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Memórias entrelaçadas: versões do passado na Alemanha e no Japão, 1945-2001
Entangled Memories: Versions of the Past in Germany and Japan, 1945-2001
Esboços: histórias em contextos globais, vol. 27, núm. 44, pp. 130-148, 2020
Universidade Federal de Santa Catarina

Tradução

Esta obra está licenciada sob a Licença Creative Commons CC-BY. Com essa licença você pode compartilhar, adaptar e criar para qualquer fim, desde que atribua a autoria da obra.

DOI: https://doi.org/10.5007/2175-7976.2020.e71081

Resumo: Mesmo em nossa era da globalização, os estudos de história da memória tendem a reforçar a categoria de nação. Isso vale também para as interpretações das diferentes maneiras pelas quais a Alemanha Ocidental e o Japão lidaram com suas próprias atrocidades e derrotas na Segunda Guerra Mundial. Frequentemente, os historiadores opõem o engajamento crítico com o passado recente na Alemanha à recusa japonesa em reconhecer, no pós-guerra, suas próprias responsabilidades. A causa desses desenvolvimentos divergentes é, segundo essa linha de raciocínio, invariavelmente encontrada na história interna desses dois países quando não na psique coletiva alemã e na japonesa. Em contrapartida, este artigo argumenta que debates sobre memória não se desenrolam em isolamento nacional, e que suas diferentes trajetórias precisam ser situadas em um contexto global.

Palavras-chave: Alemanha, Japão, Memória.

Abstract: Even in our age of globalization, studies in the history of memory tend to reinforce the category of the nation. This is also true for interpretations of the different ways in which West Germany and Japan have come to terms with the atrocities, and with defeat, in World War II. Frequently, historians oppose a critical engagement with the recent past in Germany to the refusal to acknowledge one’s own role as perpetrator in post-war Japan; the reason for these divergent developments are then invariably found in the two countries’ domestic history, if not in the collective German and Japanese psyche. This article argues, by contrast, that debates about memory do not unfold in national isolation, and that their different trajectories need to be situated in a global context.

Keywords: Germany, Japan, Memory.

Na história da memória, o paradigma nacional continua a reinar supremo. Pode soar surpreendente em um momento no qual a profissão histórica começa a descartar a categoria de nação e a produzir estudos transnacionais. Comparações internacionais e histórias correlacionadas, assim como enquadramentos mais amplos da história europeia, pós-colonial ou mundial, parecem gradualmente substituir os estreitos limites do paradigma oitocentista da história nacional.

Estudos de memória, no entanto, continuam a se apegar à nação com uma teimosia peculiar. Lembrar e esquecer são os meios pelos quais as nações enfrentam seus respectivos passados. Ao mesmo tempo, elas aparecem como produtos da memória – forjadas em comunidades imaginadas a partir de séries de efemérides, de discursos públicos e de visitas a lugares de memória. Nesse esquema, um momento idealizado ou traumático é lembrado internamente por metáforas de um “passado que não passa”. A memória, portanto, aparece em larga medida como uma relação temporal entre momentos significativos do passado nacional que permanecem como lembranças para as gerações futuras. Nos casos da Alemanha e do Japão do pós-guerra, o passado e o presente são separados por rupturas históricas e “horas-zero” que, argumenta-se, precisam ser transpostas de modo a saldar contas com uma experiência traumática que assombra ambas as sociedades. Nessa perspectiva, a memória aparece como a expressão quase direta de uma mentalidade nacional, que indica a capacidade de uma nação de lamentar, aprender e amadurecer (por meio da superação de estreitas perspectivas nacionalistas).1

A linguagem da temporalidade produz, assim, a imagem familiar da interpretação do passado como uma questão de cultura nacional. A imagem convencional do Japão como inerentemente incapaz de lidar criticamente com sua história agressiva e expansionista se enquadra nessa categoria. Essa “incapacidade” e “deficiência”, por um lado, são frequentemente expressas em termos culturais e explicadas como o produto do caráter nacional.2 A preocupação alemã com o passado nazista, por outro lado, é atribuída a um processo de aprendizado coletivo. A tese de Daniel Goldhagen (1996) de que o antissemitismo inato alemão só foi superado com sucesso após 1945 é apenas a versão mais recente desse paradigma culturalista.

Afora as tendências unificadoras de tais relatos – que homogeneízam a nação de forma sincrônica como memória-comunidade e de maneira diacrônica através das gerações –, essa perspectiva transmite uma negligência quase xenófoba dos fatores vinculados ao que está fora do território nacional. A história da memória é retratada através de uma “falta de visão periférica” do passado. Nesse caso, influências e entrelaçamentos com outras memórias nacionais tornam-se marginais. A memória é, portanto, descrita como o último domínio da autonomia nacional. Mas podemos interpretar, para dar apenas um exemplo, a famosa visita do primeiro-ministro japonês Nakasone ao santuário Yasukuni em 1982 – para homenagear os mortos de guerra em um lugar de memória simbolicamente apropriado por grupos nacionalistas – apenas em termos de desenvolvimentos internos japoneses? Não poderíamos ler esse evento particular como uma articulação com um contexto global que pode, para fins ilustrativos, ser associado aos nomes de Margaret Thatcher, Helmut Kohl e Ronald Reagan? A visita de Nakasone, assim, pareceria não apenas como expressão de uma mentalidade japonesa “evasiva”, mas também como parte de uma conjuntura global que, três anos depois, produziu a cerimônia de reconciliação em Bitburg com Kohl e Reagan de mãos dadas em um cemitério militar.

