Resumo: A partir de discussões na disciplina Políticas de Língua, podemos pensar sobre como as tecnologias possuem um papel cada vez mais atuante na vida cotidiana do ser humano. Por isso, questionamos: como o ensino de línguas pode fazer parte desse processo tecnológico? Para pensar sobre o assunto, analisamos a disciplina Linguística I: Introdução à Ciência da Linguagem, realizada a distância pelo sistema Moodle, disponibilizado pelo Centro de Aprendizagem em Rede (CEAR) da Universidade Estadual de Goiás, e pelo Facebook. Compreendemos, portanto, que a partir de metodologias diversas é possível aproveitar as ferramentas que o Moodle e o Facebook possuem. Como utilizar essa tecnologia? É preciso, para tal, considerar os sujeitos (docente e discente) numa relação com a linguagem para que a produção do conhecimento ocorra, tornando as mídias sociais e os ambientes virtuais de aprendizagem ferramentas que auxiliam o docente de Letras na interação com e entre seus alunos. Isso ocorre em duas instâncias: na primeira, pela discussão da disciplina sobre Linguística e, na segunda, pela dinâmica de possibilitar outro olhar de como o discente, ao tornar-se professor, pode dispor dessas ferramentas, como metodologias de ensino e aprendizagem. Desse modo, no espaço de enunciação do grupo fechado no Facebook, o que se considera são as práticas sociais de língua e linguagem, para conhecimento maior sobre as ferramentas dessa mídia social, antes das atividades específicas de ensino da disciplina a distância no Moodle, que ainda está em processo de aprendizagem pelo discente. Isso possibilita compreender, portanto, uma plasticidade da linguagem, no modo como ela se molda, permitindo que os sujeitos encontrem significado nesse espaço ao enunciar de forma mais específica e efetiva.
Palavras-chave:língualíngua,espaço de enunciaçãoespaço de enunciação,mídias digitaismídias digitais.
Abstract: From discussions in the subject Language Policies, we can think about how technologies play an increasingly active role in the daily life of the human being. For this reason, we ask: how can languages teaching be part of this technological process? To think about it, we analyzed the subject Linguistics I: Introduction to the Science of Language, carried out online in the Moodle system, provided by Centro de Aprendizagem em Rede (CEAR) at Universidade Estadual de Goiás, and on Facebook. We understand, therefore, that from diverse methodologies it is possible to take advantage of the tools that Moodle and Facebook have. How to use this technology? For this, it is necessary to consider the subjects (teacher and student) in a relationship with the language so that the production of knowledge occurs, making social media and virtual learning environments tools that help the teacher of Language in the interaction with and among their students. This occurs in two instances: in the first, by the discussion of the subject on Linguistics and, in the second, by the dynamics of enabling another look at how the student, when he becomes a teacher, can have these tools as teaching and learning methodologies. Thus, in the enunciation space of the closed group on Facebook, what is considered are the social practices of language, for a greater knowledge about the tools of this social media, before the specific activities of teaching of the distance subject in Moodle, which is still in process of learning by the student. This anables us to understand, therefore, a plasticity of the language, in the way how it is shaped, allowing the subjects to find meaning in this space when enunciating in a more specific and effective way.
Keywords: language, enunciation space, digital media.
Linguística e Tecnologia
ESPAÇOS DE ENUNCIAÇÃO NO FACEBOOK E NO SISTEMA CEAR: CONSTITUIÇÃO DE SUJEITOS E DE SENTIDOS
ENUNCIATION SPACES ON FACEBOOK AND IN THE CEAR SYSTEM: CONSTITUTION OF SUBJECTS AND SENSES
Recepção: 06 Fevereiro 2017
Aprovação: 16 Março 2017
Este trabalho resulta das discussões desenvolvidas durante a disciplina Políticas de Línguas, realizada no primeiro semestre de 2016 no Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT). Ao discutir, através de seminários, sobre as políticas de línguas na atualidade, debateu-se sobre como a tecnologia faz parte desse processo de constituição dos sujeitos no ensino de línguas, seja na língua portuguesa, seja na língua inglesa.
Durante as discussões foi possível compreender o uso das mídias digitais como algo que já vem sendo desenvolvido, mas não em estado acabado, como a própria tecnologia. Segundo Barton e Lee (2015, p. 12), a “[...] tecnologia faz parte das experiências vividas pelas pessoas em todos os contextos, desde engajar-se numa infinidade de sites de redes sociais com amigos, até o trabalho, o estudo ou a participação na vida familiar”. Com isso, os autores nos mostram que, devido à popularidade das tecnologias, a maioria da sociedade hoje faz parte de redes sociais eletrônicas. Sendo assim, é possível compreender o porquê devemos pensar no ensino de línguas através das tecnologias.
Assim, quando falamos em tecnologias, o que é posto em funcionamento é a noção de que os meios de comunicação têm criado novos meios de relação entre sujeitos e sentidos, pois, percebemos que há “[...] novas formas de interação, e atividades cotidianas são transformadas numa paisagem semiótica que se move rapidamente. Novas mídias fornecem diferentes relações entre pessoas e tecnologias, dando origem a novas potencialidades” (BARTON, 2015, p. 30, grifo dos autores).
