RESUMO
Introdução: São notórias a importância e a necessidade de garantias da normalidade sanitária nos estabelecimentos e de mecanismos de controle e promoção da qualidade em todo o ciclo laboratorial.
Objetivo: Pela importância das análises clínicas em Palmas, a Vigilância Sanitária Municipal iniciou em 2010 uma proposta de aprimoramento da atividade regulatória nestes estabelecimentos.
Método: O trabalho foi desenvolvido em quatro etapas em paralelo ao Licenciamento Sanitário Anual. Em 2010 foi realizada a primeira fase de recadastramento dos estabelecimentos e a apresentação do dossiê técnico existente nos estabelecimentos. Em 2011, ele se estendeu com a análise, revisão, correção e aprovação dos documentos legais e técnicos. Já em 2012 foram reavaliados os manuais, os planos de controle de pragas, de gerenciamento de resíduos, de controle dos insumos e da presença de controle da qualidade interno e externo além do fluxo para notificação de doenças compulsórias já em aplicação nos estabelecimento. Em 2013 foram exigidas a apresentação e a implementação das ações de gerenciamento da qualidade e, em 2014, intensificou-se o monitoramento da aplicação destas ferramentas.
Resultados: Os resultados obtidos foram a aceitação dos processos regulatórios, bem como a realização de correções e a inclusão de normas e procedimentos escritos nas ações técnicas e de gerenciamento dos processos de análises clínicas. Pode-se constatar que, pela exigência da capacitação dos técnicos, já ao final de 2014, observava-se a cultura da capacitação e divulgação da necessidade de aprimoramentos e correções dos pontos de maior probabilidade de problemas sanitários e analíticos, e principalmente tendo a Vigilância Sanitária como um setor de apoio e parceria.
Conclusões: Pode-se concluir com esse trabalho que a estratégia utilizada pela Vigilância Sanitária, associada em paralelo com o Licenciamento Sanitário, de ações de melhorias gradativas em busca de melhor gerenciamento dos riscos sanitários culminou em uma relação harmoniosa de assessoramento, na qual a atuação de controle e regulação sanitário necessitou de mínimas medidas impositivas e restritivas e várias ações de orientações e resolução de problemas em parceria.
Palavras chave: Laboratórios Clínicos, Vigilância Sanitária, Risco Sanitário.
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Relato de experiência sobre as ações de regulação sanitária nos laboratórios clínicos em Palmas-TO
Recepção: 04 Julho 2016
Aprovação: 07 Agosto 2017
No conceito de vigilância sanitária (VISA), em relação às ações que visam promover a saúde, deve ser observado o conjunto de fatores que diretamente ou indiretamente possui potencial de produzir danos à saúde. Assim, a utilização de processos regulatórios, fiscalizatórios e de monitoramento, além da educação sanitária, são ferramentas importantes para atuar frente aos riscos sanitários existentes.
A regulação sanitária deve se reverter também em segurança para os pacientes conforme a Portaria no 529, de 1ode abril de 2013, que institui o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP)1 . Neste contexto, a regulação das atividades laboratoriais, incluindo a estrutura física, a existência de registros sobre a formação adequada e a capacitação dos técnicos, o registro e a avaliação dos controles adotados nos processos analíticos, a informação dos resultados e o gerenciamento da qualidade para normalidade sanitária, contemplados na RDC n° 302, de 13 de outubro de 20052 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), são estratégias consideradas importantes para atuação da VISA.
Ao considerar a importância das análises clínicas para a decisão diagnóstica e as condutas terapêuticas, são notórias a importância e a necessidade de garantias da normalidade sanitária nos estabelecimentos e de mecanismos de controle e promoção da qualidade em todo o ciclo laboratorial. Neste aspecto, ações que produzam e monitorem o controle da qualidade culminam por construir um panorama organizacional e técnico tão vasto que ultrapassa a utilização de indicadores e passa a envolver ativamente todos os personagens da atividade3 .
