Resumo: Este trabalho tem por objetivo analisar o papel vanguardista da Lei nº 13.257/2016, denominada de Marco Legal da Primeira Infância e que disciplina mecanismos de regulação da exposição precoce à comunicação mercadológica e pressão consumista às crianças de zero a seis anos de idade.
Palavras-chave:VulnerabilidadeVulnerabilidade, Pressão consumista Pressão consumista, Marco legal da primeira infância Marco legal da primeira infância, Vanguardismo legislativo Vanguardismo legislativo.
Abstract: This study aims to analyze the avant-garde role of Law 13,257/2016 called the Legal Framework for Early Childhood, which regulates mechanisms of early exposure to marketing communication and consumer pressure for children from 0 to 6 years old.
Keywords: Vulnerability, Consumer pressure, Legal framework for early childhood, Legislative vanguardism.
Resumen: El presente trabajo tiene por objetivo analizar el papel vanguardista de la Ley 13.257/2016 denominada de Marco Legal de la Primera Infancia, y que disciplina mecanismos de regulación de la exposición precoz a la comunicación mercadológica y presión consumista a los niños de 0 a 6 años de edad.
Palabras clave: Vulnerabilidad, Presión consumista, Marco legal de la primera infancia, Vanguardismo legislativo .
Artigos
Em nome do direito de ser criança: o papel vanguardista do marco legal da primeira infância no combate à pressão consumista e a comunicação mercadológica
In the name of the right to be a child: the avant-guard role of the legal framework for early childhood in combating consumer pressure and marketing communication
En nombre del derecho de ser niño: el papel vanguardista del marco legal de la primera infancia en el combate a la presión consumista y la comunicación mercadológica

Recepção: 30 Setembro 2018
Aprovação: 20 Dezembro 2018
Você deve saber que não há nada mais elevado, mais forte, mais saudável e bom para a vida no futuro que uma boa lembrança, especialmente uma boa lembrança da infância, do lar. As pessoas falam muito em educação, mas uma boa e sagrada lembrança, preservada da infância, talvez seja a melhor educação. Se um homem carrega consigo muitas destas lembranças durante sua vida, ele estará seguro até o fim de seus dias, e quando se tem apenas boas lembranças no coração, isto pode, às vezes, ser o meio de nos salvar. (DOSTOIÉVSKI, 2009, p. 85)
Vanguarda. Inovação. Pioneirismo. Estes três vocábulos dão o tom exato para adjetivar a novel legislação brasileira que recebeu o nome de Marco Legal da Primeira Infância, Lei nº 13.257/2016. Referida lei assumiu o compromisso da prioridade absoluta na articulação de políticas públicas para os seus destinatários, crianças de zero a seis anos de idade, os quais ousamos chamar de “sujeitos de direito em grau superlativo” tamanha a sua importância no novo contexto brasileiro.
Primeira norma dessa categoria na América Latina, o Marco Legal da Primeira Infância alterou o tratamento destinado à criança nos primeiros seis anos de vida e, especialmente, frisou o reconhecimento dessa criança como “cidadã”, buscando a articulação entre os entes federativos e a participação solidária entre Estado, família e sociedade, bem como propugnando que o fundamento constitucional da cidadania vai além da configuração do sujeito como portador de capacidade eleitoral, mas como aquele que influi nas decisões políticas. A novel legislação sublinha os 72 meses iniciais de vida, ou seja, de zero a seis anos, como um momento não apenas de extrema relevância para o desenvolvimento infantil, mas também como um marco inicial para o desenvolvimento pleno do ser humano. A partir de um conjunto de ações voltadas à promoção do desenvolvimento infantil, desde a concepção, até os seis anos de idade, o Marco Legal da Primeira Infância se estabelece incluindo todas as esferas da Federação com a participação da sociedade, e prevê a criação de políticas, planos, programas e serviços que visam garantir o desenvolvimento integral de mais de 20 milhões de brasileiros nessa faixa etária.
Pesquisas científicas contemporâneas revelam que os investimentos em políticas públicas para a primeira infância são os mais eficazes e que trazem mais retorno, pois apresentam inúmeros resultados para o presente e para a formação futura da criança e da sociedade.
