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A estratégia político-administrativa do imperador Teodósio II na convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla (428 d.C.)
Daniel de Figueiredo
Daniel de Figueiredo
A estratégia político-administrativa do imperador Teodósio II na convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla (428 d.C.)
The political-administrative strategy of the emperor Theodosius II in Nestorius’ appointment to the Episcopacy of Constantinople (428 AD)
Anos 90, vol. 27, e2020004, 2020
Universidade Federal do Rio Grande Sul, Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
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RESUMO: O objetivo desse artigo é analisar a estratégia político-administrativa do imperador Teodósio II (408-450 d.C.) na convocação do bispo Nestório para o episcopado de Constantinopla, em 428 d.C. Esse acontecimento deu início à Controvérsia Nestoriana, conflito teológico que emergiu na hierarquia eclesiástica do Império Romano do Oriente e buscava estabelecer uma ortodoxia em relação ao modo como se deu a interação entre as naturezas humana e divina no Cristo encarnado. Ao se perceber que as facções formadas na defesa da união das naturezas, advogada pelo bispo Cirilo de Alexandria, e separação delas, defendida por Nestório de Constantinopla, contemplavam a presença de funcionários da administração imperial na disputa, indicaremos que o sentido da convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla, por Teodósio II, esteve relacionado não apenas ao estabelecimento de projeto de unidade religiosa, mas se inseria, também, no complexo jogo político-administrativo que abarcava a acomodação de interesses e o contrabalanceamento de poderes com as aristocracias de funcionários que contribuíam para legitimar a unidade imperial.

PALAVRAS-CHAVE:Antiguidade TardiaAntiguidade Tardia,Império Romano do OrienteImpério Romano do Oriente,Controvérsia NestorianaControvérsia Nestoriana,Teodósio IITeodósio II,Nestório de ConstantinoplaNestório de Constantinopla.

ABSTRACT: The aim of this article is to analyze the politico-administrative strategy of Emperor Theodosius II (408-450 AD) in the appointment of Bishop Nestorius to the Episcopacy of Constantinople in AD 428. This event led to the Nestorian Controversy, a theological conflict, which emerged within the ecclesiastical hierarchy of the Eastern Roman Empire, and sought to establish an orthodoxy regarding the manner in which the interaction between the human and divine natures occurred in the incarnate Christ. We perceived that the factions formed in the defense of the union of the two natures, advocated by bishop Cyril of Alexandria, and the separation of them, defended by Nestorius of Constantinople, had considered the presence of officials from the imperial administration in the dispute. Therefore our objective was to show that the reason Nestorius had been appointed to the Episcopacy of Constantinople by Theodosius II was related not only to the establishment of a project for religious unity, but also toward the complex politico-administrative game which included the consideration of interests and counterbalancing of powers among the aristocracies of officials who contributed to legitimize imperial unity.

KEYWORDS: Late antiquity, Eastern Roman Empire, Nestorian controversy, Theodosius II, Nestorius of Constantinople.

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ARTIGO

A estratégia político-administrativa do imperador Teodósio II na convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla (428 d.C.)

The political-administrative strategy of the emperor Theodosius II in Nestorius’ appointment to the Episcopacy of Constantinople (428 AD)

Daniel de Figueiredo
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil
Anos 90, vol. 27, e2020004, 2020
Universidade Federal do Rio Grande Sul, Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Recepção: 08 Junho 2019

Aprovação: 02 Janeiro 2020

Introdução: o problema

O governo do imperador Teodósio II (408-450 d.C.)1 foi marcado pelo enfrentamento de duas grandes facções que, no plano religioso, disputavam a afirmação de uma ortodoxia que definisse as formas de interação entre as naturezas humana e divina no Cristo encarnado (segunda pessoa da Trindade).2 Em consequência, tal discussão se desdobrava para estabelecer qual estatuto adequado deveria ser atribuído à Virgem Maria, se portadora de uma divindade onde o humano e o divino teriam se fundido em Cristo (Theotokos), conforme defendido pelo bispo Cirilo de Alexandria, ou se portadora tão somente da natureza humana dessa divindade, estabelecendo, assim, uma separação entre o divino e o humano (Christotokos), conforme postulado pelo bispo Nestório de Constantinopla. Na Antiguidade Tardia, os conflitos dessa envergadura que emergiam na hierarquia eclesiástica cristã se atualizavam e perpetuavam na medida em que seus formuladores auferiam prestígio e poder entre seus pares e nas comunidades cristãs quando logravam afirmar determinada ideia teológica por eles defendida, estabelecendo, assim, uma ortodoxia. Essa condição ainda os credenciava com o capital político necessário para influir na estruturação e preeminência das grandes Sés episcopais do Império Romano do Oriente, tais como Constantinopla, Alexandria e Antioquia.3

Mas, essa questão não ficava restrita ao meio eclesiástico. A complexidade dos debates potencializava-se em vista do estreito intercâmbio mantido entre os campos político e religioso num contexto marcado por fortes expressões de religiosidades. Além das implicações soteriológicas, relacionadas à salvação da humanidade e, portanto, com grande apelo social, as definições sobre a natureza divina também traziam no seu bojo formulações ideológicas que sustentavam a unidade do poder imperial. O imaginário do período, calcado na noção de realeza sagrada (basileia) apropriada do período helenístico, atribuía aos imperadores romanos a prerrogativa de representação do divino entre os homens (DRAKE, 2014, p. 219).4

Nessa perspectiva, conforme constatou Peter Brown (2002, p. 103), o projeto de união das naturezas, defendido por Cirilo e seus seguidores, trazia embutido na sua concepção a noção de maior centralização e potencialização do poder imperial, pois a junção entre o divino e humano passava, no imaginário do período, a percepção de proximidade entre o imperador e a divindade que ele representava. Ao contrário, a teologia de Nestório propunha uma conjunção entre as naturezas, o que trazia a percepção de separação e, consequentemente, tornava a divindade transcendente e distante da humanidade. Nesse caso, a percepção do papel reservado ao imperador era tão somente o de representante da porção humana de Cristo. Logo, essa fórmula nestoriana afetava a percepção do poder de representação divina atribuído ao imperador. Corroborando essa análise de Brown, Ernst Kantorowicz (1998, p. 27-28) já havia verificado como essas ideias cristológicas acerca da natureza da divindade cristã, elaboradas no V século, foram apropriadas e serviram de base para, mais tarde, os juristas elisabetanos do final do Medievo formularem a teologia política dos Dois Corpos do Rei, período em que a preocupação era afirmar a centralidade do poder real.

