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A pobreza e as condições de trabalho dos catadores de caranguejo no povoado de Carnaubeiras, Araioses - MA
O Social em Questão, vol. 17, núm. 31, pp. 179-202, 2014
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Seção Livre



Resumo: Este artigo analisa as condições laborais e de pobreza de trabalhadores que vivem em comunidades tradicionais e que dependem dos recursos marinhos constantemente ameaçados pelo desenvolvimento capitalista na zona costeira. Situados no meio-norte do litoral brasileiro, no povoado de Carnaubeiras, em Araioses (MA), os catadores de caranguejo-uçá vivem de sua atividade extrativa. Com base em pesquisa bibliográfica e documental, o presente estudo aborda as relações de pobreza e de exclusão social desses trabalhadores, suas limitações, as dificuldades de organização e de acesso aos programas sociais do governo.

Palavras-chave: Catador de caranguejo, Pobreza, Exclusão social.

Abstract: This article examines the labor and poverty of workers who live in traditional commu- nities that depend on marine resources constantly threatened by capitalist development in the coastal zone conditions. Located at the mid-north of the Brazilian coast, in the town of Carnaubeiras in Araioses (MA), the land crab pickers live their mining activity. Based on literature and documents, this study analyzes the relationship of poverty and social exclusion of these workers, their limitations, difficulties of organization and ac- cess to government social programs.

Crab pickers; Poverty; Social exclusion.

pg 179 - 202

O Social em Questão - Ano XVIII - nº 31 - 2014

180 Jean Carlos Costa Soares e Jaíra Maria Alcobaça Gomes

Keywords: Crab pickers, Poverty, Social exclusion.

A pobreza e as condições de trabalho dos catadores de caranguejo no povoado de ...

Considerações finais

197

Dada a importância da contribuição social em abordar os problemas enfrenta- dos pelos catadores de caranguejo no povoado de Carnaubeiras, observou-se que suas condições de trabalho seguem uma lógica de desarranjo socioeconômico, no que diz respeito às garantias de proteção social, no âmbito das políticas públicas oferecidas pelo Estado aos trabalhadores.

Nota-se que os catadores de caranguejo da referida comunidade traba- lham de forma dispersa, com jornada diária de seis da manhã às quatro da tar- de para os mangues do Delta do Parnaíba. Predomina ali uma característica de forte informalidade entre os catadores, o que lhes favorece a exploração por parte dos intermediários na comercialização do crustáceo. Assim, entre os catadores, não há cooperação que produza alguma mudança direcionada à melhoria de seu trabalho.

Ocorre que os catadores de caranguejo trabalham em núcleos independentes entre si, com pequenos grupos de 3 a 4 pessoas — geralmente membros de sua família—, com cada um coletando o seu produto. O isolamento desses grupos dificulta a articulação entre seus pares para se organizarem coletivamente, com vistas ao crescimento da categoria.

Outra questão detectada é a natureza persistente da pobreza frente ao fator renda do catador de caranguejo. O que é coletado nos manguezais da região nem sempre é suficiente para transformar em renda e manter as necessidades básicas da sua família, daí dependem do auxílio de benefícios — como o Bolsa Família, por exemplo — dos programas sociais do governo, para complementar a renda. Dessa forma, a maioria dos catadores de caranguejo em Carnaubeiras tem dificuldades no acesso a esses benefícios sociais, porquanto não dispõe de do- cumentos mínimos para o cadastro nesses programas. São, ainda, impedidos de obter crédito bancário como, por exemplo, para o beneficiamento do produto caranguejo-uçá, por não possuírem documentos como o registro geral de identi-

ficação (RG) e o cadastro de pessoa física (CPF).

A confusão jurídica entre trabalhadores artesanais da pesca, como o pescador propriamente dito, e o catador de caranguejo, leva este último a não obter acesso ao seguro desemprego, o que configura outro problema detectado na comuni- dade, onde a maioria recebe o seguro desemprego, mas não como catador de caranguejo e sim como pescador. Nesse sentido, há necessidade de se delimitar a atuação e competência dos profissionais da pesca na legislação que trata sobre a categoria, objetivando atender às demandas trabalhistas.