Neste sentido, as ações que visam garantir a segurança do paciente complementam de maneira importante o conceito do gerenciamento da qualidade nos procedimentos e técnicas utilizados dentro dos laboratórios clínicos e se incluem no ciclo do cuidado aos pacientes, demonstrando o desafio atual nos serviços de saúde. Observando que o objetivo principal das melhorias nos processos analíticos é também ampliar a segurança dos serviços prestados ao paciente e, por isso, não se resume em ações isoladas, mas como um conjunto de ações que se complementam3 .
No cenário de incorporações de novas tecnologias e novos procedimentos com diferentes graus de complexidade, é preciso considerar a importância dos processos que controlam a qualidade do produto/serviço fornecido pelo laboratório clínico, assim como se vem dando ênfase no reconhecimento e na construção de ferramentas para evitar eventos adversos em serviços de saúde4 .
Dessa forma, como o cliente necessita de resultados fidedignos para assegurar o atendimento dessa necessidade é primordial a existência de procedimentos de controle de qualidade ajustados ao processo a ser controlado. Desta forma, cabe à VISA adotar mudanças de estratégias e evoluir em novas moldagens regulatórias, considerando conhecimentos interdisciplinares e graus de especialização para além da simples inspeção, para contribuir no processo de garantia e confiabilidade dos serviços e na segurança do paciente5 .
É percebido que a qualidade das práticas em VISA deve corresponder ao uso adequado do conhecimento técnico para exercer o controle de riscos à saúde6 . Neste sentido, as atividades laboratoriais pela especificidade que possuem nas fases pré-analíticas, analíticas e pós-analíticas pela importância na decisão clínica fornecem a oportunidade de orientar e conduzir estes processos divulgando o conceito do risco sanitário e estimulando ações de análise, correção e monitoramento como estratégias de controle e regulação7 . Além do que, como resultado do gerenciamento com qualidade e segurança sanitária nos processos de trabalho, aliado ao processo de comunicação, podem minimizar a ocorrência de erros analíticos e facilitar a melhoria dos procedimentos existentes envolvendo a prestação de serviços ou oferta de novas tecnologias, sejam eles isolados ou em conjunto, atendendo expectativa de atuação sanitária no contexto do gerenciamento de riscos sanitários8 . O campo sanitário ainda pode relacionar também, os danos à integridade e à saúde dos pacientes, inclusive com a possibilidade da ocorrência de doenças e até mesmo da morte9 .
Por manterem o alto grau de sofisticação, os laboratórios clínicos passam a ser um desafio para a regulação sanitária, e se propõe neste trabalho apresentar a atuação da Vigilância Sanitária de Palmas, que pautou ações de licenciamento sanitário em conjunto com novas estratégias para além da simples inspeção. Nesse caminho, aspectos que englobam os conceitos de gerenciamento da qualidade, ações visando a redução de problemas sanitários, melhorias nos processos de análise e medidas gerais de atendimento e proteção ao paciente são importantes e precisam estar presentes nas perspectivas de enfrentamento do risco sanitário e de segurança do paciente10 .
A necessidade de conhecimento sobre a realidade sanitária dos laboratórios no município de Palmas, observando qual o grau de integração entre a legislação sanitária para licenciamento e a existência de estratégias para execução do controle de qualidade e o gerenciamento pleno deste na rotina, culminou em um trabalho propondo a modificação da realidade encontrada. A base das ações de orientação e intervenção foram pautadas na RDC n° 302/2005 da Anvisa, que dispõe sobre Regulamento Técnico para Funcionamento de Laboratórios Clínicos.
O projeto foi dividido em quatro fases a partir do início de 2010 e englobou alguns objetivos específicos citados abaixo.
Fase 1: O processo de regulação sanitária da atividade dos laboratórios clínicos foi iniciado pela atualização do cadastramento e busca ativa dos estabelecimentos laboratoriais e seus postos de coletas existentes para determinação da quantidade atual e da localização. Nos laboratórios encontrados foi realizada inspeção inicial e lavrada uma notificação sanitária para providências de solicitação do licenciamento sanitário anual junto ao órgão sanitário, apresentando minimamente o contrato social, o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), comprovante de regularidade ética, taxas, Projeto Básico Arquitetônico aprovado pelo setor de análise de projetos da Vigilância Sanitária, e um dossiê com os documentos e manuais técnicos existentes, sendo que essas atividades tiveram conclusão ao final de 2010. A base legal foi o Capítulo 5.1 e 5.2 da RDC n° 302/2005, que dispõe sobre Regulamento Técnico para Funcionamento de Laboratórios Clínicos.