As cartas imperiais e episcopais inseridas nos Acta Conciliorum Oecumenicorum, tomos I e II (ACO), que detalharemos mais adiante, trazem-nos indicações acerca dos debates que circundaram essa questão, bem como a atuação de Teodósio II na mediação do conflito, que ficou conhecido pela historiografia como Controvérsia Nestoriana. Por determinação imperial, dois concílios episcopais foram convocados com a finalidade de negociar as disputas. Em 431, no Concílio de Éfeso I, a posição que ganhou corpo e saiu fortalecida foi aquela da união das naturezas advogada por Cirilo de Alexandria. Uma vez que as divergências persistiram na arena político-religiosa, foi determinada uma nova rodada de negociações na qual, dessa vez, saiu dominante a posição nestoriana, cujo credo embutia a noção de separação das naturezas. O compromisso assinado pelas partes, em 433, ficou conhecido como Fórmula da Reunião. Mas, as divergências teológicas renovavam-se com frequência, pois, como discorreremos adiante, questões mais complexas de natureza político-administrativa estavam associadas ao conflito. Na sequência do conflito, por ocasião do Concílio de Éfeso II, em 449, Teodósio II abandonou a posição de negociação observada até então e passou, de forma contundente, a apoiar uma teologia mais radical da união, inspirada na proposta de Cirilo.5 Nesse momento, a noção de divindade que emergiu como ortodoxa aprofundava ainda mais a percepção de união das naturezas, no que viria, mais tarde, a ser conhecida como doutrina monofisista.

Em vista dessa alternância de posicionamento em relação às duas facções que se formaram na defesa da união ou separação das naturezas, a atuação do imperador Teodósio II no gerenciamento do conflito foi percebida, desde a Antiguidade Tardia, e até pela historiografia recente, como desprovida de firmeza e susceptível de manipulação por parte dos bispos que assumiram o protagonismo nos embates. Percepções como a do escritor Prisco de Pânio (2014, p. 227-229) já no século V, dentre outras subsequentes, como a do cronista Malalas (1986, XIV, 19) e do historiador da Igreja Evágrio Escolástico (2011, I, 5), ressaltavam a inabilidade política, a covardia do imperador e a excessiva influência que os eunucos da Corte exerciam sobre ele, colocando, assim, em dúvida a sua capacidade para o exercício do poder imperial:

Teodósio, que sucedeu seu pai Arcádio como imperador, era dócil e viveu uma vida de covardia. Ele obtinha a paz por dinheiro, não lutando por ela. Tudo o que ele fazia era sob influência dos eunucos, e eles traziam os assuntos em tal grau de absurdo que, para colocar brevemente, eles distraíam o imperador, como se distrai uma criança com brinquedos, e não o permitiam fazer nada digno de registro, embora ele tivesse um bom caráter. Mesmo quando ele havia alcançado cinquenta anos de idade, eles o persuadiam a continuar em certas atividades de baixa classe e em caçadas de bestas selvagens, tanto que eles, e Crisáfio [eunuco] em particular, empunharam o poder real (PRISCUS, 2014, p. 227-229).6

Impressões dessa natureza contribuíram para, na historiografia recente, se manter a construção de imagem depreciativa da atuação de Teodósio II, conforme percepção de Kathryn Chew (2006, p. 208):

É possível que Teodósio II sobreviveu tanto tempo como imperador porque ele era o fantoche de todos, mas fraqueza em um imperador dificilmente era uma garantia de longevidade - testemunha Geta ou Severo Alexandre. Teodósio II parece ter se baseado em ajuda para todas as suas realizações; e parece improvável que ele poderia ter conseguido sobreviver por conta própria.

A despeito da construção dessas imagens depreciativas, outras interpretações têm revisto a atuação do imperador no gerenciamento da crise nestoriana, no sentido de inseri-lo como um ator importante no desenrolar das negociações. Entretanto, mesmo dentre essas interpretações que reabilitam a imagem de Teodósio II, elas ainda mantêm suas análises restritas a um conflito de natureza eminentemente religiosa, que impactava apenas divergências no seio da hierarquia eclesiástica em construção. Na Antiguidade Tardia, o campo religioso interpenetrava-se com as demais esferas da vida social, como a política, a administração, a economia e a cultura, não sendo, por isso, suficiente uma análise isolada para se entender a atuação do imperador. Nesse sentido, não se pode reduzir o conflito apenas a uma querela teológica, nem tampouco entender o sentido da convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla sem ampliar esse gesto de alternância de posições do imperador e inseri-lo em um contexto mais amplo que considere a interação entre as esferas política, religiosa e administrativa.

Dentre as análises que reabilitam a imagem imperial, mas ainda mantêm uma perspectiva da atuação imperial restrita ao âmbito religioso, Susan Wessel (2001, p. 305) destaca o comprometimento e a bem articulada política de Teodósio II na questão teológica no sentido de assegurar a afirmação do credo de Niceia7 e suas intervenções visavam coibir inovações naquela doutrina que já havia sido consagrada pela tradição. George Bevan (2005, p. 230-235), por sua vez, indica que a estratégia de alternância do imperador visava promover divisão na hierarquia eclesiástica como forma de enfraquecer as facções em confronto. A despeito de reconhecer o imperador como atuante nas negociações, ele afirma, entretanto, que outras forças políticas, tais como os funcionários da aristocracia imperial, mantiveram-se neutras no conflito por não fazerem parte do meio eclesiástico. Portanto, as perspectivas de análises de ambos os estudos resultam na percepção de que o imperador mediou um conflito restrito à esfera teológica, no sentido de estabelecer uma ortodoxia, sem, ainda, adentrarem-se nas questões político-administrativas subjacentes que essa análise pretende aprofundar no item seguinte. De modo diferente, Hugh Elton (2009, p. 133-142) indica que Teodósio II estava comprometido com a unidade da Igreja, mas não estava preocupado com qual forma de pensamento religioso deveria predominar. Elton percebe, ainda, que os funcionários imperiais estavam intimamente envolvidos nos negócios religiosos, uma vez que as decisões de governo se davam de forma colegiada na Corte Imperial. Mas, tal envolvimento dar-se-ia em virtude apenas de questões burocráticas relacionadas às posições que ocupavam na estrutura imperial.

