Seção Temática
Recepción: 01 Enero 2018
Aprobación: 15 Enero 2018
Resumo: : (Terras de identidade e terras de conflito: movimento social ribeirinho e regularização fundiária nas ilhas e várzeas de Abaetetuba – PA). Tomando como referência o estudo de caso de duas políticas de regularização fundiária destinadas aos ribeirinhos do município paraense de Abaetetuba, o presente artigo aborda seus aspectos gerais de funcionamento e impasses para sua plena execução. A realização de trabalho de campo para o levantamento de informações por meio de entrevistas com lideranças, gestores públicos e ribeirinhos, somou-se à revisão bibliográfica sobre grupo, políticas fundiárias e movimentos sociais na Amazônia. Ao mesmo tempo, foram analisados os principais dispositivos legais associados aos diversos regimes de terra e aqueles que subsidiaram a execução das políticas fundiárias, argumentando que os desafios da regularização fundiária e ocupação de nosso locus empírico mantêm íntima ligação com aspectos históricos e políticos relacionados com a gestão de terras públicas.
Palavras-chave: ribeirinhos, regularização fundiária, Pará, movimento.
Abstract: : (Lands of identity and lands of conflict: riverine social movement and land tenure regularization in the islands and floodplains of Abaetetuba / PA). Taking as a reference a case study of two policies of land tenure regularization aimed at the riverine inhabitants of the municipality of Abaetetuba, this article deals with its general functional aspects and deadlocks toward its full implementation. Fieldwork for the collection of information through interviews with leaders, public managers and riverine peoples, was added to a bibliographical review on the group, land tenure policies and social movements in the Amazon. At the same time, the main legal mechanisms associated with the different land regimes and those that supported the implementation of land tenure policies were analyzed, arguing that the challenges of land tenure regularization and occupation of our case study site are closely linked with historical and political aspects related to the management of public lands.
Keywords: riverine, land regularization, Pará, social movement.
Introdução
A primeira seção do artigo apresenta o lócus empírico da pesquisa e concomitantemente aponta aspectos da formação do grupo e a emergência da identidade ribeirinha em Abaetetuba. A hipótese central é a de que a sua sociogênese foi estruturada por deslocamentos e ciclos de exploração econômica da região que contribuíram para a ocupação das ilhas e várzeas. Esta seção apoia-se, ainda, nas fontes produzidas pelo próprio grupo que mobilizam os elementos constitutivos de sua identidade, calcadas em transformações das práticas sociais que em parte foram transmitidas pela oralidade e organizadas em cartilhas produzidas pelos próprios ribeirinhos. Ao mesmo tempo, entende-se que a trajetória de organização política do grupo, que culminou na criação do Movimento de Ribeirinhos e Ribeirinhas das Ilhas e Várzeas de Abaetetuba (Moriva), operou para a assunção da identidade ribeirinha e pressão no aparato estatal para a regularização fundiária das ilhas e várzeas onde residem.
A segunda seção do artigo apresenta aspectos gerais da implantação dos Projetos de Assentamento Agroextrativista (PAE) nas ilhas e várzeas de Abaetetuba. A execução desta política de regularização fundiária lastreia- se nas principais alterações promovidas desde a redemocratização em 1985, no tocante à gestão de terras públicas. Na terceira seção, destaca-se que a mudança de missão institucional da SPU, passando da função meramente arrecadatória, em 2003, para a função social dos bens da União, criou, com o II Plano Nacional de Reforma Agrária, as condições jurídicas e políticas para que as comunidades residentes nas áreas de várzea pudessem ser incluídas nas ações de regularização fundiária instituídas pela SPU. Especialmente com a execução do Programa Nossa Várzea: cidadania e sustentabilidade na Amazônia brasileira, que tinha como objetivo o ordenamento fundiário conjugando o aproveitamento sustentável dos recursos naturais em favor das populações ribeirinhas da Amazônia Legal.
A hipótese que orienta as duas últimas seções é de que a cumulatividade de ações anteriores à própria Constituição Federal de 1988 permitiu a execução, ainda que incompleta, das políticas de regularização fundiária, e que no início dos anos 2000 a conjuntura se mostrou favorável para a participação política dos povos e comunidades tradicionais e das formas de garantir seu direito de permanência na terra. Foi nesse contexto que a mudança de missão da SPU, a elaboração do II Plano Nacional de Reforma Agrária e a criação da Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais permitiram o reconhecimento da desigualdade material e simbólica dos ribeirinhos. Por fim, juntamente com comentários sobre a política pública, considera-se que para compreender os desafios enfrentados pelos ribeirinhos para a regularização fundiária das terras tradicionalmente ocupadas, se faz necessário lançar luz sobre a base legal que regula a destinação dos bens da União, dos quais as terras públicas são elemento fundamental.
O lócus empírico e seus habitantes: os ribeirinhos das ilhas e várzeas de Abaetetuba . PA
O lócus empírico integra o município paraense de Abaetetuba, que se localiza na Microrregião de Cametá e na Mesorregião do Nordeste Paraense. Com uma população estimada em 150.431 habitantes, em uma área de 1.601 km2, possui uma densidade populacional de 87 hab./km2. O município faz limite com os de Barcarena, Ponta das Pedras, Muaná, Igarapé Mirim e Moju, e localiza-se no estuário do mesmo rio, fazendo parte da Região Metropolitana de Belém (RMB). A região insular do município paraense de Abaetetuba ou “região das ilhas”, tal como os nativos a denominam, está localizada na confluência dos rios Tocantins e Pará. A região insular de Abaetetuba, onde residem os ribeirinhos do município, composta de 73 ilhas, é banhada pelo rio Pará, em sua face oposta à orla localizada na sede municipal, a partir de onde é possível desembarcar na área urbana de Abaetetuba e em outras comunidades ribeirinhas localizadas nos rios Guajará de Beja e Abaeté. É deste último que se originou o nome do município.
As cheias e vazantes garantem a fertilidade do solo e a recomposição da vegetação nas margens dos cursos d’água, o que se constitui em componente indispensável para a produção de açaí, composição florística e de outros produtos florestais. Ao mesmo tempo, a mobilidade dos ribeirinhos é condicionada pelas marés e por outros fatores que a elas se somam, como a correnteza e a intensidade dos ventos. Portanto, as características ambientais em Abaetetuba influenciam não somente as condições do solo que favorecem o plantio de espécies que ao longo do tempo foram exploradas economicamente, mas também interfere na mobilidade e interação dos grupos entre si e com outras porções do município.
A mais relevante constatação sobre a sociogênese dos ribeirinhos de Abaetetuba, tomando por base a literatura aqui mobilizada e as entrevistas realizadas durante o trabalho de campo, é de que não há unidade ou forma única de definir a identidade ribeirinha em Abaetetuba. A sua plasticidade funda-se, em grande medida, nas transformações das práticas e deslocamentos de outros sujeitos históricos para a região. Muito embora lastros históricos gerais possam ser partilhados, considerando-se o processo de ocupação da Amazônia Legal e a ligação deste grupo social com os cursos d’água da região, as formas de vida possíveis dos ribeirinhos são resultantes das contingências com as quais se depararam em sua reprodução social.
