DOI: https://doi.org/10.5965/1982615x14322021030
Resumo: Este ensaio tem o objetivo de discutir a importância e as repercussões do avanço tecnológico dos sensores vestíveis na qualidade de vida. Após uma descrição das aplicações dos sensores vestíveis e da evolução da saúde digital, discutimos se biotecnologia, nanotecnologia, internet das coisas, inteligência artificial podem afetar a liberdade das pessoas. Para isso, a moda, como forma de compreender como acontecem as escolhas das pessoas, pode contribuir para o desenvolvimento adequado da qualidade de vida, discutindo como equilibrar a introdução dos sensores vestíveis no dia-a-dia, as liberdades individuais, e os interesses coletivos públicos e corporativos privados.
Palavras-chave: sensores vestíveis, liberdade, saúde, escolher.
Abstract: This essay aims to discuss the importance and repercussions of technological advance of the wearables in the quality of life. After the description of wearables applications and e-health development, we discuss how biotechnology, nanotechnology, internet of things, and artificial intelligence can affect freedom. Fashion, as the study of how people choose, can give important contributions to the development of proper quality of life. Fashion can help the discussions about how to balance the application of the wearables in daily life, individual freedom, and the welfare of the general public as well, the corporate interests.
Keywords: wearables, freedom, health, choice..
Resumen: Este ensayo tiene como objetivo discutir la importancia y las repercusiones del avance tecnológico de los sensores portátiles en la calidad de vida. Después de describir las aplicaciones de los sensores portátiles y la evolución de la salud digital, discutimos si la biotecnología, la nanotecnología, Internet de las cosas, la inteligencia artificial pueden afectar la libertad de las personas. Para ello, la moda, como forma de entender cómo suceden las elecciones de las personas, puede contribuir al adecuado desarrollo de la calidad de vida, discutiendo cómo equilibrar la introducción de sensores wearable en la vida diaria, las libertades individuales y los intereses de los colectivos corporativos públicos y privados.
Palabras clave: sensores portátiles, libertad, salud..
1 INTRODUÇÃO
A presença do ser humano no mundo não é silenciosa. O ser humano interfere no mundo de diferentes formas, como por meio da tecnologia. A tecnologia, o conjunto de produtos, métodos e processos que o ser humano desenvolve, muda o mundo. A tecnologia é o resultado da aplicação da técnica. A técnica, segundo Heidegger (SILVA, 2007), é algo que resulta de uma atividade que não é um processo natural. A técnica é uma atividade humana que altera o processo natural das coisas, para acelerá-las ou desacelerá-las, por exemplo. Uma das aplicações mais poderosas da tecnologia envolve o curso da vida. Quando o ser humano busca soluções para melhorar a qualidade de vida, as ações a serem promovidas podem ir para variadas direções. Alguns recentes avanços tecnológicos merecem atenção, como a evolução de instrumentos microeletromecânicos, sensores fisiológicos, e a comunicação wireless sem baixo consumo energético (KING et al., 2017). Esses avanços tecnológicos podem provocar a mudança no monitoramento da saúde e influenciar a qualidade de vida.
São abordagens da qualidade de vida a econômica, psicológica, biomédica e holística (PEREIRA et al., 2012; DAY; JANKEY, 1996). Na abordagem econômica, os indicadores socioeconômicos são usados para acompanhar as mudanças na qualidade de vida. Na abordagem psicológica, busca-se comparar o que uma pessoa ou conjunto de pessoas tem e o que quer ter. Do ponto de vista psicológico, a realização de um objetivo é importante para a qualidade de vida. Ao se compreender os objetivos de um grupo de pessoas, busca-se compreender seu o ideal. Busca-se compreender qual é a percepção que as pessoas têm sobre a condição atual de vida e o que elas esperam. Tal percepção permite comparar os diversos momentos da vida, e indicar quando aconteceu o momento da melhor qualidade de vida. Isso permite criar uma referência para a qualidade de vida e auxilia entender como as mudanças na vida interferem para cada uma. A abordagem biomédica é menos baseada na percepção, se constrói com indicadores da condição de saúde e da doença e oferta o uso das estimativas de vida. Com base nesses parâmetros, e associado aos indicadores sócio-econômicos, podemos compreender como esses indicadores influenciam a vida das pessoas. A abordagem holística busca reunir todos os indicadores mencionados para criar uma representação social da qualidade de vida. Desta forma, a qualidade de vida é constituída de indicadores subjetivos (bem-estar, felicidade, amor, prazer, realização pessoal) e objetivos (satisfação das necessidades básicas e das necessidades criadas pelo grau de desenvolvimento econômico e social).