As interpretações do passado, dessa forma, não se originam e se desenvolvem dentro de um país, mas devem ser entendidas como o produto da conexão e do intercâmbio entre diferentes discursos e práticas. “Dominar o passado” (Vergangenheitsbewältigung) de forma alguma foi apenas uma questão alemã; “responsabilidade de guerra” (sensô sekinin) nunca foi uma preocupação exclusivamente japonesa. O discurso aparentemente nacional sobre o que era considerado um legado problemático da guerra e da violência sempre esteve inscrito em contextos transnacionais mais amplos. Na contramão de muitos debates recentes que tratam a memória como o último vestígio de uma “cultura” nacional,3 parece promissor aquinhoar os complexos processos de lembrança e esquecimento do fantasma da autonomia e lê-los como “memórias entrelaçadas”.

O termo “memórias entrelaçadas” não se refere tanto ao fato de que o passado lembrado – o objeto da memória – deve ser disposto em um contexto transnacional e visto como um produto de processos de trocas e de influências. Em vez disso, concentra-se no momento da produção da memória, vista não apenas como uma tentativa de se conectar ao passado individual ou coletivo, mas também como o efeito de múltiplos e complexos impulsos no presente. A história da produção da memória é um processo de entrelaçamento mais do que uma “história compartilhada” que sugere a possibilidade de interpretações consensuais do passado. Houve esforços para chegar a uma versão incontestada e compartilhada do passado, principalmente no projeto alemão-polonês (e, mais recentemente, japonês-coreano) de escrita de um manual de história (cf. JACOBMEYER, 1989; HÔEI, 1993). Contra essa nostalgia por uma narrativa “pura” e “objetiva” (e, portanto, incontroversa) da realidade passada, o termo “entrelaçado” enfatiza as relações e interações assimétricas que produzem relatos diferentes e conflitantes do passado.

Um foco nas histórias entrelaçadas da memória na Alemanha Ocidental e no Japão pode ajudar a contextualizar e situar a experiência do pós-guerra nos dois países e, assim, tornar mais complexa uma história frequentemente compreendida por meio de estereótipos das características nacionais divergentes. Em particular, o surto de controvérsias sobre questões de memória no Japão desde os anos 1990 exige esclarecimentos. O Japão finalmente alcançou o modelo da Alemanha Ocidental de prestar contas com o passado, como muitos comentaristas alegam? O aumento de vozes críticas deve ser lido como evidência de um processo de aprendizado e de uma vontade de assumir responsabilidade pelas atrocidades e crimes do passado da nação? Os debates atuais podem ser entendidos como mais um exemplo do Japão como “retardatário”, desta vez em relação à virada crítica que a memória da Alemanha Ocidental testemunhou desde a década de 1960? Uma perspectiva comparada que lê a história da memória em ambos os países como “memórias entrelaçadas” pode ajudar a evitar as formas de essencialização cultural empregadas tão frequentemente e, em vez disso, situar a memória japonesa em um contexto maior. Em vez de interpretar a virtual “explosão” de discussões sobre o passado como uma expressão do amadurecimento político, argumentarei que ela deve ser entendida no âmbito do que sugiro chamar de “Retorno da Ásia”.

Nos primeiros anos após 1945, as memórias da guerra na Alemanha e no Japão já estavam situadas em um contexto que transcendia o Estado-nação. O ponto de referência em ambos os países era antes de tudo os Estados Unidos, principalmente porque a lembrança se deu no contexto da ocupação norte-americana.4 Tanto os debates japoneses sobre o “vale sombrio” (kurai tanima) do fascismo como as tentativas de se chegar a um acordo com o “passado maligno” do Terceiro Reich na Alemanha não podem ser entendidos sem levarmos em conta as intervenções norte-americanas.

A presença norte-americana, que permeava as interpretações do passado, fez-se sentir de diferentes formas. Nem toda influência foi direta, nem todo tabu foi explicitado. Talvez não seja exagero, no entanto, dizer que aquilo que foi lembrado e esquecido na Alemanha e no Japão do pós-guerra estava já pré-estruturado. Como Etô Jun (1979, 1994) observou, a compreensão japonesa dos eventos passados ocorreu dentro de um espaço discursivo fechado.5 Os julgamentos dos crimes de guerra realizados em Nuremberg e Tóquio, sem precedentes e altamente divulgados, estavam entre as intervenções mais diretas, e tiveram como efeito colateral a produção de uma narrativa-mestra autoritária da guerra. Nos dois casos, os líderes políticos e militares foram separados de uma população muito mais abrangente e responsabilizados pelo expansionismo e pelas atrocidades – em graus diferentes, no entanto. Na Alemanha, a população teve de passar pela desnazificação de forma individual, e vários julgamentos subsequentes ampliaram o círculo de agressores. No Japão, no entanto, nenhum julgamento posterior complementou o julgamento de Tóquio, e até o imperador ficou isento de acusação.6

