentação em Jo 1,1-3:«No princípio era o Logos e o Logos estava com Deus e o Logos eraDeus. No princípio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meiodele e sem ele nada foi feito». Na acepção de São João, «Logos significa conjuntamente razão e palavra – uma razão que é criadorae capaz de se comunicar, mas, precisamente, en quanto razão»49. Esta percepção também foi aceita por São Paulo que, em Cl 1,15-17,afirma: «Ele é a Imagem do Deus invisível, o Primogênito de toda criatura, porque nele foram criadas todas as coisas, nos céus e naterra, as visíveis e as invisíveis: Tronos, Soberanias, Principados,Autoridades; tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de tudoe tudo nele subsiste».

Assim, sobrea verdade, na relação entre conhecimentoe comportamento, tem-se o encontro entre a teoriae a praxis, peloqual surge o axioma filosófico-ético, oagir segue o ser, que, porsua vez, «gera» o axioma teológico-moral: oconhecimento da verdade determina o comportamento conforme a verdade. Este axioma ajudaa interpretar a célebre frase de Jesus que gerou uma controvérsia quanto àliberdade: Conhecereis a verdade e averdade vos libertará (Jo 8,32).

Portanto, o saber encontrado, produzido e desenvolvido em uma Universidade,exige e possui consequências éticas. É possível saberpor saber, masisso não deveria ser tolerável, visto que todo saber verdadeiro exige, por suavez, um comportamento verdadeiro que faz o ser humano viver, sobreviver e conviver como homosapiens e homo éthos.

Se há uma crise ética em todosos âmbitos da sociedade secularizadaé porque existeuma crise quanto à busca do conhecimento e o consequente exercício da verdade no que se pensa, no que se fala, no que se escreve e no que se ensina. Essa crise se instala quando se instalam os interesses particulares em detrimentodo bem comum50. Quando a verdade fica ausente ou é manipuladano debate público, acadêmico e até eclesiástico, perde-se a razão,isto é, a razoabilidade do discurso e com ela esvazia-se a razão ética.Tudo passa a ser lícito e os meios espúrios tornam espúrios «finssublimes». A razão fica, então, escravizada pelo seu distanciamento da verdade que liberta.

3.1. A verdade e a Universidade

No passado,várias profissões, foram transmitidas de pai para filho e de mãe para filha, em uma cultura agrícola, pastoril ou artesã, comunicando uma verdadeira herança humana de valores. Do saber rudimentar e básico, simples e suficiente para se viver, passou-se para o saber aprimorado e científico. Contudo, com o advento da revolução industrial e com o avanço doprogresso e das novas tecnologias, os conhecimentos passaram a ser exigidos emum nível mais técnico e superior, adequadosàs várias mudanças sociais.

A academia universitária, originada na Idade Média, ganhou um forte e novo impulso. Filosofia e Teologia eram os dois grandes pilares dasUniversidades que nasciam na Europa junto às escolasdas Catedrais51. Duas ciências que,conservando o que é próprio de cada uma,caminhavam na mesmadireção: a busca, o encontro e a promoção da verdade pela razãoe pela fé. A verdade da teologia e da filosofiaestava, nas Universidades, umadimensionada para a outra, como a alma estápara o corpo.

Um olhar atento para o percurso e desenvolvimento do pensamento humano, tanto na Filosofia como na Teologia,permite perceber que elas se relacionam «sem confusão e sem separação»52. Por isso,elas não podem se desligar uma da outra sem gravesprejuízos. Santo Tomás de Aquino foium ponto de intercessão e de equilíbrio entre Filosofia e Teologia. Ele soube imprimir nocristianismo acadêmico medieval a abertura e o diálogoentre os saberes53. Algo que urge nos dias atuais e que seja capaz de fazer, novamente, a religação («religião») dos saberes54.

Por um lado, a Filosofia e a Teologia possuem identidade própria, maspossuem também metodologia e campo específicos. Por outro lado, razão e fé interagem sem criar confusão quando, com liberdade e responsabilidade, o sujeito queconhece respeita o objeto doconhecimento, permitindo que seja este a determinar o método com o qual deve ser abordado. Nestainteração, o saber filosófico não exime o saber teológico, assim como a razãonão substitui a fé, pois a verdade é a fonte inesgotável dessas duas áreas do saber.

Se a história do pensamento é a base para a Filosofia, a históriada Revelação é a base para a Teologia. Para as duas a história humanaé o húmus sobre o qual o saber é semeado e se desenvolve. Ambas se tornarammais do que saberes interdisciplinares; foram, de fato, uma para a outra um contínuo e recíproco alimento. Não é porquemuitos dos conteúdos da Teologia continuaminacessíveis à razão, que a Filosofia e as Ciências não devam considerar comoválidos os critérios e os argumentos do conhecimento que provêm da Revelação, poisa fé ajuda a purificar a razão e a razão não permite que a fé se perca nosfundamentalismos55.

Namodernidade, deu-se o processo da racionalização através do cartesiano que foipromovido pelo Iluminismo e se instaurou na academia adicotomia entre Filosofia e Teologia, entrefé e ciência, entre imanência e transcendência. Com isso, aconteceu umamudança de paradigma filosófico que mudou a visão do ser humano e a verdade passou a ser cada vezmais relativizada56. A pura razão limitada às ciências naturais não consegue emitir respostas para asprofundas questões existenciais do ser humano: De onde eu vim? Para onde eu vou? Quem sou eu? Que eudevo fazer? Que eu devo esperar? Por que razão eu vim à existência? Por que a dor e a morte?57.