No estudo da moda, podemos analisar como as pessoas escolhem. Como pensar as escolhas das pessoas? Quais as condições para as pessoas escolherem e para os governantes criarem uma sociedade mais próspera, feliz e justa? Nessas condições, o caminho para responder essas questões pode atravessar as dimensões da qualidade de vida. Rech desenvolve uma análise sobre as abordagens para o estudo do futuro dedicado ao mundo da moda (RECH, 2013). Ela apresenta os seguintes tipos de estudo do futuro: antecipação e previsão; prospecção; prospectiva; e cenários. Assim, considerando a evolução tecnológica, qual é o papel da moda na qualidade de vida das pessoas? Qual dos tipos de estudo do futuro podemos escolher para discutir a relação entre a evolução tecnológica, moda e qualidade de vida?
Por meio da abordagem econômica de qualidade de vida, podemos sugerir que o vestuário pode ser usado como mecanismo para ascensão social e econômica. Na abordagem psicológica, podemos considerar que o vestuário pode ser usado para o reconhecimento e percepção pessoal e coletiva. O vestuário pode ser usado para monitorar os indicadores de saúde e de doença, o que se encaixa na abordagem biomédica da qualidade de vida. A partir de uma visão integradora, por meio da abordagem holística, o vestuário pode ser usado para satisfação e reconhecimento social. Portanto, é possível traçar caminhos no qual o vestuário pode assumir um importante papel na qualidade de vida.
A partir da abordagem biomédica da qualidade de vida, podemos pensar o uso do vestuário para monitorar os indicadores de saúde e de doença. Roupas, calçados e acessórios podem ser sensorizados para monitorar os hábitos de vida ou sinais vitais. Os sensores que podem ser transportados com as pessoas são classificados em dispositivos móveis, portáteis, vestíveis e manuais (WIERINGA et al., 2017). A condição de saúde-doença é um estado contínuo, multidimensional. A capacidade de manter as condições funcionais adequadas para as demandas diárias, mesmo na presença de um processo infeccioso, doença ou síndrome, trauma ou lesão, sugere que o estado pleno de saúde é uma condição transitória e que pode ser sustentada mesmo quando não há o funcionamento adequado de todas as estruturas corporais.
Como o vestuário, calçados e acessórios podem melhorar a qualidade de vida? Uma das formas de melhorar a qualidade de vida é usar as informações dos sinais vitais, que podem contar histórias sobre a saúde e doença, para medidas de prevenção. A quantidade de revisões sistemáticas sobre a importância dos sensores para medir alguma variável associada à prática da atividade física tem aumentado (CAMOMILLA et al., 2018). O principal tipo de sensor para avaliar a prática da atividade física são os vestíveis (CAMOMILLA et al., 2018). Isso sugere a importância do vestuário para monitorar os indicadores de saúde e doença. O uso de medidas dos sinais vitais se intensificou a partir da década de 1970, com o crescimento da prática da corrida, ou “fazer cooper”, e o advento dos medidores de frequência cardíaca (HEIKENFELD etal., 2018).
Considerando todas as perguntas que destacamos, o objetivo deste ensaio é discutir o papel dos sensores vestíveis na qualidade de vida.
2 SAÚDE DIGITAL
A saúde digital, ou eHealth, é uma área crescente e reconhecida internacionalmente. O US Food and Drug Administration, órgão regulador sobre alimentos e remédios dos Estados Unidos da América (EUA), define a saúde móvel, mobile health — mHealth, como o conjunto da tecnologia de informação, tecnologia vestível (wearables), a telesaúde, telemedicina e medicina personalizada. O Observatório Global para eHealth da Organização Mundial da Saúde define mHealth como um componente da saúde digital e uma prática de saúde pública e assistida por aparelhos móveis como os telefones celulares, smartphones, aparelhos de monitoramento, aparelhos de assistência pessoal e outras tecnologias wireless. Além disso, é possível usar sensores acoplados a esses aparelhos móveis. Os sensores vestíveis (WU; HAICK, 2018) podem ser usados para detectar alterações na motricidade, como detectar conclusões, discinesias, tremores e bradicinesia (JOHANSSON etal., 2018). Em outro exemplo, Liu etal. (2018) mostraram que o uso de sensores da atividade elétrica dos músculos no rosto e no pescoço pode indicar estados de humor.