Nos primeiros anos de vida, o desenvolvimento físico, psicológico e emocional da criança ganha contornos para transformações em grandes dimensões. Cabe destacar que a trajetória do Marco Legal do Primeira Infância tem início no ano de 2011 com a criação da Frente Parlamentar da Primeira Infância, integrada por mais de 200 parlamentares e que depois se agremiou à Rede Nacional Primeira Infância (RNPI), articulação nacional de organizações da sociedade civil, do governo, do setor privado, de outras redes e de organizações multilaterais que atuam, direta ou indiretamente, pela promoção e garantia dos direitos da primeira infância.
Salienta-se que 23 parlamentares da Frente participaram de um curso de liderança executiva em primeira infância, em Harvard. Em dezembro de 2013 foi apresentado o Projeto de Lei (PL) da Primeira Infância, Lei nº 6.998/2013, e em fevereiro foi criada a Comissão Especial da Primeira Infância com o objetivo de analisar o projeto. Deve ser ressaltado que o projeto recebeu inúmeras sugestões oriundas de participação social, bem como de especialistas nos temas em debates pelo Brasil afora.
O Estatuto da Primeira Infância destaca o caráter vital de se atribuir a devida atenção aos primeiros seis anos de vida da criança, reforçando medidas para consolidar o conceito aqui explanado, que conceitua a criança no papel de cidadão, apto a influenciar os rumos do país, desenvolvimento histórico que agora recebe novos detalhamentos pela sociedade e pela cultura jurídica. A preocupação mais pujante se refere não somente a disponibilizar os alicerces fundamentais para a criação de um ser humano cidadão, consciente de seu papel social e do seu direito de demandar o Estado naquilo que for oponível, como também da possibilidade marcante de oferecer à criança o direito mais inerente a ela, que é o direito de ter uma infância saudável, desenvolvendo seu aprendizado, sim, mas vivenciando essa época, brincando e convivendo harmonicamente com a família e com a sociedade, uma simbiose importante para sua formação mais apropriada.
O que deve ser ressaltado é que o estatuto eleva a criança à categoria de cidadã, coadunando com os instrumentos internacionais de proteção à criança e com o nosso texto constitucional, ressaltando a sua característica de sujeito de direito, o que significa tratá-la como um indivíduo atuante na esfera pública e sujeita à proteção do Estado, no presente caso, prioritária. Reconhecer a criança como prioridade é um passo importante, especialmente para a consolidação do modelo responsável para fazer com que sejam cumpridos de forma efetiva os objetivos e fundamentos da República Federativa propostos no texto constitucional vigente. A cidadania se impõe mediante o reconhecimento dos direitos fundamentais, da erradicação da pobreza, da redução das desigualdades e que deve ter início, literalmente, no berço. (ANDREUCCI; JUNQUEIRA, 2018).
A cidadania e o protagonismo da criança são as novas narrativas expostas no Marco Legal da Primeira Infância e, para tanto, a novel legislação declara como formas de violência as pressões consumistas e a comunicação mercadológica, merecendo toda uma engrenagem articulada de medidas jurídicas, bem como a criação de políticas públicas a fim de evitá-las.
Entre as grandes conquistas trazidas pelo Marco Legal da Primeira Infância, nosso olhar reflexivo está voltado à análise do direito à não exposição precoce de natureza mercadológica, considerada aqui na novel legislação como uma espécie de violência.
Art. 5o Constituem áreas prioritárias para as políticas públicas para a primeira infância a saúde, a alimentação e a nutrição, a educação infantil, a convivência familiar e comunitária, a assistência social à família da criança, a cultura, o brincar e o lazer, o espaço e o meio ambiente, bem como a proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista, a prevenção de acidentes e a adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica. (BRASIL, 2016)
O termo “sociedade de consumo” foi utilizado pela primeira vez por Jean Baudrillard (1993), que enfocava a sociedade contemporânea como alvo e vítima de uma nova meta de vida, a meta do consumo. Seria uma sociedade voltada única e exclusivamente para a aquisição e o descarte de bens como foco gestor da atuação dos indivíduos. Atrelado a isto, para que as vendas se tornassem céleres, combinou-se o ingrediente do fomento de “pseudonecessidades” nas pessoas, traduzindo como a imputação do “ter” sobre o “ser”, ou seja, estar incluído nessa sociedade. “Pertencer” pressupõe ser um bom consumidor que compra com rapidez e descarta com a mesma velocidade. A sociedade de consumo é umas das faces do capitalismo, incentivador da produção seriada, em larga escala e de produtos programados para pouco durar, fenômeno que se denomina obsolescência programada.