Essas análises não se adentram ao problema da convocação de Nestório para o episcopado da capital imperial, que consideramos acontecimento importante para se entender o sentido da atuação do imperador. Pois, o ocupante do cargo de bispo da capital imperial exercia importante papel nas relações de poder do período, uma vez que atuava na Corte imperial assessorando o imperador em assuntos político-religiosos. Mesmo naqueles trabalhos que analisam os motivos da convocação de Nestório não se descortina a atitude paradoxal do imperador de trazer para a proximidade do núcleo de poder alguém que defendia a doutrina da separação das naturezas em Cristo, ideia esta que não era favorável às pretensões políticas de centralidade do poder imperial na pessoa do soberano. Cabe ressaltar que a descentralização das atribuições do imperador redundaria em proveito da maior participação das aristocracias imperiais nas questões político-administrativas do Império.

Algumas explicações foram levantadas pelas historiografias antiga e moderna para se entender os motivos que levaram Teodósio II a nomear Nestório para a chefia da Sé episcopal de Constantinopla, em 428. Sócrates de Constantinopla (2007, VII, 29, 1-2), historiador da Igreja na primeira metade do século V, registrou que as qualidades de detentor de voz poderosa e exímio orador teriam sido preponderantes na escolha. Cirilo, por sua vez, acreditava que a nomeação se dera em virtude da campanha feita pelo bispo João de Antioquia junto ao imperador no sentido de emplacar um aliado oriundo da Diocese do Oriens, cuja capital era a metrópole de Antioquia, local de origem de Nestório (ACO I, 1, 2, p. 66-68). Nesse sentido, o bispo alexandrino concentrou-se na disputa por preeminência na hierarquia eclesiástica que a Sé de Alexandria mantinha, de longa data, com Antioquia pelo domínio do episcopado de Constantinopla. Nestório também justificou sua própria escolha ao acreditar que ela teria ocorrido em virtude da ausência de alguém de dentro do próprio clero de Constantinopla que pudesse apaziguar e unir as diferentes facções que disputavam espaço e liderança na hierarquia eclesiástica da capital imperial (NESTORIUS, 1910, parágrafo 377-378).

Historiadores da atualidade, dentre eles Thomas Graumann (2013, p. 113), têm se inclinado a corroborar que Teodósio II realmente optou pela escolha de Nestório em virtude das qualidades morais, pessoais daquele clérigo e por se tratar de alguém alheio às facções eclesiásticas que tumultuavam Constantinopla. Reforça, ainda, essa percepção os esforços do imperador para mantê-lo no cargo mesmo a despeito da eclosão do conflito com Cirilo e seus seguidores logo após sua investidura no cargo.

Tais percepções se baseiam, também, na carta de convocação do Concílio de Éfeso I, ocorrido em 431, por meio da qual o imperador, embora determinasse a realização da assembleia em local hostil a Nestório, pois o bispo Menão de Éfeso desde a irrupção do conflito se aliara a Cirilo, Teodósio II, por outro lado, sinalizando apoio aos nestorianos, destacou para representá-lo na reunião um funcionário imperial aliado de Nestório, o comes Candidiano8 (ACO I, 1, 1, p. 120-121). Ao tomar essa última atitude, Teodósio II passou a percepção de que favorecia Nestório, conforme também acreditam Christiane Fraisse-Coué (1995, p. 516) e Bevan (2005, p. 150). Nestório registrou esse sentimento de apoio por parte do imperador na apologia à sua doutrina e posição pessoal que escreveu no final da sua vida, o Liber Heraclidis:

Você [Cirilo] tinha todo o apoio do Império e eu somente o nome do imperador, não para dominar você, nem para me manter, nem para minha própria ajuda, mas sim para assegurar minha obediência. É por não estar servido da força da Igreja, nem das forças dos chefes, nem da força do Império que eu cheguei a essa extremidade. Eu que tinha para mim os chefes, o imperador e o episcopado de Constantinopla, eu que tive paciência em relação aos heréticos, tive a dor de ser expulso por você (NESTORIUS, 1910, parágrafo 147).

Esse sentimento teria sido reforçado em virtude da reação de defesa a ele, por parte do imperador, em vista dos distúrbios ocorridos em Constantinopla por aqueles segmentos do clero que eram contrários à sua nomeação:

O imperador lhe [a Dalmácio, Arquimandrita de Constantinopla]9 diz: eu não encontro nenhuma iniquidade nesse homem [Nestório] e nenhuma causa para que ele seja deposto. Eu protesto diante de ti e de todos os homens de que eu sou inocente. [...] Nem agora e nem antes eu me ocupei dessa ordenação, para que se possa pensar que eu me vingo ou que eu busco uma revanche por causa da sua eleição. É por causa de vocês todos que eu fiz vir esse homem de força, quando ele era muito ligado à sua família e a seus parentes. [...] Você foi a causa de tudo isso, e não eu. Quando, ó Dalmácio, eu supliquei a você de se encarregar desse caso e te solicitei com insistência para não recusar o serviço de Deus e você me suplicou, ao contrário, para não o constranger, porque você não era instruído. [...] Você mesmo me disse: Constantinopla tem necessidade de um bispo que seja amado por todo mundo graças às suas palavras e condutas, a fim de que seja o doutor das igrejas e a boca de todos em tudo (NESTORIUS, 1910, parágrafo 376-377) .