O monitoramento de indicadores de saúde e de doença do indivíduo pode atenuar os sintomas de um problema de saúde. Liu et al. (2018) mostraram os assuntos básicos dos sensores vestíveis para a saúde. Diferentes princípios físicos são aplicados para medir, como os sensores capacitivos, resistivos e piezelétricos, além dos sensores químicos. Os sensores podem ser feitos de materiais ativos, no qual a medida é resulta de uma reação química ou física, ou feito de materiais que são passivos, onde sua construção no sensor é responsável pela medida. Os sensores podem ser colocados em diferentes partes do corpo (CHEN et al., 2016); por exemplo, para ajustar o tratamento personalizado de doenças crônicas do fígado (WIERINGA et al., 2017), por meio do monitoramento contínuo da glicose no corpo (Acciaroli et al 2018) com sensores subcutâneos. Wu e Haick (2018) mostram diferentes tipos de sensores que podem ser colocados sobre a pele ou na roupa para medir os sinais biológicos. A combinação de diferentes sensores químicos em um único circuito (WU; HAICK, 2018) também é possível. Esse tipo de sensor é o sensor matricial e pode múltiplas utilidades, como monitorar vários problemas de saúde ao mesmo tempo, e isso pode melhor o acompanhamento de problemas de saúde. Com sensores matriciais, Liu etal. (2018) mostraram o monitoramento de sódio, potássio, glicose e lactato para detectar parâmetros do metabolismo. Em particular, a evolução dos sensores de glicose permite superar o uso de medidas invasivas, quando é necessário obter uma amostra sanguínea para avaliar a quantidade de glicose, e usar os sensores químicos para avaliar a quantidade de glicose nas lágrimas, saliva ou suor (LEE et al., 2018). Porém, ainda não se conhece o impacto desses sensores no controle de doenças cardiovasculares (REHMAN etal., 2017). Esses sensores podem ser plastificados e usados em diferentes partes do corpo, desde lentes de contato até bandagens de machucados (GONZALEZ; SOLINO; LORENZO, 2018). Ou esses sensores podem ser inseridos no tecido por meio de diferentes processos (HEO et al., 2018; LEE et al., 2018). Esses processos vão incorporar diferentes tipos de fibras, como as fibras de poliéster polimerizado para medir tração, os tecidos de seda carbonizada, as fibras condutoras dispostas em camadas, ou fibras elásticas compostas (LEE et al., 2018). Isso permite usar da melhor forma possível as propriedades físicas dos tecidos e melhor adaptar ao processo fabril e uso no corpo humano.
Recentemente, o programa Google smart lenses (OJAN; LONG, 2018) em colaboração com a Alcon foi suspenso por causa da dificuldade de correlacionar a concentração da glicose nas lágrimas com a glicose sanguínea (https://blog.verily.com/2018/11/update-on-our-smart-lens-program-with.html).
A estimativa para 2020 (HEIKENFELD et al., 2017) é que o maior mercado de sensores vestíveis será o de sensores químicos, principalmente os invasivos para medir a quantidade de glicose, seguido das unidades inerciais. A informação gerada por esses sensores pode ser gravada em um aparelho celular e encaminhar para uma central de informações de uma empresa de saúde (QIAN LONG, 2018). Esse tipo de processo vai aumentar com o crescimento da internet das coisas (internet of thing, IoT) (LIU et al., 2018).
2.1 Aplicações da saúde digital: mHealth
As tecnologias mHealth podem influenciar a saúde e doença das pessoas. Quando pensamos em saúde, podemos imaginar aplicações para melhorar o conforto, o desempenho e a proteção; enquanto que para a doença, os sensores podem ser usados para monitorar, controlar e se recupera da doença. Um exemplo são os sensores vestíveis para monitorar a condição cardiovascular (MICHARD, 2016). Desta forma, é possível ter indicadores de conforto para saber se uma pessoa de sente bem, os indicadores de desempenho são usados para saber se uma pessoa consegue fazer melhor, indicadores de proteção para evitar que as pessoas se machuquem, indicadores de monitoramento para não fiquem doentes, indicadores de controle para combater a doença, indicadores de reabilitação para apoiar o processo de recuperação da doença ou lesão.