Na literatura clássica sobre a ressignificação do caboclo, é o trabalho no seringal que elimina o estigma desse sujeito histórico, que passa a ter capacidade de agência e conteúdo político. Ou ainda, nos termos de Martins (1981 apud Torres, 2006, p. 60), não por acaso se dá a relação entre a substituição do termo, impregnado de preconceito e que alude à preguiça, ignorância e atraso, pelo de “camponês”, quando se intensifica a organização política e as lutas no campo. Nas ilhas de Abaetetuba, até onde os dados obtidos permitem afirmar, as identidades de seringueiro e de camponês não foram acionadas pelo grupo, mas sim as práticas que minimante lhes são constitutivas.
Cruz (2011) e Fraxe (2011) adotam os termos “caboclo-ribeirinho” e “campesinato ribeirinho”, respectivamente, para superar os estigmas que estes sujeitos históricos carregam. Para Cruz, o que se coloca como questão é a necessidade de romper com uma visão idealizada do “bom selvagem que ainda não cometeu os pecados da modernidade” (CRUZ, 2011: 134). Fraxe, por sua vez, enfatiza o sistema produtivo do grupo nas várzeas do estado do Amazonas, em que os modos de vida camponês, pescador e extrativista se fundem. Witkoski (2007) mobilizou a dimensão dos usos dos recursos naturais pelo grupo, a partir da categoria “Florestas de Trabalho”, que articulou o extrativismo, a pesca e a caça nos ambientes de várzea e terra firme.
A dificuldade em reconstituir o histórico de ocupação e formação do grupo, primeiro elemento constitutivo da identidade ribeirinha em Abaetetuba, tal como registrado pelos próprios, se deve em grande medida a dois fatores: à escassez de estudos de caso que mobilizem o tema sem negligenciar os aspectos históricos de sua composição; e, por outro lado, ao caráter difuso das informações colhidas em campo e ao limite temporal imposto pela memória oral, quando esse assunto foi abordado durante as entrevistas. No geral, as respostas dos entrevistados aludiam às memórias familiares transmitidas pelos relatos dos antepassados, e que são compartilhadas por membros do grupo.
Este indício de que haveria um passado comum, fruto de deslocamentos na região e do contato com diversos sujeitos históricos, é o que, nos termos de Furtado (2006), configura-se como “origens pluriétnicas” das sociedades amazônicas e que teriam em comum a ancestralidade indígena. Ou, ainda, nos termos de Gomes (2015), este passado pode ser entendido como resultante de “misturas étnicas” que o autor aciona para analisar as diversas formas de aquilombamento que contribuíram para a formação do campesinato negro. Embora a pesquisa de Lourdes Furtado esteja centrada na região localizada entre o Médio Amazonas até o arquipélago de Marajó, desde 1980, seu objetivo é, a partir da análise dos indícios pré-históricos do povoamento da Amazônia e da formação de sociedades pesqueiras, encontrar traços comuns com a ocupação ribeirinha. Por sua vez, em Gomes (2015), a mistura entre brancos, negros e índios com proximidades e afastamentos táticos da resistência dos negros à escravidão, se difundiu, como mostra o autor, em todas as regiões do país, chamando a atenção, contudo, para as regiões Centro- Oeste e Norte.
No século XVII, a Vila de Beja era ocupada, segundo a cartilha elaborada pela CPT Guajarina em 2009, por índios nômades da etnia Mortiguar (ou Mortiguara, dependendo da fonte) vindos do Marajó para a região. O documento informa ainda que Francisco de Azevedo Monteiro ganhara uma sesmaria à sua escolha no Baixo Tocantins, porém, pela dificuldade de navegação para chegar ao local desejado para tomar posse, acabou, em 1745, construindo nas margens do rio Maratauira uma capela em homenagem à Nossa Senhora da Conceição. Até onde as fontes permitem afirmar, nessa ocasião teve início a ocupação colonial dessas terras.
Em 1773, a Vila de Beja recebeu famílias do arquipélago do Marajó que deram início a outra etapa do povoamento da região. Nos anos seguintes, segundo conta a cartilha da CPT, um morador do povoado chamado Manoel da Silva Raposo recebeu a posse da sesmaria que havia sido concedida para Francisco de Azevedo Monteiro, em 1745. Depois de doada a sesmaria para a Mitra Diocesana, por Manoel da Silva Raposo, ao final de sua vida, o povoado experimentou por décadas uma série de transferências, anexações e fusões de seu território com municípios da região, especialmente os de Belém e Igarapé-Mirim, até a obtenção da autonomia definitiva e elevação da já Vila de Abaeté à categoria de município, por meio da Lei no 334, de 6 de julho de 1895.
Já a dispersão da população negra no estado do Pará está associada, de acordo com Castro (2004), com a construção da sociedade colonial e o aumento da exploração econômica. O negro não trabalhava somente nas fazendas de cana, algodão e de gado. A mão de obra escrava foi, segundo a autora, utilizada nas obras públicas e serviços essenciais para a construção civil, tais como olarias, pedreiras e serrarias, nos quais Abaetetuba também foi referência. Na carpintaria naval, que fez do município um importante polo regional, a mão de obra de negros escravizados também foi utilizada, dada a habilidade para a construção e reparo de embarcações que trafegavam nos cursos d’água entre Belém e outras porções do estado:
As primeiras fazendas nas proximidades de Belém e que datam de dois séculos atrás, estiveram localizadas às margens de rios que se formam na embocadura do Amazonas. Elas concentraram uma população escrava importante, embora mostrassem uma acanhada aplicação à agricultura como escreveu Baena (1969). Na visão deste observador, a plantagem do arroz e do algodão era o capital objeto das lidas agrárias nas Fazendas adjacentes à Cidade: todas as mais plantas são agriculturadas em porções mínimas (BAENA, 1839, p. 79). Spix e Martius mencionam o cultivo particularmente da cana-de- açúcar nas cercanias de Belém, chegando sua produção a atender o mercado da capital da província e a ser exportada para o Maranhão. Uma parte considerável destilava-se para fabricar cachaça e licores. Acrescentam esses viajantes que grandes remessas da aguardente comum vão para os Açores e para Portugal, de onde é recambiada ao Brasil, depois de parcialmente retificada. Pelo Relatório do Presidente da Província, Carlos de Araújo Brusque, em 1862, havia três moinhos de arroz movidos a água e um a tração animal, ao lado de 1.165 casas de farinha. (CASTRO, 2004, p. 5)
Não obstante a escravização indígena e negra fosse praticada desde o século XVI (GOMES, 2015; TRECCANI, 2006), o trabalho nos engenhos e na agricultura da região passou a demandar mais mão de obra escrava, em especial em Belém e arredores. Soma-se ainda o papel decisivo que o Movimento Cabano, conhecido também como Cabanagem, teve na ocupação das margens dos rios e igarapés do território paraense e da região das ilhas de Abaetetuba, em particular:
Eu arrisco dizer que eles se organizam ali desde a década de 80, os ribeirinhos. Da forma deles, participando da ação da pastoral, e eu acho que depois de 2000 eles começaram a se organizar mais, porque eu lembro que na época do presidente Lula chegou a visitar o Cametá, que são áreas que foram áreas de resistência da Cabanagem, que é um elemento que a gente tem referência de luta aqui no Pará, então guerreiros da Cabanagem foram oriundos dessa região aí. E lá em Abaetetuba tem muitas áreas de remanescentes de quilombos, essa luta de Zumbi dos Palmares eles são referência também. Então muitas comunidades ribeirinhas são ribeirinhas e quilombolas, que tem essa referência na luta histórica. Inclusive seria interessante estudar mais a fundo essa relação com a cabanagem, com a luta quilombola que as comunidades de lá têm (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
A hipótese que o entrevistado formula sobre o vínculo entre a Cabanagem e a presença negra na região insular de Abaetetuba reitera importante evidência, considerando que, como nos informa Vicente Salles (apud Pinto 2000), a fuga de escravos para aquilombamento ou de cabanos derrotados de Belém para a região do Baixo Tocantins em busca de abrigo contribuiu para a ocupação dos rios, igarapés e ilhas da região. A capital do estado e o arquipélago do Marajó se constituíam em localidades de origem da população negra de Abaetetuba, tal como as entrevistas de campo informam:
O meu avô era negro, descendente de escravo, ele trabalhava como um dos escravos no engenho na região do Marajó e lá tinham várias famílias negras que moravam lá. Nessa época, eles se sentiram tão humilhados que fugiram numa noite, atravessando o rio Pará num batelão, vieram várias famílias que se localizaram num quilombo no rio Assacu, é uma ilha e outras famílias se localizaram na ilha do Xingu. Minha mãe era filha desse meu avô quilombola, por essas origens eu tenho a origem negra, sou descendente das comunidades de remanescente quilombo. Eu só fui descobrir isso, a partir de um estudo que eu fiz em 99 que eu descobri que minha origem é negra (Assessor da CPT em entrevista ao autor em setembro de 2015).