Os julgamentos de crimes de guerra tiveram efeitos duradouros, particularmente no Japão, onde até hoje a “perspectiva histórica produzida pelo julgamento dos crimes de guerra” (Tokyo saiban shikan) é objeto frequente de denúncia da ala nacionalista.7 Algumas das intervenções mais diretas, no entanto, tiveram efeitos mais efêmeros. Elas incluíram expurgos nas universidades quando representantes de uma interpretação mais antiga da história, que se tornara obsoleta, foram expulsos da academia.8 O espaço de enunciação para interpretações do passado foi ainda mais delimitado pela instituição da censura. Nos dois países, objetos centrais de comemoração nacional foram sujeitos a medidas restritivas pelas autoridades de ocupação. No Japão, a cobertura das explosões de bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki foi amplamente proibida e documentários fotográficos foram banidos. Somente após o fim da ocupação, em 1952, seriam publicadas imagens do evento catastrófico nos principais jornais (DOWER, 1999; BRAW, 1991; KIYOKO, 1995). Na Alemanha, foi o movimento de resistência 20 de Julho que atraiu a atenção dos censores. Do ponto de vista das forças de ocupação, a composição amplamente aristocrática do grupo de resistência tornava-o inadequado como ponto de partida para a democratização da sociedade alemã. Os primeiros estudos sobre os planos para assassinar Hitler no complô de 1944, portanto, tiveram que ser publicados na Suíça ou nos Estados Unidos (VON HASSEL, 1946; VON SCHLABRENDORFF, 1946; ROTHFELS, 1948).9

Embora a maior parte das iniciativas norte-americanas tivesse caráter proibitivo, também houve casos de medidas prescritivas. No Japão, uma versão norte-americana da Guerra do Pacífico foi serializada em todos os jornais do país no outono de 1945. Essa versão fez uso de “fontes irrepreensíveis” para apresentar a “verdade” sobre o passado recente “até que a história da culpa japonesa na guerra tenha sido amplamente revelada em todos os seus detalhes”.10 Além disso, um documentário de rádio com o título “Esta é a verdade!” (shinsô wa kô da) foi transmitido entre dezembro de 1945 e fevereiro de 1946 para inculcar a versão norte-americana do passado japonês nas mentes dos japoneses (AKIKO, 1990). Na Alemanha, foram mostrados documentários mostrando a libertação dos campos de concentração a uma população que, além disso, foi confrontada com seu passado genocida por meio de uma série de pôsteres em grande escala exibidos em várias cidades (BRINK, 1998).

A intervenção das forças de ocupação contribuiu e reforçou uma série de marcantes semelhanças nas interpretações dos japoneses e dos alemães ocidentais do passado recente. Ao mesmo tempo, porém, o contexto transnacional pode ajudar a explicar uma das diferenças mais significativas – a persistência de uma orientação amplamente conservadora entre os historiadores alemães, que permaneceram comprometidos com os princípios metodológicos de um “historicismo política e moralmente domado” (SCHULIN, 1979, p. 140), que contrastou radicalmente com a forte influência que o marxismo teve nos acadêmicos japoneses do pós-guerra. A historiografia marxista, é verdade, não foi de modo algum uma invenção do pós-guerra. Particularmente no campo da história econômica, remonta ao final da década de 1920. O intenso “debate sobre o capitalismo japonês” (Nihon shihonshugi ronsô), que ocorreu no início da década de 1930, foi o exemplo mais notável da nova perspectiva. No decorrer dos anos seguintes, no entanto, essas discussões foram reduzidas e seus protagonistas gradualmente foram removidos da academia japonesa. Após a derrota em 1945, os estudiosos marxistas foram chamados de volta às universidades, e o materialismo histórico logo emergiu como a escola de interpretação mais influente que, por quase uma década, efetivamente silenciou os historiadores mais tradicionais (e conservadores) (HOSTON, 1986).

Esse surgimento de uma hegemonia intelectual marxista foi, portanto, a continuação de uma tendência de longo prazo, ao mesmo tempo que pactuava com a política de ocupação. Por mais improvável que pareça, a pressão dos Estados Unidos para restabelecer acadêmicos da oposição em seus cargos anteriores se referiu principalmente a estudiosos marxistas que, devido as suas posturas antiguerra, eram regularmente denominados “amigos da América” pelos documentos de ocupação. Mas, além de expurgos, reintegrações e políticas de recursos humanos, nos primeiros anos do pós-guerra houve um surpreendente grau de consenso entre as forças de ocupação e os marxistas japoneses. Em particular, o amplo programa de reformas que o quartel-general norte-americano havia projetado para o Japão do pós-guerra – uma nova constituição, a limitação do poder do zaibatsu e, mais importante, uma profunda reforma agrária – recebeu aprovação dos acadêmicos marxistas. As reformas norte-americanas basearam-se na convicção de que reminiscências feudais caracterizavam a sociedade e a política japonesas, e que essas reminiscências pareciam representar o tipo de modernização – uma “revolução burguesa” – que aos olhos marxistas tardava a chegar (CONRAD, 1999).