Os indicadores de conforto informam sobre a temperatura corporal, ou sobre a pressão em uma parte do corpo.
Os indicadores de desempenho apontam como foi feita uma tarefa ou o resultado de uma atividade funcional. Os sensores inerciais, também conhecidos como unidade inerciais, podem oferecer informação sobre o tempo, distância, velocidade, posição, e orientação. Isso pode permitir estimar (TEDESCO et al., 2017): quantidade de atividade física realizada e medida de sedentarismo; detecção de postura e estimativa do tempo de transição entre posturas; estimativa de gasto energético e intensidade do exercício; tremor e congelamento do movimento (LIMA et al., 2017); e análise do sono. Além disso, podem estar acompanhados de outros sensores, como temperatura e energia.
As unidades inerciais podem gerar informação para proteger, como o monitoramento de recém nascidos (CHEN et al., 2016). As unidades inerciais podem ser usadas para detectar a fadiga, detecção e predição de quedas (LAPIERRE et al., 2018), análise da marcha e estabilidade postural (TEDESCO et al., 2017). A detecção de fadiga é importante para evitar riscos provocados pela desatenção ou incapacidade de realizar uma atividade, ou falha de uma atividade funcional. Principalmente em idosos, a detecção de atitudes de risco de quedas ou a iminência de quedas pode ser importante para alertar e aumentar a chance de uma resposta protetora. Os padrões de marcha podem ser usados para indicar o nível de prática de atividade física, nível de impacto dos passos, comprimento dos passos e velocidade média de deslocamento horizontal da marcha (WANG et al., 2017). Estas variáveis da marcha são importantes para definir o nível de independência funcionald a locomoção.
A presença ou intensidade de uma doença pode ser monitorada a partir de exames ou meio de medidas contínuas providas pelos sensores. Os dispositivos portáteis com alto poder de processamento de informações sobre os sinais vitais que podem ser usados para o controle de doenças. Por exemplo, o monitoramento contínuo do metabolismo, atividade do coração, respiração e temperatura (LIU et al., 2017).
A reabilitação pode ser aprimorada se as informações do processo de recuperação forem monitoradas. Por exemplo, o biofeedback para órteses pode aprimorar o seu uso. Além dessas aplicações, o esses indicadores e sensores podem ser aplicados no esporte (CAMOMILLA et al., 2018). É possível acompanhar as capacidades físicas para desenvolver a análise técnica de um atleta. Podemos usar essas informações para classificar a quantidade de atividade física realizada. Por exemplo, é preciso reconhecer demandas físicas. Isso torna possível, por exemplo, acompanhar em “real-time” os comportamentos para ações “just-in-time” (SCHEMBRE et al., 2018). A partir desse acompanhamento, é possível gerar instruções sobre onde, quando e como para orientar comportamentos.
Existem outras aplicações para as informações obtidas pelos sensores vestíveis. Esses sensores permitem monitorar o sedentarismo, nível de atividade física, gasto energético, fadiga, locomoção e eventos anormais (tremores, congelamentos etc), sono e deslocamentos para decisões clínicas e de empresas de seguro (TEDESCO et al., 2017). Os sensores vestíveis sensíveis aos sinais químicos podem ser usados para monitorar o consumo de drogas (CARREIRO et al., 2017), ou mesmo serem usados para acompanhar o comportamento psiquiátrico (TOROUS et al., 2017). Wang et al. (2017) propuseram um conjunto de sensores para monitorar os movimentos e sinais vitais de idosos, como a sua localização em casa. Essas informações seriam agrupadas e enviadas para um centro de monitoramento ou mesmo para familiares.
