Artigo
Recepção: 22 Dezembro 2018
Aprovação: 10 Agosto 2019
DOI: https://doi.org/10.23925/2178-0080.2020v22i1.40787
Resumo: Este artigo é a continuação de estudos que intencionam investigar o fenômeno da liderança servidora em organizações nomeadas pela Igreja Católica de “Novas Comunidades”. A partir da conceituação da liderança servidora, realizou-se uma pesquisa na Família da Esperança (“Nova Comunidade” fundada no Brasil) através de um questionário guiado pelo Modelo de Patterson (2003), instrumentalizados por Dennis (2004), na versão em português de Luz (2011). Os dados foram analisados a partir da adoção de procedimentos ligados à estatística descritiva, e através da mensuração da importância e frequência, foi possível concluir que esta abordagem da liderança parece adequar-se ao estilo organizacional analisado.
Palavras-chave: Liderança, Liderança Servidora, Novas Comunidades.
Abstract: This article is the continuation of studies that intend to investigate the phenomenon of servant leadership in organizations nominated by the Catholic Church of "New Communities". Based on the conceptualization of the servant leadership, a research was carried out in the Family of Hope ("New Community" founded in Brazil) through a questionnaire guided by the Patterson Model (2003), instrumented by Dennis (2004) in the Portuguese version of Luz (2011). The data were analyzed from the adoption of procedures related to descriptive statistics, and through the measurement of importance and frequency, it was possible to conclude that this approach of leadership seems to fit the organizational style analyzed.
Keywords: Leadership, Servant Leadership, New Communities.
Introdução
A liderança ocupa destaque nos estudos das Ciências Sociais, sua potencialidade a torna um dos fenômenos mais estudados principalmente no contexto da Gestão e da Administração (Day & Antomakis, 2012). Presente em diversos contextos organizacionais ou grupos sociais, a liderança carrega um fértil campo de estudos e pesquisas pelo interesse multidisciplinar que oferece (Bass, 2008).
Diante dos esforços que construíram diversos campos de investigação e abordagens da temática, tratando de tendências, a mais recente revisão sistemática internacional sobre o tema, revela algumas abordagens que estão em evidência no interesse dos pesquisadores: 1) liderança em complexidade (Complexity Leadership); 2) liderança compartilhada, coletiva ou distribuída (Shared, Collective, or Distributed Leadership); 3) a centralidade no liderado e na sua percepção sobre o líder (Updates on Follower-Centric Views); 4) liderança espiritual (Spirituality and Leadership); 5) liderança virtual (E- Leadership); 6) liderança autêntica (Authentic Leadership); e 7) liderança servidora (Servant Leadership) (Avolio, Walumbwa & Weber, 2009), foco deste estudo.
Mesmo promitentes, as sete abordagens que direcionam para os novos estudos em liderança estão em fase de maturação (Avolio et al., 2009), e necessitam de uma melhor delimitação conceitual e consequentemente de maiores evidências empíricas (Fonseca, Porto & Borges-Andrade, 2016). Porém, os interesses dos estudiosos da liderança estão claramente direcionados para uma perspectiva de interação entre o líder e o seguidor, que geram uma visão compartilhada, relacional e global neste fenômeno (Avolio et al., 2009).
Analisando os novos posicionamentos do comportamento organizacional, a liderança tem sido indicada como decisiva para o comprometimento dos colaboradores e a ascensão das organizações, principalmente os estilos que proporcionam um comportamento ético e solícito (Luthans, 2002; Macik-Frey, Quick & Cooper, 2009). Por isso, a liderança servidora, tem sido sugestiva para as necessidades atuais das organizações (Van Dierendonck, 2011).
A liderança servidora citada primeiramente nos estudos de Greenleaf, nos anos de 1970, posiciona seu foco no crescimento pessoal e nas necessidades dos seguidores, acima de qualquer outra teoria da liderança (Patterson, 2003). O pensamento de Greenleaf (1977) é direcionado na perspectiva de que o líder servidor é aquele que serve primeiro. Porém, os pesquisadores e escritores ainda não encontraram uma definição exata da liderança servidora e nesta tentativa, se debruçam sobre modelos que exemplificam comportamentos deste fenômeno.
