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Ríos, Flavia y Marcia Lima (orgs.) (2020). Lélia Gonzalez. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. Rio de Janeiro: Zahar. (376 pp.)
Wirapuru Revista Latinoamericana de Estudios de las Ideas, núm. 3, pp. 1-6, 2021
Ariadna Ediciones

Reseñas


Rios Flavia, Lima Marcia. Lélia Gonzalez. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. . 2020. Rio de Janeiro. Zahar. 376pp.

O espaço acadêmico brasileiro foi historicamente construído aos moldes de epistemologias de origem eurocêntrica e estadunidense, mesmo possuindo internamente um diversificado conjunto de pensadores. Como consequência, certas questões condizentes com a realidade local acabaram sendo marginalizadas dentro do campo das Ciências Sociais, especialmente quando se trata da discussão referente ao racismo. Esse “epistemicídio” – termo utilizado por Boaventura de Sousa Santos – está presente na própria formação histórica do pensamento brasileiro que, ao receber influências de um colonialismo ainda latente na região, desenvolveu uma noção de identidade brasileira que repousava em uma suposta democracia racial, que pregava a inexistência do racismo no Brasil. Essa falsa ideia de integração e harmonia racial permitiu que a história dos povos de origem africana e indígena permanecesse invisibilizada dentro da academia brasileira. Felizmente, a partir da década de 1970, é possível notar uma maior reivindicação da comunidade afrodescendente em busca de um pensamento que melhor pudesse contemplar a realidade racista vivenciada pela população negra; é a partir desse contexto que Lélia Gonzalez irá estabelecer e direcionar seus estudos.

Após décadas sendo negligenciada nos espaços acadêmicos, a extensa obra de Lélia Gonzalez (1935-1994) finalmente se tornou acessível ao público brasileiro a partir do lançamento do livro Por um feminismo afrolatinoamericano: ensaios, intervenções e diálogos, publicado pela Editora Zahar, em setembro de 2020. Organizado pelas sociólogas Flavia Rios (UFF/RJ) e Márcia Lima (USP/SP), o livro inclui uma variedade de ensaios acadêmicos e artigos escritos por Lélia, além de palestras, publicações para a mídia e até mesmo entrevistas. Os textos encontrados nessa publicação datam do período de 1975 a 1994.

Amazon.com: Por um feminismo afro-latino-americano (Portuguese Edition) eBook : Gonzalez, Lélia, Rios, Flavia, Lima, Márcia: LibrosLélia Gonzalez foi uma filósofa, antropóloga, professora, escritora e militante do Movimento Negro; filha de pai negro operário e mãe indígena doméstica, suas origens mais humildes foram determinantes para a sua formação futura e seus escritos. Conhecia intimamente a realidade racista e sexista da sociedade brasileira, deparando-se constantemente com barreiras sociais que buscavam invisibilizar sua existência enquanto mulher negra na academia. Como consequência, introduziu a militância e o ativismo político em sua agenda, abraçando as pautas do feminismo e do movimento negro concomitantemente. Desse modo, elaborava um pensamento teórico verdadeiramente interseccional, que iria compor suas análises acerca do papel da mulher negra na sociedade brasileira.

Em seu papel como militante e ativista política participou da formação do Partido dos Trabalhadores (PT), partido pelo qual em 1982 lançou-se como candidata a deputada federal, alcançando a primeira suplência; posteriormente iria migrar para Partido Democrático Trabalhista (PDT) e se candidataria novamente a deputada estadual, alcançando a primeira suplência no pleito realizado em 1986. Foi umas das fundadoras do Movimento Negro Unificado, além de ter atuado ativamente nas discussões sobre a Constituição de 1988 e ter integrado o primeiro Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), na mesma década. Seus trabalhos percorreram o mundo e chegou a representar o Brasil em diversas palestras, seminários internacionais e conferências na ONU, tornando-se referência mundial na luta antirracista e feminista.