De formajusta, porém, a Modernidade colocou novos questionamentoscom base nos critérios que poderiam definir comoverdadeira uma ideia e um pensamento sobre uma coisa que possui formas atuais, potenciais evirtuais. Para imprimir umareferência atendível à realidade, a experiência e arepetição metodológica passaram a ser os válidos procedimentos utilizados paraaferir os graus de certeza sobre os objetos estudados. Somente o que pode sercontrolado de forma cientifica pode ser qualificado comoverdadeiro e as conclusões obtidas como verdade. Isso, porém, não é suficientepara desqualificar a racionalidade da fé cristã.

Odesejo de que a razão humana fosse o critério definitivo do saber científico e da determinação do que é ou não verdade, fez comque a dicotomia se instalasse nas academias e as conexões, antes evidentes,começaram a se desfazer, causandoenormes prejuízos tanto para a razão, que não é capaz de alcançar o sentido último darealidade, como para a fé, que precisa da razão para se livrar dosfundamentalismos, pois ela não é uma entrega cega à verdade58.

A crise da modernidade e dos seus mitos de progresso tornou-se, essencialmente, a crise darazão59 que presenciou adesumanização causada pelas duas Grandes Guerras, pela ambição do poder e pelacorrida armamentista que se instaurou durante os anos da guerra fria.

A exploração e o domínio na história levaram arazão, centro profícuo do ser humano e de seu orgulho, à escravidão de regraspolíticas totalitárias, militares e econômicas que passaram a vigorar tanto no sistema capitalistacomo comunista.

O poder deixoude estar a serviço da razão para que a razão ficasse a serviço do poder e desuas ideologias. Assim, a razão nãoatende mais às necessidades das pessoas, não se promove a liberdade, a justiçae o bem. O sonho de felicidade foi ficando cada vez mais distante60. A «verdade» que passou a ditar as regras tornou- se um sistema que olha somentepara o mercado ávido de lucro e de poder, gerandoo consumo a partir do que se poderia chamar de novo axioma: «eu quero, eu possoe, se não posso, eu articulo para possuir»... até em nome de Deus.

É o que o Papa Bento XVI afirma na alocução: «Se a razão, porém,solícita da sua pretensa pureza, fica surda à grande mensagem quelhe chega pela fé cristã e da sua sabedoria, murcha como uma árvore cujas raízes não alcançam mais as águas que lhe dão vida. Perde acoragem pela verdade e assim não cresce, mas diminui»61.

As dimensões eas fronteiras do saber foram ampliadas com as novas possibilidades que surgiram com o advento e a força dos tempos modernos. Com isso, cresceu «aconsciência e o reconhecimento dos direitos e da dignidade do homem»62, mas, nem por isso, ficou afastado e excluído o perigo da humanidade cair em grande desgraça e decadência. «No centro da discussão do problema da verdadeestá a problemática da vida humana e por isso a questão ganha sentido ético»63.

Se o saber científico e religioso não estiver a serviçoda promoção humana e da suadignidade, e se for usado em função deinteresses espúrios e utilitários, a verdade descoberta ficará instrumentalizada, confinada e não se ocupará mais com obem comum. Se isso acontece em uma Universidade é uma perversidade covarde que, longe de preparar as futuras gerações para a contínua busca da verdade, induzirá, sempre mais, ao erro e àfalta de ética nas relações interpessoais e na pesquisa.

A verdade éamiga do homem, mas nem por isso dispensa de ser tratada de forma séria; antes,exige a seriedade para que certascoisas sejam ditas, sem medo de que retaliaçõesfísicas e morais aconteçam.

Em muitos ambientes acadêmicos, porém, a lei do taliãocontinua a fazer-se presente, a autoridade não vem mais da verdade, mas se esconde na tirania dosque disputam quem retalha mais e busca lograr atenções e fundos econômicos aseu favor.

Em contrapartida, instaura-se na Universidade a liberdade acadêmica de docentes e de sérios pesquisadores, quando a verdade é a sua regra e a ética o seugalardão. Só a busca e a promoção daverdade tornam a Universidade imune do erro, garantem a sua liberdade investigativa e não permite que docentes e discentessejam tratados como consumidores ou escravos de um saber instrumentalizado64.

A globalização tem implicações especiais paraas instituições ligadas à Igreja; a sua missão, universal e espiritual, entra muitas vezes em conflitocom as forças do mercado global. Isso se torna perceptível narelação cada vez mais estreita entre ensino e prosperidade econômica, na pas-sagem de uma sabedoria intrinsecamente valiosa para uma informaçãoorientada para o proveito material; na ênfase dada à formação técnica e profissional, em detrimento da formação global da pessoa; na substituição de uma cultura humanista pela cultura da informação, que tende a limitara sensibilidade social do ensino superior à sensibilidade do mercado65.

As questões mais relevantes dizem respeito à aplicação do axioma acima formulado: o conhecimento daverdade determina o comportamento conforme a verdade. Se,por um lado, na Universidade as disciplinas humanas têm a liberdade para usar seus princípios e seus métodos, por outro lado, essa mesma liberdade sóacontece quando se preserva a dignidade da pessoa humana e a sua ordem moral. É um fato: semliberdade não há responsabilidade e, por conseguinte, não existe razão ética e muito menos bioética66.

A verdade a serperscrutada e obtida nos resultados não licita, ao mundo acadêmico, a utilização de meios espúrios e ambíguos em suas pesquisas. Por isso, cada docentepesquisador deverá estar atentopara não negligenciar a verdade que procura e nem colocar a técnica acima da ética ou o desejo da descoberta e doslucros acima da pessoa humana e da sua dignidade. Aexcelência de uma Universidade não é medida, somente, pelas conquistas e pelosprêmios recebidos, mas em particular pelas ações sociais que promove dentro efora dos seus espaços acadêmicos67.