São raros os estudos encontrados na literatura científica nacional sobre o tema da liderança em organizações sem fins lucrativos (Kearns, Livingston, Scherer & Mcshane 2015), e na perspectiva da liderança servidora são escassos. Pesquisas como a de Luz (2011), Dias (2017) e a de Dias e Moraes Filho (2018), indicam à possibilidade da aplicação desta abordagem neste estilo de organização, assim como, as contribuições que estudos deste tipo podem oferecer na contextualização e na prática do fenômeno. Neste estudo, especificamente, analisa-se uma realidade organizacional nomeada pela Igreja Católica de “Nova Comunidade”. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (2009) aponta que estas organizações se caracterizam por possuírem sede própria, estatutos, registro civil da entidade e coordenação independente. Além disso, são caracterizadas pelas diversas atividades de evangelização, que englobam os trabalhos pastorais e de assistência social.
Dentro deste contexto, a Família da Esperança, organização objeto do estudo, é uma Associação privada internacional de fiéis, nascida em 1999, e enquadrada pela Igreja Católica, como uma das organizações “Novas Comunidades”. Sendo uma organização religiosa, sem fins lucrativos, é formada por jovens e adultos, homens e mulheres, uns com vocação celibatária e outros casados: todos, porém, com a mesma disponibilidade de servir. A principal atividade dos membros da Família da Esperança está nas Fazendas da Esperança, espaços espalhados em todos os estados brasileiros e em quinze países do mundo, que fortemente trabalham na reabilitação de dependentes químicos, alcoólatras, portadores de AIDS e, crianças e adolescentes de rua.
Deste modo, este artigo tem como objetivo mensurar a importância e identificar a frequência (no sentido da aplicabilidade na prática) dada pelos integrantes da Família da Esperança, que residem no Brasil, às sete variáveis do modelo de Patterson (2003), apresentado nos estudos sobre liderança servidora. Esta pesquisa busca dar continuidade ao único estudo registrado, pelo que se tem notícia, nacionalmente e internacionalmente, realizado pelos autores, que enseja observar o fenômeno da liderança servidora em organizações chamadas de Novas Comunidades. Justifica-se também o fato deste debate ampliar a visão da administração, retirando-a apenas do contexto empresarial e reforçando a importância de estudos nos diversos estilos organizacionais.
Referencial Teórico
É importante notar que o conceito de liderança sobrepõe às definições de líder e liderado, sendo um processo relacional de ambos com a situação (Northouse, 2004; Bryman, 2004; Spector, 2005; Kouzes & Posner, 2007; Bennis, 2007; Fiorelli, 2008). Por isso, Crevani, Lindgren e Packendorff (2010), apontam que a liderança abrange processo, práticas, e até mesmo, interações que ocorrem interiormente no grupo. Isso condiz com o que Heifetz (1998) já definia: a liderança, como uma prática de associação entre pessoas, com o objetivo de superarem desafios e transformações necessárias para o alcance do propósito comum.
Perpassando eras de estudo, muitas teorias foram desenvolvidas pelos autores desta temática. Van Sters e Field (1990) elaboraram uma construção histórica das principais eras de estudo da liderança e classificou-as em: 1) Era da Personalidade, sustentada até a década de 1940, na qual o líder era diferenciado da massa; 2) Era da Influência, evidenciada principalmente na década de 1950, na qual destacou a existência de uma associação entre líder e liderado; 3) Era do comportamento, com apogeu nas décadas de 1950 e 1960, buscou-se identificar os padrões de comportamentos do líder; 4) Era da situação e da contingência, sustentadas até o final da década de 1960, nesta era são alavancadas três abordagens importantes para os estudos de liderança: situacional, contingencial de Fiedler e caminho- meta; 5) Era transacional, observou a liderança como um processo de interação social e mútua influência entre líderes e liderados; 6) Era da anti-liderança, foi uma era influenciada pelos fracassos em testes empíricos para explicação da liderança, inserindo os estudos da temática numa perspectiva de descrença; 7) Era da cultura, onde a proposta era argumentar o fenômeno presente numa cultura organizacional; 8) Era transformacional, marcada pelo surgimento da abordagem carismática e transformacional, defendendo que a motivação do liderado está ligada a aspectos intrínsecos à pessoa. A evolução dos conceitos revela o esforço dos estudiosos da liderança em explicá-la e diferenciá-la dos demais fenômenos organizacionais.
Os modelos da nova liderança estão direcionando os estudos para comportamentos simbólicos do líder, como: sentimentos emocionais, valores morais, atenção individualizada, estimulação intelectual, capacidade de emitir mensagens inspiradoras e visionárias (Avolio & Gardner, 2005; Avolio et al., 2009).