No campo acadêmico, Lélia foi umas das pioneiras na introdução de um debate que propunha investigar a relação entre gênero e raça, ao criticar os mecanismos sistêmicos e estruturais que reproduziam o racismo e o sexismo dentro da sociedade brasileira, e por extensão, da sociedade latino-americana. Seus estudos também abordavam a questão de classe e os desequilíbrios nas estruturas de poder que agudizavam os abismos entre as classes sociais no Brasil e na América Latina, adaptando o tema a partir de um olhar antirracista e feminista. Ainda na década de 1970, Lélia conceituou a ideia de tripla discriminação sofrida pela mulher negra, colocando em prática o conceito de interseccionalidade, que só viria a ser desenvolvido posteriormente por Kimberlé Crenshaw, em 1989. Com isso, afirmava que as mulheres negras eram alvos de formas particulares de sexismo e racismo, ao passo que são exploradas e marginalizadas dentro de diversos núcleos institucionais: seja na baixa escolarização, na dificuldade de inserção no mercado de trabalho ou na reprodução social do trabalho, sem contar na profunda sexualização que sofrem dentro da sociedade, assunto que Lélia abordou perfeitamente em seus ensaios e textos.

Lélia também revolucionou o meio acadêmico ao propor o conceito de amefricanidade, no qual buscou decolonizar os saberes instituídos acerca do racismo e adaptá-los a uma realidade latino-americana. A amefricanidade constituiu-se como uma formulação teórica político-cultural que ultrapassa os limites acadêmicos e constrói-se na realidade concreta experienciada por mulheres e homens negros latino-americanos, que historicamente encontraram-se silenciados e invisibilizados dentro da sociedade na qual viviam. A categoria de amefricanidade se constrói a partir do passado vivenciado na região, no qual a colonização e a escravização dos povos africanos e indígenas deixaram marcas profundas na construção da sociedade latino-americana. A América Latina assumiu uma forma particular de racismo que, ao mesmo tempo que promoveu uma tentativa de assimilação do povo não branco, os inseriu numa realidade pautada pela hierarquização racial e social. “O racismo latino-americano é suficientemente sofisticado para manter negros e índios na condição de segmentos subordinados no interior das classes mais exploradas” (Gonzalez, 2020, p. 131), a partir da instrumentalização dos aparelhos ideológicos que irão perpetuar os preceitos do homem cis branco heteronormativo do Ocidente como os valores verdadeiros e universais. Lélia expandiria a noção de amefricanidade para o campo feminista, ao reivindicar um feminismo afro-latino-americano, se afastando das limitações existentes no feminismo liberal e branco e propondo a decolonização do termo e da luta, na qual as protagonistas são as ameríndias e amefricanas.

Seu pensamento e ideias são muitos mais extensos do que esta resenha tem a capacidade de expor. Seus estudos trazem uma multiplicidade de conhecimentos e interdisciplinaridade notáveis, o que se justifica a partir das próprias experiências que Lélia vivenciou na sua trajetória acadêmica, militante, política, familiar e afetiva. Lélia traz referências de diversos mundos, desde conceituações marxistas, passando pela psicanálise lacaniana, pelos pensadores africanos e americanos, e até mesmo nas ideias e crenças do Candomblé. A abrangência de seu pensamento atravessa os diversos campos epistemológicos e disciplinares, decolonizando os saberes e sempre relacionando-os com a realidade concreta vivenciada pelas sociedades latino-americanas.

Na primeira parte do livro, intitulada “Ensaios”, encontramos os textos considerados mais acadêmicos de Lélia Gonzalez. Mesmo com seu vasto arcabouço teórico – que engloba noções e referências das mais diversas áreas das ciências sociais –, ainda é possível notar a presença de uma escrita direta, incisiva e bastante clara, nada similar aos textos carregados de erudição com os quais nos deparamos no cotidiano acadêmico.

