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Emergência Guarani-Mbyá nas Missões Jesuíticas. Novos atores no Patrimônio Cultural?
Ana Luisa Jeanty Seixas; Eber Pires Marzulo
Ana Luisa Jeanty Seixas; Eber Pires Marzulo
Emergência Guarani-Mbyá nas Missões Jesuíticas. Novos atores no Patrimônio Cultural?
Guarani-Mbyá emergency in Jesuit missions: new actors in cultural heritage
Em Questão, vol. 26, pp. 43-67, 2020
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
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Resumo: O artigo trata do processo de valorização patrimonial e da intrínseca necessidade de problematizar ideias estabelecidas, desde uma abordagem que incorpore novos atores à questão patrimonial. Se a ideia de patrimônio cultural vem se modificando ao longo dos anos, apenas muito recentemente tem ocorrido a inclusão de atores sociais fundantes do próprio patrimônio nas regiões do globo colonizadas pelas potências europeias a partir do século XV, em especial nas Américas. Os “novos atores sociais”, muitas vezes são agrupamentos presentes desde a pré-história nos territórios com bens patrimonializados, mas que não tiveram seu legado reconhecido como patrimônio cultural, ou apenas há pouco tempo e mesmo assim de maneira subordinada e secundária. Para analisar a questão se toma como caso as Ruínas Jesuíticas Guarani, em São Miguel das Missões, no Rio Grande do Sul/Brasil, patrimônio reconhecido oficialmente há quase um século, cuja valorização da cultura Guarani ainda precária e incompleta é constrangedoramente recente. Em particular, será analisado o processo de reconhecimento da dimensão imaterial Guarani do bem “Tava, Lugar de Referência para o Povo Guarani”, declarada patrimônio cultural brasileiro em 2014. A análise da valorização da Tava como patrimônio será realizada a partir da compreensão de diferentes narrativas constitutivas de um mesmo bem cultural. As formulações aqui apresentadas partem de pesquisa em andamento e se inserem no interior da abordagem da crítica à perspectiva colonial da patrimonialização.

Palavras-chave:Patrimônio CulturalPatrimônio Cultural,Novos atores sociaisNovos atores sociais,MissõesMissões,TavaTava,Guarani-MbyáGuarani-Mbyá.

Abstract: The article proposes a discussion on the return and repatriation of objects and collections, as a way of addressing the human rights. The central problem is in the human remains as musealia loaded with coloniality in the construction of museality and musealization. What for the museum is a “thing” or object, for the indigenous is a human being, according to the indigenous visions and voices brought to the article, which reinforce a vision of indigenous spirituality. This spiritual vision must be known by museum professionals to build new museum practices and new relationships between indigenous people and museums, all based on respect.

Keywords: Cultural Heritage, New Social Actors, Missions, Tava, Guarani-Mbyá.

Carátula del artículo

Emergência Guarani-Mbyá nas Missões Jesuíticas. Novos atores no Patrimônio Cultural?

Guarani-Mbyá emergency in Jesuit missions: new actors in cultural heritage

Ana Luisa Jeanty Seixas1
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Eber Pires Marzulo2
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Em Questão, vol. 26, pp. 43-67, 2020
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Recepção: 29 Julho 2020

Aprovação: 29 Setembro 2020

Financiamento
Fonte: Financiamento
Beneficiário: Eber Pires Marzulo
1 Introdução

Era outubro de 2018 quando a “Tava, Lugar de Referência para o Povo Guarani[1], localizada no Sitio Histórico de São Miguel Arcanjo em São Miguel das Missões no Rio Grande do Sul, foi reconhecida como Patrimônio Cultural do Mercosul. Alguns anos antes, em dezembro de 2014, este bem[2] foi inscrito no Livro de Registro[3] de Lugares, tornando-se assim, patrimônio cultural imaterial brasileiro. Os dois processos de reconhecimento como patrimônio, em âmbito nacional e do Mercosul – foram resultado de anos de trabalhos intensos e longos que buscavam entender a presença Guarani-Mbyá[4] no Sítio de São Miguel Arcanjo:

A presença diária dos Guarani-Mbyá, sentados no alpendre do museu para venda de seu artesanato, ou circulando silenciosos pelo sítio, constituía-se numa situação paradoxal para o IPHAN, pois não apenas a exposição do Museu das Missões, mas todo o tratamento dispensado aos sítios missioneiros patrimonializados pouco se referiam aos indígenas. (IPHAN, 2014a, p. 4)

O processo de reconhecimento e valorização da cultura Guarani-Mbyá, ou pelo menos aquela entendida como oficial Guarani-Mbyá pelos órgãos de preservação, colocou a questão indígena no interior da discussão que ocorria no Brasil, de maneira mais institucionalizada, sobre a necessidade de se pensar políticas públicas culturais patrimoniais que possam efetivamente tratar o patrimônio cultural em sua complexidade, em especial nas distintas temporalidades que lhe configura. Ao longo do processo de patrimonialização da região das Missões iniciado em 1922 com o reconhecimento pelo governo gaúcho das Ruínas de São Miguel como lugar histórico, a presença Guarani-Mbyá, “[...] quase sempre discreta e silenciosa, nem sempre era percebida” (IPHAN, 2014a, p. 6). Passou quase um século após a valorização do bem material das Ruinas de São Miguel Arcanjo para que o significado cultural atribuído ao Sítio pelos Guarani-Mbyá fosse reconhecido como parte formadora importante desse patrimônio, mesmo que a relevância do povo Guarani-Mbyá estivesse desde sempre lá marcado na própria nomeação das Missões Jesuíticas Guarani.

No Dossiê de Registro[5] da Tava, os técnicos envolvidos indicam que é necessária uma nova maneira de contar esse patrimônio (IPHAN, 2014a). Embora “superado pela historiografia e etnologia produzida nas últimas décadas, continua sendo difundido” (IPHAN, 2014a, p. 4) o jesuíta como herói civilizador e os indígenas como “bons e habilidosos aprendizes, desempenhando apenas um papel secundário no processo de constituição e perpetuação do sistema missionário” (IPHAN, 2014a, p. 4). Na década de 1990, quando da reorganização do Museu das Missões se tornou pertinente e importante, com a revisão e ampliação do tema desde novas fontes e pesquisas, a problematização da visão jesuítica difundida e oficializada, através da necessária incorporação da dimensão imaterial do patrimônio. A incidência da cultura Guarani-Mbyá no patrimônio missioneiro passava a ser incontornável. No entanto, os bens culturais Sitio Histórico e as ruínas da Igreja, seguem mais valorizados que a Tava, embora o processo de patrimonialização exista para as duas dimensões, material e imaterial. Mesmo que legalmente ambas possuam a mesma importância como bens a serem protegidos pelo Estado, por representarem e serem formadores da identidade nacional, nas ações e nas políticas públicas se observa distinção de tratamento. As políticas e ações institucionais indicam que o bem material é objeto de maior investimento financeiro e de recursos humanos.