Esse relato sobre a história de ocupação da ilha do Xingu, onde se localiza o Quilombo Bom Retiro, titulado pelo Iterpa, pode ser estendido, como verificado em campo, para outras comunidades localizadas no rio Assacu e demais comunidades quilombolas assentadas nos PAEs. Ao mesmo tempo, a história oral do grupo sobre a Cabanagem (CPT, 2009) foi registrada nos seguintes termos:
Contavam os mais velhos que os cabanos eram homens sérios, rudes que vinham prontos para tudo. A Cabanagem era um movimento do povo simples que se encontrava na miséria contra aqueles que se enriqueciam à custa da maioria. Ao chegarem a uma casa eles a cercavam rapidamente dominando assim as pessoas que lá moravam, onde os homens fortes eram obrigados a ir com eles. O dono da casa só tinha duas opções:ou ir com eles ou morrer. Muitos senhores abastados ao pressentirem a presença dos cabanos fugiam mata adentro abandonando as casas e enterrando jóias, dinheiro, ouro. Por aí dá para ver que a luta era contra os exploradores, pois só eles tinham dinheiro, joias e ouro (CPT, 2009, p. 39).
Segundo Gomes (2015), a formação de quilombos na Amazônia se deu de modo geral nas áreas de difícil acesso e, diferentemente do que parte dos estudos sobre o tema sugere, tinham como base econômica não só a agricultura, mas a comercialização de excedentes com outros mocambos, com indígenas e com os brancos. A formação de um campesinato negro diversificado em uma “rede mercantil articulada” (GOMES, 2015: 31) que extrapolava as relações locais, retirava o grupo do isolamento e contou com a participação de escravos e libertos. Na mesma direção, Gomes (2006 apud Pereira 2014, p. 89) cita a formação no século XIX de “microcomunidades camponesas” no vale do Tocantins, formadas por quilombolas em interação com índios e que integravam à paisagem local práticas econômicas.
É o que demonstram Acevedo Marin e Castro (1998) ao pesquisar o histórico de ocupação negra da porção setentrional do município de Oriximiná, localizado no Baixo Amazonas. Muito embora distante da nossa região de pesquisa, as autoras informam como a cabanagem irradiou um “espectro de liberdade” por todo o território paraense. Uma vez sufocado o movimento, as redes de comércio foram reestruturadas e acabaram por criar as condições para que os quilombolas do rio Trombetas vendessem seus produtos, em especial gêneros da floresta como breu e urucum, e se aproximassem da sede paroquial onde realizavam excepcionalmente atos de batismos e outras formas de integração. A distância entre o estuário e o Baixo Amazonas não impediu a afirmação da identidade quilombola na região insular de Abaetetuba, tendo como influência a luta das comunidades remanescentes do rio Trombetas2:
As comunidades que se formaram ao longo das margens dos cursos d’água e no interior das ilhas participaram dos diversos ciclos econômicos experimentados pela região. Seus moradores se mantiveram no período de tempo alcançado pela memória coletiva do grupo, ora expropriados do acesso à terra, por meio de um tipo de “inquilinato”, ora alienado do produto de seu trabalho, como indicam o sistema de meia e o aviamento nos ciclos da cana e da borracha. Nos finais dos anos 1950, com a chegada da Igreja Assembleia de Deus na região das ilhas, e posteriormente, na década de 1970, com a formação das 57 CEBs, “caboclos das ilhas” passam a atuar diretamente nas comunidades nas atividades de evangelização e de mobilização política do grupo.
A natureza das comunidades, e seus tipos possíveis, já era uma preocupação de Max Weber (2009), sobretudo porque cada uma delas engendra formas distintas de ação comunitária e de relação entre os membros. O autor nos informa da tendência do camponês individual em relutar contra a interferência de “terceiros” em seus assuntos. Portanto, a ação comunitária, em que a aldeia da economia agrária autárquica de tempos primitivos se constitui em tipo ideal, seria uma exceção. Nesse tipo de comunidade, a relação está baseada na ajuda mútua, em caso de insuficiência de meios da própria comunidade doméstica, por meio do trabalho de favor não remunerado e empréstimo de bens de uso e de consumo. Contudo, o autor reconhece que a vizinhança pode atuar além dos limites rígidos de outras “formações”, como as políticas (WEBER, 2009, p. 247). O tipo ideal de comunidade que pretendemos destacar, por permitir compreender a ocupação das ilhas e várzeas de Abaetetuba, refere-se às comunidades étnicas, que são definidas nos seguintes termos por Weber:
Como não se trata de clãs, chamaremos grupos “étnicos” aqueles grupos humanos que, em virtude de semelhanças no habitus externo ou nos costumes, ou em ambos, ou em virtude de lembranças de colonização e migração, nutrem uma crença subjetiva na procedência comum, de tal modo que esta se torna importante para a propagação de relações comunitárias, sendo indiferente se existe ou não uma comunidade de sangue efetiva. A “comunhão étnica” distingue-se da “comunidade de clã” pelo fato de aquela ser apenas produto de um “sentimento de comunidade” e não uma comunidade verdadeira como o clã, a cuja essência pertence uma efetiva ação comunitária (WEBER, 2009, p. 270).
No caso das comunidades étnicas, nas quais o costume e as lembranças de um passado comum de colonização e migração lhes são constitutivos de uma crença subjetiva compartilhada, podem ser ligadas, sem incorrermos em reificações, aos ribeirinhos de Abaetetuba. Somamos às formulações de Weber, as “origens pluriétnicas” das quais trata Lourdes Furtado e as “misturas étnicas” de Flavio Gomes que indicam episódios de aliança e enfrentamento entre indígenas e quilombolas.