O texto que inaugura a leitura é “Cultura, etnicidade e trabalho: Efeitos linguísticos e políticos da exploração da mulher”, no qual é possível encontrar a interseccionalidade que tanto caracteriza seu discurso e escrita – nele, as questões de classe são elencadas a partir de uma análise acerca da reprodução do sistema capitalista na formação socioeconômica brasileira, orientada por conceitos desenvolvidos pela corrente marxista e, em particular, pelo argentino José Nun, como exército industrial de reserva, massa marginal e superpopulação relativa. Essas ideias serão resgatadas nos subsequentes textos do livro, “A juventude negra e questão do desemprego” e “A mulher negra na sociedade brasileira: Uma abordagem político-econômica”; nestes ensaios, Lélia Gonzalez resgata as formulações acerca do capitalismo dependente brasileiro e o funcionamento do modo de produção capitalista brasileira que gerou, consequentemente, o desenvolvimento desigual da força de trabalho no país por gênero e por etnicidade. Isso significa que o caráter político-econômico e ideológico das relações de produção capitalista se sustentou a partir de uma divisão racial e sexual do trabalho, no qual a população negra constitui a massa marginal crescente e exército industrial de reserva e a mulher negra, sistematicamente excluída dos processos dentro do mercado de trabalho, desempenha papeis sociais desvalorizados dentro da população economicamente ativa, revelando assim sua tripla exploração.

Os primeiros textos evidenciam a necessidade de analisar de forma mais abrangente as relações de classe no Brasil. Entende-se que tanto negros quanto brancos podem sofrer as consequências da exploração capitalista e superexploração da força de trabalho, contudo a população branca continuará sendo privilegiada por conta da estrutura de opressão racial existente na sociedade. Em outras palavras, os aparelhos ideológicos, políticos e econômicos são estruturados a partir de um sistema racista que beneficia a população branca, a partir de um maior acesso à educação, moradia ou oportunidades de emprego.

Em “O apoio brasileiro à causa da Namíbia: Dificuldades e possibilidades”, podemos ver as tentativas de Lélia Gonzalez ao afirmar a importância do fortalecimento da diáspora negra no Brasil como condição essencial para compreender e apoiar os movimentos de libertação da África Austral; o texto ainda salienta que o estreitamento das relações entre Brasil e África possui uma série de obstáculos que precisam ser superados, justamente por conta da tendência ideológica brasileira de apagar a herança africana presente na sua história, a partir de conceitos falaciosos que clamam por uma suposta democracia racial.

Um dos aspectos inovadores da produção de Lélia no contexto das análises das relações raciais foi o acréscimo da subjetividade do gênero para uma cognição mais completa de seus exercícios. Em “Racismo e sexismo na cultura brasileira”, um dos importantes legados deixados pela intelectualidade de Lélia dentro do pensamento social brasileiro repousa na desconstrução de um dos alicerces do discurso da democracia racial: a conformidade nas relações sexuais entre os portugueses e as mulheres negras e indígenas, defendida por Gilberto Freyre em Casa grande & Senzala (1933); Lélia combate tal visão: ela define tais relações como sendo o resultado da violentação das mulheres negras por parte da minoria branca dominante, como por exemplo os senhores de engenho. Crítica semelhante é feita por Lélia a Caio Prado Jr. que, em Formação do Brasil Contemporâneo (1942), animalizou e objetificou as mulheres negras escravizadas, ao afirmar que o “fator sexual” relativo a elas foi incapaz de realizar “o milagre do amor humano”, que seriam edificantes de sentimentos mais complexos. Segundo Lélia, a maior consequência do mito da democracia racial é a crença de que o racismo é inexistente em nosso país, já que seríamos um povo miscigenado per se. Adicionalmente, Lélia insere nesse ensaio um português informal, inserindo em sua escrita expressões da oralidade tipicamente estereotipadas ao modo de falar das pessoas pretas, tal qual “Cumé que a gente fica?”; o objetivo de incomodar o leitor pode ser interpretado como forma de protesto.