Se as mudanças de abordagem em relação aos bens valorizados têm se ampliado com novos focos temáticos e discussões no campo patrimonial, ainda não se alteraram os instrumentos de gestão e políticas de preservação que permanecem ligadas à valorização do bem material derivado da história colonizadora, tal como demonstrará o caso em análise do Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo/Tava[6].

Ao se reconhecer a presença no Território Missioneiro de variadas possibilidades de narrativas e atores sociais com diferentes temporalidades, foca-se a análise na narrativa do patrimônio Jesuítico-Guaraní em função da relevância no processo de colonização das Américas das Missões Jesuíticas e na América do Sul a importância do povo Guarani. A sua hipotética dominação teve como central a função da Companhia de Jesus, por meio da implantação das Missões em territórios que hoje são parte do Brasil, Argentina e Paraguai. E a recente valorização da Tava como patrimônio imaterial, que até o presente momento é o único patrimônio com reconhecimento pela sua dimensão imaterial Guarani no contexto do patrimônio missioneiro brasileiro.

O artigo está estruturado em 5 seções. Sendo a primeira esta Introdução, na seguinte se realiza uma breve reflexão sobre a ideia de patrimônio e apresenta-se em traços gerais a história da preservação patrimonial no Brasil. O caso em análise de Missões é analisado em termos históricos na terceira seção, em que se trata das transformações nas valorizações do patrimônio missioneiro desde 1922 e a relação com as discussões acadêmicas no campo do patrimônio, em especial no Brasil e América do Sul, problematizando-se em especial o reconhecimento da Tava do povo Guarani-Mbyá a partir do reconhecimento da sua narrativa. Em Tensionando a ideia patrimonial, na quarta seção, aprofunda-se o significado do reconhecimento da Tava e dos problemas ainda inerentes ao substrato colonial da patrimonialização. Isso ocorre mesmo ao se reconhecer a relevância de novos atores, no caso atores anteriores à própria existência da materialidade patrimonializada e razão da empreitada colonial através das Missões Jesuíticas. Na última seção, à guisa de projeto inconcluso da questão da patrimonialização e sua valorização na experiência colonial nas Américas, aborda-se o sentido político e transformador desse processo patrimonial, na medida em que se reconheça com a devida relevância a perspectiva dos povos originários e seu impacto no projeto de sociedade nacional.

2 Construindo a ideia patrimonial

Enquanto a concepção de patrimônio cultural ampliou-se ao longo do tempo (CASTRIOTA, 2009; FIGUEIREDO, 2014; SANT’ANNA, 1995), a preservação patrimonial parece nos mesmos ideais baseados em modelos europeus, não incluindo, ou incluindo de uma maneira muito superficial, novos atores e valores identificados ao longo dos anos, em especial de práticas, de produções e de agrupamentos sociais de povos originários e/ou subalternizados pela experiência colonial. Se o patrimônio está intrinsicamente articulado à memória, narrativa e significado, sua definição parte de uma seleção do que é considerado ou não importante para um agrupamento, povo, identidade e/ou nação. A ideia de patrimônio ao remeter imediatamente à memória[7] e à história, instaura no presente dimensões identitárias desde uma trajetória temporal, em processo de identificação e valorização para gerações futuras de partes do passado, enquanto herança cultural capaz de dar sentido a processos de identificação (GUTIÉRREZ, 1989). Nesse sentido, os bens culturais e os monumentos, criados especificamente para isso ou não, remetem e incidem na construção da identidade de uma sociedade ou agrupamento social.

Ao entender o patrimônio como uma manifestação da memória, se compreende que os bens materiais, sejam cidades, edificações, monumentos, assim como os bens imateriais, sejam festas, rituais, saberes e lugares, são práticas sociais de agrupamentos que configuram e afirmam seus valores e costumes (SEIXAS, 2014). Todavia, o discurso tradicional do patrimônio subjacente às ações de preservação apresenta uma visão eurocêntrica do patrimônio cultural, uma concepção que remonta a Revolução Francesa, desde a ideia de “patrimônio nacional” surgido com o sentido de proteger a propriedade pública e evitar pilhagens (SANT’ANNA, 1995).

No Brasil, a institucionalização das práticas de preservação, iniciada com a aprovação do Decreto-Lei nº 25, em 1937, que “[...] organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional” (BRASIL, 1937) e consolidada com a criação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1938, legitima a política de preservação e indica diretrizes a serem seguidas no campo do patrimônio. Ao longo de sua trajetória como órgão responsável pela preservação do patrimônio cultural, o IPHAN esteve voltado aos bens materiais, com foco nas edificações. Desde sua fundação, o Instituto passa por diferentes fases, com diversas ações e intervenções nos bens tombados, nas áreas de entorno[8] e nas cidades em geral.