A liderança servidora, mesmo citada como uma abordagem com mais de trinta anos, tem sido redescoberta pelos acadêmicos a partir de meados da década de 1990, enquadrando-a como uma das abordagens contemporâneas da liderança (Van Dierendonck & Nuijten, 2011).
Para Spears (1993), Stone, Russell e Patterson (2004) e Van Dierendonck e Nuijten (2011), Greenleaf é considerado o primeiro autor que apresenta o conceito de liderança servidora, ainda na década de 1970. Lopes (2009) explica que o líder deve ser o indivíduo que mesmo estando no centro da organização, está para servi-la e não para ser servido. Sustentando a afirmação de Greenleaf (1977) de que os primeiros líderes são os primeiros servos. Para o autor, o líder servidor se diferencia dos demais líderes que almejam o poder, afinal, para os líderes servidores o serviço surge como uma escolha secundária após o estabelecimento da liderança. Assim, outras abordagens da liderança apresentam como preocupação principal do líder o bem-estar organizacional, mas o líder servidor está genuinamente preocupado com seus seguidores, abrindo espaço para relacionamentos seguros e fortes no interior da organização (Stone, Russell & Patterson, 2004). O propósito do líder servidor é servir os outros, encontrando nos esforços a busca da realização de tarefas para o bem comum (Page & Wong, 2000).
A característica do líder servidor está em ajudar as pessoas a serem e fazerem o melhor, retirando uma imagem limitada de um indivíduo destinado apenas à execução de tarefas, o mesmo está atento aos momentos e decisões como qualquer outro líder. A influência do líder aos seguidores é manifestada na atitude do serviço, o que diferencia dos líderes preocupados com as tarefas, que acabam sem a sensibilidade de servir os outros. Esse líder consegue alcançar os objetivos zelando pelo espírito de comunidade, tendo como propósito o bem comum (Page & Wong, 2000).
Observa-se nesta abordagem que dois fatores estão intrinsicamente relacionados: a necessidade de servir, combinada com a motivação em liderar. É por isso, que a liderança servidora torna-se uma abordagem específica do poder (Van Dierendonck, 2011). Para Greenleaf (2006), na relação entre líder servidor e liderado, nasce a crença do líder em valorizar cada indivíduo, reconhecendo as habilidades presentes, e o que ele ainda pode aprender.
Numa perspectiva de ampliar a contextualização, já que Greenleaf não apresentou uma definição precisa da liderança servidora, alguns modelos de mensuração são constatados com suas interpretações e ilustrações de uma ampla gama de comportamentos. É necessário considerar a construção da contextualização da liderança servidora que acusa muitos modelos de mensuração, principalmente por não haver um consenso nos componentes do construto, causado pelas poucas demonstrações empíricas, por isso há um esforço dos autores para minimizar este cenário (Van Dierendonck, 2011). Os modelos mais influentes na literatura são os desenvolvidos por Spears (1995), Laub (1999), Russell e Stone (2002) e Patterson (2003), este último escolhido como aporte teórico desta pesquisa.
Patterson (2003) em seu modelo constrói a mensuração da liderança servidora em sete variáveis, nomeadas pela autora de “construções virtuosas”, a saber: (a) amor ágape, (b) humildade, (c) altruísmo, (d) visão, (e) confiança, (f) empowermente e (g) serviço. Deste modo, a liderança servidora seria analisada a partir da preocupação que o líder servidor possui em servir seus seguidores. O modelo é ilustrado na figura 1.
Conforme a figura 1, Patterson (2003) apresenta uma construção de ações iniciadas pelo Amor Ágape perpassando pelos demais construtos que resultam no serviço, tais “construções virtuosas” são virtudes e se iluminam dentro de um contexto da liderança servidora. Para Patterson (2003):
o Amor Ágape é percebido nos líderes que consideram a totalidade das pessoas - sendo uma pessoa com necessidades e desejos;
a Humildade está na não atenção central do líder em suas realizações, mas no outro;
o Altruísmo que busca o que é melhor para os outros do que para o próprio líder;
a Visão refere-se à percepção do líder em relação ao liderado como uma pessoa digna e sempre à enxergar além;
a Confiança como elemento fundamental para líderes servidores capaz de produzir padrão de excelência para a organização;
o Empowerment na capacidade de confiar poder aos outros e permitir que os seguidores assumam o controle, sempre que necessário; e
o Serviço que está em dar-se generosamente, podendo significar, dar tempo, energia, cuidado, compaixão e até mesmo pertences.