3.2. O papelda Universidade

Do ponto devista antropológico, todo ser humano busca a sua própriarealização e, no contexto familiar e social, vê surgir as exigências, os ideais e as inclinações pessoais que levam cada pessoaa se interessar por uma profissão. O discernimento é necessário e deve ser feito, a fim de ajudar o jovem a descobrir se a profissão escolhida é fruto de uma orientação vocacional, modismo, ou simples impulso.As razões e as motivações da escolha por uma profissão devem ser avaliadas comcritério, seriedade e honestidade. O guia e a metadevem ser a verdade.

Quando avocação precede a profissão ou a profissão escolhida é vocação, pode existirrealização plena. Assim, o discernimento ajudaráa enfrentar asdificuldades próprias de cada profissão, perseguindo os ideais, mesmo quando parecem distantes e até pouco rentáveis. O drama para muitaspessoas é: não se faz o que realiza,mas busca-se o que é bem pago. Por isso, há pessoas que até passarama ganhar muito com os cursos que fizeram, mas estão frustradas no exercício da profissão.

Doponto de vista de quem não se fecha para a fé e o seu papel na vida,acredita-se que toda profissão é uma vocação que nasce do amor de Deus para serealizar no amor humano, pois não se erra quando se faz uma opção de vida por amor humano em conformidade com a fé quebroa do amor divino.Resistir à fé e ao amor é negar-se a possibilidade de uma total realização68.

Cabe ainda lembrar, que toda vocação-profissãocomporta uma missão, a se realizar em cada pessoa não em função de si mesma, mas em função do próximo. É saindo de si mesmo que o ser humano volta plenamente a si mesmo. Viver na verdade é a melhor opção, pois significareceber a liberdade pela participação e exercício cotidiano da vida doada aosdemais. Quando se é verdadeiro, aumentam as possibilidades de se viver o queproporciona a realização da felici- dade: a alteridade.

A alteridade,como serviço, foi o que caracterizou a vida e a total entrega de Jesus: «E assim, a inversão cristã dos valoresalcança a meta, tornando plenamente claro que quem se entrega completamente ao serviço dos outros,ao total altruísmo e ao despojamento,é verdadeiro homem, o homem do futuro, o ponto de junção entre homem e Deus»69.

Nesse sentido, as exigências de realização pessoal têm a ver com asexigências de realização do próximo. Os ideais pessoais surgem como comprometimento altruísta e as relações interpessoais se tornam a ocasião para a vocação-profissão ea missão se concretizarem de forma plena.

Em diversossetores da sociedade, percebe-se a nefasta difusão do liberalismo relativista,do cientificismo positivista e de certo pessimismo perante as perpectivasprofissionais marcadas pela ênfase no aspecto econômico. Os jovensuniversitários veem-se continuamente expostos e confrontados com essasrealidades e, nem sempre, encontram-se preparados para saber distinguir o «joiodo trigo»70. Hoje, a «racionalidade» é pragmática e de acordo com omercado. Disto resulta a importância e o papel que a Universidade devedar à força da argumentação e do raciocínio lógico, desenvolvendonos alunos o espírito crítico, para que sejam capazes de fazer a justaescolha do bem, promover a justiça e perseguir a verdade, evitandoa ilusão e o fascínio do sucesso, do poder e da vida fácil.

Assim, por suaidentidade e missão, uma Universidade não somente promove a pesquisa e aformação de cada geração que por ela passa, promove também e principalmente ahumanização. Isso requer empenho e fadiga de docentes e discentes que desejam crescer reciprocamente. Osaber dos docentes se alimenta e se percebe desafiado pelo desejo que osdiscentes manifestam pelo saber71.

Devido às novas exigências do saber, nota-se a multiplicação dos cursossuperiores que surgiram nos últimos trinta anos. Aacademia universitária tornou-se o espaço formativo e informativo privilegiado para se desenvolver e se aprimorar os diversos tipos devocação-profissão. Dentre os seusnumerosos cursos, desde o seu surgimento, encontra-se a Teologia que, no dizerdo Papa Bento XVI, possui um discurso dirigido à razão e não está confinada àesfera privada de alguns, sejam poucos ou muitos. É precisoinsistir na grandeza da fé e na beleza do amorhumano, fontes de satisfação e de realização para quem busca a verdadee a ela se conforma. O momento atual é propício para apresentar o que háde positivo e válido na proposta cristã72.

Ora, desde há muito tempo que o ocidente viveameaçado por esta aversão contra as questõesfundamentais da sua racionalidade,e desse modo, o único resultado é sofrer um grande dano. A coragem de abrir-se à vastidão da razão, e não arejeição da sua grandeza – tal é o programa pelo qual uma teologiacomprometida, na reflexão sobre a fé bíblica, entra no debate de nossa época73.

Pelo cursoregular de Teologia, no nível de graduação, futuros clérigos,religiosos, religiosas, leigos e leigas adquiremconhecimentos e se preparam para atuar em diversos setores da Igreja e da sociedade com base sólida, em particular, atuandonas várias pastorais e noensino religioso, seja ele confessional ou não.

A promoção dodiálogo entre a fé e a razão encurta a distância entre Teologia e Ciência, eevita o divórcio entre práxis da fé e práxis da ciência, mostrando que, apesarde distintas pelos graus de certezas, podem ser próximas pelo objeto: a buscada verdade. Nesse sentido, os cursos de Teologia podem se orgulhar se estãoprestando um serviço não só aos que tem fé, mas aos que têm procurado as razõesda própria fé (cf. 1Pd 3,15). Através de suas diversasdisciplinas, a Teologia propicia aos alunos a possibilidade de verificar avalidade dos argumentos e dos critérios teológicos, a fim de que possamreconhecer que a fé não atrofia a razão, mas a liberta de preconceitos e depensamentos espúrios, não conformes com o bem, a justiça e a verdade74.