A partir do levantamento da problemática acima, e, ao constatarmos a sofisticação das negociações empreendidas por Teodósio II, contrariando a imagem negativa construída em relação a esse imperador pela historiografia, temos por objetivo inserir-nos no debate acerca da estratégia imperial de convocar Nestório para o episcopado de Constantinopla a partir de uma análise político-administrativa. Quando se percebe na documentação o envolvimento de funcionários imperais se aliando às facções lideradas por Cirilo ou Nestório entendemos que a questão se apoiava no tripé religião, política e administração, que se interagiam por meio de um complexo equilíbrio de forças dentro de uma sociedade repleta de diversidades e, portanto, com interesses variados.

Nesse sentido, indicaremos que a convocação de Nestório por Teodósio II se inseria em estratégia que não abarcava somente a busca de unidade doutrinal em torno de uma ortodoxia com membros da hierarquia eclesiástica. O imperador estava, também, negociando a unidade imperial em torno de elementos culturais, políticos, administrativos e territoriais, com outros grupos detentores de poder, que contribuíam para legitimar a sua posição de governante. O jogo de concessões estabelecido pelo imperador ao alternar seu apoio entre as facções longe de caracterizar que ele estava conduzindo as negociações somente com o clero, ou sendo susceptível de ser conduzido pela habilidade dos bispos, indica-nos que as negociações também abarcavam estratégias de negociações de poderes com as aristocracias de funcionários. Conforme já nos indicou Pierre Bourdieu (2007, p. 62-64), o campo religioso é um lugar de concorrência e as ideologias produzidas nele, visando à instauração do monopólio dos instrumentos de salvação, são propícias a serem utilizadas nas lutas por poder e prestígio de seus membros que, no caso em questão, extrapolava a esfera religiosa em virtude da associação entre clérigos e funcionários da administração imperial.

A estratégia político-religiosa e administrativa imperial na Controvérsia Nestoriana e o sentido da convocação de Nestório para o episcopado de Constantinopla

As ações de Teodósio II no gerenciamento da Controvérsia Nestoriana e a emergência do conflito após a indicação de Nestório para o episcopado da capital imperial podem ser perscrutadas por meio das cartas imperiais e episcopais inseridas nos Acta (ACO), bem como no Liber Heraclidis, de Nestório. Os Acta constituem-se de uma monumental coletânea de manuscritos reunidos e editados pelo filólogo Eduard Schwartz e colaboradores, no início do século XX. Os documentos abrangem não somente os registros das sessões conciliares - que reuniram bispos de diferentes províncias do Império por determinação do imperador - mas, também, de uma miríade de cartas trocadas entre membros da organização eclesiástica, decretos e cartas dos imperadores10 e funcionários imperiais, homilias, transcrições de relatos verbais das sessões dos Concílios de Éfeso I (431) e Calcedônia (451)11 e citações de tratados doutrinais contemporâneos aos acontecimentos e também subsequentes. Os documentos foram redigidos no idioma grego, sendo que alguns deles foram preservados em versão latina (MILLAR, 2006, p. 236-237). O Liber Heraclidis, de Nestório, reproduz e comenta algumas cartas imperiais e episcopais inseridas nos Acta. Essa apologia de Nestório, possivelmente escrita também em grego, foi inicialmente preservada através de uma tradução para o idioma siríaco, feita entre os anos de 525 e 540. A origem das traduções para línguas modernas, inglesa e francesa, provém de um arquétipo do século XI ou XII, que se encontrava na biblioteca do patriarca nestoriano em Kotchanes (atual Konak), no Curdistão turco (SCIPIONI, 1956, p. 1; LOOFS, 1914, p. 11).

Por meio dos dados dos indivíduos que se corresponderam ou foram citados nas cartas, o método prosopográfico12 possibilita rastrear os interesses comuns daqueles que se congregaram em torno dos líderes das duas facções, nestoriana e ciriliana. Pode-se constatar, por meio disso, o envolvimento de diversos funcionários imperiais, de diferentes escalões, civis e militares. Tal associação entre as aristocracias imperiais e o corpo eclesiástico nos sinaliza que o conflito extrapolava para além das disputas religiosas. O objetivo da formação desses grupos era o de maior participação na estrutura administrativa imperial centralizada na figura do imperador, em Constantinopla.

Percebe-se que dentre os funcionários que se inclinaram a apoiar Cirilo e suas ideias religiosas se destacaram os eunucos da Corte imperial (os cubicularii), conforme registrou Nestório nas suas memórias:

Eles prepararam ainda outras maldades. Pois eles fizeram reuniões de padres e tropas de monges e mantiveram conselhos contra mim, os ajudando nesse objetivo. Eles tinham por auxiliares nessas coisas todos os eunucos do imperador (NESTORIUS, 1910, parágrafo 375).

Essa equipe de funcionários, chefiada pelo Praepositus sacri cubiculi (PSC), atendia às necessidades pessoais do imperador e da família imperial. Em decorrência dessa função que exerciam, eles se constituíam em um canal de comunicação privilegiado na administração imperial, passando a percepção de ascendência sobre o imperador. Por isso, amealhavam grandes fortunas no mercado de influências, embora se tratassem de indivíduos estrangeiros e de origem servil.13 Nesse sentido, tendo grande conhecimento dos meandros da administração imperial, Cirilo destinou a eles grande quantidade de presentes e expressiva quantia de ouro com objetivo de cooptá-los ao seu projeto político religioso. Por ocasião do Concílio de Éfeso I (431), uma carta do bispo alexandrino, escrita por seu secretário Epifânio, foi direcionada a um aliado do clero em Constantinopla, dando a dimensão do jogo político estabelecido entre funcionários e membros da hierarquia eclesiástica:

Agora, então, meu santíssimo senhor [Cirilo] direcionou todo o seu zelo a essa causa. Pois uma carta foi escrita por meu senhor, seu irmão, para a reverendíssima serva de Deus, a dama Pulquéria [irmã de Teodósio II], para Paulo, o prefeito; para Romano, o cubicularius; para a dama Marcela, a cubicularia; e para a dama Droséria. Ricas bênçãos foram enviadas a eles. E para aquele que é contra a Igreja, Crisero, o magnífico Aristolau foi preparado para escrever algumas coisas que o seu mensageiro deve obter; e para ele próprio [Aristolau] ricas bênçãos também foram enviadas. Além disso, meu senhor, o seu irmão mais sagrado, também escreveu para o senhor Escolastício [cubicularius] e para o magnífico Artaba [cubicularius], de modo que eles se reúnam com Crisero, a fim de persuadi-lo da persistência do seu ataque contra a Igreja e, para isso, bênçãos verdadeiramente ricas foram despachadas (ACO I, 4, p. 224-225).