Essas potencialidades dizem respeito também ao ensino. Estudar no sistema online pode ressignificar práticas de ensino que atinjam os discentes através de um outro espaço de enunciação. Para Guimarães (2003, p. 47), “[...] as línguas funcionam segundo o modo de distribuição de seus falantes”, pois falantes e línguas se constituem mutuamente, não há como definir língua sem pensar no sujeito que a fala. Por isso, o autor coloca as línguas como objetos históricos e não abstratos. Nessa relação, pensar a materialidade digital constitui pensar em sujeitos em determinadas condições, e pensar no meio digital como um outro espaço de enunciação no qual o sujeito identifica-se.
Tomamos a partir desse conceito o espaço virtual para o ensino-aprendizagem. Conforme Guimarães (2003), pensar o espaço virtual como espaço de enunciação permite que compreendamos como as relações de ensino e aprendizagem se constituem nesse ambiente e produzem efeitos tanto nos professores quanto nos alunos.
Por isso, questionamos: como o professor interage com as tecnologias através das condições atuais, de outros espaços de enunciação? Como fazer uso desses meios de forma mais interativa e significante? São questões presentes constantemente na sala de aula. Não se trata de o professor saber usar a tecnologia, mas sim “como” se apropriar e aplicá-las de maneira didática. Como o ensino de línguas pode fazer parte desse processo?
Dias e Couto (2011) propõem que estas questões passam por um processo histórico e político que envolve as tecnologias e a globalização. Compreendendo essas mídias como materialidades significantes, as autoras se pautam na compreensão de um sujeito tomado como posição. No nosso caso, é a partir das relações entre tecnologia e ensino que o sujeito se constitui. Para Orlandi (2007), a noção de sujeito propõe pensar a língua na relação como uma exterioridade. Nessa relação, o sujeito, não é o sujeito empírico, mas a posição tomada de acordo com as suas condições materiais de existência. Desse modo, o sujeito é assujeitado à língua para significar. A autora explica isso compreendendo, a partir de Althusser e Pêcheux (2009), que “[...] o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia e é assim que a língua faz sentido” (ORLANDI, 2007, p. 17). A partir da relação entre ideologia e sujeito, pode-se compreender como o processo de assujeitamento se dá como um ato de autonomia, mas sendo uma condição imaginária, pois há o assujeitamento no ato de dizer e de significar. Para a autora, o sujeito se coloca como o centro do dizer, sua origem, como se suas palavras possuíssem apenas um sentido, mas este está sempre interpelado por uma ideologia que o constitui.
Por isso, busca-se compreender como as tecnologias produzem conhecimento e como o sujeito assujeitado a essas novas mídias também se significa. Desse modo, ao trabalhar em sala de aula, há a necessidade de se discutir com o discente esse processo tecnológico atuante no mundo todo. Como dar suporte para o aluno compreender esse processo? Como pensar a língua em meio a uma materialidade digital?
Para Barton e Lee (2015, p. 25), isso pode ser realizado através da abordagem sociocultural da escrita, pois nela “[...] o letramento é uma atividade social, e a melhor forma de descrevê-lo é em termos de práticas de letramento das pessoas. Essas práticas se baseiam em eventos de letramento mediados por textos escritos”. Observando como a escrita assume função primordial no ambiente virtual, abordaremos a noção de autoria na produção textual nesse meio.
Nessa direção, para Dias e Couto (2011, p. 633), a “[...] popularização da internet [...] é parte desse processo. E nele as redes sociais assumem papel preponderante no que diz respeito à divulgação do conhecimento e aos modos de subjetivação e individuação do sujeito”. Isso ocorre através da produção da escrita, na qual, ao postar/escrever, o sujeito se coloca como autor do seu dizer.
Pensando nessas questões, direcionamos esta discussão para formas mais específicas: como o professor de língua portuguesa e linguística compreende essas questões? Como trabalhar com a tecnologia de uma forma que produza efeitos nas relações de ensino-aprendizagem?
Para compreender esse funcionamento, propomos analisar a atuação de uma disciplina a distância no ensino superior. Essa disciplina é tomada no espaço de enunciação digital, sendo realizada dentro de um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), produzido pela Universidade Aberta do Brasil (UAB) e pelo Centro de Aprendizagem em Rede (CEAR). Utilizou-se, ainda, a rede social Facebook para complementação das atividades.
Como o aluno se coloca ao estudar dentro de um sistema criado pensando na atuação do aluno de acordo com seu acesso, seu tempo? Como as mídias sociais podem auxiliar esse processo de aprendizagem? Para responder essas questões, este estudo visa compreender o funcionamento das ferramentas como mídias digitais e outros sistemas de ensino a distância como o Moodle, em um espaço enunciativo que permite ao interlocutor produzir sentidos e ressignificar o conhecimento através dessa relação.
Para isso, analisaremos a disciplina Linguística I: Introdução à Ciência da Linguagem, realizada no primeiro semestre de 2016, no curso de Letras da Universidade Estadual de Goiás (UEG), na modalidade a distância. Assim, discutiremos o funcionamento do Centro de Ensino e Aprendizagem em Rede (CEAR), que através do sistema Moodle, disponibiliza a possibilidade de que as disciplinas que fazem parte da grade curricular dos cursos de graduação sejam realizadas a distância. Ou seja, não estamos falando de um curso realizado a distância em conjunto com a Universidade Aberta do Brasil (UAB), mas de uma disciplina que faz parte do curso de Letras, desenvolvida através da semipresencialidade. Relacionaremos, ainda, a metodologia do AVA com o uso da rede social, buscando compreender os sentidos produzidos no ensino a distância, através do uso do Moodle e da mídia social Facebook.