3.3. A religação dos saberes

Como contribuição pessoal, gostaria de propor a necessária e tãourgente religação de diversos campos do saber75, como um caminho possível deser percorrido em prol da promoção e da edificação de uma cultura em favor daverdade. Esta religação resulta da união de esforços entre os meios usados para produzir o saber científico e a sua finalidade específica: alcançar a verdade que liberta dosabsolutismos. Não basta, porém, que a finalidade seja moralmenteboa se os meios não forem, igualmente, bons e lícitos.

O ponto de partida dessa contribuição deriva da convicção de que uma real atividadecientífica, eclesial e social emuma Universidade precisa ser, inicialmente, interdisciplinar e,posteriormente, multidisciplinar. Nesse sentido, cada área do saber é chamada a marcar presença e a contribuir com o que possui e produz de específico, tendo a verdade como principal finalidade da pesquisa em prol da humanidadee do bem comum. Não tenho a pretensão de ser exaustivo, cito apenasalguns campos do saber, com ointuito de demonstrar que, com boa vontadee empenho, a tarefa de religar os saberes não é somente possível, mas indispensável eurgente nas Universidades.

Começo pelaHistória, porque no que tange o tema da verdade, estesaber lida com inúmeros registros que esperam ser novamente interpretados ereinterpretados. Por meio destes, acomunidade acadêmica recebe a base necessária para aelaboração das leituras e releituras a serem feitas, da forma mais objetiva possível, a fim de conseguir evitar cair nas ideologiasou subjetivismos. A história é responsável pela memória, sema qual a identidade e a missão do ser humano facilmente se perderiam pela amnésia provocada com o prazer gerado pela buscadesumana do sucesso e do poder.

Pelas CiênciasSociais e a Psicologia, alcança-se um estudo de grande envergadura e contribuição sobre a compreensão dos fenômenosessenciais, dos processos que decorrem da estruturação ou da desestruturação individual e social, das manifestações típicas da vida em sociedade e das suas transformações, que estão na origem dos fatores que impelem a busca ounão da verdade. Indivíduos e grupos são,continuamente, analisados em suas tendências psicossociais, porque estão pautadas em elementos que condicionammais ou menos as relações capazes de influenciar a sua singularidadeou coletividade. O auxílio e interação desses dois saberes permite que sejam encontrados os meios necessários e eficazes para restabelecero equilíbrio, sem o qual nãose promove a primazia da verdade orientadora das diversas formas de saber

Pelo exercício do Direitobusca-se estabelecer ou restabelecer a verdade em nível individual ou social. Essa dimensão da vida humana institucionalizada tem comofinalidade específica a promoção da cultura da paz entre os seres humanos peloestabelecimento da verdade dos fatos, assegurando que a convivência seja o maisjusta possível,ordenada ao bem comum e livre de conflitos e violências. Em qualquer cultura, a dimensão jurídica é imperiosa e necessária, porque é uma experiência antropológica fundamental que, no íntimo,aspira pelo bem, pela justiça e pela verdade.

Pela Comunicação Social, em suas diferentes áreas e formasde agir, proporciona-se o progresso das relações interpessoais esociais. Por meio da comunicação, cada ser humano interage coma coletividade e vice-versa. A comunicação não é capaz apenasde formar opinião, mas de transformar experiências em vida e depromover encontros que ultrapassam as fronteiras mais distantes.A comunicação a serviço da vida é enorme promotora e veículoda verdade; quando não se deixa corromper por ideologias, mas,também comprometida com o bem e a justiça, suscita no indivíduoe na coletividade, em particular numa Universidade, o compromissocom a verdade da informação formadora de opinião.

Pela Educação, o ser humano tem a possibilidade de desenvolver as suas faculdades e deadquirir a capacidade necessária para se posicionar com critérios objetivosdiante da influência cada vez maior que o progresso tecnológico impõe àsociedade. Na medida em que cada ser humano adquire uma consciência mais plenada sua dignidade, percebe o dever de se tornar cada vez mais ativo e participativo na vida social e, sobretudo, na vida econômica e política, ocupando o espaço privilegiado para ser sujeitogerador da unidade e dos vínculos que favorecem a promoção da verdade. A Educação, indispensável em uma Universidade, por seronipresente em todos os saberes e por poder acontecer em espaços sociais formais e não formais, cotidianamente enfrenta o desafio da formação integralda pessoa humana, pela partilha de ideias, de ideais e de valores,razão pela qual, ordenada ao bem social, influencia, fortemente, naprática da verdade que salvaguarda e redimensiona os direitos e osdeveres humanos.

Pela Economia, as normas da casa familiar e social se entrelaçam, e se percebe a sua natureza interdisciplinar e, aomesmo tempo, a sua fisionomia transversal, pois não existe alguma atividade quedela possa prescindir. A suafinalidade está intimamente ligada a de seus atores que não devem apenas seguiras «leis do mercado», que têm diante de si papéis, números e cifras monetárias.«A área econômica não é nem eticamente neutra nem de natureza desumana e antissocial. Pertence à atividade do homem; e, precisamente porque humana, deveser eticamente estruturada e institucionalizada»76. Nessa abertura, a Economia deve formar especialistas namedida em que se comprometem com a prática da verdade, certos de que odesenvolvimento econômico não deve acontecer pelas «leis da van- tagem e dolucro», mas essencilmente pelo princípio da gratuidade, como forma de caridadee de fraternidade77.