A carta é acompanhada de um extenso catálogo das “benções” (presentes) enviadas à Corte (Quadro 1):

Quadro 1 -
Presentes de Cirilo para a Corte em Constantinopla.

Fonte: ACO, I, 4, p. 222-224; ACO, I, 4, p. 224-225.

O levantamento acima nos mostra a investida preponderante de Cirilo sobre o segmento dos cubicularii. Um dado digno de nota no inventário é a quantidade de ouro superior enviada ao PSC Crisero que, conforme registrou Epifânio, se mostrava hostil em apoiar Cirilo. Os dados prosopográficos de Crisero indicam que, embora fosse cubicularius, tratava-se de cidadão romano e, portanto, não era eunuco (PLRE 2, 1980, p. 297). Esses dados nos ajudam a entender a não adesão imediata de Crisero à facção ciriliana, conforme fizeram os demais cubicularii. Por se tratarem de indivíduos de origem estrangeira e servil que atuavam na Corte, conforme já indicamos, os eunucos poderiam, no máximo, se posicionarem como canais de comunicação entre o imperador e a sociedade e como mediadores na rede de trocas políticas em que estavam inseridos, sem, contudo, terem maiores pretensões de avançarem na hierarquia política. Em nossa opinião, por mais riqueza e influência que um eunuco pudesse angariar, ele nunca seria um indivíduo elegível para ocupar posições na administração imperial reservadas a cidadãos romanos, como, por exemplo, o posto de imperador. Daí o apoio deles à teologia ciriliana que centralizava o poder na figura do governante, diferentemente, conforme discorreremos mais adiante, dos demais segmentos de funcionários da administração que tenderam a apoiar as ideias nestorianas.

No que se refere à excessiva soma de 1.500 libras de ouro destinada ao comes Amônio, a carta redigida por Epifânio, em nome de Cirilo, permite-nos inferir que, pela distinção do cargo de “companheiro” do imperador que exercia, Amônio possa ter, inclusive, intermediado, no todo ou em parte, vultosa quantia que seria destinada ao próprio soberano:

Os clérigos que estão aqui estão tristes, pois a igreja de Alexandria está sendo despojada por causa desse distúrbio. E é devido, além das coisas que foram expedidas a partir daqui: mil e quinhentas libras de ouro para o comes Amônio, para que ele mantenha a sua promessa. Mas, sua igreja [deve] prover a avareza daqueles a quem você conhece, para que a igreja de Alexandria não se entristeça por sua santidade ter agido contra as suas promessas. Como você o conhece, fale ao comes Amônio de modo que sua santidade possa persuadi-lo e trazê-lo para mais perto de nós, de modo que não haja tristeza sobre isso também (ACO I, 4, p. 224).

Em contrapartida, dentre os demais funcionários que compunham a complexa estrutura político administrativa imperial, do Império Romano do Oriente, conforme descrito na obra Notitia Dignitatum,14 o que se percebe em relação àqueles de fora do segmento dos cubicularii é uma preponderância de perfilarem apoio à causa nestoriana. Nesse amplo contingente que incluía aristocratas que exerciam funções diversas no primeiro escalão de governo, como os Praefecti Praetorio (PP), os Magistri Officiorum (MO), os Quaestores Sacri Palatii (QSP), dentre outros, destacaremos, nessa análise, os Magistri Utriusque Militiae (MVM). No Oriente, havia cinco Magistri que eram generais responsáveis por determinada região do Império: o Oriente, a Trácia, o Ilírico e dois praesentalis, cujas tropas ficavam estacionadas próximas à cidade de Constantinopla e tinham fácil acesso à capital e ao palácio imperial. Havia ainda uma divisão das tropas em comitatenses, sob a supervisão direta dos magistri, e os limitanei, que ficavam alocadas nas fronteiras e sob o comando dos comites e duces (LEE, 2013, p. 97).

Essa descentralização do comando militar parecia ser uma estratégia para se evitar a concentração de poder em um único general, pois isso encorajava a competição entre eles em proveito do imperador. A partir do governo do imperador Teodósio I (378-395), avô de Teodósio II, percebe-se o incremento de assentamentos de godos, alanos e hunos dentro das fronteiras do Império, cuja contrapartida era fornecer unidades com status de aliados para campanhas específicas do exército romano (foederati) (CURRAN, 2008, p. 103). Durante o governo de Teodósio II, percebe-se que esses grupos já haviam se incorporado à sociedade romana, pois os chefes de determinadas famílias comandavam divisões do exército romano por várias gerações, o que demonstra a existência de verdadeiras dinastias de funcionários de origem germânica dentro do exército.

No quadro abaixo, indicamos a origem e a diversidade político-religiosa desse grupo de funcionários (Quadro 2):

Quadro 2 -
Magistri Utriusque Militiae (MVM) durante o governo de Teodósio II.

Fonte: PLRE 2, 1980.