Baseado no aporte teórico de Patterson (2003), o estudo de Dennis e Bocarnea (2005) resultou na construção de um instrumento que busca medir a liderança servidora a partir das “construções virtuosas”. Este instrumento servirá como base para coletas de dados desta pesquisa, principalmente pela aplicabilidade e adequação em organizações religiosas sem fins lucrativos.
Metodologia
Este artigo é um dos produtos de uma pesquisa iniciada para fins de dissertação de mestrado em administração, sendo ampliada pelos autores com novos esforços posteriores. Trata-se de uma pesquisa exploratório-descritiva de natureza quantitativa. Sendo uma pesquisa exploratória, pretende analisar uma temática pouco explorada num objeto de estudo (Nova Comunidade) pouco investigado nacionalmente. Assim, o propósito motivador deste estudo é ensejar familiaridade com o tema, o problema de pesquisa bem como refinamento da abordagem, e favorecer a construção de um cenário perceptivo mais completo sobre o objeto do estudo. A pesquisa também é descritiva por se aplicar em descrever características ou comportamento de determinada população, sem, no entanto, se obrigar em explicar o fenômeno que descreve (GIL, 2007).
É também uma pesquisa de campo que em menor grau, possui traços prescritivos, mas o foco principal está em relacionar os dados à causalidade, buscando mensurar a realidade de forma objetiva (Cooper & Schindler, 2003; Malhotra, 2006; Vergara, 2009; Yin, 2009; Flick, 2013).
O aspecto transversal se dá principalmente porque a coleta foi em tempo único, o foco esteve no momento da realização da pesquisa e objetivou-se ofertar um panorama ou descrição dos elementos administrativos (Hair, Babin, Money & Samouel, 2005).
Em relação ao procedimento técnico, classifica-se como um levantamento do tipo survey. Principalmente por buscar informações diretamente com um grupo de interesse (neste caso a organização “Família da Esperança”), a respeito dos dados que se deseja obter, utilizando como instrumento de pesquisa um questionário (Malhotra, 2012).
A população desta pesquisa é composta pelos 788 membros inseridos na organização, espalhados em algum dos centros da organização localizados em território brasileiro. Deste modo, não estão sendo considerados os 154 membros que residem nos centros espalhados no território internacional. A escolha específica desta população se deu principalmente porque a Família da Esperança é considerada uma das maiores Novas Comunidades do Brasil e do mundo, além disso, um dos autores possui acesso à organização.
A amostra da pesquisa somou 301 membros, que responderam o questionário online durante o período de 1 a 28 de maio de 2018. O tipo amostral deste estudo é não probabilístico, e foram utilizadas técnicas de amostragem por conveniência. Como percebido nesta caracterização, a escolha desta amostra se dá principalmente pela curiosidade dos autores quanto a possível aplicabilidade dos conceitos da liderança servidora neste estilo de organização.
Elegeu-se instrumento de coleta de dados um questionário estruturado, auto administrado (Vergara, 2009) no modelo original desenvolvido e validado por Dennis e Bocarnea (2005), e traduzido para o português por Luz (2011), tal instrumento foi construído com 56 questões, baseadas nos estudos de mensuração da liderança servidora de Patterson (2003). A adoção deste instrumento de coleta de dados se deu preliminarmente, pela adequação das sete “construções virtuosas” (amor ágape, humildade, altruísmo, visão, confiança, empowerment e serviço) à realidade da população e amostra deste estudo. Optou-se ainda pela adaptação de alguns termos para torná-los mais acessíveis aos respondentes, existindo sempre a preocupação de não descaracterizar o sentido das questões. Outra alteração foi na escala de medição adotada. Ao invés de medir com os valores de 1 a 10, optou-se pela avaliação em uma escala do tipo Likert de 1 a 5, para retirar a hipótese de atribuição de notas às ações indicadas nas questões.
Na primeira escala - IMPORTÂNCIA - foi mensurado o grau de importância que os integrantes atribuíram a cada comportamento listado no questionário. Considerando a seguinte escala de alternativas: 1) nada importante; 2) pouco importante; 3) razoavelmente importante; 4) muito importante; e 5) extremamente importante.