Pela Filosofia, a questão fundamental sobre quem éo ser humano está sempre no centrodos debates na sua constante busca pela verdade. Aresposta ou o impasse para essa questão essencial tem implicações em todas asáreas do saber. Se essa questão,desde a sua origem, já era complexa, a busca pela resposta ficou ainda maiscomplexa pela evolução e trajetória do pensamento humano ocidental78. Como definir um ser que, por natureza, sedemonstra tão instável e complexo? A Filosofia, na sua tarefa de ajudar a refletire a amadurecer o pensamento, desempenha o importante papel de bússola para a descoberta e apreensão da verdade, pela qual, coma justiça e o bem, apontam o caminho para a concretização de umacultura da paz.

Enfim, se a perda da dimensão transcendente da vida implica em perda de qualidade na vida humana, um adequado conceito de verdade pressupõe a reconciliação do ser humano com ele mesmo, com o próximo, com todas as criaturas e principalmente com Deus, Verdade Absoluta. Sem essa reconciliação, os nexos entre os diversos tipos de saber não são capazes de lançar bases sólidas e de alcançar juntos resultados claros e objetivos, pois as crises sociais afundam as suas raízes em uma crise antropológica. Por certo, não pode haver busca da verdade se as relações entre todos os seres continuarem fraturadas em dualismos. O saber teológico desponta, ao lado dos demais, não como supremo saber ou dono da verdade, mas como mediador e como diaconia nessa sublime e fundamental tarefa de unir, novamente, os saberes universais, sem os quais o ser humano dificilmente terá uma formação completa, integral, ordenada e comprometida com a verdade que liberta.

Conclusão

O presente artigo partiu de uma situação concreta: a visita que o Papa Bento XVI iria fazer à usr, na qual pronunciaria a aula inaugural, mas que, por motivos alheios à sua vontade, acabou sendo cancelada.Essa alocução, porém, foi enviada ao Reitor da referida Universidade,que se comprometeu a refletir o seuconteúdo junto a docentes e discentes. Além disso, a sua publicação e difusão permitiram que opúblico em geral pudesse ter acesso ao que seria dito naquela ocasião, motivo que inspirou a sua retomada e estudo, percebendo o quanto o pensamento de Bento XVI tem a dizer aos acadêmicos.

Por essaalocução, ficou patente que a Universidade, por sua natureza, é uma realidadecapaz de ajudar o pensamento a evoluir por suasdiferentes dimensões e especializações. O papel da Universidade não se reduzapenas à aplicação rigorosa de métodos científicos para se obter a verdade doobjeto estudado, mas deve, principalmente, ajudar no processo de humanização da sociedade, a fim de que o ser humano não perca a sua dignidade e a sua liberdade,distanciando-se do seu fim último.

A Universidade torna-se um espaço apto para que sejamformuladas as respostas para as questões importantes da vida quelhe são apresentadas, mas deve ser capaz de escutar e de formularcritérios válidos, reconhecendo e permitindo que a fé, ao lado daciência, continue sendo um princípio válido na vida de docentese discentes que possuem o direito de não sofrer qualquer tipo dediscriminação por manifestarem a sua religião. De certo, nestadinâmica, com a qual a Universidade abriga e abre espaço, existe ocontato contínuo de pessoas, idéias e ideais que permitem dizer que«A afirmação da verdade é o primeiro fardo e, talvez, o único fardoimediato numa apresentação acadêmica»79.

O ser humanonunca conseguiu, em época alguma, viver sem aautoridade, que se manifesta e deve se manifestar,principalmente, quando a verdade encontra-se ameaçada e a dignidadehumana é menosprezada. Então, dizer que a Universidade deve estar ligada,exclusivamente, à autoridade da verdade é um convite à reflexão.

É, também, umdesafio a reconhecer e a aceitar que a verdade não se alcança somente através de repetições experimentais, mas é uma Razão-Amor que se encarnou, habitouentre nós e deixou-nos o seu legado sobre a verdade e sobre a liberdade:«Conhecereis a verda- de e a verdade vos libertará». É a verdade que seencontra unida à experiência bíblica ehistórica, que vai de Abraão a Jesus Cristo e, por sua Igreja, até a parusia,rumo ao encontro definitivo com a Verdade Absoluta80.

A verdade dita deve corresponder à verdade praticada. A revelação da verdade, acontecendo como caminho histórico, permite que a fé e a razão promovam o sentido da existência do ser humano. Assim, a verdade de Jesus, que é fruto de sua pregação e do seu agir, e a verdade sobre Jesus, que é fruto da pregação e da ação da Igreja, não se chocam com as verdades alcançadas pelas ciências naturais. Fé e razão, juntas e abertas para as questões fundamentais do ser humano e da sua dignidade, podem, com coragem, ser desenvolvidas em parceria na Universidade, provocando debates, entre as diversas áreas do saber, que aumentem a qualidade da reflexão comprometida não apenas com a teoria sobre a verdade, mas com a práxis da verdade que liberta e humaniza a sociedade.