Quando os ribeirinhos se tornam assentados: o caso dos projetos de assentamento agroextrativista em Abaetetuba
O Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) é uma modalidade de assentamento rural constituído por meio da obtenção de terras pela União e implantado pelo Incra. Esta se constitui na principal política de regularização fundiária que atende à população ribeirinha e quilombola do município de Abaetetuba. Considerando os dados da CPT local, atende a 7.584 famílias distribuídas nos 24 PAEs instalados no município. Os documentos que fundamentam essa modalidade são o Estatuto da Terra, o I Plano Nacional de Reforma Agrária e a Portaria no 627/1987 do Incra, e com base neles foram editadas três portarias do Incra que ofereceram as condições para a instalação desta modalidade de assentamento na região das ilhas. A primeira Portaria é a no 268, editada em 23 de outubro de 1996, que considera que a atividade agroextrativista na Amazônia “afirma-se como alternativa aos projetos de assentamento executados pelo Incra”, considerando a modalidade convencional de assentamento. O seu preâmbulo ressalta que a necessidade de preservação do meio ambiente e o “respeito às populações rurais” das diferentes regiões se constituem em elementos que satisfazem a função social da propriedade e permitem, tal como previsto pelo Estatuto da Terra, “a perfeita integração do trinômio homem-propriedade-uso da terra” (Incra, 1996), copiando literalmente o anotado na Portaria no 627/1987, que criou a modalidade de Projeto de Assentamento Extrativista e que foi revogada no mesmo ato, adicionando o prefixo “Agro” nesta modalidade de assentamento.
Ao mesmo tempo, reconhece que as especificidades ecológicas de regiões do país permitem o desenvolvimento de atividades agroextrativistas e propiciam, para as populações que delas dependem, uma base econômica autossustentável que não interfere nos ecossistemas em questão, assegurando a manutenção de suas condições naturais.
Alguns aspectos da Portaria relacionam-se com a exploração de áreas dotadas de riquezas extrativas. Em Abaetetuba, o açaí e o miriti são os principais produtos florestais das ilhas e várzeas de Abaetetuba, ambos importantes fontes de alimento e de renda da população ribeirinha, desde finais dos anos 1990 quando se intensificou a produção. O segundo aspecto que merece destaque é a forma de destinação das áreas para os PAEs, que deveria ser mediante concessão de uso, mecanismo de transferência de domínio de terras públicas previsto tanto pelo I PNRA quanto pela CF/1988.
O terceiro aspecto da Portaria que chama a atenção é a constituição do Grupo Executivo do Projeto de Assentamento Agroextrativista, que ficou com a tarefa de conduzir as atividades operativas, com autorização para
solicitar às demais instâncias do Incra a colaboração para a execução das suas atividades. Nesse sentido, por meio da Portaria Incra no 41/1996, é instituído pelo Grupo de Trabalho responsável pela elaboração da metodologia de implantação dos PAEs, que foi aprovada para ser aplicada aos assentamentos com a Portaria Incra/no 269, de 23 de outubro de 1996. O Grupo de Trabalho foi composto por funcionários do Incra e contou com a participação de representantes de prefeituras, sindicatos de trabalhadores rurais, universidades e membros do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS). Vê-se nesse GT a tentativa de construção de “novas institucionalidades” (DELGADO; LEITE, 2011) que concorressem para que gestores públicos e demais atores construíssem de modo participativo a política. Entre seus principais objetivos estava o de respeitar a forma de ocupação tradicional e a biodiversidade, conjugando o manejo florestal e a recuperação de áreas degradadas pela ação humana.
A metodologia de implantação dos Projetos de Assentamentos Agroextrativistas foi composta de várias etapas, e a definição contida na apresentação do documento permitiu a compreensão de como aspectos da legislação acionados foram acomodados para a efetiva instalação desta modalidade de assentamento:
Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) é uma modalidade de assentamento destinado a populações tradicionais, para a exploração de riquezas extrativas, por meio de atividades economicamente viáveis e ecologicamente sustentáveis, introduzindo a dimensão ambiental às atividades agroextrativistas. Tais áreas de domínio público, serão administradas pelas populações assentadas através de sua forma organizativa, que receberá a concessão de direito real de uso (INCRA, 1996b, p. 05).
Podemos ver na definição do PAE, que se buscava conjugar diversos, quais sejam, a exploração racional da terra e a regularização fundiária com formas de exploração coletiva da terra e uso dos recursos naturais, como previsto pelo I PNRA. Ao mesmo tempo conjugava o princípio da função social da propriedade, consagrado na CF/1988, que reconhecia como bens da União as terras devolutas, como anotado no Art. 20. Por seu turno, articulava o direito previsto no Art. 215 da proteção dos grupos participantes do processo civilizatório brasileiro. Cabe ressaltar, ainda, que se tratou do primeiro documento que fazia menção explícita às populações tradicionais3 no conjunto dos dispositivos legais relacionados com políticas fundiárias.
No caso específico das ilhas e várzeas de Abaetetuba, a obtenção das áreas exigiu um arranjo institucional com a SPU. Por se tratarem de terras da União em sua maioria, mas que não haviam sido arrecadadas pelo Incra e tampouco eram de propriedade comprovada de particulares, os primeiros PAEs criados em Abaetetuba foram, de acordo com entrevista realizada em campo com um técnico do Incra que participou de parte do processo de instalação, resultantes da ação conjunta de dois ministérios
O “ineditismo” que o entrevistado ressalta refere-se à ausência de dispositivos legais e administrativos para o assentamento de populações ribeirinhas até a edição das Portarias nos 268 e 269. Some-se a esse fator o já avançado grau de organização dos ribeirinhos de Abaetetuba no sentido de reivindicar a regularização de terras ocupadas, mobilizando estratégias de ação coletiva em seu início fortemente influenciadas pela interação com o MST. Ainda que o I PNRA permitisse a inclusão em suas políticas do grupo social que viria a ser nomeado como ribeirinho, faltava não só o reconhecimento mais explícito na legislação, mas também as experiências anteriores de assentamento que servissem de referência para o movimento social ribeirinho de Abaetetuba.4 A cooperação técnica entre
o Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão (MPOG), por meio da SPU, e o Incra permitiu a instalação dos dois primeiros projetos em Abaetetuba, com a aplicação da metodologia formulada pelo Grupo de Trabalho e contida na Portaria no 41/1996. Em seguida, o cadastro com a identificação e quantificação dos ocupantes permitiria o avanço à etapa posterior, que consistia no assentamento dos candidatos cadastrados e selecionados. No caso de Abaetetuba, todas as etapas anteriores foram cumpridas, permitindo a liberação de recursos sem, no entanto, a titulação ser confirmada, ainda que o perímetro do PAE fosse demarcado. A partir do resultado obtido nas duas primeiras ilhas (Campompema5 e Jarumã), com os PAEs nelas instalados, a luta do movimento social ribeirinho ganhou força e assumiu como principal bandeira a extensão da
Essa mobilização permitiu que nos demais 22 PAEs instalados em Abaetetuba fosse aplicada a metodologia prevista pela Portaria no 41/1996, que estabelecia, além das etapas até aqui descritas, a necessidade de “Organização Social do Assentamento”, devendo contemplar a melhoria do nível de organização dos assentados, dos processos de produção e a obtenção da concessão de uso. Cumpre ressaltar que a “lei” ou a tomada de conhecimento da existência das portarias que estabelecem a criação dos PAEs, por parte do Moriva, representou a oportunidade para o grupo orientar a sua luta no sentido de garantir o direto às terras ocupadas.