A segunda escala - FREQUÊNCIA - os integrantes atribuíram a frequência do que o líder se comporta diante da ação indicada, considerando a seguinte escala de alternativas: 1) nunca; 2) raramente; 3) moderadamente; 4) frequentemente; e 5) sempre.
No questionário, inicialmente, os respondentes identificavam um dos membros da Família da Esperança que era considerado como seu líder. Todas as respostas foram norteadas pela sua adesão dessa pessoa como um(a) líder.
A aplicação dos questionários se deu via e-mail institucional da Organização. Os pesquisadores encaminharam para a instituição um e-mail contendo as instruções para preenchimento, e o link de acesso ao questionário. O questionário foi adaptado na plataforma virtual de pesquisa “www.onlinepesquisa.com”, que oferece ferramentas ilimitadas para estudantes de pós-graduação e possibilitam a formatação das escalas pretendidas.
Os dados foram analisados a partir da adoção de procedimentos ligados à estatística descritiva, tomando-se a média por medida de tendência central e o desvio-padrão por medida de dispersão; no esforço de identificar a importância e frequência dos comportamentos predominantes da Liderança servidora na organização.
Análise dos Resultados
O primeiro aspecto que pode ser percebido nesta análise da amosta, seria distribuição dos respondentes quanto ao gênero. Observa-se que há uma pequena diferença no número de respondentes masculinos (52,51%) e femininos (47,49%).
Desta amostra, conforme figura 2, apresenta-se o alcance da representação de todos os estados brasileiros na pesquisa. Destaca-se que esses dados não correspondem essencialmente à naturalidade dos respondentes, mas a primeira investigação esforçou-se para identificar onde os membros residem atualmente, entendendo assim, que estão ligados aos centros da organização nos estados correspondidos.

O estado de São Paulo obteve maior número de respondentes (80) correspondendo a 26,58% da amostra. Uma possível explicação para este valor elevado deve-se a localização da sede principal da Família da Esperança, que fica em Guaratinguetá/SP, local de origem da instrituição, sendo o maior centro da Família da Esperança. Sequencialmente, o estado de Minas Gerais (24) constitui 7,97% da amostra; seguido do Ceará (15) 4,98%; Rio Grande do Sul (14) 4,65%; Pernambuco e Tocantins (13) 4,32% cada; Santa Catarina (12) 3,98%; Amazonas, Pará e Maranhão (10) sendo 3,32% cada; Distríto Federal e Rio de Janeiro (9) 2,99% cada; Piauí, Bahia, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul (8) correspondendo a 2,66% cada; Mato Grosso (7) 2,33%; Sergipe (6) 1,99%; Paraná (5) 1,66%; e Roraima, Acre, Rondônia, Amapá, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas e Goiás (4) cada um somando 1,33% da amostra.
A distribuição da faixa etária da amostra consta na seguinte escala: a) até 21 anos (4) correspondem a 1,33% da amostra; b) de 22 a 31 anos (42) referente a 13,95% da amostra; c) de 32 a 41 anos (107), sendo a faixa etária com maior número de respondentes, relativos a 35,55% da amostra; d) de 45 a 51 (76) equivalente a 25,25% da amostra; e d) acima de 51 anos (72) alusivos a 23,92% da amostra.

A tabela 1 apresenta a distribuição dos respondentes quanto ao tempo (em anos) que fazem parte da Família da Esperança. Observa-se que a maior parcela da amostra está representada naqueles que estão na organização há até 5 anos (117) sendo 38,87%, aqueles que estão entre 6 e 10 anos (85) são 28,24%, de 11 a 15 anos (33) correspondem a 10,96%, de 16 a 20 anos (30) são 9,97%, de 21 a 25 anos (16) caracterizam 5,32%, e os mais antigos, com mais de 25 anos (20) na organização constituem 6,64% da amostra.
O primeiro construto avaliado foi o nomeado por Patterson (2003) de amor ágape. Os resultados apontados na tabela 2 indicam que a média da importância foi de 4,48 e o desvio padrão de 0,09, resultando a média com maior valor dos sete construtos. Existe uma pequena diferença decimal no resultado da média da frequência (4,38), com valor igual do desvio padrão (0,09) da importância. Dennis (2004) explica que o Amor Ágape, construção virtuosa criada por Patterson (2003), se caracteriza pela não centralidade do líder em si mesmo, mas pela preocupação em servir e se dedicar aos seus seguidores apresentando atitudes no senso moral e social que resultam no amor.