Material suplementar
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Notas
Notas
1 Regensburg, que antes se chamava Ratisbona, é uma cidade que remonta à época doImperador efilósofo estóico Marco Aurélio Antonino (121-180 d.C.) e se encontrana região da Bavária. Cf. JamesV. Schall, «De Cambridge a Regensburg: DuasConferências sobre a Coragem Intelectual», Communio 2, Vol. xxvi (2007): 254.
2 O discurso do Papa aos representantes da academia, emRegensburg, está disponível na internet:acesso emoutubro 3, 2012, www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/speeches/2006/september/documents/hf_ben-xvi_spe_20060912_university-regensburg_it.html.
3 Na sua primeira encíclica à Igreja, o Papa Bento XVIproclama o Amor de Deus como Verdade-Amor:«A fémostra-nos o Deus que entregou o seu Filho por nós e assim gera em nós acerteza vitoriosa deque isto é mesmo verdade: Deus é amor!», Bento XVI, DeusCaritas est (São Paulo: Paulinas, 2006), n.39. Para um aprofundamento sobre osprincipais aspectos dessa encíclica, veja-se: Angelo Scola, «AUnidade do Amor eo Rosto do Homem: Um convite à leitura da Encíclica Deus Caritas Est de BentoXVI», Communio 2, Vol. xxvi (2007): 203-233.
5 A frase pertence a Santo Ambrósio, mas tornou-secélebre com Santo Agostinho que a usou para sereferir, positivamente, ao pecadooriginal e passou a ser cantada no precônio da solene vigília pascaldo SábadoSanto: o felix culpa qui talem et tantum meruit habere redemptorem.
6 Estaliberdade acadêmica surge «quando a Universidade de Paris recebeu um alvaráescrito da SantaSé em 1215, abriu-se uma nova dimensão não civilizaçãoeuropeia; agora as Universidades existiamcomo centros de cultura relativamenteautônomos, dedicados à busca do conhecimento», Richard Tarnas, A Epopeia doPensamento Ocidental (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011), 199.
8 Interessa ressaltar que tanto João Paulo II como Bento XVI foram entrevistadose procuraram elucidarsobre o papel do papado na Igreja e no mundo: Cruzando oLimiar da Esperança, por sua Santidade João Paulo II, entrevistado por VittorioMessori. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1994. No caso do Papa Bento XVI, olivro é anterior à eleição ao papado e intitula-se O Sal da Terra. Ocristianismo e aIgreja Católica no Limiar do Terceiro Milênio [Saiz der Erde:Christentum und Katholische Kirche im 21Jahrhundert Ein Gesprāch mit PeterSeewald. München: Deutsche Verlags-Anstalt GmbH, 1996], pelo Cardeal JosephRatzinger, entrevistado por Peter Seewald (Rio de Janeiro: Imago, 2005).
9 Ovocábulo ἐπίσκοπος pertence a uma vasta família de vocábulos formada pela raizσκεπτ e pelo prefixoἐπί. Caracteriza-se pela ação de observar, examinar, tomarconhecimento, indagar ou experimentar oque está sendo feito. É a ação de quem se preocupa, de forma ativa e responsável,pelo objeto que estásendo observado. O vocábulo está atestado desde Homero efoi usado como atributo de uma divindadeque vigia eprotege o país e seus habitantes. A divindade era invocada como testemunha depactos,contratos e negócios comerciais. Nesse sentido,era, também, atribuído a homens que exerciam afunção de responsáveis peloestado e por comunidades religiosas. Pode-se dizer que a grande funçãodo ἐπίσκοπος era a de manter a ordem pública e religiosa como guardião. A LXX, para falar do olharfavorável e atentode Deus pelo seu povo usou ἐπίσκοπέω (cf. Dt 11,12). 1Pd 2,25 é um texto que resumebem o sentido do termo: Jesus é oPastor e o Bispo dos que a Ele se converteram. De Jesus Cristo, comoexpressãomáxima do serviço, é que se deve aprender o sentido que esteconceito revela, enquantopreocupação pelo bem e pela salvação do ser humano.Cf. Lothar Coenen, «ἐπίσκοπος» em Dizionario dei Concetti Biblici del Nuovo Testamento, ed.Lothar Coenen, Erich Beyreuther e Hans Bietenhard(Bologna:edb, 1986), 1975-1979.
10 Citoapenas a definição adotada pela Psicologia que assume duas acepções, umagenérica e uma específica.Pela primeira, a razão está em referência ao Logosgrego, que Herácilo usou para expressar oprincípio racional que rege o Caos eque Cícero traduziu por ratio. Cf. Richard Tarnas, op. cit., 61. Pelasegunda, arazão está em referência à diánoia grega, entendida como procedimentodiscursivo quese expressa na demonstração, em oposição ao nous que aescolástica medieval entendeu como intellectus,segundoa acepção aristotélica da intuição dos primeiros princípios. Cf. UmbertoGalimberti,«Ragione», Dizionario di Psicologia(Bergamo: L’Espresso, 2006), 296-298.
11 A verdade crida e professada pelo cristianismo nãoanula o que de bom, válido e verdadeiro existeem outras expressões religiosas.É exatamente essa postura de tolerância e de compreensão que permitea verdadecristã entrar em diálogo inter-religioso e ecumênico. Por meio deste diálogo,pode-sepromover, no mundo, a paz, a justiça, o bem e, principalmente, a lutapor salvaguardar a dignidadehumana, grande objeto do amor de Deus. Cf. Mario deFrança Miranda, «Verdade cristã e pluralismoreligioso», Atualidade Teológica13, Vol vii (2003), 47-49.
12 Lembra, oportunamente, Samuel Greg, «Europa, Cristianismo e Secularização:Insights de Joseph Ratzinger – Bento XVI», Communio 2, Vol. xxvi (2007), 339: «AEuropa é o continente, onde primeiroemergiu o cristianismo como religiãodominante, e o cristianismo exerceu uma influenciaincomparável na história e naidentidade européias. Mas a Europa também é o berço da modernidadee o cenáriode choques entre determinadas ideologias do iluminismo e do catolicismo».