Em “Por um feminismo afrolatinoamericano”, Lélia digressa em sua visão de um movimento feminista, ciente do racismo estrutural nas sociedades latino americanas, e propõe um pensamento feminista do Sul e decolonial, atuante nas margens e propositor de modelos alternativos de sociedade. Novamente, Lélia é enérgica em suas críticas à invisibilidade da raça nos estudos feministas latino-americanos, e argumenta que ele não consegue se potencializar por negligenciar os atributos pluriculturais que compõem a singularidade das mulheres da região. Para Lélia, a atitude antirracista deve ser parte componente do pensamento feminista e um movimento não pode ser considerado verdadeiramente feminista sem cultivar essa postura, uma vez que juntamente com o sexismo, o racismo expõe as mulheres negras ao maior raio de opressões e subjugações na sociedade.

Em “A categoria político-cultural de amefricanidade” e “Nanny: Pilar da amefricanidade”, evidencia-se seu olhar feminista sob esses prismas plurirraciais e multiculturais. No primeiro ensaio, Lélia expõe seu brilhantismo ao criar a categoria amefricanidade. Segundo a pensadora, a presença da latinidade no Novo Mundo foi uma ficção; na realidade, foi a prevalência de elementos ameríndios e africanos que compôs de fato o que ela denominou de “Améfrica Ladina”. Para explicar a apagamento do caráter afro-ameríndio pelos brasileiros, Lélia utiliza a psicanálise, mais especificamente o conceito de denegação: “enquanto denegação dessa ladino-amefricanidade, o racismo se volta justamente contra aqueles que, do ponto de vista étnico, são os testemunhos vivos da mesma, tentando tirá-los de cena, apagá-los do mapa” (Gonzalez, 2020, p.151). Ao inaugurar esse conceito, González repensa as realidades indígenas e africanas, desta vez “por dentro”. Por conseguinte, surgem novas interpretações desses povos, mais próximas de suas realidades e vivências, uma vez afastadas as visões eurocêntricas que vinham sendo cunhadas e engessadas desde o século XV. Essas novas interpretações sobre os povos indígenas e africanos são abordadas no segundo texto sob o aspecto da resistência. Nanny, mulher negra escravizada, líder maroon, teve papel de destaque na luta anticolonialista da Jamaica do século XVIII. Para os jamaicanos, Nanny é um símbolo nacional, heroína e mártir; é por conta dessa importância dada a uma mulher preta que González a aduz em seus escritos. Ela visava destacar a importância das mulheres nas lutas das comunidades amefricanas, presentes na resistência desde sempre; “nossos passos vêm de longe”, diria Conceição Evaristo mais de 30 anos depois. As mulheres pretas e indígenas traçaram um caminho de luta contra as opressões do racismo e sexismo desde o regime colonial, e cumpre às mulheres pretas da contemporaneidade honrarem esse legado e continuarem a contribuir para a transformação positiva do mundo.

Em ensaios como “Mulher negra”, “O Movimento Negro Unificado: Um novo estágio na mobilização política negra” e “A mulher negra no Brasil”, muito antes da jurista e socióloga estadunidense Kimberlé Crenshaw cunhar o termo “interseccionalidade”, Lélia criticava os movimentos feministas brancos que tinham o privilégio de se organizar sob a bandeira única do gênero; Angela Davis traz essa mesma discussão no livro “Mulheres, raça e classe”(1981), ao criticar o movimento feminista sufragista estadunidense. González defende que foi a partir da denúncia das mulheres negras que a questão de raça foi reivindicada como fator essencial que precisava ser incluído dentro das abordagens do movimento feminista. Lélia trouxe também duras críticas aos seus companheiros de luta no Movimento Negro Unificado, ao denunciar o sexismo sofrido por mulheres negras militantes pelas mãos de seus próprios companheiros homens; Lélia afirma que esse “machismo negro” era uma espécie de compensação pela discriminação racial que também sofriam.

Na seção do livro intitulada “Intervenções”, podemos acompanhar diversos materiais desenvolvidos por Lélia Gonzalez ao longo de sua carreira como militante, seja em publicações nos periódicos dos movimentos negro e feminista, seja em artigos de opinião em jornais e outros veículos de mídia ou até mesmo em transcrições de discursos e debates dos quais participou ao longo da sua carreira política no Brasil. Organizados cronologicamente e escritas – na sua grande maioria – na década de 1970, esses textos possuem uma afinidade gritante com as questões enfrentadas pela população negra nos dias atuais, excluindo-se talvez os escritos que tiveram como função homenagear figuras públicas como Abelardo “Chacrinha” Barbosa, Zezé Motta, Luiz Gama e Abdias Nascimento.