Para Dennis (2004) são atitudes exemplares que podem atrair os seguidores não por uma imposição, mas por uma conquista através do exemplo. A variável do amor ágape se torna mais explicativa neste estilo de organização que prega o amor e os valores cristãos, no desejo de promover Deus, o que parece adequar esta característica aos estilos de liderança presentes na Família da Esperança.
O segundo construto nomeado por Patterson (2003) de humildade, busca analisar a não centralidade do líder nas suas realizações, mas no outro. A média da importância, conforme apresentado na tabela 3, identifica o valor de 4,47, revelando que os respondentes atribuem a este construto um grau elevado de significância, e um desvio padrão de 0,25. A mensuração da frequência também apresenta um valor decimal um pouco abaixo do apresentado na importância com média de 4,38 e desvio padrão de 0,28. O resultado da frequência parece apresentar um esforço daqueles que são considerados líderes, em se comportarem humildemente, aproximando-se dos seguidores.

A tabela 4 apresenta os valores do construto altruísmo, assim nomeado por Patterson (2003). A escala da importância apresentou média de 4,16 e desvio padrão de 0,32. A escala da frequência expõe o valor da média de 4,09 e desvio padrão de 0,20. Observa-se que novamente o valor da frequência possui um valor discretamente inferior ao da frequência tanto na média como no desvio padrão.

Uma possível explicação para o elevado valor dos resultados deste construto deve-se ao estilo da organização (essencialmente servidora). A missão e valores internos das novas comunidades estão em direcionar os membros à doação total para o serviço, na sua maioria, de caráter evangelizador ou social, mesmo que isso exija certo sacrifício. A percepção dos integrantes para com os líderes indicados revela que estes indivíduos acabam encontrando um sentido diferente de não olharem apenas para si, mas para o outro e para organização como um todo (Patterson, 2003). Afinal, o que caracteriza as ONG’s é que não existe remuneração nos serviços prestados. Por isso, para Greenleaf (1977), o altruísmo é um comportamento essencial na liderança servidora.
Para Dennis (2004) a visão é uma forma de prever, imaginar e discernir o futuro da organização. A tabela 5 apresenta os resultados deste quarto construto nomeado por Patterson (2003).
A média da importância representa 4,38 e o desvio padrão 0,08. A frequência apresenta média de 4,24 e desvio padrão de 0,10. Repete-se o comportamento discretamente menor dos valores da frequência em relação à importância dada. Autores como Russel e Stone (2002) e Patterson (2003) apresentam com evidência as características que representam o construto visão, como essenciais para contextualização da liderança servidora. Nesta variável, analisa-se a necessidade do líder em observar os valores pessoais e organizacionais para tomada de decisão. Através dos valores obtidos, na percepção dos integrantes da Família da Esperança, conclui-se que esta “construção virtuosa” é importante e frequente na organização.

A média da importância representa 4,38 e o desvio padrão 0,08. A frequência apresenta média de 4,24 e desvio padrão de 0,10. Repete-se o comportamento discretamente menor dos valores da frequência em relação à importância dada. Autores como Russel e Stone (2002) e Patterson (2003) apresentam com evidência as características que representam o construto visão, como essenciais para contextualização da liderança servidora. Nesta variável, analisa-se a necessidade do líder em observar os valores pessoais e organizacionais para tomada de decisão. Através dos valores obtidos, na percepção dos integrantes da Família da Esperança, conclui-se que esta “construção virtuosa” é importante e frequente na organização.
Na análise do quinto construto, a confiança (Patterson, 2003), apresentado na tabela 6, observa-se os resultados da importância com média 4,21 e desvio padrão de 0,16. A frequência com comportamento semelhante aos demais construtos, com média de 4,13 e desvio padrão de 0,12, um pouco abaixo dos valores da importância.
A confiança é um fator presente em quase todas as abordagens contemporâneas da liderança. Na liderança servidora, possui destaque nos modelos de Russel e Stone (2002) e Patterson (2003), enfatizando um importante atributo para os líderes. O valor elevado da importância deste atributo, pela percepção dos integrantes, pode gerar a conclusão de que organizações como as sem fins lucrativos, especialmente as novas comunidades, sustentam suas lideranças pela confiança dos membros naqueles que são vistos como líderes. O valor da frequência aponta que aparentemente os líderes avaliados se comportam como esperado pelos liderados.