14 «Na verdade, o mito foi a primeira grande arma daqual o homem se serviu para enfrentar odesconhecido e, de algum modo,controlá-lo», Severo Hryniewicz, Para Filosofar (Rio de Janeiro:Edição do autor, 1999), 55. As viagens marítimas, ainvenção do calendário, da moeda, da política,do alfabeto e a reorganização davida urbana estão na base das condições históricas para quea filosofia surgissee superasse o mito. Cf. Marilena Chaui, Convite à Filosofia (São Paulo: Ática,1995), 31-32.
15 A filosofia, por nascer da religião, possui as marcasdo sagrado em toda a sua trajetória e desenvolvimento.Não havia dicotomia entrefé e razão no âmbito da filosofia grega, mas havia a preocupaçãode que a razãonão cedesse aos fundamentalismos e exageros patológicos de expressõesreligiosasinsanas. Cf. Clemente Ivo Juliatto, Ciência e Transcendência, duas lições a aprender(Curitiba: Champagnat – pucpr, 2012), 63.
17 Overdadeiro nome de Platão era Aristocle, do grego platús, devido a sua robustezfísica.Depois da morte de Sócrates, seu mestre, Platão viajou muito e até foifeito escravo. Apósa sua libertação, regressou aAtenas e fundou uma escola, denominada Academia porquefuncionava nos jardinsdedicado ao herói chamado Academo. A sua intenção era a de formaruma classedirigente que fosse bem preparada intelectualmente, evitando que a tiraniaassumisseo poder. Tentou implantar o seu pensamento em Siracusa, governada pelotirano Dionísio o jovem, mas não conseguiu. Cf.Maurizio Pancaldi, Mario Trombino e MaurizioVillani, «Platone», em Atlantedella filosofia. Gli autori e le scuole, le parole, le opere (Milano:Ulrico Hoepli, 2006), 342-348.
18 Platão, para distinguir a filosofia pré-socrática, naturalista,da filosofia inaugurada por Sócrates e quebusca a essência de todas as coisas,cunhou, com base na prática náutica da sua época, o conceito de«primeiranavegação» e de «segunda navegação». Esta se encontra narota certa que conduz à descobertado ser que está acima do sensível e que éinteligível por natureza. Cf. Giovanni Reale e DarioAntiseri, História daFilosofia. Antiguidade e Idade Média. Vol. 1 (São Paulo: Paulinas, 1990),134-136.
19 Acreditar em uma disposição divina não contradiz, porcerto, o princípio da evolução da razão humana,segundo o qual o cérebro humanoevoluiu na passagem do homo erectus (que viveu entre 1.8 milhõesde anos e300.000 anos atrás) para o homo sapiens, graças à ingestão de proteína deorigem animal. Cf.Stephen C. Cunnane e Michael A. Crawford, «Survival of thefattest: fat babies were the key to evolutionof the large human brain», emComparative Biochemistry and Physiology Part A 136(2003): 17-26.
21 O livro da Sabedoria serve de exemplo, o autor, umautêntico judeu, preocupa-se em ajudar os irmãosda diáspora egípcia,influenciados pela cultura grega, a salvaguardar a fé diante do materialismo,dohedonismo e da idolatria com forte inspiração no evento do êxodo do Egito.Cf. Cássio Murilo Dias da Silva, «Tradições do êxodo em Sb 11–19», AtualidadeTeológica 49, Vol. xix (2015): 91-95.
23 Itinerário breve e preciso sobre as etapas quemarcaram o encontro entre a fé e a razão encontramseem João Paulo II, CartaEncíclica Fides et Ratio, sobre as relações entre fé e razão (São Paulo:Paulus,1988), nn. 36-44.
26 Cf. Hans-Georg Link, «ἀλήθεια», em Dizionario dei Concetti Biblici del Nuovo Testamento, op.cit.,1961-75. Na discussão com os judeus, essa relaçãoaparece nos lábios de Jesus que defende o seutestemunho (cf. Jo 8,32.43-47).
27 Ao se formular que o ouro puro é diferente do ouronão puro, tem-se a verdade objetiva, pela qual aessênciae a natureza de um ser se equivalem. Ao se formular que uma pessoa é umser humano, tem-sea verdade lógica, pela qual o juízo une quando afirma esepara quando nega. Tais formulações encontram-se nabase do conceito e da afirmação ocidental de verdade, seja proposta de formapopular oucientífica. A verdade é reduzida e regulada pelo fato, enquantodemonstrável pela experimentação epela repetição metodológica. Daí que éverdadeiro o que é exato e é verdade o que é exatidão.
33 καὶ εἰς τοῦτο τοἐλήλυθα εἰς τὸν κόσμον, ἵνα μαρτυρήσω τῇ ἀληθείᾳ. Πᾶς ὁ ὢν ἐκ τῆς ἀληθείας ἀκούει μου τῆςφωνῆς. As traduções, comumente, utilizam «para dar testemunho», e écorreto, mas, também, poderiaser traduzido: «e eis que eu vim ao mundo para queeu seja mártir da verdade (grifo do autor). Todoaquele que é da verdade escutaa minha voz», Joseph Ratzinger, afirma: «Mas é precisamente assim,na carência total de poder que Ele é poderoso, e só assim averdade se torna força, sem cessar», Jesus de Nazaré. Da entrada em Jerusalématé a Ressurreição (São Paulo: Planeta, 2011), 177.
40 A base dessa afirmação é a concepção filosófica deAristóteles (384-322 a.C.) que ficou conhecidacomo «motor imóvel», isto é, umacausalidade eficiente e eficaz que move todas as coisas e por nadaé movido. Cf.Giovanni Reale e Dario Antiseri, op. cit., 180-191.
52 Nas disputas cristológicas, a fórmula: sem confusão, sem mutação, sem divisão, sem separação,do Concílio de Calcedônia (451), serviu para mostrar a relação que existe entreas duas naturezas de Jesus Cristo, que é verdadeiro Homem e verdadeiro Deus. Cf.Heinrich Denzinger e Peter Hünermann, EnchiridionSymbolorum et Declarationum de Rebus Fidei et Morum (Barcelona: Herder, 1999),can.303, 163.
