Resumo: Este artigo dialoga com o debate sobre a condição de cidadania de adolescentes em confli- to com a lei. Nesta medida, dialoga com atores do Estado e da sociedade civil, problema- tizando suas atribuições como promotores e operadores do direito, bem como reprodu- tores de valores e práticas, nem sempre em concordância com os preceitos legais. Aborda as dificuldades decorrentes do falso conflito entre a responsabilização e a proteção dos direitos, apresentando três argumentos para o debate: o protagonismo invertido dos ado- lescentes pobres em virtude da sujeição criminal, o dilema da cidadania inacabada e sele- tiva e o argumento ambíguo da incompletude institucional. Finaliza apontando iniciativas que estão sendo implementadas com o objetivo de fortalecer a articulação e integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade civil na efetivação dos direitos hu- manos de adolescentes envolvidos na prática de ato infracional.
Palavras-chave:Adolescente em conflito com a leiAdolescente em conflito com a lei,Ato infracionalAto infracional,Medidas socioeducativasMedidas socioeducativas,CidadaniaCidadania.
Keywords: Adolescents in conflict with the law, Offense, Educational measures, Citizenship
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Somos todos infratores
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liberdade em todo o mundo, convencidas de que os jovens, quando se encontram privados de liberdade, são extremamente vulneráveis aos maus-tratos, à vitimi- zação e à violação de seus direitos.
Neste sentido, a Organização das Nações Unidas (ONU) é categórica ao afir- mar que a reclusão juvenil só será aplicada em último caso e pelo menor período possível. Essas regras têm como objetivo normatizar minimamente a proteção dos jovens privados de liberdade, de maneira compatível com os direitos huma- nos e liberdades fundamentais e deverão ser aplicadas sem discriminação4.
Pouco antes disso, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança5 já apontava as diretrizes sobre a matéria, sob a luz do melhor interesse da criança, já que em seu artigo 376, também estabelece regras para a privação de liberdade de crianças, preconizando valores como dignidade, humanidade, respeito, preserva- ção dos vínculos familiares e separação de presos adultos. Mesmo as Regras Míni- mas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude (Regras de Beijing), adotadas na Assembleia Geral da ONU em sua resolução 40/337, de 1985, adotavam esses princípios norteadores8.
Três argumentos para o debate
No nosso país, sempre que se fala do Estatuto da Criança e do Adolescente, em especial da questão da prática do ato infracional envolvendo adolescentes e jovens e das medidas socioeducativas, a abordagem do tema é local e as soluções passam em condenar a um ou outro personagem ou instituição. Poucos se dão conta de que se trata de uma questão que envolve o Estado, a família, toda socie- dade brasileira e a comunidade internacional.
O debate sobre a intervenção com adolescentes em conflito com a lei par- ticipa, de modo muito incipiente, na agenda9 formal do país. Não se trata de um tema prioritário, se comparado a outros, como serviços públicos, formas de representação, corrupção, entre outros. No entanto, sempre que ocorre um ato infracional grave, cometido por um adolescente de origem pobre, o tema tende a ocupar a agenda com argumentos regressivos em relação ao que a lei estabelece. Os argumentos acerca do que deve ser feito para conter a violência entre adolescentes variam a depender da origem social dos infratores. Nesta hora, con- firma-se a suspeita de que os pobres são perigosos e devem, por isso, ser conti- dos, disciplinados e exemplarmente punidos. Os episódios espetacularizados pela mídia servem de base para proposições variadas, entre elas, a que mais ganhou