Conforme dados extraídos do site do órgão6, somente em uma das Superintendências Regionais do Incra no estado do Pará (SR-01), localizada em Belém e que abrange o município de Abaetetuba, foram criados 407 Projetos de Assentamento (PA) entre os anos de 2004 e 2015. Deste total, 268 são da modalidade Projeto de Assentamento Agroextrativista, o que corresponde a 65,8% do total de assentamentos criados no período, aproximando-se do percentual de PAEs criados.
A partir de 2009, a criação de PAEs é reduzida, indicando a retração da política, com uma retomada em 2011, ligeiramente superior à média anual do período, até o ano de 2015, com a criação de um único assentamento desta modalidade. Considerando os limites da nossa pesquisa, asseveramos que concentramos a extração de dados do Incra naqueles relativos à modalidade de assentamento que beneficiou o grupo pesquisado.7 O segundo dado que chama a atenção é que dos 268 Projetos de Assentamento Agroextrativistas criados pela SR-01, 24 deles localizam- se no município de Abaetetuba, correspondendo a 8,9% dos PAEs desta Superintendência, se tratando, deste modo, do quarto município com o maior número de assentamentos desta modalidade:

Coube ao Incra, como estabelecido pela Portaria que institui os PAEs, a delimitação das áreas dos assentamentos por meio da elaboração dos memoriais descritivos de cada um deles e o respectivo georreferenciamento dos polígonos. No entanto, ainda que essa etapa fosse fundamental para os contratos de CDRU, se fazia necessária a destinação das terras ao órgão de modo a permitir a transmissão de domínio das terras aos ribeirinhos, posto que a posse, com a instalação dos PAEs, estava minimamente assegurada. Considerando a localização das ilhas e várzeas em terras federais, como anotado na legislação acionada nas seções anteriores, na celebração do termo de cooperação técnica entre o Incra e a SPU, caberia à segunda a transferência das terras sob sua responsabilidade para o Incra, de modo a permitir a conclusão da etapa final dos assentamentos. Contudo, conforme relato do técnico da SPU envolvido com a questão, trata-se de processo longo e que envolveu recursos humanos e financeiros:
Para funcionar o PAE a gente precisa destacar a área, fazer todos os trâmites, até chegar a discriminatória. Vou dar o exemplo de uma ilha que o Incra foi lá, fez o trabalho de geo8 e solicitou para a gente, aí se dá tudo certo, de acordo, a gente faz a entrega da ilha, para o Incra fazer o PAE. Aí na ilha tem 200 famílias, mesmo já tendo sido criado o PAE, as famílias podem se cadastrar no Nossa Várzea. Agora se a gente não autorizou para fazer o PAE, na ilha só vai ter o Nossa Várzea. A orientação é para a gente autorizar todas, o que demora é o procedimento da discriminatória, porque nesse procedimento, isso requer recurso para fazer. Digamos que tu identifica na ilha, na discriminatória, particulares com direito, do seu título legítimo ou não. Aí vai ter que ter indenização da família, vai ter que ter exclusão de áreas. Tem um trabalho topográfico que leva tempo, pode levar 30 dias, com mais ou menos 3 servidores, aí são diárias para 3 servidores, isso demanda custo. Nós somos autorizados a utilizar apenas 40 diárias por ano. Esse ano não usamos quase nada, então se o servidor já cumpriu as 40 diárias dele, não pode viajar, por isso que o processo as vezes trava, além de fazer a discriminatória, tem as outras ações. Não é má vontade de fazer, é porque trava nisso para finalizar o procedimento e entregar a ilha (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
Se, por um lado, para a instalação dos PAEs o Incra ficou responsável pela aplicação da metodologia, coube à SPU a transferência das terras para o acervo fundiário do primeiro, como também as atividades de campo necessárias para a discriminação das ilhas e várzeas que se constituem em bens da União. A morosidade do trabalho de campo, por falta de recursos financeiros para as atividades que envolvem os técnicos da SPU, se revelou durante as entrevistas como um dos principais obstáculos para a efetiva transmissão das terras dos PAEs de Abaetetuba para o domínio do Incra. Em certa medida, o número reduzido de servidores, a falta de articulação entre os dois órgãos (IPEA, 2015) e o fato da Superintendência da SPU estar localizada somente na capital do estado dificultam a efetiva conclusão da instalação dos PAEs nos dias atuais. Enquanto o Incra dispõe de três superintendências localizadas em Marabá, Santarém e Belém, mais a unidade avançada de Altamira, a Superintendência de Patrimônio da União do estado do Pará, está localizada em Belém, e não dispõe de unidades em outros municípios.
A principal luta dos ribeirinhos de Abaetetuba, organizados em torno do Moriva, é a emancipação dos PAEs e a celebração do CDRU com a União. As estratégias de luta, como se verá mais adiante, envolvem a reivindicação permanente ao Incra e à SPU sobre o andamento desta última etapa. O que podemos afirmar, a partir das entrevistas realizadas tanto com os técnicos dos dois órgãos quanto com os ribeirinhos, é que as terras em que estão instalados os PAEs encontram-se em um “meio do caminho” entre terras passíveis de arrecadação pelo Incra ou SPU e a real discriminação destas. A realização desta etapa requer a investigação sobre se se tratam de terras devolutas, e portanto públicas, que estão em posse de particulares ou se são terras particulares, devidamente tituladas e que exigem desapropriação.
O Programa Nossa Várzea e Função Social das Terras da União
O Programa Nossa Várzea: cidadania e sustentabilidade na Amazônia brasileira, criado em 2005 pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU), não previa a transferência de domínio das áreas de várzea para particulares. A SPU concede direito à ocupação e à exploração sustentável dos recursos naturais às comunidades ribeirinhas que utilizam essas áreas para o desbaste de açaizais, colheita de frutos ou manejo de outras espécies florestais. Esta é outra contradição que surgiu no âmbito das duas políticas de regularização fundiária executadas nas ilhas e várzeas: enquanto a instalação dos PAEs previa a emissão do CDRU para associações dos assentamentos, o mesmo contrato não poderia ser estabelecido individualmente entre a SPU e cada família ribeirinha atendida pelo TAUS, perfazendo aproximadamente 6 mil termos emitidos. Nesse sentido, a luta do movimento ribeirinho pela emancipação dos PAEs se tornou mais urgente do que a reivindicação de regularização de sua ocupação com o Programa Nossa Várzea.
A trajetória da SPU e de seu objeto de atuação se inicia, de acordo com o site da instituição, com a edição da Lei no 601, de 18 de setembro de 1850, conhecida como Lei de Terras. Esta lei se mostra uma fundamental referência legal nos estudos aqui mobilizados que se debruçam sobre a história do regime de terras no Brasil, posto que além de superar os institutos das sesmarias e da posse, permitindo a distinção entre propriedade pública e privada, buscou ladear o país, no âmbito jurídico, com aqueles países onde o capitalismo se desenvolvia, aprofundando a influência do ideário liberal europeu (CARDOSO, 2010b). Para tal feito, de forma a refundar as bases da economia agrária, tendo em vista a proibição do tráfego negreiro no mesmo ano de sua criação, a lei consolida a aquisição de terras devolutas exclusivamente por meio de compra, instituindo deste modo a função arrecadatória das terras públicas.