A maior parte desses generais era de filiação político-religiosa cristã ariana15 ou mesmo eram indivíduos não cristãos que praticavam algumas formas de cultos neoplatônicos que se mantinham atuantes no período. É interessante notar, desde o início da controvérsia, a obsessiva intenção de Cirilo de emplacar um discurso que associasse a doutrina defendida por Nestório ao arianismo. Para Cirilo, quando Nestório propunha apenas uma conjunção (e não a união) entre as naturezas humana e divina em Cristo, ele separava essas naturezas e estabelecia uma forma de subordinação entre elas, assim como fizera o presbítero Ário, no século IV, em relação às pessoas da Trindade, conforme excerto de carta do bispo alexandrino enviada ao bispo aliado Acácio de Melitene:

Mas eu acho que é necessário dizer as razões pelas quais aqueles do Oriente [Nestório e seus aliados] chegaram a tal grau de sutileza. Para os defensores da impiedade de Ário, adulterando perversamente o significado da verdade, dizendo que a Palavra de Deus se tornou homem, mas que ele se beneficiou de um corpo sem alma, e eles fazem isso por amor à maldade, a fim de que atribuindo a Ele [Cristo] as declarações humanas, eles podem mostrar àqueles que estão sendo desviados por eles que Ele está em uma posição menor do que a excelência do Pai e declarar que ele é de uma natureza diferente do Pai. (ACO I, 1, 4, p. 20-31).

Nessa perspectiva, o Deus/Pai criado por Nestório se tornava transcendente, distante da humanidade que ele deveria salvar, enquanto o Deus/Filho era relegado ao status de um deus mundano, comparável, na concepção de Cirilo, a um rei da Pérsia (WESSEL, 1999). Em uma das homilias em louvor à Virgem Theotokos (Portadora de Deus) que pregou por ocasião do Concílio de Éfeso, em 431, Cirilo nos dá pistas das implicações políticas dessa forma de divindade nestoriana:

Você [Nestório] não foi persuadido por Paulo quando ele disse: ‘Mesmo se um anjo dos céus pregar ao contrário daquilo que pregamos que ele seja amaldiçoado’? Paulo não parou sua arrogância [de Nestório]. Mas Isaías, quando ele disse, ‘Observem, uma Virgem conceberá, e ela dará à luz um filho, e ele se chamará Emmanuel, que é interpretado Deus está conosco’? Ele [Isaías] não fez de outro modo. Pois você possui uma mente de terrível perversidade. Ouça ao menos os demônios que dizem: ‘O que você tem a ver conosco, Ó Filho de Deus? Você veio no princípio dos tempos para nos torturar?’ Que conselho você dá para esse inútil argumento? Quem trabalhou com você nessa inoportuna calamidade? Você [Nestório] não tem vergonha de comparar Deus a um rei persa? Você não tem vergonha de rejeitar as tradições dos Padres, dos evangelistas e dos profetas na intenção de dominar sobre todas as Igrejas; você não se lembra do que te levantou do monte estrume às alturas celestes e, concentrado nas criaturas, você não reconhece o Criador. [...] Mas imitando Beliar você pensa que pode convencer, pelas correntes do seu pensamento sem lei, um imperador afeiçoado da doutrina ortodoxa e adorador da consubstancial trindade, através da qual ele reina continuamente, esmaga os inimigos hostis, e através do qual reinam o coro das virgens perpétuas [irmãs imperiais] e ele restaura a paz no mundo, - você pensa que pode fazer desse homem um apóstata com suas enganosas palavras (ACO I, 1, 2, p. 103-104, grifo nosso).

Ao fazer essa comparação entre o deus nestoriano e o rei da Pérsia, Cirilo faz, também, implicitamente, uma ligação entre a questão da representação divina exercida pelo imperador na sociedade romana, conforme já haviam percebido Kantorowicz (1998) e Brown (2002), citados anteriormente. Isso porque, conforme tem destacado Ze’ev Rubin (2008, p. 651-654), o quadro de uma sociedade hierárquica bem ordenada, controlada e regulada por uma monarquia forte tem sido reavaliado pela historiografia em relação ao Império Persa na Antiguidade Tardia. No período da dinastia Sassânida (224-651 d.C.), o controle do vasto império persa era exercido por um governo central, mas não uniformemente efetivo. Os soberanos sassânidas respeitavam os territórios assegurados pelos grandes senhores do reino, alguns dos quais pertenciam a linhagens cujas raízes alcançavam tão longe quanto o período parta (247 a.C.-224 d.C.). No século V d.C., os líderes daquelas linhagens admitiam apenas uma fidelidade nominal ao governo central e, desse modo, gozavam de certa autonomia nos seus domínios territoriais hereditários. Nesse sentido é que entendemos a alcunha de “Rei dos reis” que o soberano persa atribuía a si. Cabe ressaltar, ainda, que no campo religioso a teologia do Zoroastrismo, religião predominante na Pérsia do período, concebia a divindade de forma dualística, assim como na teologia de Nestório, que, por sua vez, possuía ascendência persa, conforme dados prosopográficos (NAU, 1910, p. v).

Nesse sentido, podemos inferir que um imperador romano representante de um deus conforme concebido na teologia nestoriana se assemelhava a um rei persa que governava com auxílio de uma aristocracia descentralizada. Assim, verifica-se que, com exceção dos eunucos da Corte, a maioria dos funcionários imperiais inclinaram-se a apoiar Nestório, em especial os generais do exército romano que professavam, majoritariamente, o credo ariano que Cirilo comparava ao nestorianismo. Um exemplo que revela as pretensões da aristocracia de funcionários, conforme destaca A. Doug Lee (2008, p. 35-37), reside na constatação de que uma das grandes preocupações de Teodósio II era com a possibilidade de usurpação do poder imperial pelo MVM Flávio Zenão (PLRE 2, 1980, p. 1199-1120).