Na Alemanha Ocidental, a noção de um déficit estrutural que fez o fascismo parecer mais um resultado lógico do que uma aberração temporária – noção que os marxistas japoneses tão prontamente adotaram – foi recebida de modo muito menos favorável entre os historiadores. De fato, a maioria reagiu polemicamente contra as opiniões propagadas pelo consultor do Ministério das Relações Exteriores britânico, lorde Vansittart, que imaginou continuidades “de Bismarck a Hitler” (RADKAU, 1970; SOLCHANY, 1997, p. 5-24). O papel insignificante que as primeiras variações da “tese Sonderweg” cumpriu na Alemanha Ocidental – moeda corrente em sua encarnação japonesa nas primeiras décadas do pós-guerra – teve muito a ver com o fato de que a particular configuração da profissão histórica permaneceu praticamente inalterada. Além disso, no entanto, a aversão a interpretações de continuidade histórica deve ser situada no contexto do que poderia ser provisoriamente descrito como uma divisão do trabalho entre historiadores da Alemanha Oriental e Ocidental. Na mesma medida em que a interpretação da “catástrofe alemã” como resultado necessário da história alemã ganhou status hegemônico na Alemanha Oriental, ela perdeu credibilidade entre os historiadores da Alemanha Ocidental.11

A historiografia da Alemanha Ocidental estava assim inscrita em uma matriz, com os Estados Unidos e a Alemanha Oriental como os dois principais pontos de referência. Essa dupla perspectiva esteve particularmente evidente na historiografia do período nazista, agora desenvolvida sob o rótulo de “história contemporânea” (Zeitgeschichte). As interpretações do passado recente, sustentava-se, precisavam ser eliminadas das distorções dos historiadores norte-americanos que não tiveram experiência direta da ditadura e, consequentemente, careciam da capacidade de “entender” a vida em um Estado totalitário. Somente aqueles que haviam vivido o Terceiro Reich e “suportado os desafios dos tempos” pareciam elegíveis para interpretar a história alemã (ROTHFELS, 1949). Desde o início, um dos propósitos do recém-fundado Instituto de História Contemporânea em Munique era manter as interpretações do passado recente firmemente nas mãos alemãs. O diretor do instituto, Hermann Mau, proclamou em 1950: “A pesquisa sobre a história do nacional-socialismo é uma tarefa alemã” (apudINSTITUT FÜR ZEITGESCHICHTE, 1975, p. 27). Ao mesmo tempo, a Zeitgeschichte da Alemanha Ocidental foi colocada contra a emergente ortodoxia da Alemanha Oriental e enfatizou a possibilidade de desenvolver pesquisas independentes, livres de fins propagandísticos. O foco na oposição alemã a Hitler, por exemplo, foi destinado não apenas a complementar as visões anglo-americanas, mas também a corrigir as distorções e “pseudoverdades do Oriente” (KLUKE, 1955, p. 7433).

Enquanto na Alemanha Ocidental as interpretações sobre o passado recente com frequência articulavam essa dupla referência, no Japão a principal orientação permaneceu em direção aos Estados Unidos. As vozes dos países asiáticos vizinhos dificilmente contribuíram para os pontos de vista a respeito dos tempos de guerra. Até certo ponto, esses dois aspectos estavam inter-relacionados. O papel hegemônico dos Estados Unidos, que não diminuiu após o fim da ocupação como resultado da Guerra Fria, também reforçou a ignorância em relação às perspectivas chinesa ou coreana. Um exemplo particularmente revelador diz respeito ao nome da guerra, que até 1945 havia sido glorificada como a “Grande Guerra do Leste Asiático” (daitôa sensô), termo proibido durante a ocupação. Em vez disso, “Guerra do Pacífico” foi trazida à baila como o nome oficial da Segunda Guerra Mundial no Japão. Esse termo, no entanto, destaca certos aspectos do conflito, especialmente a guerra japonesa contra os norte-americanos, iniciada com o ataque a Pearl Harbor, em 1941. O longo período de luta no continente asiático, com uma estimativa de mais de 20 milhões de vidas chinesas ceifadas, é marginalizado (MINEAR, 1995). De qualquer modo, essas intervenções terminológicas durante os dias de ocupação não foram simplesmente impostas aos japoneses, mas apropriadas e internalizadas por eles. Quando escreveu uma nova história da guerra, o historiador Ienaga Saburô (1968) produziu uma narrativa marxista que se concentrava nos eventos ocorridos na China. No entanto, optou por chamar seu livro de Guerra do Pacífico porque (como ele admitiu no prefácio), de outro modo, teria antecipado a ignorância dos leitores sobre o assunto da obra.12 Alguns dos efeitos discursivos das intervenções norte-americanas sobreviveram após a retirada das forças de ocupação.

Ao mesmo tempo, o exemplo mostra que a posição privilegiada dos Estados Unidos conspirou para a marginalização do envolvimento militar do Japão na China e na Coreia durante a guerra. Nas décadas de 1960 e 1970, esse não foi um fenômeno excepcional, mas parte de um modelo geral. Isso ilustra o que Karatani Kôjin (1993) chamou de “desasianização” do discurso japonês do pós-guerra.13 Em certo sentido, isso pode ser interpretado como uma continuação de tentativas anteriores de “escapar da Ásia” (datsu-a) e inserir o Japão na história do Ocidente moderno. No campo da memória, isso levou à amnésia parcial sobre o passado expansionista do Japão. A agressão japonesa a outras nações asiáticas e a história da violência japonesa no continente asiático continuaram em grande parte sem discussão. A guerra apareceu, em primeiro lugar, como um conflito entre Japão e Estados Unidos. As atrocidades cometidas no continente asiático – o massacre de Nanjing, os experimentos bioquímicos da Unidade 731, a prostituição forçada em toda a Ásia – foram excluídos do debate. No discurso japonês, “Ásia” desapareceu em um vácuo historiográfico (ORR, 2001).