Após quatros anos de edição da Lei no 601, sua regulamentação veio por meio da criação da Repartição-Geral de Terras Públicas, prevista no Decreto no 1.318, de 30 de janeiro de 1854, que disciplinou o regime jurídico aplicável às terras públicas, definindo as atribuições e o corpo técnico que as comporia, bem como que a destinação das terras seriam reservadas: “1. para a colonização dos indígenas; 2o para a fundação de povoações, abertura de estradas, e quaisquer outras servidões, e assento de Estabelecimentos Públicos” (BRASIL, 1854). A Repartição-Geral de Terras Públicas foi a instituição antecessora, até onde as fontes consultadas permitem afirmar, da SPU, com a mesma incumbência de gerir as terras sob seu domínio. Tanto o instituto das sesmarias quanto o de posse são fundamentais para a compreensão de como se conformou a propriedade no Brasil e, em especial, aquela que nos interessa, que são as terras da União localizadas em áreas de várzea e ilhas fluviais.
A partir da redefinição da missão institucional da SPU, foi editada em 14 de outubro de 2005 a Portaria no 284, que autorizava o desbaste de açaizais, a colheita e manejo de frutos e outras espécies extrativas. Essa inovação permitia o manejo ambiental dos açaizais localizados nas áreas de várzeas e sob domínio da União, o que, de acordo com as entrevistas realizadas em campo, possibilitou, juntamente com a assistência técnica e os Planos de Utilização elaborados para os PAEs de Abaetetuba, que a produção de açaí se consolidasse como importante fonte de renda e de segurança alimentar dos ribeirinhos. Para fazer jus à autorização de uso, o ribeirinho deveria respeitar os limites da tradição do vizinho, comprovar a ocupação tradicional e obter parecer do Ibama atestando a não degradação da área com a extração do fruto. Essa portaria Permitiu a formulação do Programa Nossa Várzea e determinou que a Autorização de Uso representasse o início da regularização fundiária especificamente nas áreas de várzea da Amazônia, excluindo, portanto, a ocupação no interior das ilhas, como no caso de Abaetetuba.
A execução do Programa iniciou-se no ano de 2005 a partir de Abaetetuba, em grande medida pelo grau de organização política anterior do movimento social ribeirinho do município. Ao mesmo tempo, o reconhecimento de acesso à terra pelas populações ribeirinhas anotadas no II PNRA e a previsão de políticas de regularização fundiária para o grupo levaram à mobilização dos movimentos sociais na Amazônia Legal, culminando em um seminário, em 2005, que deu os contornos da atuação da SPU na execução do programa.
O principal problema que o Programa Nossa Várzea imaginava enfrentar, sobretudo envolvendo terras que ainda não haviam sido incorporadas aos PAEs, é o “sistema de meia”, prática comum nas ilhas e várzeas do município e que mantinha os ribeirinhos em condições de trabalho que se baseavam na tradição e ausência de remuneração. O sistema de meia consistia na entrega da metade da produção (açaí, camarão, mandioca, milho e aves) dos ribeirinhos residentes nas ilhas e várzeas aos pretensos donos das terras. Em geral, estes “patrões” residiam na área urbana do município ou em outras cidades do nordeste paraense e eventualmente possuíam títulos de propriedade da terra, emitidos pelo estado do Pará e registrados em cartório de imóveis. Não obstante grande parte deles fosse títulos “quentes” ou autênticos, por conta da localização das propriedades em terras da união, tinham o domínio da terra cancelado pela SPU, o que motivava o ingresso na justiça de reclamantes que reivindicam o reconhecimento dos títulos, quando estes eram anulados no âmbito da execução do Programa Nossa Várzea:
Geralmente a gente não reconhece, porque muitos deles são em cima das áreas de uso comum, das várzeas, aí a gente pede para eles fazerem o geo excluindo a área da União e tem uns que não voltam. Aí continua na justiça, tentando inclusive oprimir na justiça comum, na justiça do Estado. Eles conseguem mais quando passa pelo Estado, porque quando passa na justiça federal a gente tem êxito porque eles conhecem melhor a realidade da política pública federal. Por isso eles preferem entrar na justiça comum do Estado, para ganhar e expulsar os ribeirinhos, mas a gente tem revertido muitos casos, em Muaná, Ponta de Pedras, em Abaetetuba, em muitos casos a gente ainda não foi julgado, mas a gente consegue tramitar na justiça federal e o caso ficar sub-júdice e não haver despejos (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
Quando a disputa pelas terras chegava ao Judiciário, em alguns casos relatados pelas entrevistas, os pleitos dos pretensos proprietários aludiam ao costume e à falta de regularização originada no regime de sesmarias, os principais argumentos de suas defesas. O tamanho atribuído às áreas “muitas vezes ia até onde der, vai das margens do rio tal até onde der” e “não tinha marcação”. A demarcação dos limites da sesmaria era imprecisa e na maioria das vezes o registro das terras não incluía a extensão da propriedade. Nesse sentido, as contestações judiciais dos TAUS emitidos em favor dos ribeirinhos se baseavam em títulos cuja cadeia de domínio não era comprovada. Para garantir mais segurança jurídica para a execução do Programa Nossa Várzea, evitando assim contestação sobre as autorização de uso, foi aprovada em 31 de maio de 2007 a Lei no 11.481, que em seu Art. 1o autoriza a SPU a executar:
(...) ações de identificação, demarcação, cadastramento, registro e fiscalização dos bens imóveis da União, bem como a regularização das ocupações nesses imóveis, inclusive de assentamentos informais de baixa renda, podendo, para tanto, firmar convênios com os Estados, Distrito Federal e Municípios em cujos territórios se localizem e, observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, celebrar contratos com a iniciativa privada (BRASIL, 2007).
Os meandros da regularização fundiária das populações ribeirinhas por meio da legislação citada tem início quando motivada pelas associações de ribeirinhos que solicitam diretamente ao órgão a inclusão no programa ou com as ações de busca ativa da equipe de técnicos da SPU de comunidades e de famílias mais isoladas que atendam as condições mínimas que a Lei no 11.481 exige, quais sejam, a morada desde no mínimo cinco anos no local, ocupação tradicional e mão de obra familiar. A inclusão dos ribeirinhos pelo programa pode ser realizada diretamente no órgão, apesar das distâncias a serem percorridas até Belém, ou se dá, em sua maioria, pelas ações de campo dos técnicos da SPU, quando, a partir delas, tem início o processo de regularização individual da ocupação:
Se ele não tiver documento, mesmo assim nós vamos pedir para ele preencher o requerimento, solicitando a regularização. Aí nós vamos pedir para ele aguardar a visita de um servidor, para saber se ele está mesmo lá. Esse é o primeiro passo da regularização fundiária, a gente deslocar um servidor para fazer a vistoria, os principais requisitos são que ele tem que estar ocupando a área da União, a ocupação dele tem que ser uma ocupação sem conflito, tem que ser mansa e pacífica, tem que respeitar os limites da tradição do vizinho. Ele não pode vir aqui sem regularizar porque brigou, por isso que a ocupação tem que ser mansa e pacífica. Aí depois disso a gente diz que vai mandar um servidor para comprovar as coisas que eles estão reivindicando, isso no caso do ribeirinho que vem individualmente aqui. Geralmente a gente faz um plano de trabalho anual, com deslocamento para fazer ações longas, de dez dias, então a gente vai para uma ilha, passa dez dias lá e vai cadastrar todo mundo que tiver nas áreas da União. Esses que forem cadastrados, não precisam vir mais aqui, eles vão assinar o requerimento lá e o servidor vai dar continuidade do trabalho aqui. Esse que vem especificamente sozinho vai precisar analisar o documento dele e mandar o servidor in loco lá (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
Com a emissão dos TAUS para cada atendido, passa a ser possível acessar outros programas sociais do Governo Federal, uma vez que utilizando também o cadastramento do domicílio pela SPU se realiza simultaneamente a inscrição no Cadastro Único, permitindo o acesso aos programas sociais destinados à população de baixa renda. No caso de Abaetetuba, permitiu às famílias ribeirinhas a inclusão no Programa Bolsa Verde, além dos demais programas sociais, tais como Bolsa Família, Benefícios de Prestação Continuada e emissão de documentos pessoais. Em Abaetetuba os moradores das ilhas e várzeas são ribeirinhos, posto que têm em comum a moradia na “beira” dos rios, mudando somente a relação com a terra firme, o que não ocorre com os moradores das ilhas. Isto significa que a Secretaria de Patrimônio da União é inicialmente o órgão gestor das terras de ilhas e das várzeas, e executa um programa destinado em princípio aos moradores das várzeas ou das porções das beiras de rios localizadas no continente:
A Várzea, além de receber este documento, ela recebe um outro documento anexo que dá direito ao varzeiro a vender os produtos retirados do seu terreno sem a intervenção do Ibama até o raio de 500m. Tem legalidade para você vender esses produtos, o que a SPU não entregou para os moradores das ilhas, dos PAEs, ela entregou só um título. Ele recebe esse título de certidão que eles usaram um lobby, que essa certidão dá direito a eles à terra, mas não dá. Porque pela metragem que eles tiraram num raio de 9 m², eles colocaram lá no primeiro documento... tem morador que tem só 1 hectare de terra, mas eles dividiram por igual, o que gerou um certo conflito fundiário, porque uns dizem: no meu documento diz que eu tenho 9, mas onde é que está esses 9 hectares de terra que você tem? (Liderança do MORIVA em entrevista ao autor em setembro de 2015).