Correlata a toda esta estrutura está condicionada a notabilidade do cidadão à aquisição e descarte de produtos. Cumpre dizer que a posse de objetos ultrapassados é vista como sinônimo de estupidez pelos demais membros da sociedade. Não basta apenas consumir e ter, é preciso consumir cada vez mais em um diminuto espectro de tempo. Durabilidade, perenidade são conceitos que não mais se coadunam com a sociedade de consumo, rarefeita e que se liquidifica com extrema facilidade (BAUMAN, 2008, p. 78).
Zygmunt Bauman considera o consumo desenfreado como uma forma de consciência coletiva e núcleo da vivência coletiva humana, os quais são os responsáveis por recepcionar também os novos sujeitos de direito, bebês ainda, quando ingressam neste mundo existencial e declara que “tão logo aprendem a ler, ou talvez bem antes, a ‘dependência das compras’ se estabelece nas crianças. […] Numa sociedade de consumidores, todo mundo precisa ser, deve ser e tem que ser um consumidor por vocação” (Ibidem, p. 73).Na chamada sociedade pós-moderna, consumismo, felicidade e angústia se confundem e se consomem na medida em que a celeridade na aquisição, a felicidade instantânea e a angústia sequencial são elementos correlatos para a manutenção do sistema:
O consumismo se torna uma economia do engano, em que a felicidade está associada a um volume e intensidade de desejos sempre crescentes, gerando assim, uma constante insatisfação. Se por um lado é evidente que as mercadorias na sociedade de consumidores são planejadas para pouco durar, gerando – se a necessidade de novos produtos serem constantemente adquiridos, por outro também as relações sociais adentram nessa lógica de efemeridade e de durabilidade instantânea. (GALIAZZI; LEITE, 2013, p. 204)
Resta enfatizar que a publicidade dirigida à criança colabora na formação de conceitos e em protagonismos voltados ao consumo, englobando a crença de uma sociedade alicerçada no “ter” e na exclusão daqueles que não possuem bens materiais destacados como objetos de desejo. Tal exclusão é responsável pela exposição à violência enquanto da infância como alvo de consumo e não como uma criança cidadã em fase de desenvolvimento (OLMOS, 2018, p. 34). No mesmo sentido, dá-se a construção dos primeiros elementos da subjetividade infantil, a qual estará adstrita aos estímulos do mundo material atuando como manipuladores dos significantes sociais. A assimilação consumista se dá de forma rápida e a aquisição dos bens materiais passa a ser não apenas um objeto em si mesmo, mas sim a sua representatividade social pautada no binômio inclusão/exclusão e assim “a boneca Z não é apenas um brinquedo, mas assume um lugar de signo, é desejada por todas as crianças; tê-la significa ter status, ser admirada, respeitada e invejada por outros” (PEREIRA et al., 2005, p. 106). Pressões consumistas também se fazem constantes na aparição frenética de inúmeros portais dirigidos ao público infantil e alojados na internet, por meio das atividades lúdicas, coloridas, games e jogos, as memórias das crianças ainda em fase de desenvolvimento vão gravando e associando marcas, personagens e produtos como estímulos positivos (KARAGEORGIADIS; TOLEDO, 2014, p. 73).Divertimento, excitação e experiências de aprendizado são falas recorrentes de crianças para usar a mídia de forma abundante e sem reservas, exercendo sobre elas experiências de aprendizado para a inclusão e acompanhamento dos acontecimentos (FEILITZEN; BUCHT, 2002, p. 79). Diante desta efervescência de possibilidades, a crença na mídia como educadora ganha espaço e a noção de manipulação no discurso passa longe dos holofotes. As contribuições no campo da formação cognitiva desenvolvidas por Piaget são alicerces notáveis para a compreensão do desenvolvimento infantil na chamada primeiríssima infância; consumir pode ser um ato político e refletido, mas pode também trazer graves consequências para a consolidação da personalidade infantil, na medida em que as pressões mercadológicas podem ser consideradas como formas de violência, cabendo citar:
A precocidade das interações entre a criança e seu ambiente sociocultural é evidenciada na assimilação da cultura do consumo, pela infância, desse contexto, em que ela se vê bastante exposta aos estímulos das propagandas e ao bombardeio feito pelo mercado através das mídias. Essa faixa etária marca a inserção da criança no mundo do consumismo devido ao seu egocentrismo, ao surgimento da linguagem e às primeiras relações sociais, de forma que tais particularidades atuam em harmonia com as estratégias das empresas para atingir o público infantil. (MOURA; VIANA; LOYOLA, 2013, p. 475)
A exposição excessiva aos apelos de consumo, o ter como base para uma existência “feliz” se traduz como senha para ingresso e pertencimento ao mundo pós-moderno, responsável por rotular e etiquetar sociamente as pessoas. Para o atingimento desta meta cultural “ter” igual a “ser”, anteriormente vinculada apenas aos adultos, todas as formas para se chegar lá são permitidas, e até mesmo as que causem danos para si e para outrem. Há uma massificação dos sentimentos negativos entre eles, desejos infinitos de consumir, inveja, ira, tristeza, angústia, e até mesmo a ocorrência de deslizes criminógenos. Há a disseminação da cultura do conflito nas relações sociais, entre eles, na escola, na família e na comunidade.
A outra face do consumo é a exclusão, que gera a violência por não pertencer e por buscar meios de pertencer, com a consequente discriminação e hierarquização de grupos sociais (CAMURRA, 2010) exercendo ainda maior influência e manipulação em crianças da primeira infância que não possuem as reais dimensões da noção de pertencimento e cidadania política, passando a desejar o ter como forma de serem enxergadas pela sociedade.
Há uma inversão absoluta na noção de cidadania, posto que temas correlatos ao consumismo, tais como aquisição e exclusões, vão sendo apresentados da pior maneira possível ao público infantil, “coloridos” pelo desejo e pela retórica da sedução, ratificando o mercado produtor de necessidades e desejos incessantes.
No momento em que a sociedade elege como valor determinadas situações, por exemplo a ascensão social, o lucro, o enriquecimento a qualquer preço, sem propiciar uma correspondente oportunidade de se alcançar esses objetivos, cria-se um estado de anomia no qual o cidadão não consegue, por vias legais, atender àquilo que os outros esperam dele. O espaço para a convivência e a politização necessário ao processo reflexivo dos indivíduos de uma sociedade foi substituído nos dias atuais pelos passeios aos grandes centros de compras e deve ser urgentemente ressignificado, afirmando a necessidade de se orientar as crianças para que possam desenvolver suas capacidades críticas e não acreditem piamente em tudo o que veem como verdades absolutas, visto que a proibição ao acesso a este meio de comunicação não consegue evitar esta influência (DETTERBORN, 2002, p. 37). Mas é possível fazer diferente e o próprio Marco Legal da Primeira Infância em sua articulação dogmática oferece uma rede conjugada de esforços para a alteração deste estado de coisas, ao centrar como temas nucleares o direito a brincar e o papel da comunicação para o desenvolvimento infantil. O direito a brincar, previsto no art. 17 (BRASIL, 2016), pode ser vislumbrado como um direito humano indeclinável, na medida em que objetiva o desenvolvimento das subjetividades infantis. Do mesmo modo, quis o legislador que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios fossem responsáveis pela criação de espaços lúdicos que propiciassem o bem-estar, o exercício da criatividade em locais públicos e privados em ambientes livres e seguros nas comunidades. Estabelece de maneira vanguardista algo que pode parecer paradoxal, o retorno às origens, a construção de narrativas significadas do brincar como lazer, alteridade, vivência comunitária e a construção de uma infância livre de consumismo.