Fase 2: Após a avaliação e a aprovação inicial dos documentos apresentados na fase 1, deu-se início à segunda fase envolvendo nova notificação sanitária, neste momento, com a solicitação de apresentação para a análise e de outros documentos gerados pelo estabelecimento, com o objetivo de checar a regularidade das atividades frente à legislação sanitária comum aos estabelecimentos de saúde. A análise destes documentos gerou um parecer que foi utilizado como critério básico para emissão do licenciamento sanitário referente ao ano de exercício de 2011. A avaliação destes documentos gerou uma notificação para correção dos erros encontrados durante a avaliação. Os documentos avaliados foram o Projeto Básico Arquitetônico baseado na RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 200211 , que dispõe sobre o Regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde, Manual de Boas Práticas (MBP), Plano de Gerenciamento de Resíduos, mantendo a base legal na RDC n° 302/2005 e incluindo a RDC nº 306, de 7 de dezembro de 200412 , que trata do Regulamento Técnico para o Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde.
Fase 3: Conforme as documentações foram inicialmente formalizadas, no ano de 2012, o licenciamento sanitário anual foi vinculado ao cumprimento de demandas direcionadas ao aprimoramento e construção das medidas e ações de implantação, adequação, monitoramento e evolução das estratégias e ferramentas utilizadas para o controle de qualidade nas etapas pré-analíticas, analíticas e pós-analíticas. Foi reavaliado o MBP com enfoque na atualização das técnicas e procedimentos, aplicação e uso na rotina, construção da legalização ética e contábil dos laboratórios. Foram também solicitadas a construção e a apresentação de um plano anual de controle integrado de pragas para avaliação e aprovação, além do cadastramento do corpo técnico e dos equipamentos existentes no estabelecimento. Exigiu-se a formalização do rol de procedimentos executados e quais eram terceirizados, além do cadastramento compulsório junto à Vigilância Epidemiológica para atender as rotinas de notificação de doenças compulsórias.
Fase 4: Deu-se início à última fase do processo de regulação sanitária notificando os laboratórios para providenciar licenciamento sanitário obedecendo aos critérios que foram divulgados em Comunicação Técnica específica. Importante destacar que, devido à extensão das medidas exigidas para esta fase, a organização solicitada se prolongou até o licenciamento sanitário anual de 2014. Sendo assim, foi determinada a construção de dossiê dividido em capítulos, contendo informações e comprovações necessárias conforme os itens seguintes:
Comprovação da adequação contábil do estabelecimento.
Declaração do corpo técnico com as devidas comprovações técnicas e éticas da equipe, na qual todos os citados no corpo técnico deveriam estar presentes nas comprovações de execução do programa de capacitação anual da equipe que foi apresentado.
Apresentação da portaria de aprovação do projeto arquitetônico;
Declaração dos procedimentos realizados, dos serviços terceirizados com a comprovação de relação e legalidade contábil, ética e sanitária dos contratados;
Declaração de análise e aprovação das atualizações do MBP;
Apresentação do Plano de Gerenciamento de Resíduos (PGRSS) para avaliação específica do destino final dos resíduos com a implantação de formulário para quantificação e acompanhamento da geração de resíduos.
Foi solicitado aos laboratórios comprovação da aplicação do controle interno proposto anteriormente, com o registro e medidas de auditação e correção realizadas no ano anterior. Bem como a comprovação de estar realizando controle externo de qualidade no laboratório;
Apresentação por meio de formulário de cadastro individual dos equipamentos, proposto pela Vigilância Sanitária, com destaque para o campo de registro das manutenções e calibrações exigidas no manual do fabricante e propostas nos MBP apresentado anteriormente;
Apresentação do mapa de controle de insumos para cadastramento dos produtos químicos utilizados no estabelecimento;
Implantação de formulário para apresentação das rotinas de higienização e conservação do sistema de climatização de interiores, com utilização de formulário específico para a avaliação das rotinas de higienização por ambiente;
Apresentação do programa de saúde ocupacional para avaliação sanitária;
Implantação de um formulário de quantificação e monitoramento de notificação de doenças compulsórias.