2.2 Como usar os sensores vestíveis?
Os sensores vestíveis devem ter alguns cuidados (WIERINGA et al., 2017): 1) cuidado extra com a análise de risco de usar sensores vestíveis; 2) deve existir um sentido prático para todas as partes que se envolvem com o uso desses sensores; 3) não incomodar o usuário; 4) robustez do equipamento, que não deve limitar ou atrapalhar os movimentos do usuário, assim como resistir a impactos e a prova d'água; 5) ser fácil de usar e deixar as mãos livres; 6) ter conectividade e ser seguro; 7) reconhecimento automático de eventos importantes; Conhecer a quantidade de atividade física realizada é útil para definir ações. Com o uso adequado, é possível monitorar estados da doença, associar eventos e o estado da doença, e prever cenários castatróficos. Isso torna os indicadores de saúde e de doença importantes aliados para os cuidados com saúde. Esses comportamentos podem ser associados e ajudar a tomar decisões e estabelecer políticas.
Quando os sensores vestíveis são usados para descrever comportamentos é possível associar comportamentos e riscos. A quantidade de movimentos indicada por acelerômetros serve para classificar se uma pessoa é sedentária. Nesse caso, associar comportamentos e riscos é importante para previnir problemas de saúde. Avaliar dados individuais ou coletivos permite tomar decisões. Essas decisões podem alertar e combater comportamentos de risco.
3 NOVAS TECNOLOGIAS NOS SENSORES VESTÍVEIS
3.1 Nanotecnologia e biotecnologia
Novas tecnologias provocam uma revolução nos sensores vestíveis. Como usar a nanotecnologia e biotecnologia? A nanotecnologia pode criar os tecidos inteligentes. Os tecidos inteligentes, os smart fabrics, trouxeram uma nova dimensão para o que é possível fazer com as roupas. Nanosensores podem ser aplicados em tecidos ou mesmo sobre a pele por meio de adesivos (YAO et al., 2018) permitindo o monitoramento de sinais biológicos mensurando as mudanças químicas que ocorrem na pele (YAO et al., 2018). Os sensores podem se conectar, os smart shoes são um tipo de acessórios para o exercício que permitem monitorar a forma de correr e indicar o posicionamento em mapa, pois se mantém conectados com o smartphone por meio de comunicação bluetooth. Outros acessórios para praticar exercícios, os fitness gadgets, como os relógios e pulseiras, permitem acompanhar variáveis de desempenho durante o exercício, e comunicar-se por meio da internet ou bluetooth com um smartphone. Cada vez mais produtos como esses estão disponíveis para as pessoas se sentirem informadas sobre como estão se exercitando.
3.2 Internet das coisas e Inteligência artificial
Os objetos podem ser instrumentados para que estejam conectados à internet, isso é conhecido como a internet das coisas A internet das coisas e suas aplicações na área da saúde, conhecida como internet of medical things, IoMT, tem um mercado valioso e se expande no século atual. Esse mercado mundial foi avaliado em 1,3 trilhões de dólares em 2013 e está estimado em 3 trilhões de dólares para 2020 (HAGHI et al., 2017).
Com a internet das coisas, os dispositivos que embarcam vários tipos de sensores, os sensores matriciais incorporados aos tecidos e roupas, e todos os outros tipos de sensores, podem transmitir e gravar informações e acumular dados longitudinais das pessoas. Isso é uma realidade, por exemplo, para as pessoas que usam o Polar® ou similares, ou usam aplicativos como o Strava, por exemplo. O agrupamento dessas informações de milhares de pessoas, com o apoio da inteligência artificial, pode ajudar a criar padrões de comportamento de condições pré-clínicas e clínicas (TOROUS et al., 2017). O uso da inteligência artificial para a tomada de decisões na área da saúde tem um potencial poderoso. A partir de bancos de dados cada vez maiores e mais ricos em variáveis, o uso de inteligência artificial para encontrar padrões de comportamento, subgrupos de pessoas com características semelhantes, associações entre comportamentos ignorados ou pouco percebidos, riscos de saúde e condições das doenças se torna cada vez mais evidente. O processamento dessas informações é importante para a tomada de decisões.
O contexto destas tomadas de decisões é muito importante. É possível usar o monitoramento contínuo de sinais vitais para usar como feedback para mudanças agudas na dieta e prática da atividade física (SCHEMBRE et al., 2018). Isso pode mudar os hábitos de uma pessoa. As perguntas certas devem ser feitas para melhorar a qualidade de vida. Para isso, o uso da inteligência artificial no processo de tomada de decisões necessita de conhecimento específico sobre os assuntos abordados, de suas repercussões e do contexto que se encontram as informações. Existem alguns sistemas de inteligência artificial que podem ser usados por pessoas que não são familiares ao conhecimento técnico da inteligência artificial. Nesse caso, é importante ter um banco de dados com informações bem organizadas e as questões certas. O sistema Watson, da IBM, é um exemplo de sistema de inteligência artificial. Os estudos desenvolvidos com o sistema Watson permitiram entender melhor as escolhas, entender contextos mais amplos das consequências das decisões propostas, e mesmo entender qual informação é importante. Todos esses resultados fortalecem as tomadas de decisão.