Para compreender sobre o ensino e a aprendizagem no ensino a distância, discutiremos um pouco sobre a história da educação em Goiás e a constituição da UEG. Falar em história da educação em Goiás é falar sobre algo em construção, pois há grupos[2] buscando compreender como se deu esse processo. Citamos a pesquisa de Valdez (2002) em Retratos da Educação escolar em Goiás no século XX, que faz uma análise de fotografias e diz de um trabalho em andamento de recolhimento de documentos que possibilitam compreender a história da educação em Goiás. Segundo a autora, no Estado de Goiás, durante o século XIX, havia um descaso com a educação, pois as condições de produção da época são atravessadas por nômades à procura de ouro e
[...] nem de longe se interessavam por escolas. Igualmente, mais tarde, quando a sociedade voltou-se para a produção pecuária, não interessava aos fazendeiros saber ler e escrever, nem aos funcionários do governo, e muito menos aos portugueses. O ensino era restrito ao lar, exercido por alguns pais letrados ou pela disposição de alguns fazendeiros que contratavam professores particulares para educar seus filhos (VALDEZ, 2002, p. 7).
Segundo a autora, Goiás não contou com a ação da Companhia de Jesus, no início da colonização brasileira; mesmo assim é posta em evidência uma grande influência da Igreja em catequizar os curumins, contando com o empenho do Estado. Isso é mostrado nos retratos analisados, pois eles “[...] registram particularidades do ensino religioso, é visível a mistura dos terços nos uniformes compridos e as imagens de santos decorando o retrato” (idem, p. 8).
Assim, até a década de 40, a educação em Goiás não era bem desenvolvida. Ainda se realizavam as aulas nas varandas, embaixo de árvores, referências que até hoje são significadas nos dizeres de agentes administrativos da educação, quando se fala em estrutura, em construção de prédios.
Em relação a isso, o estudo de Barra (2008), sobre Condições materiais para o exercício docente: sinais de um projeto educacional oitocentista, mostra um discurso relevante ainda hoje: “Educação se faz com pessoas, não com prédios” (BARRA, 2008, p. 166). Neste estudo, o que é colocado em funcionamento pelo discurso do Estado é a melhoria do ensino sem construções de prédios, mas com aumento de salas de aula, é a melhoria do ensino sem gastos para o Estado. Isso ressignifica o que Valdez (2002) mostrou nas fotografias; os lugares de ensino eram varandas, embaixo de árvores, pois, conforme Barra (2008) nos mostra, as aulas poderiam ocorrer em qualquer lugar, desde que constasse a presença do docente e dos discentes. Isso coloca em funcionamento espaços de enunciação, ressignificados em outros espaços de salas de aula, adaptados a partir de lugares que possuíam outras funções (jardins, parques, quadras).
Esses dois estudos servem para termos noção da educação em Goiás e como sua história ainda está em construção. Com base nisso, é possível compreender que a Universidade Estadual de Goiás (UEG) é uma universidade nova, com apenas 17 anos. Segundo a história constante no site[3] da Universidade, a construção da universidade ocorreu através da organização multicampi, transformando a antiga Universidade Estadual de Anápolis e a incorporação de outras 12 Instituições do Ensino Superior. Está presente em 39 municípios e possui atualmente 42 campi, dos quais 15 possuem cursos de Letras.
Assim, a história da instituição é algo em desenvolvimento, pois várias mudanças ocorreram durante esses anos, entre elas o aumento de professores com titulação de mestres e doutores, com a realização dos concursos de 2010 e 2013. Outra mudança refere-se ao número de programas de pós-graduação lato sensu, com uma nova resolução[4], sendo que mais de 30 cursos gratuitos estão em funcionamento em 2016[5].
O Projeto Pedagógico de Curso (PPC) de Letras traz em sua estrutura o histórico da UEG, contando que a Lei n.13.456 de 16 de abril de 1999 transformou a Universidade Estadual de Anápolis (UNIANA) em Universidade Estadual de Goiás (UEG).
Conforme o site da UEG[6], a história da construção do ensino a distância na instituição começa em 2001 com a criação da UEG Virtual, passando em 2002 a se tornar o Centro de Educação Aberta e Continuada a distância (CEAD). Atualmente, conta com quatro cursos de graduação a distância, realizados juntamente com a UAB (História, Administração Pública, Ciências Biológicas, Computação), presentes em vários polos da instituição, como: Uruaçu, Aparecida de Goiânia, Jussara, Uruana etc. Além dos cursos de graduação também possui cursos de pós-graduação ligados à gestão (Gestão Pública, Gestão Pública Municipal e Gestão em Saúde).
Atualmente, sob o nome de Centro de Ensino e Aprendizagem em Rede (CEAR), a Instituição possui cursos de capacitação de docentes e servidores para atuarem em disciplinas a distância, através desses cursos. Assim, a partir de 2015, iniciou-se a atribuição de disciplinas a distância ofertadas nos cursos regulares.
Isso ocorreu devido ao regimento dos cursos que propõem que 20% da grade de cada curso possam ser desenvolvidas a distância, sendo as disciplinas realizadas de 20%, 50% a 100% a distância.
A Portaria do Ministério da Educação (MEC) nº 4.059 de 2004 mostra como deve ser o ensino a distância e como ele pode ser inserido nas disciplinas em cursos superiores reconhecidos. Conforme o inciso segundo, as disciplinas poderão ser ofertadas de modo integral ou parcial, não ultrapassando os 20% da carga horária total do curso. Com base nessa portaria, a UEG emitiu a Resolução CsA nº. 053/2014:
Parágrafo Único. A modalidade semipresencial é caracterizada, conforme Portaria MEC nº 4.059/2004, por atividades didáticas, módulos ou unidades de ensino-aprendizagem centrados na auto-aprendizagem e com a mediação de recursos didáticos originados em diferentes suportes de informação que utilizam tecnologias de comunicação remota.