Isso não quer dizer que não houve qualquer tentativa de outras nações asiáticas de intervir na política de memória japonesa. Um exemplo disso são as extensivas negociações entre o Japão e a Coreia do Sul, entre 1951 e 1965, que levaram a um tratado de reparação e compensação. No processo das negociações, no entanto, a Coreia teve que desistir da ideia de um pedido de desculpas oficial por parte do governo japonês. As demandas por compensação material e pagamento de salários da mão de obra recrutada durante a guerra encontraram obstinada resistência por parte da delegação japonesa. Finalmente, reparações não foram pagas para compensar a opressão colonial, mas, como dizia a retórica oficial, foram pagas como parte de uma “ajuda financeira”. No contexto das relações assimétricas de poder e da lógica dicotômica do pensamento da Guerra Fria, a perspectiva sul-coreana sobre o passado comum não teve repercussões nos debates japoneses (FUHRT, 2002).

Na virtual ausência da Ásia, o principal referente da política e visão de mundo japonesas foram os Estados Unidos. No campo da historiografia, essa constelação se traduziu na importação maciça da teoria da modernização norte-americana, começando com a famosa conferência de Hakone, em 1960. Financiada pela Ford e pela Asia Foundation, a conferência fez parte de uma política decididamente anticomunista no Leste Asiático por apresentar o conceito de modernização sem ter a revolução como um padrão histórico (COBURN, 1969). Enquanto nos primeiros anos do período de ocupação encontramos afinidades surpreendentes entre as versões norte-americana e japonesa marxista sobre o passado japonês, a perspectiva trazida pela teoria da modernização era explicitamente antimarxista. No âmbito da teoria da modernização, o fascismo japonês apareceu apenas como uma aberração temporária para um caminho de sucesso em direção à modernidade (SAMON, 1968). Seu principal proponente, o historiador de Harvard Edwin O. Reischauer, enfatizou a natureza política dessa remodelação do passado japonês: “Esse marxismo clássico é nosso verdadeiro inimigo no Japão. Nunca me esquivei do ensejo de infligir um golpe contra ele. Obviamente, não se deve usar essas palavras. As palavras que uso são: ‘Adquirindo uma nova visão da história’” (apud HAROOTUNIAN, 1983, p. 207). Quando, em 1960, Reischauer foi nomeado embaixador dos Estados Unidos no Japão, esse casamento entre estudioso e político apenas sublinhou o fato de que as interpretações sobre o passado não são formadas no vácuo acadêmico. O cenário da Guerra Fria, como Harry Harootunian argumentou, “levou os japoneses a incorporar as expectativas norte-americanas a fim de efetuar uma narrativa sobre si mesmos, produzida por outros, em outros lugares”. A memória do passado recente foi inscrita em um contexto decididamente transnacional – e “o Japão dos Estados Unidos se tornou o Japão do Japão”, concluiu Harootunian (1983, p. 200, 215).

Enquanto o Japão permaneceu “desasianizado”, na Alemanha Ocidental as décadas de 1960 a 1980 podem ser caracterizadas pelo que o historiador Heinrich August Winkler (2000) chamou recentemente de “longo caminho da Alemanha para o Ocidente”. Em termos historiográficos, isso implicava o domínio da interpretação Sonderweg da história moderna alemã, que deve ser entendida como uma tentativa de inserir a Alemanha na história da Europa. Isso não quer dizer que a influência norte-americana tenha desaparecido. As abordagens norte-americanas continuaram sendo um fator importante, particularmente a partir da apropriação do trabalho de Max Weber pela teoria dos sistemas parsoniana e sua subsequente reimportação para a Alemanha. Ao mesmo tempo, a “Europa” emergiu como um ponto de referência complementar e, em sua encarnação particular e, principalmente, metafórica, como um tipo ideal weberiano. O alegado Sonderweg foi confrontado com uma suposta normalidade do noroeste da Europa, e a história moderna alemã foi interpretada através da medição de sua distância, sua diferença e seu desvio em relação a essa região. A preocupação com a história comparada entre os historiadores sociais desde os anos 1980 é uma das consequências dessa abordagem. Não apenas em termos de trajetória histórica, mas também em perspectiva teórica e metodológica, a ascensão da história social (Sozialgeschichte) fez parte de uma tentativa de integrar a historiografia alemã na paisagem europeia (WELSKOPP, 1999).