O imbróglio sobre qual a mais eficiente estratégia de regularização fundiária para os ribeirinhos de Abaetetuba pende em favor, segundo as entrevistas, da executada pelo Incra, por meio da instalação dos PAEs, por dois motivos principais: a maior oferta de crédito rural associada ao assentamento e a posse comunal da terra com a celebração do CDRU:
É um ponto que eu defendo com muita tranquilidade com relação a isso. De certa forma teve outra vertente, essa questão do Programa Nossa Várzea, porque o primeiro ponto seria você fazer a discriminatória dessas áreas, matricular em nome da União para depois destinar, isso é muito claro e isso não foi feito. Porque era muito mais cômodo, na minha avaliação, e fizeram coisas totalmente que ao invés de solucionar, você criou um problema. Porque se você pega aquela TAUS, ela fala em 500 m de raio, numa área onde você não tem título quando esse documento cai na mão de uma pessoa mal intencionada, a pessoa vai ocupar a terra do outro, quem tem mais força.
Porque pra ele, ele não compreende que aquilo é um documento precário, aquilo não tem valor jurídico de nada, se a pessoa for pra justiça, ele não é um título, ele é um documento precário (Técnico do Incra em entrevista ao autor em setembro de 2015).
O caráter precário do TAUS como garantidor da posse é reconhecido de modo geral pelos entrevistados, e tanto o Programa Nossa Várzea quanto os PAEs instalados em Abaetetuba têm como obstáculo a emissão do CDRU. Este se constitui no segundo impasse da regularização fundiária envolvendo Incra e SPU, tal como se vê:
Cada TAUS dessa tem uma coordenada, ela vai gerar um trecho e a partir desse trecho nós vamos fazer uma demarcação do limite da área, aí a gente liga para a CDRU, faz a ligação do interesse público da área e começa os procedimentos da CDRU. Sai em nome da associação, com o nome de todos os ribeirinhos da área. Deixa eu dar um exemplo aqui do rio Muaná, lá 200 famílias tem a TAUS, tem todas as coordenadas, o material descritivo, o mapa dessa área, faz uma portaria de interesse público e começa o procedimento para fazer a CDRU.
(...) para garantir a manutenção e a segurança das famílias, nós vamos começar por lá, mas de fato a gente precisava mais para conseguir as CDRU onde já tem TAUS. Atualmente isso não aconteceu por falta mesmo de recursos, não tinha o material, financeiro, o orçamento ali como recursos de serviço para fazer o trabalho de campo e transformar os TAUS em CDRU. Você tem que voltar com dinheiro, com o topógrafo das áreas (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
A viabilidade de celebração de contrato só poderia se dar via a formação de associações, tendo e vista que o CDRU não podia ser celebrado com particulares. Para contornar esse impedimento legal, foi editada a Portaria no 89, de 15 de abril de 2010, permitindo a emissão de TAUS coletivos para um dado conjunto de famílias, para que então, após a formação de um único polígono, a transferência de domínio se realize para uma organização coletiva. Este é o caso das associações Várzea I e II constituídas pelos ribeirinhos de Abaetetuba e que foram a base do Moriva, por estarem sobrepostas aos PAEs. Na Portaria no 89/2010 destacamos dois aspectos importantes que evidenciam a articulação do aparato estatal com as reivindicações de diversos grupos sociais. O primeiro deles encontra-se no Art. 1o, que busca disciplinar o aproveitamento dos imóveis da União em favor das comunidades tradicionais, reconhecendo ao mesmo tempo o caráter “precário e transitório” dos TAUS emitidos. O segundo aspecto trata da nulidade de qualquer título privado nestas áreas, se aproximando, portanto, de uma maior atuação junto de áreas que constitucionalmente pertencem à União. Apesar das exceções praticadas na execução do programa, podemos afirmar, reiterando o que expusemos na seção anterior, que as ilhas e várzeas de Abaetetuba são terras devolutas, cabendo ao órgão, portanto, a sua discriminação e incorporação ao patrimônio público. A ausência de matrícula das terras devolutas também impede a conclusão do Programa
Nossa Várzea, da mesma forma que impede a emancipação dos PAEs
À “confusão fundiária” historicamente construída no estado do Pará adiciona-se, no presente, o segundo aspecto que chama a atenção no relatório e que se relaciona com a desarticulação dos entes federativos na implantação das políticas. Essa percepção foi captada nas entrevistas que realizamos com os gestores e lideranças ribeirinhas e se refletem tanto na identificação da cadeia dominial das ilhas e várzeas quanto na formulação de acordos e convênios entre os órgãos envolvidos no sentido de implantar de modo cooperado os mecanismos de garantia de direito à terra dos ribeirinhos:
Eu acho que o gargalo maior é a gente ter mais agilidade, ter condições materiais para concluir os procedimentos, ter mais destacamento orçamentário para o programa funcionar, mais ação, mais condições para os servidores, porque as vezes eles saem para o trabalho de campo e nem o equipamento deles está garantido, como colete, capa de chuva, GPS, escolta, as diárias. Acho que um concurso público seria fundamental também, para colocar mais gente na equipe e a gente ter um instrumento, uma conexão de diálogo mais forte com os outros órgãos. Nós temos esse poder, mas a gente ter uma ação integrada, acho um desafio integrar as ações, entre Incra, SPU, ICMBIO, MMA, prefeitura, governo, somar esforços porque a partir disso a gente consolidaria e finalizaria os procedimentos. Faria a identificação, demarcação, emitiria as TAUS e finalizaria com a CDRU, acho que isso seria o central para a gente (Técnico da SPU em entrevista ao autor em setembro de 2015).