Em sua “Fase Heroica”, entre 1937 até 1967, o IPHAN busca a construção da identidade e procura por bens culturais que melhor representassem o que era o “ser brasileiro”, através do estabelecimento de bens materiais, mais especificamente coloniais luso-brasileiros e modernos, e na estruturação das políticas patrimoniais e do órgão em si (FONSECA, 2009). Entre os anos de 1968 e 1979, identifica-se a chamada Fase Moderna, com novos questionamentos sobre o que deveria ser considerado Patrimônio Nacional (FONSECA, 2009). Nesse contexto, busca-se a ampliação da ideia de patrimônio cultural entendendo que “[...] mudando o necessário e conservando o imprescindível, talvez possamos preservar a memória nacional — até aquela feita em barro pelas mãos dos mais humildes e anônimos artesãos” (MAGALHÃES, 1997, p. 188). Essa proposta promoveu uma alteração nos valores então enraizados no IPHAN, através da formulação de que o “melhor guardião do patrimônio é a comunidade” (BLOG DO MAMAM, 2020). Surgia outra concepção do IPHAN e logo outra narrativa do valor dado ao patrimônio. Foi o momento em que, de maneira mais institucionalizada, ocorre uma atenção aos novos atores sociais: aqueles mais simples e não necessariamente identificados pelas edificações icônicas luso-brasileiras ou modernas. Embora houvesse essa indicação de ampliação de conceitos e a concretização de algumas ações muito importantes, como a criação do Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC), no corpo técnico do IPHAN permanecia a concepção de arquitetos urbanistas com o foco nos bens materiais e com uma visão eurocêntrica e elitista da preservação e do patrimônio. No período da ditadura militar (1964-1985), ocorre uma modernização do aparelho estatal, cujo efeito no âmbito das políticas patrimoniais se dá por meio de investimentos voltados para o desenvolvimento de cidades turísticas.

Principalmente a partir de 1980, em virtude do crescimento das grandes cidades nos anos de 1970 e do fortalecimento das organizações civis, o interesse pela definição de normas e de planejamento urbano para as cidades se ampliou, incidindo na inclusão das questões de preservação em planos diretores urbanos e na criação de dispositivos de preservação em leis de ordenamento e uso do solo, através da proposição de instrumentos para uma reforma urbana (SANT’ANNA, 2017). Na década de 1990, ocorre um período de revitalização dos centros urbanos e uma relação mais acentuada com o turismo (MEIRA, 2004), provocando a chamada artificialização (SANT’ANNA, 2017). Os bens culturais adquirem um papel predominante de atrativo cultural, como objetos turísticos a serem valorizados e que poderiam reverter em dinamismo econômico para a cidade. Nesse momento, cultura e patrimônio passam a ser vistos como ferramentas da refuncionalização das cidades, recurso estratégico da economia urbana e da competição entre cidades, por meio da articulação do mercado turístico e imobiliário à economia cultural/criativa.

A partir dos anos 2000 (FIGUEIREDO, 2014), novos instrumentos e ações do Estado propõem ação direta na dinâmica das cidades de maneira mais integrada e articulada aos patrimônios culturais. Em 2000 o Decreto nº 3551 “Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, (que) cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial” (BRASIL, 2000). Através do instrumento do Registro, se constitui formalmente o patrimônio imaterial como parte do patrimônio cultural brasileiro, conforme a Constituição Brasileira (BRASIL, 1988). A partir de sua institucionalização como patrimônio nacional, os bens de valores imateriais passam a ser objeto de políticas públicas específicas para a sua valorização. Com a criação do Departamento do Patrimônio Imaterial (DPI) no IPHAN em 2004, inicia-se a documentação dos povos indígenas, utilizando a metodologia do Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) para se aproximar dessas comunidades. Assim, é realizado o trabalho piloto com dois povos indígenas, que são os grupos que convivem na região de São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro (AM), e outro junto aos Guarani-Mbyá, que vivem em São Miguel das Missões (RS). Isso demonstrava a inserção, agora de maneira plenamente institucionalizada, de novos atores nas políticas de preservação e de patrimônio.

3 Aplicando a ideia patrimonial: o caso de Missões

A região das Missões, localizada no noroeste gaúcho brasileiro, possui a história relacionada diretamente ao início da ocupação luso-espanhola no local, nos séculos XVII e XVIII. A partir do século XVII a ordem religiosa Companhia de Jesus, fundou reduções em terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, situadas nos atuais territórios do Paraguai, Argentina e Brasil, e que formavam uma unidade territorial - a Província Jesuítica do Paraguai (figura 1), o que permitia a colonização dos territórios conquistados pela Coroa Espanhola (IPHAN, 2014a).


Figura 1
América do Sul com a indicação da Província Jesuítica do Paraguai.
Fonte: IPHAN/RS (2015)


Figura 2
Trinta Povos das Missões nos atuais Paraguai, Argentina e Brasil.
Fonte: IPHAN/RS (2015)

A Província Jesuítica do Paraguai era composta por trinta reduções/povoados (figura 2), aldeias criadas para facilitar a evangelização dos povos nativos, a missão evangelizadora, resultando daí o nome Missões. Essa apropriação espacial permitia garantir a posse do território[9] através de uma ocupação sistematizada. O declínio das Missões inicia-se com o Tratado de Madri[10] em 1750, um acordo entre as coroas de Portugal e de Espanha que desencadeou a Guerra Guaranítica entre 1753-1756, na qual as Coroas saíram vitoriosas contra os indígenas e jesuítas. Após os tratados de delimitação de fronteiras, esse tipo de ocupação perde força, principalmente após a expulsão dos jesuítas em 1767 e das tentativas de continuidade do sistema reducional que foram fracassadas. As terras passam por um longo período de abandono desse tipo de ocupação, embora ainda permanecessem habitadas até o final do século XIX. A partir de meados do século XVIII, ocorrem os processos de imigração por meio da vinda de casais açorianos para o sul do Brasil, porém o processo migratório para a região ocorre de forma mais intensa entre o final do século XIX e início do século XX, com a vinda principalmente de alemães, italianos e poloneses que se instalam na região (STELLO, 2013).