[...]
Art. 2° - A opção por disciplinas a serem ofertadas na modalidade semipresencial deverão ser aprovadas pelos colegiados dos cursos.
§ 1º Poderão ser ofertadas disciplinas parciais ou integrais na modalidade semipresencial, obtendo o limite máximo de 20% (vinte por cento) da carga horária do total do curso.
[...]
Art. 4° O professor que queira oferecer disciplina, parcial ou integral na modalidade semipresencial deverá possuir a capacitação necessária para exercício de atividades nesta modalidade.
A partir dessa Resolução, a UEG tem capacitado os docentes para a realização dessas disciplinas a distância através do sistema CEAR. Assim, antes de o curso ser oferecido pelo CEAR, é questionado ao docente seu conhecimento em aulas a distância, sendo cada professor direcionado para o curso de acordo com a sua capacitação, divididos em: Capacitação de professores em EaD e Planejamento e construção da Disciplina em EaD. Esses cursos de capacitação docente em EaD são específicos para montagem e criação da disciplina que será ministrada a distância. Dessa forma, tem-se um controle sobre como o sistema é utilizado para a realização da disciplina, pois há critérios relacionados ao ensino a distância para que aluno e docente possam aproveitar todas as ferramentas disponíveis no sistema Moodle.
Para debatermos como o sistema CEAR possibilita a produção do conhecimento através das suas ferramentas, descrevemos como foi pensada e realizada a disciplina Linguística I: Introdução à Ciência da Linguagem.
A disciplina foi realizada na UEG, no Campus de São Miguel do Araguaia. Depois de realizado o curso de capacitação docente, a disciplina Introdução à Ciência da Linguagem foi aprovada para ser ministrada a distância. Essa disciplina faz parte do terceiro período do Curso de Letras, sendo a segunda disciplina a ser realizada com essa turma de alunos, ou seja, os alunos já tiveram uma disciplina a distância, no semestre anterior, o que de certa forma facilitou um pouco o processo de adaptação dos discentes com o sistema online.
Assim, a disciplina foi construída na modalidade semipresencial, com a realização de dois encontros presenciais, além da avaliação presencial. Houve a distribuição das leituras e atividades em quatro módulos, cada um computando 15 horas/aulas, concluindo o curso com 60 horas/aula.
O Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) possui várias ferramentas para o desenvolvimento do ensino-aprendizagem. Segundo Souza (2009), o AVA poder ser compreendido como um sistema adaptativo complexo, pois se estrutura como um sistema dinâmico, no qual a interação professor e aluno ocorre através de multimodalidades: vídeos, textos verbais e links, sendo uma interação com várias possibilidades para o ensino.
Podemos observar esse funcionamento na Figura 1 a seguir:
Dentre as atividades, tivemos: o Fórum de Discussão, Questionário online, Postagem Tarefa, e Glossário. Além disso, o sistema também possuía o Fórum de Orientação da Disciplina e Chat de Orientação da Disciplina.
Como pode ser observado, a variedade faz parte do Ambiente Virtual de Aprendizagem. Isso ocorre devido a não haver a constância da aula presencial. O sistema permite essa interação de outro modo, através do Chat e do Fórum de Orientação, nos quais o discente tem acesso ao docente e vice e versa, para poder tirar dúvidas, comentar o que entendeu etc. Nesse ambiente, há também controle de quem entrou e o que fez na disciplina, permitindo visualizar como o discente está trabalhando na disciplina.
As atividades como Fórum e Glossário permitem também uma interação entre os alunos, que podem visualizar as postagens dos colegas e, assim, compreender como as atividades estão sendo realizadas
Algo que é constante no sistema Moodle é a escrita, tanto nas postagens quanto para tirar dúvidas. No Chat também a escrita se faz presente. Esse é um ponto interessante a se pensar, pois na sala de aula presencial a oralidade se faz mais presente. No caso da disciplina online, o aluno deve-se colocar sempre através da escrita, com exceção de quando houver uma webconferência. Assim, mesmo com a gravação de videoaulas pelo docente, a prática da escrita é mais constante no ensino a distância.
Uma das dificuldades foi desvincular o aluno do ambiente presencial ao qual estava acostumado. As dúvidas postadas estavam mais relacionadas a como proceder na disciplina: como acessar, postar e abrir vídeos, por exemplo, ou seja, muito do tempo foi utilizado para tirar dúvidas sobre as discussões e dar apoio técnico aos alunos para uso da plataforma Moodle (isso ocorreu mesmo tendo os discentes realizado uma disciplina a distância anteriormente). Depois disso, foi possível que a disciplina se desenvolvesse de forma mais fluida.
Essas são as condições da realização da disciplina. A partir disso, pensando ainda na prática da escrita, um dos recortes que selecionamos para esta pesquisa atravessa uma problemática para pensar sobre a questão da autoria. Na primeira atividade, o Fórum de discussão, cada aluno deveria postar um comentário, após realizar as leituras e assistir ao vídeo (Ver Figura 4).