Em todas as fases, os documentos foram avaliados primeiramente e somente após a conclusão do parecer da avaliação, o estabelecimento recebeu a visita para inspeção sanitária da equipe da Vigilância Sanitária no estabelecimento.
As atividades de análises clínicas em Palmas iniciaram-se juntamente com a criação da cidade, que em 2016 tinha apenas 27 anos. Por todo o período, a Vigilância Sanitária licenciou sanitariamente a atividade avaliando a normalidade quanto às exigências éticas e sanitárias. Neste sentido, as ações que eventualmente ocorreram após o licenciamento com vistas ao controle da normalidade sanitária, foram motivadas essencialmente por denúncias ou reclamações dos usuários pelos serviços prestados.
Contudo, a evolução na atividade laboratorial influenciada pelo crescimento populacional da cidade e também com a crescente tendência de investimentos no atendimento e na satisfação do cliente, bem como o aumento na oferta de serviços para garantir viabilidade comercial13 deram-se por estimular a inclusão de novas tecnologias no setor, ampliando a capacidade diagnóstica e também a complexidade para a regulação sanitária satisfatória.
A proposta de Licenciamento Sanitário iniciado em 2010 com notificação para atualização de cadastro junto ao órgão sanitário obteve como resultado a ampliação do controle regulatório da atividade laboratorial conforme mostra a Tabela 1 , na qual pode ser observado que, de um total de 62% de laboratórios licenciados em 2010, passou-se para 92% em 2014.
Ocorreu que, à medida que se atualizaram os dados junto a Vigilância Sanitária, constatou-se a necessidade por parte de alguns estabelecimentos de se adequarem seus contratos sociais, Cartão de CNPJ, Cadastro Imobiliário, citando todas as atividades que realmente executavam e nesta incluírem obrigatoriamente a opção do Código Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) para laboratórios clínicos14 .
A fase inicial do processo de licenciamento foi positiva para o reconhecimento da presença da atividade no plano municipal pela Vigilância Sanitária. Na mesma linha, merece ser destacado que, pela facilidade de diálogo e colaboração do setor na solução dos conflitos burocráticos, também se perceberam melhorias no relacionamento e na harmonização do vocabulário utilizado entre a Vigilância Sanitária e os estabelecimentos regulados.
A adequação cadastral com monitoramento e verificação das informações prestadas influenciou no perfil geral das autorizações para funcionamento, também no valor das taxas cobradas e, por vezes, resultou na permanência apenas da atividade prevista na Classificação Nacional de Atividades Econômicas na subclasse no 86.402/02 (Laboratórios Clínicos). É importante observar que não foi impedido o acúmulo de atividades comerciais, todavia exigiu-se que fossem cumpridas todas as exigências de controle sanitário para o funcionamento, sempre garantindo que não houvesse prejuízos às rotinas do laboratório nem aos pacientes.
Na Tabela 2 pode-se perceber que, ao iniciar os trabalhos de Licenciamento Sanitário, foi necessário enfatizar o cumprimento das exigências documentais, cujo objetivo principal era garantir a legalidade mínima para o funcionamento e menos enfática como comprovação do controle da qualidade e ferramentas para gerenciamento e diminuição dos riscos sanitários. Baseado nos resultados apresentados na Tabela 2 , é possível constatar que, em 2010, nos 18 laboratórios cadastrados, não havia registro no estabelecimento da realização do controle de qualidade externo, não se realizavam vínculos nem comprovações para avaliação dos laboratórios de apoio. Era uma prática comum a presença de profissionais sem o adequado registro no corpo técnico. Comprovando a necessidade de realizar modificações na realidade sanitária posta em 2010, observou-se a situação de que 55% dos laboratórios se encontravam realizando as atividades sem registros ou protocolos operacionais desconsiderando a importância dos MBP ou de haver registro dos procedimentos. Realidade também constatada com as negligências no controle interno de qualidade conforme prevê a legislação (RDC n° 302/05 da Anvisa). Na mesma forma estavam os procedimentos com relação ao tratamento e descartes de produtos, e não havia programa de gerenciamento de resíduos conhecidos e avaliados pela Vigilância Sanitária em nenhum destes estabelecimentos. Outra informação importante é que não havia registro na VISA (Sem registro) das comprovações do Controle de Qualidade externa sendo realizada pelos laboratórios.