A atenção patrimonial para a região das Missões emerge de maneira institucionalizada em 1922, quando o Estado do Rio Grande do Sul declara as Ruínas de São Miguel Arcanjo, na cidade de São Miguel das Missões, como Lugar Histórico, indicando assim uma valorização do bem (MEIRA, 2008). Em âmbito nacional, a atuação na região das Missões, sobretudo no Sítio de São Miguel Arcanjo, coincide com a trajetória da preservação do patrimônio nacional e do IPHAN. Em 1937, no mesmo ano de criação do IPHAN, o arquiteto Lúcio Costa realiza uma viagem às Missões para verificar os remanescentes das Missões Jesuíticas dos Guarani, viagem que resulta em relatório com recomendações sobre as ações de conservação das estruturas e a proposta da construção do Museu das Missões para abrigar as peças de arte sacra produzidas nas Reduções. No ano seguinte, em abril de 1938, o primeiro bem imóvel é tombado em nível federal no Rio Grande do Sul: uma casa construída com material missioneiro, ou seja, material reaproveitado das ruínas das reduções, no município de Entre-Ijuís. Infelizmente, a edificação foi sendo demolida aos poucos posteriormente. Em maio do mesmo ano, ocorre o tombamento das Ruínas de São Miguel Arcanjo como Patrimônio Nacional, através da sua inscrição no Livro de Belas Artes devido ao seu valor artístico, de excepcionalidade e monumentalidade. Trinta e dois anos depois, em 1970, ocorre o tombamento dos Sítios de São João Batista (Município de Entre-Ijuis); São Lourenço Mártir (Município de São Luiz Gonzaga), e São Nicolau (Município de mesmo nome), declarados Patrimônio Nacional e inscritos no Livro Histórico (SEIXAS; SILVA, 2016; SEIXAS; HAHN, 2017). Em 1978 foi inaugurado o espetáculo de Som e Luz nas ruinas de São Miguel, que narra a experiência Jesuítico Guarani, com abordagem eurocêntrica do jesuíta heroico e do indígena submisso, evento que até hoje é apresentado no sítio de São Miguel Arcanjo. Em 1983 a UNESCO inscreveu as ruínas de são Miguel Arcanjo na Lista do Patrimônio Mundial, juntamente com as ruínas de San Ignacio Mini, Santa Ana, Nuestra Señora de Loreto e Santa María La Major da Argentina, pelo excepcional valor universal e arquitetônico, bem como por serem importantes exemplares da atuação da Companhia de Jesus nas terras sul americanas.

A comunidade Guarani-Mbyá está presente na região, em acampamentos efêmeros e transitórios, pelo menos desde os anos de 1940, quando se têm registros de uma aldeia na Mata de São Lourenço, localizada entre São Miguel e São Luiz; e nos anos 1970 pela existência de acampamentos próximos a São Miguel (IPHAN, 2014a). Na década de 1990, um grupo de índios Guarani-Mbyá volta a se estabelecer nas imediações do Sítio de São Miguel, junto à chamada fonte missioneira, estrutura de abastecimento de água do período reducional, e recebe autorização para a venda de artesanato dentro do Sítio, no alpendre do Museu das Missões. Em 1996 é construída a Tekoa Koenju (Aldeia Alvorecer), na reserva indígena do Inhacapetum, localizada a 27 quilômetros de São Miguel das Missões, ano em que nasce a primeira criança na nova aldeia, Miguelina Romeu, o que se constitui num marco do “[...] retorno dos Guarani-Mbyá às Missões” (IPHAN, 2014a). Em virtude da distância entre a reserva indígena e a sede do município de São Miguel das Missões, onde estão o Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo, as ruínas e o Museu, local em que são vendidos os artesanatos indígenas, foi permitido que os Guarani-Mbyá ocupassem uma casa em situação precária e, em 2005, foi construída uma Casa de Passagem, permitindo aos indígenas a estadia na cidade para a venda do artesanato no Sítio Histórico (IPHAN, 2014a).

A consolidação da presença indígena na região gerou uma série de questionamentos por parte da comunidade e das autoridades sobre a relação entre a comunidade Guarani-Mbyá com os indígenas do período missioneiro (IPHAN, 2014a). Tais questionamentos foram responsáveis pela aplicação entre 2004 e 2008 do INRC junto ao povo Guarani-Mbyá de São Miguel das Missões, o que

[...] possibilitou a identificação de práticas e saberes considerados pelos Guarani-Mbyá como fundamentais para experenciarem seu nhande rekó (o bom modo de viver), muitos dos quais não são vivenciados como deveriam, em razão do acesso limitado às matas e à terra. (IPHAN, 2014, p. 7)

Em 2007, após a realização de encontros com as lideranças Guarani, foi aberto o Processo de Registro de Lugar, considerando a importância do lugar para os Guarani-Mbyá, devido à localização ali do espaço da Tava.

Enfim, a Tava é um lugar relacionado à sua memória e que, pela presença dos remanescentes daquilo que foi construído por mãos indígenas, apresenta uma condição singular de visualidade de significados que expressam a compreensão do mundo Guarani, no tempo presente. Além disso, por meio da Tava, os Mbyá interpretam o evento histórico - as Missões - incorporando-o às suas narrativas e reelaborando-o segundo a lógica de sua cosmologia. Tais sentidos dados à Tava permitem acionar sentimentos de pertencimento e identidade. (IPHAN, 2020, não paginada)

Em 2009 foi criado o Parque Histórico Nacional das Missões – PHNM, consequência de uma nova etapa das discussões sobre patrimônio em nível internacional e nacional. Com ele, buscou-se a integração dos quatro sítios missioneiros de São Miguel Arcanjo, São Nicolau, São Lourenço Mártir e São João Batista. Em dezembro de 2014 a Tava Lugar de Referência para o Povo Guarani-Mbyá é registrada como Patrimônio Cultural Imaterial Nacional, reconhecendo-se os significados e valores atribuídos pelos Guarani-Mbyá ao Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo. Concomitante ao registro da Tava e da declaração como Patrimônio do Mercosul, e como resultado de discussões e amadurecimento internos do IPHAN, em 2013 é lançado o Projeto de Valorização da Paisagem Cultural e do Parque Histórico Nacional das Missões Jesuíticas dos Guarani-Mbyá, produzido pelo IPHAN com a cooperação da UNESCO. No ano de 2015, novamente acompanhando discussões internacionais sobre a temática patrimonial e ampliando o entendimento das Missões para além dos Sete Povos atualmente no território brasileiro, ocorre o reconhecimento das Missões Jesuíticas Guarani-Mbyá, Moxos e Chiquitos, na Bolívia, como Patrimônio do Mercosul. Em 2018, a Tava passa a ser reconhecida também como Patrimônio do Mercosul.

Desde o início da política de preservação no Brasil, a região das Missões é objeto de políticas públicas de reconhecimento e patrimonialização nas mais diferentes esferas e escalas, acompanhando as diversas fases e ampliações do conceito de patrimônio, em especial no Brasil (SEIXAS; SILVA, 2016; SEIXAS; HAHN, 2017). Narrativas como a Guarani-Mbyá foram institucionalmente valoradas há pouco tempo e ainda assim em posição aparentemente hierarquicamente subalterna ao patrimônio colonial. Enquanto isso, outras narrativas, como as da imigração, ainda não fazem parte da discussão institucionalizada, e permanecem excluídas do processo oficial de valorização do território missioneiro.