A discussão que trazemos é sobre a autoria e o plágio na produção textual dos discentes no sistema a distância. Muitos dos alunos citaram a fonte das leituras que utilizaram, mas o que chamou nossa atenção foi a postagem de um texto, em anexo, que explicava a linguística e a linguística aplicada com cópias de sites da Internet. Desde o início o curso chama a atenção para formas de se evitar o plágio: sempre deve haver a referência, citar fonte e o autor. O que torna esse fato interessante não é o ato de plágio em si, mas que no final do texto constam as referências de onde o texto foi produzido (Figura 2). Esse amontado de recortes não pode ser considerado um texto devido à cópia integral; não houve paráfrase, reformulações, mas as referências foram citadas.
Isso coloca em questão o plágio como cópia da internet sem que haja referências no texto sobre os autores. Em relação às referências, observamos na Figura 2 que o aluno coloca as referências dos textos plagiados. Isso nos faz pensar como o aluno compreende o uso das referências no texto. Disso, pode-se compreender que houve uma noção de que caso se colocassem os sites/as referências, não haveria plágio. Esse exemplo problematiza a noção de autoria, pois observamos que nem sempre os alunos conseguem se colocar como autores, dizer sobre um assunto, escrever um texto sobre sua compreensão. Eles copiam da internet, não produzindo efeitos de compreensão do que está sendo trabalhado.
Por isso, discutir sobre a noção de autoria torna-se importante também nesse espaço de enunciação. Como a escrita ocorre neste espaço? Devemos compreender que “[...] pensar na função autor é pensar no sujeito – seu funcionamento. É pensar sob quais condições e formas um sujeito pode funcionar na ordem do discurso” (PFEIFFER, 1995, p. 52). Nesse caso, colocar o aluno em situações de produção em que possa se colocar como autor faz parte das tarefas da instituição de ensino.
Para Orlandi (2007), se colocar na posição de autor é se colocar em um lugar de interpretação, é tomar todo um dizer passado, toda uma memória discursiva, e nesses dizeres introduzir seu dizer no repetível, para que assim produza sentidos. O texto e o autor seriam a unidade imaginária, condição necessária para a interpretação, pois a autoria compreende a unidade, a coerência, a não-contradição e o fim, condições necessárias para ser autor. Devemos nos reconhecer como autor, como donos do nosso dizer (condição imaginária).
Pode-se pensar, no caso em questão, que se trata de um simples plágio, no qual o aluno fez simples montagem do texto, mas compreendemos também como o aluno deve aprender a se colocar como autor do seu dizer, principalmente nesse espaço de enunciação, o ambiente virtual. Isso mostra como a relação entre o que se copia, a ideia do outro, e o que é do aluno, sua produção escrita, é algo que deve ser mais debatido. É preciso esclarecer como o conhecimento é construído na produção do próprio texto, separando o que é seu e o que é do outro.
Esse ato, na atividade acadêmica, não se constitui como um fato isolado. Ao aluno do caso mencionado foi dada a nota zero pela atividade e ainda houve a tentativa de explicar como deveria ser o texto, como a cópia constitui plágio, portanto, crime. Isso também remete à ideia de pesquisa enquanto cópia de livros e nos faz questionar como o conhecimento é debatido hoje diante de vasta quantidade de informação, de textos, de discursos, pois, “[...] vivemos num mundo cada vez mais móvel, tanto física quanto virtualmente. Fluxo de pessoas, conhecimentos, ideias e objetos estão todos em aceleração, levando a novas interações entre as pessoas e a novas formas de aprendizagem online e off-line” (BARTON, LEE, 2015, p. 91). Como mostrar ao aluno a sua autoria, na relação com a escrita, com a teoria, com as práticas de escrita? Sugerimos que isso seja desenvolvido nas práticas de leitura e escrita, explicitando-se a diferença entre eu e o outro, o conhecimento que parte da repetição para a produção.
Por isso, o (re)conhecimento da posição autor é importante para que o aluno desenvolva a sua produção escrita, pois nesse reconhecimento é “[...] que estaria a aprendizagem, a possibilidade de a Escola interferir na relação com o receptível: criar condições para que o aluno trabalhe sua relação com suas filiações de sentido, com a memória do dizer” (ORLANDI, 1998, p. 14). O conceito de memória discursiva é importante nesse aspecto.
A memória, segundo Orlandi (2007, p. 31), é compreendida como a constituição de tudo que já foi dito, de sentidos já produzidos que continuam a fazer efeito na atualidade, ou seja, é “[...] o saber discursivo que torna possível todo dizer e que retorna sob a forma do pré-construído, o já-dito que está na base do dizível, sustentando cada tomada de palavra”. Por isso, ao falar sobre a escrita, observamos que o discente coloca em funcionamento uma memória que o constitui a partir da escrita.
Assim, compreende-se que o processo de autoria, da identificação como sujeito-autor passa por essa relação entre o que é da ordem do reproduzido e da produção de conhecimento, a partir do momento que o discente se reconheça como tal, com a capacidade de produzir textos com autonomia, assumindo a posição sujeito-autor e, assim, historicizando o seu dizer.
As próprias tecnologias podem contribuir com esse processo de formação, acrescentando novas questões sobre autoria por ser um outro espaço de enunciação, ou seja, universo digital.
Vários estudos têm abordado o funcionamento das redes sociais nos processos de ensino, como o estudo de Dias e Couto (2011) e Barton e Lee (2015).