4 AS QUESTÕES ÉTICAS DAS NOVAS TECNOLOGIAS
Quando várias informações são coletadas de uma pessoa, um problema aparece. O que fazer com a informação? As pessoas podem ter medo do uso de suas informações privadas. No Reino Unido, os Samaritanos criaram um software que monitorava os tweets de uma pessoa e avisava para os usuários cadastrados nesse software quando surgiam mensagens que sugeriam depressão ou pensamentos suicidas; porém, nove dias depois, houve uma petição para suspender o funcionamento desse aplicativo porque pessoas se sentiram ameaças pela invasão de privacidade e que receio das informações serem usadas para explorar pessoas (http://www.theguardian.com/society/2014/nov/07/samaritans-radar-app-suicide-watch-privacy-twitter-users). Deve existir transparência ou privacidade dessa informação? Quando os sistemas de saúde têm acesso ao comportamento do indivíduo, qual é o valor da privacidade? Na verdade, não está claro como ajustar o engajamento e aceitabilidade da mHealth (MCCALLUM et al., 2018). Discutir e responder às questões éticas do uso das informações é preciso. Recentemente, no final do ano de 2017, o órgão regulatório de alimentos e remédios dos Estados Unidos da América, US Food and Drug Administration, lançou o Plano de ações para a inovação na saúde digital (https://www.fda.gov/MedicalDevices/DigitalHealth/), o que um inclui a organização de um conjunto de leis que devem ser observadas quando se desenvolve um aplicativo com fins para a saúde, ou denominados software para dispositivos médicos.
Torous et al. (2017) apresentam uma árvore de decisões para as questões éticas para o uso das tecnologias móveis aplicadas para a saúde. A árvore de decisões começa com 1) o questionamento se existe benefício no uso da tecnologia no tratamento do problema de saúde; 2) levanta-se os riscos do uso de tal tecnologia; 3) investiga-se se foi realizado os procedimentos adequados para o consentimento informado; 4) se foi feita a discussão sobre a confidencialidade das informações; e 5) se existe o alinhamento mútuo da tecnologia móvel e as expectativas e objetivos do tratamento (TOUROS et al., 2017).
De acordo com Heidegger e seus conceitos sobre a técnica, a técnica é um destino que se oferece ao homem. Porém, se não for bem compreendido, esse destino submergirá no domínio da técnica. Para que isso não ocorra, é preciso ouvir o apelo e compreender o destino das informações sobre o indivíduo e sobre o coletivo. Isso é liberdade.
O estudo da moda é o estudo de como as pessoas escolhem. Como pensar as escolhas das pessoas? Como oferecer as condições para as pessoas escolherem e para os governantes possam criar condições de uma sociedade mais próspera, feliz e justa? Os estudos da moda e seus atores podem contribuir para isso, quando pensamos nas implicações dos usos dos sensores vestíveis para melhorar a qualidade de vida. Se por um lado, há o crescente interesse na criação de bancos de dados longitudinais alimentados pelos sinais vitais das pessoas, potencializando a sua aplicação para interesses públicos e privados; as pessoas precisarão estar bem informadas sobre como usar, garantir sua privacidade e compreender as consequências.
Os estudos do futuro na moda (RECH, 2013) nos ajudam a compreender essas aplicações da tecnologia nos vestuários e suas repercussões na qualidade de vida. Assim, seria possível antecipar e prever comportamentos; prospectar como os sensores vestíveis podem ser incorporados aos vestuários, por exemplo, no ambiente de trabalho; e criar os melhores cenários para as políticas públicas baseadas nas informações longitudinais dos sensores vestíveis. A moda pode ajudar as discussões sobre como equilibrar a aplicação desses sensores na vida diária, a liberdade individual e o bem-estar do público em geral, bem como os interesses corporativos.
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