4 Tensionando a ideia patrimonial

O poder de um grupo dominante se apresenta por meio do estabelecimento da narrativa oficial com implicação no caso do patrimônio na definição da identidade valorada. Se inicialmente o serbrasileiro era ligado à arquitetura luso-brasileira e moderna, encontram-se desde os primórdios a existência de narrativas alternativas e não hegemônicas que colocam a participação central de outros povos na constituição da nacionalidade brasileira (VIVEIROS DE CASTRO, 2015). Nas décadas de 1960/1970, a noção de patrimônio se ampliou no Brasil e em 2000, através do Decreto nº. 3551 (BRASIL, 2000), instituiu essa ampliação pontual e paulatina com a inclusão de povos e imaterialidades como patrimônio. Entretanto a narrativa oficial, embora ampliada e mais inclusiva, ainda apresenta uma base de pensamento eurocêntrica explicitada na legislação. A necessidade de um reconhecimento da relevância de outros padrões materiais e imateriais, além do colonial europeu-ocidental, nas formações culturais nacionais colonizadas implica na compreensão que “[...] a história do mundo escrita por europeus corresponde à experiência europeia e não à sensibilidade e experiências de todo o mundo” (MIGNOLO, 2008, p. 245). A legitimação e reconhecimento das comunidades locais e dos povos originários, em especial, problematizam as narrativas oficiais já estabelecidas e as delas decorrentes. O patrimônio, enquanto prática social de um grupo e como parte formadora das identidades nacionais (GUTIÉRREZ, 1989), estabelece uma narrativa conforme os interesses daqueles que exercem e exerceram o poder dominante ao longo do tempo, constituindo uma narrativa oficial da história e da cultura excludente dos povos e das práticas originárias e de outros subordinados no processo colonizador.

Se as Missões fazem parte da identidade brasileira, sendo construídas no imaginário como um dos pilares da formação nacional, desde a narrativa oficial estabelecida e difundida pela literatura e artes que indica, e reconhece recentemente, a presença fundante dos Guarani-Mbyá como parte formadora do bem patrimonializado Missões, só o faz em função da relação com o projeto colonial europeu e sob o jugo deste. Isso parece ser uma inversão, pois a relevância da implantação das Reduções Jesuíticas para o projeto colonial consiste na força do significado pré-colonial da presença do povo Guarani-Mbyá no continente, razão pela qual as Missões e seu projeto evangelizador foram realizados em território Guarani. Todavia, a valorização patrimonial ocorre quase um século depois dos primeiros processos de patrimonialização das edificações jesuíticas. As políticas de preservação foram, desde o princípio, destinadas ao patrimônio material das “Missões Jesuíticas” e os Guarani-Mbyá colocados à parte desse processo e, quando incluídos, o foram em situação subordinada e de submissão (IPHAN, 2014a).

A seleção de bens patrimoniais no início do movimento de preservação no País buscava identificar e formar a identidade nacional a partir de bens que representassem para a construção do Estado Brasileiro, “[...] aquilo que foi classificado como arquitetura tradicional do período colonial, representante ‘genuína’ das origens da nação” (CHUVA, 2009, p. 48) associado à Europa cristã e branca. Embora o Sitio Histórico de São Miguel Arcanjo seja reconhecido como patrimônio desde 1922, a história apresentada até os anos 20 do século XXI ainda insiste em valorizar mais a experiência de sociedade e de evangelização e o bem material da Igreja barroca construída em terras sul-americanas do que o significado para a maioria da população indígena que ali habitava: havia cerca de cinco a sete mil indígenas e apenas dois ou três padres jesuítas (IPHAN, 2014a). No entanto, sempre foi o papel e o legado jesuíta destacado e reconhecido, enquanto os povos originários eram colocados à margem, mesmo sendo uma sociedade com grandes avanços artísticos e tecnológicos[11].

A narrativa colonial valorizada e assim hegemônica fundamenta as políticas públicas patrimoniais e os instrumentos regulatórios, desde uma epistemologia que será atribuída ao território e sobre o patrimônio, movimento que encontra resistência de larga duração pelo povo Guarani e que provoca modificações epistemológicas ao terem seus saberes reconhecidos. Como palco de importantes fatos que definiram o território brasileiro e sul americano, com desdobramentos na história mundial, as Missões apresentam um vasto patrimônio e bens culturais que estão sendo lentamente resgatados. A complexidade do território das Missões (STELLO, 2013; SEIXAS; SILVA, 2016; SEIXAS; HAHN, 2017) e a presença de outros bens passíveis de patrimonialização na região, e para além dela, compreendendo-se a experiência missioneira e a relação com os Guarani como muito mais profunda e extensa, aponta a inclusão de demais processos histórico-culturais que se seguiram ao período reducional. O patrimônio das Missões Jesuíticas, incluindo-se os Guarani, trata-se de um bem com valor imensurável que extrapola o território delimitado como das Missões (figura 3).


Figura 3
Mapa Guarani Digital indicando a presença da população no território atualmente
Fonte: Pierri (2020).

Na medida em que se têm outros pontos no território sul-americano relacionados ao processo histórico da presença dos jesuítas associada aos Guarani constituindo uma rede territorial, impõe-se a necessidade ao projeto nacional brasileiro o reconhecimento e a valoração de cultura e de saberes tradicionais anteriores, simultâneos e posteriores à experiência colonial. Ampliam-se dessa forma e incorporam-se como parte constitutiva da nacionalidade brasileira as experiências pré-coloniais e sua continuidade em diferentes períodos temporais como também sua inserção em distintos arranjos socioeconômicos. Essa abordagem traz em si uma perspectiva epistêmica em que o referencial eurocêntrico de tempo e espaço e vida e morte fundado na ideia de delimitação e assim de fronteiras são necessariamente problematizados.

As várias ruínas que se espalham pelo território de ocupação tradicional Guarani-Mbyá, tanto no que foi a Região Missioneira, como no litoral, e as demais casas de pedra marcam e delimitam os deslocamentos das populações Mbya, no seu território que estão relacionadas aos caminhos percorridos pelos seres imortais, conforme relatado nos mitos. Elas foram deixadas por Nhande Ru Miri para marcar o caminho tradicional dos Guarani-Mbyá (IPHAN, 2014a, p. 32)

A presença Guarani-Mbyá não se limita ao Sítio Histórico ou à Aldeia, estando sua existência relacionada a diferentes lugares com importância para sua cultura, cuja identificação pelos próprios indígenas apresenta uma área mais ampla e transfronteiriça (ver figura 3).