Corrobora essa perspectiva de análise a decisão de Teodósio II de convocar Nestório para o episcopado da capital imperial, em 428, em momento especial nas relações externas do Império Romano do Oriente com o Império Persa e o reino da Armênia. Na viagem que fez de Antioquia a Constantinopla para assumir o episcopado, Nestório foi escoltado pelo magister Flávio Dionísio (PLRE 2, 1980, p. 365-366), que retornava de uma embaixada à Pérsia para renovar o tratado de paz que colocara fim ao breve conflito bélico entre os dois impérios, ocorrido em 421-422 (TRAINA, 2009, p. 1-6). Naquele ano de 428, Moisés de Corene, escritor armênio do século V, informa-nos que parte do clero do reino da Armênia que fazia oposição ao catholicos Sahak16, bispo defensor das ideias cirilianas naquele reino (CONSTAS, 2003, p. 104), aliou-se às aristocracias locais e, com ajuda do rei da Pérsia, Bahrām V, destituíram o rei armênio, Artashes IV (MOÏSE DE KHORÈNE, III, 63). A partir de então, a Armênia se tornou uma província (satrapia) do Império Persa, que fazia fronteira com o Império Romano do Oriente. Em contrapartida, o rei persa concedeu às elites armênias mais autonomia no gerenciamento dos seus interesses e domínios (THOMSON, 2008, p. 665; GARSOÏAN, 1998). A perda de influência política em uma região, até então sob a esfera de influência romana, bem como o perigoso precedente criado, que poderia motivar a associação entre o clero nestoriano e os funcionários imperiais em direção a tentativas de usurpação ou fragmentação territorial, levaram Teodósio II a prestigiar e trazer para perto de si Nestório e aliados. Contudo, ao se antecipar a uma situação que poderia caminhar para uma solução similar àquela adotada pelas elites armênias, a decisão de Teodósio II de dar maior peso político a esse grupo do qual Nestório era representante ajudou a precipitar a emergência da Controvérsia Nestoriana.

Assim, Teodósio II não arbitrou somente uma querela teológica entre Cirilo e Nestório e seus aliados na hierarquia eclesiástica. Nem tampouco se tratou de um governante fraco e influenciável que mudava de opinião em decorrência da ascensão de bispos e cortesãos poderosos. O governo de Teodósio II foi repleto de paradoxos e corrobora essa constatação o fato de a dinastia teodosiana ter tido como um dos seus pilares de sustentação a defesa de uma ortodoxia lastreada nos princípios emanados do Concílio de Niceia (325), mas, apesar disso, comportar na sua administração, sobretudo no que se referem à administração civil e militar, indivíduos pertencentes a outras orientações político-religiosas, inclusive não cristãs.

Desse modo, constata-se que o grande trunfo da atuação de Teodósio II foi a manutenção da unidade imperial por meio da negociação com a ampla diversidade que caracterizava a sociedade romana oriental na Antiguidade Tardia, inclusive com seus adversários políticos. As implicações político-administrativas subjacentes ao conflito teológico, que motivaram a disposição de negociação do imperador podem, também, ser percebidas na carta endereçada aos bispos do Império para se reunirem no Concílio de Éfeso, em 431, indicando o quão estreitas eram as relações entre a natureza da divindade e os negócios do Estado romano, que requisitavam o esforço de negociação por ele empreendido:

A condição de nosso Estado depende da piedade em relação a Deus e há um grande parentesco e afinidade entre os dois. Eles estão, de fato, mutuamente ligados e crescem cada um pelo progresso do outro, de sorte que a verdadeira religião brilha sustentada pela conduta justa e que o Estado prospera quando é sustentado por ambos. Intermediários entre a Providência e os homens, nós somos, de um lado, os servidores da Providência para o crescimento do Estado, e, por outro lado, passando em revista, por assim dizer, a todos os nossos súditos, nós fazemos com que eles vivam em piedade e se conduzam como convém aos piedosos. Tomamos cuidado, como necessário, de um e de outro, pois não é possível que, se reivindicações são levantadas em [apenas] um dos dois, nós não nos importemos semelhantemente do outro - nós nos importamos, antes de tudo, de fazer com que a condição da Igreja permaneça tal que ela convenha a Deus e seja vantajosa para nosso tempo, que essa condição conheça a ausência de problemas graças à concórdia de todos, que ela conheça a ausência de facção graças à paz nos negócios eclesiásticos, que a piedosa religião permaneça irreprochável e que aqueles que fazem parte do clero e do grande sacerdócio se mantenham ao abrigo de toda reprovação quanto à sua vida (ACO I, 1, 1, p. 114-115).

Durante a maior parte do seu principado, a estratégia política do imperador consistiu em contrabalancear poderes e acomodar interesses, governando para aliados (cirilianos) e opositores (nestorianos), tanto no clero quanto nas aristocracias imperiais, em proveito dos estreitos negócios mantidos entre a Igreja e o Estado. Nesse sentido, logrou assegurar o comando do poder imperial por longos quarenta e dois anos - o mais longevo período de um governante em toda a história romana.

Cirilianos e nestorianos, por longo tempo, montaram os seus próprios dossiês que traziam embutidas versões personalizadas da imagem imperial que melhor convinha aos seus interesses político-religiosos. Registros conciliares, cartas e tratados inseridos em diferentes tradições manuscritas abarcam não somente o período do governo de Teodósio II, mas, também, daquelas administrações imperiais que o sucederam, uma vez que o conflito se estendeu até o período das invasões árabes, que subtraíram as regiões do Egito e da Síria da esfera de influência político-administrativa de Constantinopla, nas primeiras décadas do século VII d.C. Os documentos produzidos e preservados por aquela corrente teológica de viés nestoriano, por exemplo, que veio a ser vencedora no Concílio de Calcedônia, em 451, e que reverteria os dogmas impostos por Teodósio II (morto em 450), no Concílio de Éfeso II (449), embutem uma imagem francamente depreciativa do imperador, qualificando-o de despreparado para o exercício das suas altas funções administrativas, sobretudo no que tange ao gerenciamento da controvérsia. Esse caráter propagandístico da produção, preservação e transmissão dos documentos condicionaram, até recentemente, as percepções historiográficas negativas sobre a postura de Teodósio II no conflito.