O conhecimento e adoção de critérios para avaliação da normalidade sanitária, da qualidade e da biossegurança contribuem na avaliação dos riscos envolvidos na atividade realizada. Desta maneira, a ausência de controles e registros nos processos ou de informações geradas pressupõe que, para obtenção de licenciamento sanitário, deveriam ser melhor gerenciados e comprovados. Embora não existam relatos registrados, nem denúncias de erros laboratoriais ou desvios de qualidade analíticos, nem mesmo indicadores epidemiológicos relacionados à atividade laboratorial reportados ou relacionados neste período para colaborar com o assunto.
O cadastramento dos estabelecimentos e a realização de monitoramento de critérios de interesse sanitário após o final do processo de licenciamento, em conjunto com a verificação das medidas adotadas com a implementação de ferramentas e práticas operacionais voltadas à elevação da garantia de qualidade, em todas as fases pré-analítica, analítica e pós-analítica, produziram mudanças importantes na perspectiva do funcionamento destes estabelecimentos.
A evolução na melhoria das informações prestadas em conjunto com a realização de adequações estruturais, investimento nas condutas técnicas pautadas por procedimentos operacionais publicados, exigiu empenho e reorganização no corpo técnico, além das estratégias de atendimento e nas demais condutas em geral.
Nesse mesmo sentido também se percebeu a ampliação no entendimento da necessidade de reconhecer e gerenciar os pontos críticos no controle analítico, da mesma forma que a necessidade de realização de investimentos na capacitação da equipe. Existiram avanços que merecem destaque como ampliação das medidas e ações para o controle da qualidade analítica, uma vez que os laboratórios passaram a buscar e inserir nas práticas de rotinas analíticas, novas medidas internas para controle, avaliação e registro dos resultados. Aliados à política de controle e monitoramento da normalidade no funcionamento dos equipamentos e insumos, refletindo diretamente na elevação da confiança dos resultados.
A evolução na perspectiva dos cuidados sanitários nos laboratórios também é demonstrada na Tabela 3 , uma vez que as exigências documentais, em conjunto com o processo de assessoramento da construção, aprovação e aplicação destes procedimentos, estimularam o empenho dos profissionais graduados e dos técnicos no estabelecimento. Pode-se constatar, ao final de 2014, a preocupação em manter as rotinas em obediência ao portfólio de manuais técnicos produzidos e normas de orientação dos procedimentos existentes. A mudança comportamental dos envolvidos na atividade laboratorial com atitudes pró-ativas é confirmada pelo aumento de tempo e oferta de cursos nos calendários de cursos de atualização, revisão de práticas, produção de eventos científicos de aprimoramento e capacitação.
Promover ações que visem aumentar os controles da garantia na qualidade e que auxiliem na promoção da exatidão e confiança nos resultados laboratoriais envolve várias atividades que se complementam. Combinadas as ações no controle das rotinas, seja nas etapas de preparação do laboratório para receber e manipular as amostras, seja na fase analítica e pós-analítica, na saúde ocupacional e de satisfação do cliente, elas são fundamentais porque, além de atender à legislação sanitária, destacam-se o compromisso ético e técnico de minimizar a ocorrência de erros.
Pode-se perceber que a estratégia da Vigilância Sanitária ao monitorar ações presentes na Tabela 2 , como a higienização dos ambientes em critérios definidos, a limpeza de equipamentos de circulação de ar e refrigeração interior, somada ao monitoramento do controle dos vetores urbanos, produz resultados positivos e direciona as ações para atitudes concretas que complementam os resultados imediatos na contenção dos perigos e das possibilidades de gerar danos pelos riscos sanitários envolvidos.