53 É reconhecido o mérito de Santo Tomás no que diz respeitoa conceber a teologia como ciência emsentido rigoroso,pois seu método era, por um lado, a distinção entre conhecimento pela razãoeconhecimento pela fé, e, por outro lado, a capacidade de fazer teologiasegundo as exigências dademonstração da razão. Cf. Cornelio Fabro, Introduzionea San Tommaso. La metafisica tomista e ilpensiero moderno (Milano: Ares, 1983),118-130; Richard Tarnas, op. cit., 202-213.
55 Visão coerente dessa situação manifesta Joseph Ratzinger, O Sal da Terra. Ocristianismo e a Igreja Católicano Limiar do Terceiro Milênio, op. cit.,110-111: «As “seitas” protestantes fundamentalistas registramhoje grandessucessos nas suas atividades missionárias na America do Sul e nas Filipinas.Dão àspessoas a sensação de segurança e da simplicidade da fé (...). A busca desegurança e da simplicidadetorna-se perigosa quando conduz ao fanatismo e à faltade horizontes. Quando se desconfia da razãoem geral, a fé também é falsificadae torna-se uma espécie de ideologia partidária que já nada tem aver com aentrega, cheia de confiança, ao Deus vivo, enquanto fundamento originário danossa vidae da nossa razão». Veja-se, também, Paulo Cezar Costa, «Agir contra aRazão é agir contra Deus»,Communio 2, Vol. xxvi (2007): 329-336; Maria deLourdes Corrêa Lima, «Fundamentalismo: Escriturae Teologia entre fé e razão»,Atualidade Teológica 33, Vol. xiii (2009): 332-359; Leonardo AgostiniFernandes,«Leituras inaceitáveis (espúrias) da Palavra de Deus», Coletânea 15,Vol. viii (2009): 11-31.
56 Cf.Urbano Zilles, Desafios Atuais para a Teologia (São Paulo: Paulus, 2011),20-29. Para além dos danoscausados, é preciso saber pensar, também, nas novaspossibilidades de crescimento que se abremcom o secularismo. Cf. Maria ClaraLucchetti Bingemer, «Secularização e experiência de Deus», emSecularização:novos desafios, op. cit. 105-138.
59 «O exercício livre da racionalidade moderna noprocesso de construção de um sujeito autônomo propiciaráa emergência de umfenômeno denominado secularização», Roberlei Panasiewcz, «Secularização:o fim da religião?», em Secularização: novos desafios, op.cit., 10.
64 Éséria e pertinente a seguinte denúncia: «Muitos professores que conhecemos,sobretudo de Universidadesmais dedicadas à pesquisa, se comportam como se nãodessem a mínima importância aoensino. Para eles, pesquisar, publicar,participar de congressos, discutir com os pares e especialistassobre sua áreade especialização é o que realmente importa. Dar aula é considerado o preço aserpago por fazer aquilo de que gostam e poder progredir nacarreira. As oportunidades de lecionar e dese aperfeiçoar didaticamente nãolhes dizem nada e não lhes trazem nenhum apelo», Clemente Ivo Juliatto, OHorizonte da Educação. Sabedoria, Espiritualidade e Sentido da Vida, op. cit.,164-165.
65 de
66 A bioética «representa a tentativa de compreensão doverdadeiro significado da novidade, visandorealçar seus aspectos positivos ealertar para os negativos. Ela consiste no esforço em estabelecer umdiálogoentre a ética e a vida. (...) Num primeiro momento,podemos entender a bioética como umaramificação da ética, preocupada,particularmente, em fazer valer os valores éticos, na medida em quequestiona orespeito à dignidade humana, em meio ao progresso das ciências», SeveroHryniewicze Regina Fiuza Sauwen, O Direito «in Vitro». Da Bioética aoBiodireito (Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008), 8.
67 A busca pela excelência no ensino universitário temse defrontado com enormes desafios e muitos sãoos debates em torno da qualidadedo ensino e da educação. No átrio dos debates, fala-se muito, maspouco se fazpara, de fato, criar as condições necessárias para que as mudanças aconteçam.Sobre oproblema, veja-se: Clemente Ivo Juliatto, A Universidade em busca daexcelência. Um estudo sobre aqualidade da educação (Curitiba: Champagnat –pucpr, 2010).
68 «Oscônjuges cristãos são, um para o outro, para os seus filhos e demaisfamiliares, cooperadores dagraça e testemunhas da fé. Para osseus filhos, eles são os primeiros pregoeiros da fé e educadores;pela palavra epelo exemplo, formam-nos para a vida cristã e apostólica e ajudam-nos aescolherprudentemente a sua vocação e acalentam com todo o cuidado a vocação deconsagração, neles porventuradescoberta», Concílio do Vaticano II, «DecretoApostolicam Actuositatem», 18 de novembro de1965, n. 11, Acta Apostolicae Sedis58 (1966): 837-864.
70 «Averdade é o horizonte último da busca existencial. Isso nos leva a compreendero conhecimentopor uma perspectiva que supera a visão simplificadora dopositivismo. Ao invés de admitir que oconhecimento humano é sinônimo deverdade, admitimo-lo apenas como caminho de acessoàverdade (mesmo que seja rotulado de científico ou metodologicamente testado).Isso muda toda aquestão!». Clemente Ivo Juliatto, OHorizonte da Educação. Sabedoria, Espiritualidade e Sentido daVida, op. cit.,161.
72 «Temos que reconhecer entretanto que o desafio maiorprovém da própria Igreja que carece de quadroscatólicos competentes,imprescindíveis para um diálogo com esta diversidade dentro da Universidade.Comraríssimas exceções o episcopado não investe em vocações intelectuais no cleroe nolaicato», Mario de França Miranda, «Universidade Católica hoje», AtualidadeTeológica 49, Vol. xix(2015): 18.
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