Finalmente, a comunicação imbuída de sua principal missão de informar para a ética e aproximação ganha dimensões diferenciadas no Marco Legal da Primeira Infância, pois lhe cabe o papel precípuo de transmitir conteúdos relativos àqueles que nominamos no início do presente artigo de “sujeitos de direito em grau superlativo”. Erigida à categoria de direito humano fundamental, o papel da comunicação na novel legislação é singular e plural, único e dotado de inúmeras possibilidades para trazer informações consistentes e formativas para a sociedade brasileira, em especial no universo do consumo. Assim, a comunicação ética se impõe sobre a comunicação pressionadora e mercadológica.
Prestes a completar a maioridade no ano de 2019. Este é o status do PL nº 5.921/2001, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly, em discussão na Câmara há dezessete anos com vistas a implementar o Marco Regulatório da Propaganda Infantil no Brasil. Há um forte lobby econômico para a sua não aprovação, eis a razão dos anos que se acumulam no Parlamento para a sua não aprovação. Argumentos tais como liberdade econômica e censura são recorrentemente utilizados por aqueles avessos à regulamentação.
Por outro lado, associações, sociedade civil organizada, Ministério Público e institutos − com destaque para o Instituto Alana − têm tido ganhos representativos no tema. Entre eles, a Resolução nº 163/2004 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), dispondo sobre a abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente. Resta dizer que, desde a edição da resolução no ano de 2004, o conceito de comunicação mercadológica – agora também disciplinado pelo Marco Legal da Primeira Infância – já se fazia presente e pode ser compreendido como:
Art. 1º:
§ 1º Por ‘comunicação mercadológica’ entende-se toda e qualquer atividade de comunicação comercial, inclusive publicidade, para a divulgação de produtos, serviços, marcas e empresas independentemente do suporte, da mídia ou do meio utilizado.
§ 2º A comunicação mercadológica abrange, dentre outras ferramentas, anúncios impressos, comerciais televisivos, spots de rádio, banners e páginas na internet, embalagens, promoções, merchandising, ações por meio de shows e apresentações e disposição dos produtos nos pontos de vendas. (BRASIL, 2014)
Ainda, o tema vem sendo fortemente judicializado no Brasil, com destaque para a paradigmática decisão do Superior Tribunal de Justiça, coibindo a venda casada, a utilização de mascotes e o uso de técnicas persuasivas nas propagandas destinadas às crianças e adolescentes em caso envolvendo a Empresa Alimentícia Bauducco (NASSAR; ANDREUCCI, 2016). A partir de tal moldura urge destacar a necessidade imperiosa do debate e da conscientização da sociedade para o tema, que não se restringe ao âmbito da família, mas traz em seu delineamento a solidariedade na atuação sobre a problemática.
Finalmente, resta dizer que o consumo deve ser visto como um ato político e de solidariedade, e pressupõe ser ensinado em seu caráter transdisciplinar. Não é apenas problema da família, mas sim dos atores sociais conjugados nos termos do art. 227 da Carta Magna de 1988 (BRASIL, 1988), e o querer do constituinte se fez em forma de princípio da cooperação, impondo à família, sociedade e Estado os deveres em relação ao público infantojuvenil.
A solidariedade é um dos corolários da sociedade brasileira, tendo por vocação constitucional a construção de uma sociedade livre, justa, desenvolvida, com a promoção do bem de todos e apartamento das desigualdades regionais. A solidariedade para o estado democrático de direito brasileiro deve ser concebida como sinônimo de desenvolvimento, justiça social, bem-estar e paz. O vocábulo solidariedade nos remete à concepção de ligação entre pessoas, responsabilidade mútua, congregação de interesses individuais para o desenvolvimento comum, vinculação de indivíduos em prol de um bem maior, comunhão de responsabilidades, e que se estabelece de maneira cabal no Estatuto da Primeira Infância. Por arremate, resta clara a vocação vanguardista do Marco Legal da Primeira Infância Brasileiro – reforça-se o seu ineditismo na América Latina – na busca dogmática pela reconstrução de conceitos que operam como bússolas para a compreensão do ser criança em todo o seu desenvolvimento. Tal estatuto dignifica a categoria infância como ambiência privilegiada do começo da vida, desenvolvimento e início da humanidade.