O Sonderweg emergiu como a nova meta-história do passado alemão, não muito diferente do seu equivalente japonês nas décadas imediatas do pós-guerra. Nos dois países, essa interpretação permaneceu por muito tempo a metanarrativa mais influente.14 A principal diferença foi que ela permitiu à Alemanha Ocidental se tornar europeia, enquanto o Japão dificilmente se considerava asiático. No caso alemão, por um lado, esse desenrolar foi gerado pelo processo político da unificação europeia e também por vários tratados de reparação que compensavam as atrocidades alemãs durante a guerra.15 A dinâmica dessa situação política mais ampla repercutiu nas interpretações da história, que precisavam levar em conta a sua potencial recepção europeia. No Japão, por outro lado, na ausência de um movimento em direção à lealdade política, a Ásia permaneceu amplamente em um vácuo político e historiográfico. A marginalização da “Ásia” na memória japonesa do pós-guerra não foi tanto o produto de decisões conscientes, mas o efeito de um contexto internacional mais amplo. O silenciamento da “Ásia” correspondeu à grande divisão da Guerra Fria, à incorporação do Japão em uma ordem mundial ocidental/capitalista dominada pelos Estados Unidos. Sob o guarda-chuva do tratado de segurança com os norte-americanos, não havia espaço no discurso japonês para as preocupações de outras nações asiáticas. O Japão se considerava “ocidental” (cf., por exemplo, TADAO, 1947), e era tratado como a “Prússia do Oriente”. Nas palavras de Noam Chomsky (1991, p. 13), “É claro que a Europa agora inclui o Japão, o qual podemos considerar como um europeu honorário”.

A partir dos anos 1980, mais particularmente no decorrer dos anos 1990, o cenário da memória japonesa mudou de forma drástica. Essa mudança pode ser descrita como uma combinação de dois fenômenos: um aumento maciço das discussões sobre o período da guerra e o surgimento de novos atores nesses debates. Mais importante ainda, as vozes de outros países asiáticos foram ouvidas nas discussões acaloradas sobre o legado de guerra japonês. As intervenções deles não eram mais marginalizadas, mas recebiam uma resposta muitas vezes crítica e, às vezes, empática.

Não muito diferente de muitos outros países, o Japão nos anos 1990 testemunhou um intenso debate sobre questões de memória e recordação. As razões para esse notável aumento do interesse e da conscientização públicos são múltiplas. Algumas têm caráter mundial e contribuíram para uma tendência global nos debates sobre memória, enquanto outras são mais específicas ao arquipélago japonês. Para começar, a atual onipresença das discussões sobre o passado claramente tem uma dimensão geracional. Aqueles que experimentaram a guerra e ainda podem se lembrar dela não estarão vivos por muito mais tempo. Esse fator biológico contribuiu para a natureza acalorada de alguns conflitos recentes sobre questões como compensação pelo trabalho forçado e as “mulheres de conforto” a serviço das forças armadas japonesas. Além disso, a documentação e o testemunho da experiência pessoal se tornaram uma necessidade urgente no momento em que existem poucas testemunhas por perto. O extraordinário boom de histórias pessoais (jibunshi), de inúmeros “japoneses comuns”, também deve ser colocado nesse contexto (cf. BUCHHOLZ, 2002).

Mais importante ainda, o fim da Guerra Fria ajudou a abrir um novo espaço para debates e vozes dissidentes. A queda do muro de Berlim e o colapso da União Soviética não só tiveram efeitos nesses países, como também indicaram o fim da ordem mundial do pós-guerra em um sentido mais amplo. Com o desaparecimento da dicotomia Leste-Oeste, a clara estrutura dentro da qual todos os eventos foram dotados de significado político também desapareceu. Em muitos aspectos, os conflitos simbólicos sobre o significado do passado foram transferidos de lugar e substituídos pelos antagonismos ideológicos (GLUCK, 1996, 1993). Como resultado, podemos falar de uma “explosão” virtual de memória no Japão nos anos 1990. Após o “fim da história” (pelo menos o fim de uma história dominada por projetos universalistas), o discurso permanente sobre o passado corresponde a uma economia pós-ideológica de signos (YUMIKO, 2000).

O fim da primazia do antagonismo soviético-norte-americano afetou consideravelmente o cenário político no Japão. Uma das consequências foi o fim do monopólio político do Partido Liberal Democrata (PLD) em 1993. A dissolução do “sistema de 1955”, baseada no domínio do PLD conservador e em uma política externa e de segurança voltada exclusivamente para os Estados Unidos, correspondia a um debate renovado e contestado sobre o passado nacional silenciado nas décadas anteriores. O fim do monopólio do poder do PLD coincidiu com o colapso da economia da “bolha” no início dos anos 1990, e a recessão econômica subsequente também forneceu motivação para olhar para si mesmo e submeter a história recente do Japão a um exame crítico. Um último fator não deve ser esquecido: a morte do imperador Hirohito, chefe de Estado desde 1926, que, por sua simples presença, tornava virtualmente impossível discutir a responsabilidade de guerra (sensô sekinin) e a incapacidade de se prestar contas com o passado após 1945 (sengo sekinin) (BURUMA, 1994).

O efeito mais notável do fim da Guerra Fria foi a mudança que gerou no relacionamento do Japão com seus vizinhos asiáticos. Após um longo período de relativa alienação, o Japão estava novamente se aproximando da Ásia (HEIN, 1995). Esse desenrolar já havia começado na década de 1980 e foi influenciado, em particular, pelo crescimento econômico da Coreia do Sul, por exemplo. As conexões políticas e econômicas, bem como as trocas culturais, aumentaram desde então e, nesse contexto, a interpretação do passado nacional também sofreu mudanças palpáveis (GEROW, 2000). Em particular, as vozes das vítimas asiáticas do expansionismo japonês em tempos de guerra ganharam uma importância que não tiveram nas décadas anteriores. Essas mudanças complexas e fortalecedoras abriram a possibilidade de novas formas de contestação das versões hegemônicas da memória nacional.