Barton e Lee (2015) nos mostram, por exemplo, discussões sobre a linguagem no ambiente online, como se dão as práticas digitais. Ao falar sobre o Facebook, expõe que seu objetivo inicial era a comunicação entre estudantes universitários, sendo depois essa rede social conhecida mundialmente. Se pensarmos no seu objetivo inicial, observamos como a relação ensino e aprendizagem já fazia parte de sua estrutura. Assim, mesmo que atualmente seja considerada mais uma rede social para entretenimento do que um objeto de ensino, é possível compreender como ela, com seus recursos, com o acesso de milhões de pessoas, permite que o ensino possa ocorrer de forma sistemática e produza efeitos.
Para os autores,
O Facebook apresenta uma justaposição de espaços online, enquanto uma série de formas síncronas e assíncronas tradicionais de interação CMC [Computação mediada por computador] ocorre em um mesmo espaço. Além das atualizações de status, há um recurso de comentário que, por vezes age como um site para minifóruns de discussão (BARTON, LEE, 2015, p. 59).
Isso mostra como as ferramentas disponíveis no Facebook podem ser utilizadas para o ensino. Conforme Barton e Lee (2015, p. 59), o “[...] Facebook é um dos melhores representantes da cultura de convergência. Os usuários podem facilmente se conectar a sites externos, por exemplo, um artigo de jornal, clicando no botão ‘curtir’. Isto imediatamente cria conexões intertextuais entre textos e recursos online”.
Ao trabalhar com a disciplina a distância no primeiro semestre de 2016, uma das problemáticas foi acesso à Internet e habilidade para lidar com o sistema Moodle. Para isso, a UEG propiciou para os docentes e para os discentes cursos a distância sobre o funcionamento da plataforma. Um número considerável de discentes não o realizaram: de 31 alunos, apenas 05 realizaram o curso, mostrando que o conhecimento da maioria dos alunos sobre o sistema Moodle é pouco. Em oposição, podemos dizer que o conhecimento das ferramentas do Facebook é considerável entre os alunos.
A turma da disciplina Linguística I: Introdução à Ciência da Linguagem já havia passado por vários problemas referentes ao sistema; um deles provocou o atraso da abertura da página online do Moodle, juntamente com o semestre das disciplinas presenciais.
Para não haver o atraso da disciplina, nem prejuízo dos alunos, foi proposto para a turma, na primeira aula presencial[7], que, enquanto o sistema estivesse com problemas, poderíamos iniciar as atividades através de um outro sistema, ou seja, através da mídia social Facebook, sendo uma complementação da disciplina Linguística I: Introdução à Ciência da Linguagem. Objetivamos, com essa medida, facilitar o acesso a novas informações e o alcance mais imediato, através das postagens no Facebook. Como o sistema AVA era algo em processo de aprendizagem para os alunos, consideramos a rede social como mais acessível e de maior alcance, pois muitos não conseguiram acessar a plataforma Moodle, mas, por outro lado, todos tinham acesso ao Facebook. Assim, foi criado um grupo com o nome da disciplina, ao qual todos os alunos tiveram acesso e tiravam as dúvidas que surgiam.
Ressalta-se que todos tinham acesso a essa mídia e um domínio muito maior, pois já fazia parte de seu cotidiano, por ser um conhecimento já construído. Essa condição auxiliou o desenvolvimento da disciplina, pois o sistema CEAR só estaria com a disciplina pronta em torno de dez dias depois.
Segundo Silva (2016, p. 51), o Facebook é uma ferramenta dinâmica e complexa
[...] já que sua estrutura está em constante mutação, em função das interações e interatividade dos sujeitos que podem, em virtude de suas ações internas, provocar a emergência de novos estados organizacionais do sistema da rede. É uma rede dependente de dinamizadores linguísticos, ou seja, sua materialidade na tela dos suportes digitais é de língua(gem) em todas as suas modalidades e plasticidade.
Observamos como a linguagem é algo constitutivo dessa dinamicidade. A materialidade que constitui o Facebook permite que os sujeitos e os sentidos se constituam nessa relação de constante interação e mudança. Quando falamos em linguagem, estamos abordando não somente a escrita, verbal, mas também o não verbal, que se imbricam produzindo seus efeitos através dos mecanismos do Facebook.
Assim, depois de iniciado no sistema CEAR, as atividades já desenvolvidas passaram a se realizar neste sistema, mas o grupo fechado no Facebook continuou a ser acessado. De acordo com Silva (2016, p. 54): “Apesar de o FB não ter sido concebido como um espaço para as práticas de produção formal de conhecimento, como é o caso, por exemplo, da plataforma Moodle e Teleduc, nos últimos anos tem sido exponencial o número de pesquisas referenciadas no âmbito das redes sociais [...]”. Desse modo, utilizar essa mídia auxiliou-nos no desenvolvimento da disciplina, mostrando como as mídias sociais podem auxiliar na prática docente.
Isso também é compreendido por Silva (2016), o qual abordou o funcionamento da mídia social na disciplina Linguagem e Tecnologia, buscando compreender
[...] em que medida as decisões tomadas pelos participantes afetaram a dinâmica organizacional interna dos pequenos grupos (os encontros presenciais e virtuais; os espaços físicos; as mídias utilizadas; as pesquisas realizadas; o processo de delimitação do conteúdo; a colaboração; os métodos, as estratégias e os procedimentos didáticos adotados; a mediação dos debates, etc.), e, em segundo, os efeitos desses grupos para a dinâmica e complexidade do grande grupo Linguagem e Tecnologia (SILVA, 2016, p. 55).
Ao realizar este trabalho, Silva (2016) compreendeu que as práticas de língua(gem) produzidas nos contextos digitais são fundamentais para a formação docente na área de Letras e Linguística. Ou seja, trabalhar com os discentes da graduação sobre metodologias envolvendo as mídias digitais potencializa o funcionamento de uma ferramenta dinâmica, produzindo efeitos no ensino-aprendizagem, pois esses alunos se tornarão professores conscientes dessas práticas e de como elas funcionam.