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Por fim, convém promover uma articulação entre os governos federal, es- tadual e municipal, a fim de sanar os problemas detectados na comunidade de Carnaubeiras. Os catadores de caranguejo desse povoado também devem fazer a sua parte, organizando-se coletivamente para formar um grupo coeso de pressão junto ao poder público, objetivando a busca por melhores condições de trabalho e acesso a políticas públicas para a categoria.

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Notas

1 Bacharel e licenciado em Geografia pela Universidade Estadual do Ceará e Universidade de Nova Venécia-ES (UECE/UNIVEN), com especialização em Gestão Ambiental pela Faculdade de Ciências eTecnologia de Salvador (FTC), mestrando em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Email: jean-carloscs#@hotmail.com 2 Economista pela Universidade Federal do Piauí, mestrado em Economia Rural pela Universi- dade Federal de Campina Grande e doutorado em Economia Aplicada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Professora Associada do Dep. de Ciências Econômicas da UFPI, Professora do Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente - REDE PRODE- MA. Atualmente é Coordenadora Geral de Pesquisa/PRPPG/UFPI. Email: jaira@ufpi.edu.br
3 Conjunto de medidas – que se compõe de dez regras básicas – formulado em novembro de 1989 por economistas de instituições financeiras situadas em Washington D.C., como o FMI, o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, fundamentadas num texto do economista John Williamson, do InternationalInstitute for Economy, e que se tornou a política oficial do Fundo Monetário Internacional em 1990, quando passou a ser “receitado” para promover o “ajustamento macroeconômico” dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades.
4 Incorporadoras, agentes do turismo, empreendimentos hoteleiros, dentre outros.
5 Pobreza, miséria, violência, informalidade, dente outras.
6 Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. pg 179 - 202 O Social em Questão - Ano XVIII - nº 31 - 2014 202 Jean Carlos Costa Soares e Jaíra Maria Alcobaça Gomes
7 A extensão litorânea total correspondente não considera os recortes litorâneos, podendo che- gar a aproximadamente 8,5 km de extensão.
8 Entende-se por informalidade, segundo Rosa (2005, p. 8), uma atividade desprovida de pro- teção jurídica, ou seja, da inexistência de uma legislação trabalhista que ampare determinada atividade laboral.
9 A globalização, no que diz respeito à economia mundial, provoca mudanças na relação capital e trabalho.
10 Conjunto de medidas de austeridade propostas pelas principais instituições financeiras interna- cionais como o FMI e o Banco Mundial para “reorganizar” a economia dos Estados emergentes.
11 Por questão social entende-se um “conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operária impôs no mundo no curso da constituição da sociedade capita- lista. [...] está fundamentalmente vinculada ao conflito entre capital e trabalho” (CERQUEIRA FILHO, 1982, p. 21). As manifestações da questão social derivam do conflito entre capital e trabalho na forma de pobreza, miséria, violência, exclusão social, dentre outros.
12 O centro do sistema capitalista encontra-se nas principais economias desenvolvidas ao norte do equador. Como exemplos, o centro financeiro norte-americano chamado de Wall Street, na Europa e no Japão onde operam a financeirização do capital por meio de bolsas de valores.
13 Autores como Robert Castel, Vera Telles, José de Souza Martins, Luis Eduardo Wanderley e Elimar Nascimento (SHCWARTZ; NOGUEIRA, 2000, p. 97). 14 “Ser virtuoso é ter um coração francês”. 15 “louco”.
16 Os direitos de que trata Carvalho (2002) foram empregados pela primeira vez por Marshall (1967) em direitos políticos, civis e sociais ao analisar a sociedade inglesa do século XIX e a primeira metade do século XX.
17 A política pública é entendida como “ação pública, na qual, além do Estado, a sociedade se faz presente, ganhando representatividade, poder de decisão e condições de exercer o controle sobre a sua própria reprodução e sobre os atos e decisões do governo” (PEREIRA, 2008, p. 94). Artigo recebido em dezembro de 2013, aprovado para publicação em fevereiro de 2014.O Social em Questão - Ano XVIII - nº 31 - 2014 pg 179 - 202


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