Além do modelo de Patterson (2003), os modelos de mensuração da liderança servidora de Russel e Stone (2002) e Page e Wong (2000) apresentam o construto empowerment, definindo-o como sendo as atitudes que revelam a confiança nas outras pessoas na delegação de poder, possibilitando a formação de novos líderes na prática.

A tabela 7 apresenta os resultados do empowerment; a importância denota média de 4,34 e desvio padrão de 0,10. A frequência com média de 4,23 e desvio padrão de 0,06. Sugere o mesmo comportamento dos construtos apresentados anteriormente, com uma pequena diferença entre os valores da importância e da frequência. Destaca-se neste construto, que Patterson (2003) apresenta o empowerment como a capacidade do líder em dar poder aos seguidores, por isso, este resultado parece adequado à realidade deste estilo de organização que tem como característica valorizar todas as funções desempenhadas pelos membros, revelando que os líderes conseguem distribuir o poder e mostrar a significância de cada liderado.
Greenleaf (1977) no surgimento dos estudos sobre liderança servidora, já indicava que o serviço seria o alicerce para esta abordagem liderança. Nas organizações do Terceiro Setor, sem fins lucrativos, acaba predominando nos valores organizacionais o ato de servir, sendo algo que deveria ser natural para todos os integrantes. Numa organização religiosa este construto pode receber destaque, principalmente pelos valores cristãos e humanitários que são pregados.
A tabela 8 apresenta os resultados do construto que Patterson (2003) define como serviço. Apresenta-se 4,20 e 0,36 como média e desvio padrão da importância. A frequência obteve resultado de 4,14 de média e 0,31 de desvio padrão. Repetindo a pequena diferença entre o “achar importante” e o que “realmente acontece”.
O serviço é uma variável que nomeia esta abordagem da liderança e está presente nos modelos de mensuração mais evidentes nos estudos (Spears, 1995; Laub, 1999; Russell & Stone, 2002; Patterson, 2003).

O fato de o estudo acontecer numa organização essencialmente servidora, e os valores apresentarem resultados elevados, comprova que este construto também parece aderente ao estilo de organização, concatenando com a teoria apresentada.
Conclusões
A temática da liderança continua emergente nos estudos das Ciências Sociais Aplicadas, ascendendo cada vez mais o interesse no campo da Administração e Gestão. Observa-se que este tema possui registros de investigação desde o início do século passado, alimentando os questionamentos dos pesquisadores na busca por melhores definições.
A liderança servidora surge como abordagem contemporânea neste vasto campo de estudos e provoca interesse de autores principalmente internacionais. Observam-se poucas investigações nacionais, carecendo de aprofundamento teórico e empírico para conclusões mais precisas no cenário brasileiro.
O interesse deste estudo foi de investigar especificamente o comportamento da liderança servidora numa organização sem fins lucrativos, enquadrada no terceiro setor, mas caracterizada como organização religiosa, nomeada pela Igreja Católica de Nova Comunidade. A curiosidade surge principalmente, porque os pesquisadores internacionais têm indicado a ausência de trabalhos empíricos que testem os modelos da liderança servidora, apresentados na literatura científica, nos diversos estilos organizacionais.
A possível aplicabilidade dos conceitos de Patterson (2003) em organizações como as novas comunidades, instigou a pesquisa. A partir do instrumento de coleta de dados de Dennis e Bocarnea (2005), observou-se que as sete “construções virtuosas” de Patterson (2003) adequam-se ao caso de estudo.
Os líderes investigados e citados pelos membros respondentes, parecem comportar-se de acordo com o pressuposto teórico apresentado, expressando características de líderes servidores.
É possível concluir que a Nova Comunidade investigada possui características de organização essencialmente servidora, e que a teoria apresentada adequa-se ao estilo organizacional. Deste modo, com o crescente número de Novas Comunidades, no Brasil e no mundo, as conclusões deste estudo podem servir de cenário para abstração de ideal-tipo teórico, por ser um caso de experimentação conceitual.
Este estudo é a continuação de estudos iniciados para fins de dissertação de mestrado, carecendo ainda de futuros testes com multimétodos que possam oferecer resultados mais conclusivos. A continuação deste estudo permitirá ampliar o entendimento do das organizações Novas Comunidades, e da liderança servidora no contexto nacional.
REFERÊNCIAS
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