O Dossiê da Tava (IPHAN, 2014a) e o Parecer do Departamento de Patrimônio Imaterial – DPI (IPHAN, 2014b) indicam que esse processo de identificação e de valorização do discurso Guarani-Mbyá se faz necessário uma vez que há “[...] significados e sentidos atribuídos pelo povo indígena Guarani-Mbyá ao sítio histórico que abriga os remanescentes da antiga Redução Jesuítico-Guarani de São Miguel Arcanjo” (IPHAN, 2020, não paginado). No processo administrativo de Registro está destacado que “[...] os valores que motivaram o tombamento não abarcavam a importância que ele tem como referência cosmológica para esse povo indígena” (IPHAN, 2014b p. 298V). A Tava indica não apenas uma estrutura física, mas um sentimento de pertencimento constitutivo da identidade do povo Guarani-Mbyá.

[...] tal presença relembra aos Mbyá quem eles são, catalisa sentimentos de pertencimento. Trata-se de um lugar onde se concentram lembranças de práticas culturais coletivas que devem ser vivenciadas. Nesse sentido, a Tava em São Miguel Arcanjo é um lugar de referência para os Mbyá, a partir do qual eles pretendem contar sua história. (IPHAN, 2014b, p. 34)

Nas falas Guarani-Mbyá se tem a exposição de sua própria narrativa em oposição à oficial jesuítica-colonial, em que apresenta uma inversão quase simétrica da concepção das Missões como afirmação de um hipotético domínio colonial historicizado ao ser atribuído aos brancos ciúmes das ruínas por (n)ela estar/ser a Tava, espaço Guarani sobre o qual foram construídas as edificações jesuíticas e que assim a eternizaram e materializaram. Trata-se de uma interpretação possível dos relatos dos Guarani-Mbyá em que emerge uma concepção que apresenta a construção das Missões pelos jesuítas como a realização da Tava. No relevante documentário Tava – A Casa de Pedra (2012), realizado por um grupo de jovens indígenas Guarani-Mbyá, encontram-se formulações sobre a sua visão das ruinas de São Miguel Arcanjo, tais como:

Os brancos têm ciúmes das ruínas, porque encontraram elas. Temos que contar as histórias da Tava, pra tocar o coração deles e eles nos darem uma situação melhor, reconhecerem nosso direito. Nhande Ru deixou pra gente, mas os brancos não sabem. (TAVA - A CASA DE PEDRA, 2012)

O patrimônio das Missões emerge como profundamente relevante para os indígenas, ao remeter à existência anterior daquele espaço no mundo simbólico Guarani-Mbyá como Tava, cujo reconhecimento institucional e valoração poderão significar uma atribuição de direitos, tornando de modo explícito a patrimonialização uma disputa política que pode resultar no empoderamento de populações originárias e/ou tradicionais. Todavia, embora com o reconhecimento do patrimônio, as ações de preservação têm sido apenas pontuais e muitas vezes desconexas das formas de planejamentos mais abrangentes, sem levar em conta a relevância para o povo originário Guarani e para a constituição da nacionalidade brasileira. Se há avanços pelo reconhecimento do patrimônio de novos atores, no caso das Missões a comunidade Guarani-Mbyá, não se detectam ações em políticas públicas efetivas para a salvaguarda patrimonial. Esse é um problema reconhecido no Dossiê do próprio IPHAN

O reconhecimento do direito de narrarem sua história na Tava, vai ao encontro de outras vitórias que os Mbyá obtiveram, lentamente, ao longo de anos. Eles conquistaram o direito de permanecerem no sítio histórico, ou melhor, na Tava, conseguiram a construção de uma casa de passagem e a possibilidade de venderem artesanato, bem como de realizarem reuniões e apresentações. Mas, querem consolidar sua presença e fazer ouvir sua voz. Só assim será possível tê-los respeitosamente junto a um patrimônio cultural da humanidade, atendendo ao princípio que emana da Constituição Federal Brasileira de 1988, que reconhece os grupos formadores da sociedade como sujeitos legítimos das políticas de preservação. (IPHAN, 2014a, p. 47)

Do investimento significativo em obras nas Ruínas ou na dimensão material do bem desde os princípios da conservação (STELLO, 2005) até recentemente, antes da política deliberada do governo federal anti-patrimonial (2018), não correspondem ações de mesma envergadura e relevância ao patrimônio Guarani-Mbyá. Esse fato pode ser percebido em uma busca no site do IPHAN (2020), por exemplo, que não noticia nenhuma ação específica de salvaguarda da Tava, desde sua declaração como patrimônio imaterial brasileiro em 2014. Entretanto, informa ações em relação à dimensão material do bem Ruínas, como, por exemplo o projeto de requalificação urbana no entorno imediato do Sítio de São Miguel. Embora haja ações mais amplas propostas pelo IPHAN no período citado (2014 - 2020), como a exposição 7 Povos: Retratos de Um Território (2019) e o Ano internacional das Línguas Indígenas, lançado pela Unesco (2019), não é possível identificar pelos dados disponíveis no site, ações específicas de salvaguarda da Tava. Temas como a territorialidade livre, importante para a manutenção do modo de vida Guarani-Mbyá e que necessita de políticas públicas que permitam essa circulação por áreas hoje particulares, ou transfronteiriças, embora indicados como parte importante para a preservação do patrimônio, não foram, até o momento, noticiados como ação em desenvolvimento pelo IPHAN. A temática da territorialidade livre faz parte da condição Guarani-Mbyá, sendo importante para a sua identidade como tal:

Esse trânsito articula passado e presente, pois sua prática é relacionada à caminhada dos ‘antigos’, os que atingiram a condição de aguydje (imperecibilidade), almejada por todos. (...) Para os Guarani-Mbyá (...) caminhar entre as aldeias para visitar parentes, repetir os passos dos ‘antigos’ e fundar novas tekoás (aldeias) é um ato de exercício e de reforço de sua identidade. As tekoás são como os nós que mantém a força da rede. Precisam existir, mas sua população muda ao sabor das migrações de indivíduos e de famílias. (IPHAN, 2014a, p. 4)