Material suplementar
Referências
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Notas
Notas
1 As demais indicações temporais referem-se ao período “depois de Cristo” (d.C.), salvo indicação contrária.
2 No transcorrer do século IV, os conflitos teológicos que emergiram na hierarquia eclesiástica estiveram, em sua maior parte, centrados em estabelecer a natureza trinitária da divindade cristã, ou seja, como explicar que Deus era Uno e Trino (Pai, Filho e Espírito Santo) ao mesmo tempo, sem comprometer o caráter monoteísta do Cristianismo. Esses conflitos ficaram conhecidos por Controvérsias Trinitárias. No século V, os debates concentraram-se na segunda pessoa da trindade (Cristo/Filho) e a interação entre o divino e humano nessa pessoa, configurando, assim, as chamadas Controvérsias Cristológicas (MAGALHÃES, 2009).
3 Na documentação consultada, os bispos das grandes Sés episcopais, como Constantinopla, Alexandria e Antioquia, são designados como “Arcebispos”. Conforme indica Jean-Michel Carrié (2006, p. vii-xv), as grandes circunscrições territoriais que seriam denominadas de Patriarcados, sendo chefiadas por um Patriarca, passam a se configurar, sobretudo, a partir do Concílio de Calcedônia, em 451.
4 A questão teológica relacionada à definição da correta divindade apresentava um caráter prático para os indivíduos, pois estava relacionada à salvação da humanidade (soteriologia). Na concepção de Cirilo de Alexandria, inspirado na teologia do bispo Atanásio (296-373), a união das naturezas divina e humana em Cristo era necessária para que se operasse a redenção da humanidade. Somente o ensino e o exemplo do Cristo não seriam suficientes para a mudança do comportamento humano (LYMAN, 1993). Ao contrário, na concepção de Nestório, inspirada em Diodoro de Tarso e Teodoro de Mopsuéstia, a salvação seria tarefa humana de ascensão rumo a uma era perfeita, que se realizaria a partir da pedagogia dos exemplos do homem Jesus e não necessariamente necessitaria da união entre a carne e a divindade para que isso ocorresse (FAIRBAIRN, 2007, p. 392).
5 A radicalização da ideia de união das naturezas foi proposta pelo monge Eutiques (378-454). Essa cristologia operava uma fusão completa entre o divino e humano de modo a existir apenas uma natureza depois da encarnação do Cristo (Monofisismo). Essa proposta que saiu como ortodoxa no Concílio de Éfeso II, em 449, seria condenada no Concílio de Calcedônia, em 451, após a morte de Teodósio II (CHADWICK, 1993).
6 As traduções dos excertos da documentação preservada em grego ou latim para uma língua moderna (inglês ou francês) foram efetuadas pelos tradutores, conforme indicado nas referências bibliográficas. Efetuamos a tradução para a língua portuguesa sempre consultando os textos antigos das edições bilíngues disponíveis.
7 Os fundamentos do Concílio de Niceia (325) preconizavam que o Cristo era verdadeiramente homem e Deus ao mesmo tempo, composto por uma tríade de pessoas em igualdade de condições, sem subordinação entre elas (uma ousia em três hipóstasis). Ou seja, uma mesma divindade que se manifestava por meio de três substratos distintos. Essa fórmula foi mantida e aperfeiçoada pelo Concílio de Constantinopla (381) (MAGALHÃES, 2009).
8 O título de comes (companheiro) era reservado aos funcionários próximos que assessoravam o imperador na Corte imperial (PIGANIOL, 1972).
9 Arquimandrita era o posto exercido pelo monge superior de um monastério (SHIPMAN, 1907).
10 As cartas imperiais tinham força de lei e eram emitidas em nome dos imperadores do Oriente e do Ocidente. Embora as porções oriental e ocidental já estivessem separadas política e administrativamente, Fergus Millar (2006, p. 1-38) avalia que essa disposição possuía um sentido retórico de unidade imperial em torno da dinastia teodosiana, que governava ambas as porções.
11 Mesmo após a morte de Teodósio II, em 450, muitos documentos relacionados ao seu governo foram lidos e registrados nas atas do Concílio de Calcedônia, em 451 (ACO, II).
12 O propósito do método prosopográfico é coletar dados biográficos das elites políticas e religiosas que transcendam suas vidas individuais na perspectiva de analisar grupos de indivíduos a partir dos seus contatos mútuos e interesses comuns (KOENRAAD; CARLIER; DUMOLYN, 2007, p. 41-43; PUECH, 2012, p. 155-168).
13 A origem estrangeira dos eunucos é justificada pela lei emitida pelo imperador Constantino (306-337) que proibia a emasculação de cidadãos romanos (TOUGHER, 2002, p. 144).
14 A Notitia Dignitatum omnium tam ciuilium quam militarium in partibus Orientis et Occidentis é um documento da Antiguidade Tardia (séculos IV e V) estruturado na forma de um meticuloso e exaustivo elenco da disposição burocrática civil e militar. As dignidades dos funcionários civis e militares são definidas em termos de insígnias e subordinações, muito mais do que em funções. No Império Romano do Oriente, ela foi organizada refletindo as cerimônias imperiais em Constantinopla (FALEIRO, 2005).
15 O arianismo emergiu a partir dos ensinamentos do presbítero Ário, um sacerdote de Alexandria, no início do século IV d.C. Suas proposições enfatizavam uma superioridade, em diferentes gradações, do Deus Pai, único não concebido e sem princípio, e uma subordinação do Filho (Logos) a ele. Na crença de Ário, a trindade era composta de três entidades de naturezas distintas. Ordenadas hierarquicamente, ou seja, apresentavam uma relação apenas de harmonia e subordinação entre elas. Seu propósito parece que esteve em salvaguardar na Trindade a originalidade e os privilégios do Deus Pai (MARROU, 1985, p. 36-40).
16 Catholicos era o termo distintivo reivindicado pelo bispo da Sé da capital Selêucia-Ctesífon, no Império Persa, e pelo bispo superior da hierarquia eclesiástica no reino da Armênia, que buscavam estabelecer primazia sobre todos os demais bispos metropólitas (MOÏSE DE KHORÈNE, III, 49).
Autor notes
Doutor em História pelo PPGH UNESP/Franca. Pós-doutorando pelo Departamento de História da FFLCH da Universidade de São Paulo. Esse artigo integra as reflexões da nossa pesquisa de doutoramento financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

* E-mail: dd66fig@gmail.com

Quadro 1 -
Presentes de Cirilo para a Corte em Constantinopla.

Fonte: ACO, I, 4, p. 222-224; ACO, I, 4, p. 224-225.
Quadro 2 -
Magistri Utriusque Militiae (MVM) durante o governo de Teodósio II.

Fonte: PLRE 2, 1980.
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