O ressurgimento da “Ásia” não implica que outras conexões transnacionais não sejam mais relevantes. Pelo contrário: como demonstrou a controvérsia sobre a exposição Enola Gay em Washington, em 1995, a preocupação com as interpretações norte-americanas do passado japonês não diminuiu.16 Outro caso interessante, particularmente em nosso contexto, é o modelo alemão que, a partir da década de 1980, foi instrumentalizado por grupos de oposição no Japão, que pressionavam por uma perspectiva mais crítica da história do país em tempos de guerra. O Japão, alegava-se, não havia “dominado o passado” o suficiente e deveria procurar um modelo na Alemanha Ocidental. O famoso discurso de 1985 do presidente alemão Richard von Weizsäcker, quarenta anos após o final da guerra, por exemplo, foi traduzido para o japonês e alcançou 29 edições em doze anos. Até mesmo o termo “dominar o passado” (kako no kokufuku) foi inventado em 1992 para traduzir o alemão Vergangenheitsbewältigung. A comparação com a Alemanha Ocidental estava envolta nos conflitos políticos da época e serviu como modelo para grupos de oposição; ao mesmo tempo, estava disponível à instrumentalização pelos seus oponentes políticos (KIICHIRÔ, 1983, p. 50; FUHRT, 1996; KENTARÔ, 1994; HÔEI, 1986; TAKEO, 1991).17

Não obstante esses exemplos de entrelaçamentos transnacionais, o desenvolvimento mais importante na década de 1990 foi o que poderia ser chamado de “Retorno da Ásia”.18 Na ocasião do cinquentenário do fim da guerra, em 1995, em particular, a demanda por uma desculpa oficial do governo japonês foi feita por muitos governos asiáticos e grupos da sociedade civil. Os debates no Japão não podem ser entendidos fora desse contexto mais amplo (cf. SERAPHIM, 1996). A representação da guerra nos livros escolares também permaneceu um terreno contestado, como demonstram amplamente os protestos chineses contra a utilização de um manual revisionista na primavera de 2001. As interpretações conflitantes do massacre de Nanjing são outro assunto de interesse público e de diálogo acadêmico. No curso das trocas acadêmicas, as posições “chinesa” e “japonesa” são negociadas, mas ao mesmo tempo sugerem a possibilidade de transcender a nacionalidade como um fator crucial para determinar a interpretação do passado (cf. YANG, 1999, 2001). A arena na qual a dimensão asiática da memória japonesa perde sua eficácia de forma mais proeminente, por fim, é na questão da compensação para as antigas “mulheres de conforto” (jûgun ianfu), mais precisamente prostitutas forçadas a serviço do exército japonês.19

O que chama atenção em todos esses debates não é apenas o grau em que as vozes anteriormente marginalizadas se fizeram ouvir e transformaram uma preocupação japonesa com o passado nacional em um esforço transnacional. Ao mesmo tempo, essas vozes se diversificaram. Nas primeiras décadas do pós-guerra, os governos falaram em nome dos interesses declarados de suas nações, e se insurgiram contra assuntos de livros escolares ou para corrigir o que consideravam interpretações defeituosas do papel do Japão no continente asiático nas décadas de 1930 e 1940. Além disso, questões relativas a reparações e compensações foram negociadas exclusivamente entre governos, enquanto reivindicações individuais não foram admitidas. Essa forma de representação, em alguns casos, levou a coalizões surpreendentes, como demonstra o exemplo da prostituição forçada, quando governos japoneses e coreanos conspiraram para reprimir as alegações das antigas “mulheres de conforto”. Nos anos 1990, no entanto, as vozes aumentaram e minaram o monopólio governamental sobre a memória nacional. Indivíduos e grupos da sociedade civil de outras nações asiáticas começaram a desempenhar um papel de liderança no terreno instável da produção da memória japonesa. Por meio dessas intervenções variadas e discordantes, elas contribuíram para o surgimento do que Lisa Yoneyama (2001) chamou recentemente de “esferas públicas pós-nacionalistas na produção de conhecimento histórico”. A multiplicação de atores e as coalizões discursivas para além das fronteiras nacionais atestam a centralidade da política de memória no Japão contemporâneo, assim como o papel crucial da “Ásia” no contexto da formação da identidade japonesa (cf. FIELD, 1997).

A história da memória faz parte de uma história entrelaçada e transnacional. Os debates sobre o passado carregam os traços de um mundo globalizado que estão profundamente entalhados no que muitas vezes ainda é percebido como reino exclusivamente do nacional, de mentalidade e raciocínios peculiares. As várias trocas e intervenções para além das fronteiras nacionais introduzem múltiplas temporalidades em uma arena em que essas narrativas conflitantes do passado são negociadas. Às vezes, intervenções de fora delimitam o espaço discursivo dentro do qual o passado pode ser lembrado (por exemplo, a ocupação). Em muitos casos, no entanto, elas ajudaram a descentrar narrativas dominantes de uma história nacionalizada e, assim, contribuíram para uma pluralização do passado, o que Kang Sang-Jung (2005) chamou de “guerra civil da memória” no Japão contemporâneo. A complexa dialética de lembrar e esquecer – como a própria história – não se limita ao território de um Estado-nação.