As demandas dos Guarani-Mbyá para a salvaguarda da Tava se referem à possibilidade de continuar seu modo de vida e o direito a apresentar a sua narrativa. Algumas das linhas de salvaguarda apontadas no Dossiê (IPHAN, 2014, p. 48–49), indicam o reconhecimento da narrativa Guarani-Mbyá como legítima frente a oficial-colonial. Entre elas, citam-se oficinas para formação de pesquisadores, cineastas e de monitores indígenas para receber turistas; material audiovisual e livros sobre a Tava para ser distribuídos nas escolas; e a constituição de acervo para um Museu Guarani indica o reconhecimento da narrativa Guarani-Mbyá como legítima frente a oficial-colonial. Em alguma medida, propõe-se um protagonismo Guarani cujo sentido pode ser o de retirar sua narrativa de um papel secundário e subalterno nesse patrimônio. Trata-se de uma demanda do povo Guarani-Mbyá ao Estado que o reconhece como patrimônio cultural para contar sua narrativa e pelo significado que atribui ao bem cultural. Tal reconhecimento e perspectiva, no entanto, exigem a definição e implantação de políticas públicas capazes de efetivar o reconhecimento e sua valoração.

5 Considerações finais

A partir de uma breve reflexão sobre as origens do patrimônio e sua trajetória no Brasil, identificou-se a ampliação da ideia e do conceito de patrimônio que se movimenta em direção ao reconhecimento na constituição da nacionalidade brasileira, fundada pela presença de povos originários e outros não-integrados à narrativa da formação nacional. Para isso, foi analisado o caso de Missões, com a indicação das diferentes fases de valorização patrimonial, desde 1922 pelo menos. Embora presente na narrativa desde o princípio da patrimonialização das Missões, o significado Guarani através do povo Guarani-Mbyá obtém um protagonismo maior apenas na segunda década do século XXI, pelo reconhecimento da Tava mesmo que em posição subalterna e subordinada ao patrimônio material jesuítico-colonial das Ruínas.

Embora tenha sido um dos primeiros bens patrimonializados no Brasil e cujo processo de valorização ocorre antes mesmo da instituição oficial brasileira referente ao patrimônio cultural, tem-se uma narrativa oficial e consequentemente políticas públicas dela derivadas sobre as Missões que não incorporam o significado de atores sociais que permanecem por cerca de um século colocados à margem da história oficial e que no caso são a própria razão da produção do patrimônio colonial valorizado. O Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo, ou melhor, a Tava em sua inserção no interior da experiência missioneira se torna importante como caso a partir do instante em que há o reconhecimento de sua relevância em relação à identidade do povo Guarani-Mbyá e de sua particular valoração ao território. Ou, ainda, desde o que se sugere como uma perspectiva do povo Guarani-Mbyá, a compreensão da existência de uma inserção do projeto colonial jesuítico-missioneira materializado nas Ruínas no território Guarani cujo significado da territorialidade está associado ao espaço da Tava.

O Sítio Histórico de São Miguel Arcanjo, com as ruinas da igreja barroca do século XVII construída por indígenas sob orientação de padres jesuítas durante o projeto de evangelização da Companhia de Jesus, associada às coroas de Espanha e Portugal em terras sul-americanas, apresenta outro significado quando a narrativa é tomada na perspectiva do povo Guarani. Para os Guarani-Mbyá, trata-se de um local sagrado “[...] onde viveram seus antepassados, que construíram estruturas em pedra, nas quais deixaram suas marcas, ou melhor, parte de suas corporalidades” (IPHAN, 2014a, p. 1).

Se as ruínas de São Miguel Arcanjo para os brancos colonizadores e seus descendentes, ou para os juruá, os não-indígenas, tratam-se de “[...] vestígios materiais existentes [...] que permitem expressar esse singular modelo de ocupação territorial” {Formatting Citation}, para os Guarani-Mbyá seria a materialização de uma Tava, as “casas de pedra” que “[...] são lugares que já tiveram a presença de imortais, isto é, dos primeiros Mbyá, que se encantaram e hoje moram na Terra sem Mal” (IPHAN, 2014a, p. 7).

Ao se compreender que os valores patrimoniais e as narrativas sobre o mesmo território e materialidade, e em torno do mesmo bem material e imaterial, são diferentes e por diferentes e, por isso, requerem um tratamento que respeite as diferenças e sua complexidade, assume-se uma abordagem analítica cujo movimento se aproxima da crítica decolonial. O caso Guarani-Mbyá e Missões funciona para apresentar a necessidade e a urgência da manutenção e de identificação, para a composição de uma hipotética sociedade nacional brasileira, dos valores de diferentes povos que compõem a nacionalidade brasileira. Isso inclui desde políticas de preservação patrimoniais em que esses significados sejam reconhecidos, tal qual o discurso do colonial-europeu vem sendo produzido desde a própria emergência ocidental da ideia de patrimônio.

A exemplaridade não consiste no compartilhamento de uma mesma triste narrativa de desindianização – de captura por uma fraudulenta e falida empresa de “civilização” -, mas na capacidade de resistir, reagir, inverter essa narrativa, mostrando ao chamado “povo brasileiro” que ele é, pois continua a ser, uma multiplicidade tanto patente como latente de povos em estado de variação contínua; que ele contém uma imensa reserva inconsciente de diferença capaz de gerar muitos outros futuros diferentes deste com que nos acenam, deste que os poderosos determinam como sendo o único possível, o único desejável, e mesmo como o único, puro e simples, pois estaria já presentificado. (VIVEIROS DE CASTRO, 2015, p. 10)

maneira como se vê, como se monta, desmonta, remonta o patrimônio e a sua narrativa depende de disputas e de avanços nas pesquisas sobre as tensões inerentes e normalmente negadas do projeto colonial. Há outros tempos e outras narrativas possíveis sobre o mesmo patrimônio que devem alterar o sentido das políticas de preservação. Há outros patrimônios. Ao se indicar uma narrativa dentre várias possíveis do território missioneiro e estabelecer o reconhecimento da relevância sócio-histórica do povo Guarani-Mbyá, o próprio território entra em processo de ressignificação e de revalorização patrimonial com impactos possíveis no âmbito dos direitos junto ao Estado brasileiro. Diferentes abordagens devem ser perseguidas para que novas perguntas e questionamentos surjam no processo contínuo de constituição da(s) identidade(s) nacional (is) brasileira(s) com a inclusão de outros povos e nacionalidades.