Observamos que houve mais interação no Facebook do que no Moodle, o que acabou restringido as leituras e postagens, que algumas vezes foram também postadas no Facebook. Conforme Dias (2011, p. 636):
As redes sociais são ambientes virtuais nos quais sujeitos se relacionam instituindo uma forma de sociabilidade que está ligada à própria formulação e circulação do conhecimento. A sociabilidade nas redes sociais, como o Orkut, Facebook e Twitter, não tem as mesmas condições de produção que a sociabilidade em espaços escolares ou universitários, por exemplo, e essa é uma diferença importante para compreender a divulgação de conhecimento em (dis)curso na sociedade contemporânea. A explicação para isso é a de que o imaginário que rege essas relações é diferente do imaginário que rege as relações nas redes sociais.
Esse imaginário pode ser relacionado ao ambiente Moodle, pois nele observamos uma linguagem e tratamento mais formais, enquanto no Facebook a relação foi menos formal. Esse menos formal, mas ainda formal, mostra que o espaço enunciativo do Facebook permite uma melhor interação entre discentes e docente, como também em relação às atividades. Quando dizemos menos formal, mas ainda formal, é devido às condições específicas de produção da escrita. O Facebook é um espaço de enunciação que veicula uma linguagem informal, mas ao tomá-lo como metodologia de ensino, a linguagem passa a ser formal, mas partindo da informalidade, sendo um processo sem dificuldades de transição entre o informal e o formal.
Como observamos nas Figura 4 e 5, o Facebook também permite a postagem de vídeos e áudios (presentes no sistema CEAR), e ainda a participação através da barra de comentários. São recursos que podem ser utilizados como meio de ensino e aprendizagem, através de uma mídia social, que todos, de uma forma ou de outra, possuem acesso e conhecimento para interagir.
Barton e Lee (2015), ao falar sobre o uso o Facebook no ensino, colocam em evidência a questão do uso da língua numa relação com o discurso acadêmico e com o discurso informal. Para os autores, esse trabalho de ensino apresenta “[...] um estilo de discurso híbrido” (BARON e LEE, 2015, p. 211). Ao observamos as postagens em questão (Figuras 4 e 5), percebemos que a relação professor-aluno, por se tratar de um espaço de enunciação em rede social, realiza-se, ao mesmo tempo, de forma acadêmica e informal. Isso ocorre por ainda se tratar de uma rede social que se constitui como ambiente de entretenimento, mas que sofre alterações na interação por ser empregada pela disciplina e pela posição professor e aluno.
Compreendemos, portanto, que, para muitos, o Moodle é o espaço institucional e o Facebook não. Produz-se um apagamento das condições de produção que significam de fato o espaço para a realização do ensino, seja ele qual for. Fazendo relação com Valdez (2002), por que aulas na varanda têm valor se a varanda não é sala de aula nos moldes historicamente postos? Desse modo, o Facebook também pode ser um meio para o ensino-aprendizagem. Isso vai depender do modo como a metodologia de ensino se apropria das ferramentas dessa mídia social.
Por outro lado, o Ambiente Virtual de Aprendizagem, o Moodle, criado em 2000, pouco mudou. É um sistema fechado dependente de vários aspectos que os alunos não conseguem fazer por não compreenderem bem sua organização. Por exemplo, ao postar no Fórum de Notícias no Moodle, e depois a mesma postagem no Facebook, houve respostas mais rápidas na mídia social, isso põe em evidência o uso que a tecnologia possui nos grupos sociais.
Em relação ao plágio, podemos dizer que ele foi minimizado, pois as postagens eram mais curtas e breves; o próprio discente realizava a escrita. Essa metodologia também incluía que a postagem era visualizada por todos no grupo, o que ocorreu tanto no Fórum quanto no Facebook. Entretanto, a visibilidade do Facebook é maior; por isso, houve também mais cuidado nessa exposição, tanto com o plágio, quanto com a escrita. Mesmo que ainda produza seu texto com erros de escrita e de estrutura, observamos que é o aluno que se coloca como autor do seu dizer.
Podemos observar na Figura 6 que mesmo se tratando de um ambiente que visa ao entretenimento e assim possui uma escrita mais informal, ao colocá-lo como ferramenta de ensino, a formalidade da escrita acadêmica o constitui.
Esse funcionamento é possível pelo uso cotidiano da mídia social, na qual as postagens são constantes. Nesse contexto, tornamos a mídia social como um espaço de enunciação constituído por uma linguagem informal, passando para uma linguagem mais formal, mais acadêmica, pois o hábito de escrita nesse mesmo ambiente permite que haja a facilitação da produção textual e o reconhecimento do discente como autor do seu dizer. Portanto, compreende-se que a produção escrita dos discentes passa pelo lugar do já dado para a produção de novos conhecimentos.
Assim, entendemos que dar espaço, condições de produção, é papel da universidade para que o discente possa se situar, se sentir na posição de autoria. Por isso, ler, discutir e expor a interpretação de textos são procedimentos necessários e que devem fazer parte da vida do graduando, não apenas na sala de aula. Os diferentes recursos que a mídia digital possui permitem trabalhar diferentes gêneros, permitem mostrar a estrutura e as várias formas de significar pela escrita, como um espaço de enunciação em que a língua é interpelada pela informalidade. A escrita formal se constitui com base nesse conhecimento anterior, de se colocar como autor do seu dizer, através da informalidade. Assim, ao tornar a mídia social um espaço de enunciação em que a língua formal é a exigida, o docente consegue deslocar a interação do informal ao formal, através do conhecimento que o discente já possui. Desse modo, o plágio é minimizado, pois não há necessidade de recorrer a outros recursos para produzir seu texto.