A reestruturação dos procedimentos operacionais existentes, revisando as rotinas e adequando as responsabilidades internas, demonstra que as melhorias são viáveis e não comprometem a viabilidade da atividade. Uma vez que a construção das ações de monitoramento no controle interno da qualidade e a verificação de realização do controle externo da qualidade nos laboratórios talvez tenha sido a atitude sanitária mais acertada no ponto da elevação do controle da qualidade nestes estabelecimentos. Pois, se observarmos a elevação quantitativa nestes processos de 2010 para 2014, podemos concluir que existiam laboratórios realizando análises clínicas com poucos controles e verificação de normalidade e exatidão dos resultados produzidos.
A Tabela 2 demonstra o crescimento do Controle Interno de Qualidade (CIQ) e do Controle Externo de Qualidade (CEQ), apresentando os estabelecimentos que atualmente executam a verificação analítica da rotina com os laboratórios externos, assim reduzindo a possibilidade de que rotinas equivocadas permaneçam em execução.
Após o processo de regularização das exigências sanitárias e observando-se que os resultados laboratoriais podem ser úteis e apoiar no processo de registro, mapeamento e investigação epidemiológica, a Vigilância Sanitária determinou, por meio de notificação com cumprimento imediato, a providência de abertura de livro para registro e comprovação do envio das notificações compulsórias de doenças e agravos considerando a Portaria n° 104/GM de 25 de janeiro de 201115 .
Seguindo ainda no fluxo de notificação de doenças compulsórias, a cobrança na comprovação de capacitação a respeito do fluxo a ser obedecido entre o estabelecimento e o setor responsável na Diretoria de Vigilância em Saúde permitiu que o setor de epidemiologia estabelecesse um canal de importância nas ações que relacionam a atividade laboratorial ao processo de investigação epidemiológica e alimentação dos sistemas de informações e indicadores de saúde municipal.
A iniciativa de licenciar os laboratórios clínicos sob responsabilidade de regulação sanitária municipal em Palmas, atrelada às medidas para reconhecimento das condições sanitárias na qual cada um se encontrava e dar início a um processo gradual de melhorias na qualidade, levando em conta as condições financeiras e técnicas disponíveis, além da capacidade de arcar e produzir as mudanças necessárias, é uma das estratégias que a Vigilância Sanitária pode utilizar em substituição ao modo de operação tradicional, utilizando uma análise documental prévia e uma inspeção no local. O monitoramento das ações dos laboratórios de análises clínicas não deve possuir a intenção de punir ou gerar questionamentos sobre as rotinas, e sim de estabelecer relações de parcerias, estimulando os laboratórios a se associaram para facilitar difusão de conhecimentos e solução dos problemas em comum.
Em paralelo a estas ações, a Vigilância Sanitária buscou se posicionar sempre como um setor de apoio, que auxiliasse e colaborasse, monitorando os resultados e orientando as atividades com vistas à redução do risco sanitário envolvido, garantindo que a legislação sanitária seja atendida e a finalidade da atividade também.
Podemos concluir que a Vigilância Sanitária possui várias formas de atuação para garantir os objetivos de prevenir e reduzir os danos diretos e indiretos para a saúde da população. A realização do Licenciamento Sanitário Anual que garanta a normalidade da atividade e que associe objetivos em etapas é uma estratégia a ser considerada.
Com os devidos acompanhamentos e a orientação para a realização de adequações documentais e estruturais, a reconstrução dos registros e as melhorias na publicação e aplicação dos procedimentos, além da promoção e a participação nos processos de capacitação dos técnicos e envolvidos nas etapas pré-analíticas, analítica e pós-analíticas, permitiram aos laboratórios estabelecer novos paradigmas de atuação em Palmas. Esse trabalho em parceria com a Vigilância Sanitária resultou na ampliação do entendimento das funções regulatórias sanitárias e demonstrou praticamente que as interações entre setor regulado e regulador podem ocorrer de maneira harmoniosa e colaborativa.
os autores informam não haver qualquer potencial conflito de interesse com pares e instituições, políticos ou financeiros deste estudo..
* E-mail: marciotrevi@gmail.com