A temática dos novos atores sociais no patrimônio identificado, no caso apresentado das Ruínas de São Miguel Arcanjo/ Tava, encontra-se em processo e sua complexificação traz contribuições tanto para a produção do conhecimento como para o estabelecimento de um novo pacto em que seja reconhecida a relevância histórica-sócio-cultural. Isso pode ocorrer através da patrimonialização dos agrupamentos originários e/ou aqueles historicamente constituídos como subalternos (MBEMBE, 2018). Afinal, o patrimônio cultural constitui e é constituinte da(s) identidade(s) de (um) povo(s) e/ou de (uma) nacionalidade(s).

A maneira como se vê, como se monta, desmonta, remonta o patrimônio e a sua narrativa depende de disputas e de avanços nas pesquisas sobre as tensões inerentes e normalmente negadas do projeto colonial. Há outros tempos e outras narrativas possíveis sobre o mesmo patrimônio que devem alterar o sentido das políticas de preservação. Há outros patrimônios. Ao se indicar uma narrativa dentre várias possíveis do território missioneiro e estabelecer o reconhecimento da relevância sócio-histórica do povo Guarani-Mbyá, o próprio território entra em processo de ressignificação e de revalorização patrimonial com impactos possíveis no âmbito dos direitos junto ao Estado brasileiro. Diferentes abordagens devem ser perseguidas para que novas perguntas e questionamentos surjam no processo contínuo de constituição da(s) identidade(s) nacional (is) brasileira(s) com a inclusão de outros povos e nacionalidades.

A temática dos novos atores sociais no patrimônio identificado, no caso apresentado das Ruínas de São Miguel Arcanjo/ Tava, encontra-se em processo e sua complexificação traz contribuições tanto para a produção do conhecimento como para o estabelecimento de um novo pacto em que seja reconhecida a relevância histórica-sócio-cultural. Isso pode ocorrer através da patrimonialização dos agrupamentos originários e/ou aqueles historicamente constituídos como subalternos (MBEMBE, 2018). Afinal, o patrimônio cultural constitui e é constituinte da(s) identidade(s) de (um) povo(s) e/ou de (uma) nacionalidade(s).

Material suplementar
Agradecimentos

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) – Bolsa Doutorado.

Referências
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BRASIL. Decreto no 3.551, de 4 de agosto de 2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasilia, 2000.
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VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. O índio em devir. In: HERRERO, Martina; FERNANDES, Ulysses (org.). Baré: povo do rio. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.
Notas
Notas
1 Nesse artigo optou-se pela grafia segundo o Dossiê de Registro, que destaca que as palavras em Guarani-Mbyá estão escritas em itálico (IPHAN, 2014, p. 1).
2 Entende-se, a priori, que “bens culturais” são bens que representam valores para algum grupo social e “patrimônio” ou “bem tombado/registrado” são os que possuem processo valorização oficial pelo Estado. Essa definição baseia-se nas ideias de Márcia Chuva (2009), entretanto atores como Castriota (2009) e Gutiérrez (1989) , entre outros, também abordam esse tema.
3 O instrumento de preservação utilizado para o patrimônio imaterial é o “registro”, enquanto para o patrimônio material trata-se de “tombamento”.
4 Optou-se por utilizar, seguindo a nomenclatura oficial do IPHAN, “Missões Jesuíticas dos Guarani” e “Tava – Lugar de Referência para o povo Guarani”; o nome “Guarani -Mbyá” será utilizado apenas para a denominação da comunidade.
5 Material produzido por técnicos do IPHAN e por pesquisadores contratados que serviu de base para o processo administrativo de reconhecimento desse patrimônio.
6 Optou-se por utilizar primeiro o nome de “Sítio” e depois “Tava” considerando a ordem cronológica da valorização desse bem: A dimensão material é reconhecida desde 1938 e a imaterial desde 2014.
7 Segundo Françoise Choay (2011) o termo monumento origina-se do latim “monumentum” que deriva do verbo “monere”, significando “advertir; lembrar à memória”.
8 Área na vizinhança dos bens tombados e que tem como objetivo preservar a sua ambiência.
9 É possível identificar que esse Território abrangia o que atualmente é Brasil, Argentina e Paraguai. No atual Brasil existem Sete desses Povos – os 7 Povos das Missões - São Francisco de Borja (1682), São Nicolau (1687), São Luiz Gonzaga (1687), São Miguel Arcanjo (1687), São Lourenço Mártir (1690), São João Batista (1697) e Santo Ângelo (1706).
10 O tratado previa a troca das missões orientais, o Sete Povos das Missões (pertencentes a Coroa Espanhola e localizados atualmente em território brasileiro) pela Colônia de Sacramento (pertencente a Coroa Portuguesa, atualmente em terras uruguaias). Em função desse tratado, todos os habitantes da região, definidos pelas duas coroas como população espanhola, deveriam abandonar as terras e bens e migrar para o território de Espanha, na outra margem do Rio Uruguai. Esse fato não foi aceito pelos indígenas que, apoiados pelos jesuítas, desencadearam uma série de enfrentamentos e batalhas pela permanência nas suas terras - a Guerra Guaranítica (1753-1756). Como consequência desse processo, conforme Custódio (2002, p. 51), os jesuítas foram expulsos de Portugal (1759), Espanha (1767) e da América (1768).
11 Diversos atores indicam isso, como Ramón Guttiérrez, Vladimir Stello, Luís Antônio Custódio, Ana Lúcia Meira, Jean Batista, Bartolomeu Meliá, entre outros.
Autor notes
1 Doutoranda; Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil;

analuisaseixas@gmail.com

2 Doutor; Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil

eber.marzulo@ufrgs.br


Figura 1
América do Sul com a indicação da Província Jesuítica do Paraguai.
Fonte: IPHAN/RS (2015)

Figura 2
Trinta Povos das Missões nos atuais Paraguai, Argentina e Brasil.
Fonte: IPHAN/RS (2015)

Figura 3
Mapa Guarani Digital indicando a presença da população no território atualmente
Fonte: Pierri (2020).
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