A partir do discutido, compreendemos a facilidade encontrada pelos alunos ao se relacionar com as mídias sociais, por mais que eles tenham alguma dificuldade em atuar com as tecnologias. Por se tratar da mídia social isso não ocorre, conforme nos mostram Barton e Lee (2015): a mídia social torna-se parte de seu cotidiano, parte do conhecimento que já possui, sendo, portanto, mais acessível que outros funcionamentos tecnológicos, como o Moodle.
Dias e Couto (2011) apontam que a circulação do conhecimento através de uma mídia como o Facebook ocorre através das várias possibilidades, como a de colocar em circulação e compartilhar textos, artigos, vídeos, eventos, excertos, lançamentos de livros e campanhas, entre outros. Assim, “[...] as novas formas de aprendizagem devem considerar a constituição, formulação e circulação do saber, inseparavelmente, como momentos do ‘processo de produção do discurso’ (ORLANDI, 2001, p. 9) de divulgação de conhecimento” (DIAS, COUTO, 2011, p. 637). Tomando o Facebook como uma metodologia de ensino, permite-se mais acesso a outras modalidades de escrita e produção, favorecendo o ensino e a aprendizagem.
Considerar o ensino a distância, na atualidade, é compreendê-lo como um espaço de enunciação, no qual o sujeito aluno vai significar pela/nas relações que estabelece entre docente, discente e os recursos que tanto o AVA quanto a mídia social possibilitam. Nesse caso, consideram-se ambos como um sistema adaptativo complexo (SOUZA, 2009), que, através de multimodalidades de produção e interação, permite que o ensino-aprendizagem ocorra de forma fluída, de acordo com a realidade atual.
Assim, a partir de metodologias diversas é possível aproveitar as ferramentas que o Moodle e o Facebook possuem. Como utilizar essa tecnologia? Acreditamos que isso pode ser feito considerando os sujeitos (docente e discente) numa relação com a linguagem para que a produção do conhecimento ocorra; tornando as mídias sociais e os ambientes virtuais de aprendizagem ferramentas que auxiliam o docente de Letras na interação entre seus alunos. Isso ocorre em duas instâncias: na primeira, na discussão da disciplina sobre Linguística e, na segunda, pela dinâmica de possibilitar um outro olhar de como o discente, ao tornar-se professor, pode dispor dessas ferramentas como metodologias de ensino e aprendizagem. Essas várias possibilidades produzem um dinamismo em ambos ambientes virtuais.
Podemos dizer que a diferença entre um sistema e outro é a relação com o espaço de enunciação, referente à linguagem. Para Guimarães (2003), compreender a noção de língua é importante; deve-se compreendê-la como um objeto histórico. No seu funcionamento o uso da linguagem escrita tanto em um ambiente quanto em outro permite que sentidos sejam entendidos e colocados em circulação.
Por isso, utilizar mais e melhor o ambiente do Facebook significa manter relação com a uma memória de um lugar conhecido, acessível, e que possui em sua estrutura uma memória de entretenimento, criando condições específicas para o desenvolvimento de cada discente e produzindo efeitos no modo como ele ganha significado nesse espaço.
Já o sistema Moodle é constituído por uma memória sobre o ensino, portanto, um lugar que visa desde sempre à aprendizagem, exige uma escrita formal. Essa constituição fica implícita para o aluno quando vai interagir por esse sistema. O interessante é perceber que por mais que o discente possua conhecimento sobre o Facebook não é a mesma coisa quando se trata de outro sistema online. É necessário um processo de aprendizagem que ocorre de forma gradual e constantemente.
Assim, o espaço de enunciação se ressignifica no processo de “[...] identificação social dos grupos humanos. O espaço de enunciação é que atribui as línguas para seus falantes. E cada espaço de enunciação tem uma regulação específica, ou seja, distribui as línguas em relação de um modo particular” (GUIMARÃES, 2003, p. 47). Por isso, mesmo se tratando de um espaço virtual, o Facebook e o Moodle como sistemas de ensino-aprendizagem vão se colocar de modos diferentes para os alunos; um pelo lado do entretenimento passando para a formalidade e o outro pelo lado do ensino, da disciplina, da formalidade que o constitui.
Por isso, pode-se dizer que no Facebook conseguimos uma produtividade maior com o ensino e aprendizagem devido a ele se colocar como esse lugar de mais informalidade. Contudo, como mostramos neste artigo, no momento em que se exige a formalidade ela é conseguida mais gradualmente, pois o sujeito, nesse espaço de enunciação, se constitui a partir do que já conhece, produzindo outros sentidos, produzindo conhecimento.
Desse modo, no espaço de enunciação do grupo fechado no Facebook, o que se considera são as práticas sociais de língua e linguagem, anteriores ao ensino da disciplina a distância. É um conhecimento maior sobre as ferramentas da mídia social, diferentemente do Moodle, que ainda está em processo de aprendizagem pelo discente. Isso permite compreender, portanto, uma plasticidade da linguagem, no modo como ela se molda permitindo que os sujeitos se signifiquem nesse espaço ao enunciar de forma mais específica e efetiva.
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