Nesse sentido, a sobreposição de políticas nas ilhas e várzeas de Abaetetuba impede a efetiva regularização das terras, em que a CDRU emitida em favor das associações é o principal pleito do grupo e se aproximaria mais fortemente do cumprimento da função social da propriedade da União. Os PAEs, instituindo territórios coletivos e vinculados às organizações comunitárias dos ribeirinhos, e os TAUS individuais em uma área circular, com 500 metros de raio, criam as condições para tensionar a relação entre vizinhos. Para tanto, se faria necessário que a Superintendência de Patrimônio da União no estado do Pará dispusesse de um maior número de técnicos envolvidos com o Programa Nossa Várzea, bem como de unidades descentralizadas com vistas ao atendimento do grupo social em uma unidade da Federação com as dimensões que o Estado possui, além de maior integração.
Considerações finais
No caso específico de Abaetetuba, a indefinição das terras devolutas se mostrou central para a compreensão dos impasses das políticas de regularização fundiária destinadas aos ribeirinhos. Por se tratarem de porções de terras (terrenos de marinha e ilhas de águas interiores) pertencentes em tese à União, precisariam estar matriculadas na SPU para se caracterizar como bem público. Portanto, não seria possível a existência de títulos destas terras registrados em cartório, como se verificou nos processos de formação dos PAEs, e emissão dos TAUS no âmbito do Programa Nossa Várzea. Isso aconteceu em virtude da não utilização de porções de sesmarias concedidas e das lacunas que a cadeia de domínio deixava.
Este é o busílis da questão fundiária que impede a definitiva transferência de domínio das terras da União para os ribeirinhos, por meio dos projetos de assentamento agroextrativista e do Programa Nossa Várzea. As terras públicas que foram concedidas pelo instituto da sesmaria, mas que não foram registradas ou demarcadas, tal como exigido pela Lei de Terras de 1850, eram consideradas “vagas”, mesmo que estivessem sendo utilizadas por particulares, posto que, sem o devido registro, não havia como o Estado delimitar sua extensão. Se, por um lado, a ausência de registro e demarcação se fez conveniente durante diversos ciclos econômicos que atuaram para a formação do latifúndio, por outro, o aparato estatal não instituiu mecanismos eficazes de identificação e apropriação das terras devolutas de modo que estas, uma vez matriculadas, tivessem a sua função estabelecida. Tal problema persiste se consideramos, por exemplo, as dificuldades orçamentarias da Superintendência de Patrimônio da União do estado do Pará para “discriminar”, como relatado nas entrevistas, as terras que em tese são públicas, mas que não foram incorporadas ao patrimônio da União. Ainda que a Constituição Federal defina a localização e o ambiente das terras que pertencem à União, estas precisam estar devidamente matriculadas na SPU para que a função socioambiental da propriedade seja exercida.
As terras que integram os 24 PAEs em Abaetetuba são devolutas, porque o Estado brasileiro, por meio da SPU, não as discriminou para que posteriormente lhes desse destinação, excetuando, quando pertinente, aquelas sob domínio privado havidas com título legal. As formas de destinação das terras devolutas que, uma vez discriminadas e incorporadas ao patrimônio público, se convertem em bens da União estão previstas no Art. 20 (destinadas à defesa de fronteiras), Art. 188 (destinadas à política fundiária e agrícola) e Art. 225 (destinadas à preservação ambiental) da Constituição Federal.
Por outro lado, a ocupação tradicional nas ilhas e várzeas é reconhecida desde o I PNRA, faltando, contudo, a articulação pelo Poder Executivo das normas disponíveis para a regularização da ocupação. Estas normas e a própria trajetória do grupo sugerem a influência mútua entre estrutura e a agência dos sujeitos, posto que a afirmação da identidade ribeirinha e o reconhecimento explícito do grupo nos documentos públicos estão ligados entre si. Podemos afirmar que, assim como o II PNRA de 2003 reconheceu o direito à terra e a necessidade de regularização fundiária para os ribeirinhos e quilombolas, a Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), instituída pelo Decreto no 6.040, de
7 de fevereiro de 2007, estabeleceu o ambiente para a assunção da identidade ribeirinha entre os residentes das ilhas e várzeas de Abaetetuba. Isto não significa dizer que tais políticas são isoladas e que por mera coincidência reconhecem direitos do mesmo grupo.
Mesmo que a intenção dos gestores públicos fosse a de instituir políticas de regularização fundiária fundadas exclusivamente na identidade, ainda assim, elas se defrontariam com os próprios pleitos do grupo que extrapolam o viés das particularidades dos ribeirinhos. Tanto as políticas que aqui apresentamos como a afirmação das identidades ribeirinha e quilombola podem ser entendidas, por um lado, como resultante da radicalização da modernidade e, por outro, pela organização política do grupo até sua entrada na cena pública. Este momento se deu em 1982 quando foi criado o movimento Centrilha – resultado da aliança entre moradores do centro da área urbana do município e ribeirinhos residentes nas ilhas – com o objetivo de lançar candidaturas próprias para as eleições proporcionais. Nos anos seguintes a organização do grupo avançou com a criação, em 1986, da Associação de Moradores das Ilhas de Abaetetuba (AMIA), o que representou não somente a ressignificação da identidade do grupo para “morador das ilhas”– de modo a escapar do estigma associado à designação de caboclo – como também consolidou o pleito por serviços públicos como principal reivindicação, em especial saúde, educação, moradia e geração de emprego e renda.
No entanto, faltava uma entidade que substituísse a Amia no papel de representação política do grupo. E em 2006, após o congresso realizado nas ilhas e várzeas de Abaetetuba, foi criado o Moriva, que era em grande medida reflexo e influência do reconhecimento dos direitos da população ribeirinha, tal como anotado no II PNRA. A criação do Moriva e a organização política dos ribeirinhos, tendo por base a instituição de 24 associações, levam à convergência entre organização política, assunção da identidade ribeirinha e implantação das duas políticas de regularização fundiária.
Os anos seguintes à criação do Moriva seriam de consolidação da hegemonia da entidade na representação política dos ribeirinhos e mobilização para o avanço na instalação da infraestrutura prevista para os PAEs, com a reivindicação dos recursos do Pronaf e sua efetiva aplicação. Além da busca por reconhecimento dos direitos específicos num plano mais geral, a demanda por serviços públicos e a emancipação dos assentamentos, por meio da emissão da CDRU passavam a fazer parte da pauta de pleitos dos ribeirinhos.
Nos aspectos fundamentais da formação das terras públicas se encontram as bases sociais, políticas e jurídicas com as quais a SPU e as populações ribeirinhas se depararam na implantação dos PAEs e do Programa Nossa Várzea. A justificativa pelo caminho que aqui adotamos já se revelava premente nas primeiras leituras da produção acadêmica recente sobre regularização fundiária no Brasil, posto que a menção, ainda que breve, à história do regime de terras em diversos textos mostrou a necessidade de um exame mais detido. A pretensão não foi a de fazer uma exaustiva descrição das normas legais e sim analisá-las até o ponto que permitisse compreender as condições sociais e políticas de produção de cada uma delas e identificar impasses e potencialidades da destinação de terras públicas para a garantia de direitos das comunidades ribeirinhas da Amazônia Legal, a partir do caso de Abaetetuba.
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Notas