Uma perspectiva que inclua em primeiro plano a integração transnacional da produção da memória pode contribuir para uma interpretação mais complexa das diferentes trajetórias das interpretações da Alemanha Ocidental e do Japão sobre seus “maus” passados, que têm sido frequentemente nublados pelo mito do caráter nacional. Essa perspectiva sugere que uma maneira supostamente mais autocrítica de lidar com a experiência de guerra na Alemanha Ocidental deve estar situada dentro de um processo de integração europeia e de múltiplas formas de intercâmbio discursivo. Ao mesmo tempo, ajuda a explicar a “explosão” dos debates japoneses sobre a guerra nos anos 1990, ultrapassando a conveniente narrativa de repressão, amnésia e, eventualmente, domínio crítico. Além disso, uma perspectiva transnacional sugere que o terreno modificado da produção de memória japonesa pode estar associado ao que eu escolhi chamar de “Retorno da Ásia” ao discurso japonês.

Isso não significa negar a importância de conflitos internos e a heterogeneidade dentro de determinada sociedade, que, por sua vez, sempre podem ser contextualizados dentro de uma arena transnacional maior. Mas enquanto a dicotomia de Ruth Benedict entre “culturas da culpa” e “culturas da vergonha” continuar a servir de explicação abreviada para um suposto processo de aprendizado alemão em contraste com a negação japonesa, o foco em “memórias entrelaçadas” pode servir como um complemento necessário. Dado o papel central da memória nas definições de um Eu nacional na virada do século XXI, essa perspectiva sugere que a própria identidade nacional é o produto – e não a pré-condição – de processos de interação transnacional, intercâmbio e entrelaçamento.

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Notas

1 A “habilidade de lamentar” se refere, é claro, a Alexander Mitscherlich e Margarete Mitscherlich (1968).
2 Mesmo o magistral Wages of Guilt: Memories of War in Germany and Japan (1994), de Ian Buruma, não está livre dessa tendência.
3 O projeto Les Lieux de Mémoire (1984-1992), em sete volumes, de Pierre Nora é logo lembrado.
4 Enquanto no Japão a ocupação foi essencialmente um assunto norte-americano, a Alemanha Ocidental foi ocupada por tropas francesas, inglesas e norte-americanas. Nas esferas educacionais e acadêmicas, no entanto, políticas norte-americanas logo emergiram como as mais relevantes. Cf. Johannes Weyer (1984).
5 Para a continuidade à censura no período da Guerra, cf. Takumi, (1998).
6 Sobre os efeitos da ocupação norte-americana na Alemanha, cf. Walter L. Dorn (1958). Para o Japão, cf. Richard H. Minear (1972), Awaya Kentarô (1989) e Hosoya Chihiro et al. (1986).
7 Exemplos proeminentes dessa tendência são as interpretações desenvolvidas pela “Associação por uma Visão Liberalista da História” (Jiyûshugi shikan kenkyûkai) dirigida por Fujioka Nobukatsu. Cf. Rikki Kersten (1999) e Aaron Gerow (2000).
8 Para a Alemanha, cf. Winfried Schulze (1993); para o Japão, cf. Yamamoto Reiko (1994).
9 Esse tabu só foi superado quando o renomado historiador Hans Rothfels traduziu seu testemunho para o alemão em 1949. Cf. Steinbach (1994).
10 GHQ (Quartel General das Forças Armadas dos Estados Unidos no Pacífico), Artigos Históricos sobre a Guerra no Pacífico, GHQ/SCAP – Registros na Biblioteca Nacional da Dieta de Tóquio, Prateleira No. CIE (D) 05235, 05236, Caixa No. 5869, Classificação No. 840, 800, 000 e No. 000, 840, 1.
11 Para a historiografia da Alemanha Oriental, cf. Martin Sabrow (2001).
12 Em relação às diferentes abordagens terminológicas para se encarar a guerra, cf. o artigo de Reynolds (2003).
13 O filósofo Takeuchi Yoshimi, em seu Kindai no chôkoku (1983), argumentou de forma semelhante.
14 Na Alemanha Ocidental, essa metanarrativa tornou-se hegemônica na medida em que o que era compreendido como Sonderweg japonês era interpretado como cópia direta do modelo alemão (cf. MARTIN, 1990).
15 A tentativa de adaptar interpretações do passado a um contexto europeu começou muito antes. Para um exemplo ilustrativo, cf. Institut für Zeitgeschichte (1957).
16 Ver os artigos no volume 5, número 3, de 1997, da Positions.
17 Kanji (1994) adverte explicitamente sobre ver a Alemanha como modelo.
18 Certamente, a preocupação com assuntos asiáticos nunca esteve totalmente ausente dos debates japoneses. Veja, por exemplo, Naokichi, Shigeki e Masatoshi (1966); ver também Seifert (1977). Antes da década de 1980, no entanto, essas perspectivas permaneciam marginais.
19 Ver os artigos no volume 5, número 1, de 1997, da Positions.

Autor notes

Koserstraße 20, Room A 355, 14195, Berlin, Germany.

Informação adicional

ORIGEM DO ARTIGO: Artigo originalmente publicado com a seguinte referência: Conrad, Sebastian (2003). Entangled Memories: Versions of the Past in Germany and Japan, 1945–2001. Journal of Contemporary History, Vol 38(1), 85–99. Copyright © 2003 SAGE Publications, London, Thousand Oaks, CA and New Delhi. Reprinted with permission. Esta tradução possui a permissão do autor Sebastian Conrad e da SAGE Publications.

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