Aqui também podemos ver a máxima expressão de sua revolta e os ecos que ressoam até hoje: ao mesmo tempo que Lélia Gonzalez ressalta a importância das mulheres negras dentro dos espaços políticos institucionais, pleiteando em seus escritos suas candidaturas, desde que comprometidas aos valores do movimento negro, ela também tece duras críticas ao racismo e sexismo presentes na cultura brasileira e questiona a importância dada aos movimentos sociais dentro dos próprios partidos políticos. Em um país que há 3 anos se pergunta quem matou Marielle Franco e o porquê, é importante reafirmar uma postura reivindicatória e a luta proposta por Lélia frente à conformidade das instituições.

Seus discursos e debates transcritos nessa seção do livro resgatam o papel central da interseccionalidade no pensamento de Lélia, bem como evidenciam a multiplicidade de temas que a autora propôs discutir ao longo de sua carreira, ao trazer os aspectos subliminares das questões raciais em todos os aspectos da vida cotidiana. Pode-se enxergar essa diversidade a partir da discussão acerca das origens do Carnaval como um evento que celebra a cultura negra e é constantemente apropriado e vendido ao exterior como uma caricatura do Brasil, sem contar a hipersexualização promovida às custas das mulheres negras, reduzidas às “mulatas”. Lélia expõe também sua denúncia aos padrões de beleza brasileiros, que constantemente promovem estereótipos racistas ao propor, concomitantemente, ideais de beleza pautados nos perfis fenotipicamente eurocêntricos, enquanto animalizam a beleza negra e reduzem suas características a feições “grosseiras” e “sujas”.

A última parte do livro, intitulada “Diálogos”, é composta por uma série de entrevistas nas quais tem-se a chance de se aprofundar na biografia de Lélia, muito além de sua persona acadêmica e militante. Essas entrevistas perpassam o livro quase como depoimentos e uma chance de entender suas origens, sua criação, as influências e os momentos decisivos de sua vida que a conduziram para o caminho dos estudos e da militância: a influência materna na sua infância, os obstáculos que enfrentou no campo acadêmico, seu casamento com um homem branco e sua consciência e reflexão enquanto mulher negra no Brasil.

É indispensável compreender o interesse de uma grande editora em publicar a maior parte de seu legado escrito após quase 30 anos de sua morte: vive-se atualmente um momento de expansão e resgate de autores negros estrangeiros, africanos ou pertencentes à diáspora africana – em especial, os estadunidenses. A produção brasileira nesse segmento permaneceu por muito tempo subrepresentada e é por conta desse fator que se deve ensejar e fomentar o interesse do mercado editorial na busca por autores nacionais. Em visita ao Brasil em outubro de 2019, a filósofa e militante Angela Davis trouxe uma reflexão em uma de suas palestras, ao afirmar que os brasileiros tem muito mais a aprender com Lélia Gonzalez do que com ela. Se, ao finalizar esta resenha, o leitor ainda não foi convencido, nem ao menos ficou intrigado em mergulhar no pensamento desta autora, cabe mais uma vez reiterar os motivos pelos quais deve-se ler Lélia González.

Lélia foi uma pensadora comprometida em analisar a condição da mulher negra no Brasil e os mecanismos que reproduzem todo tipo de desigualdade e violência em nossa sociedade. Muito mais que uma simples proposta de reinterpretação da realidade brasileira, Lélia propôs trazer mudanças palpáveis para a população negra, sistematicamente denunciando as estruturas de opressão ao mesmo tempo que revolucionava os estudos acerca de gênero e raça dentro da academia. Atualmente, mais do que nunca, é necessário que o pensamento rico e sofisticado desta autora esteja inserido nos currículos de ensino, para que o campo acadêmico não se limite a uma replicação constante de clássicos distantes da realidade brasileira e para que se possa dar um passo além de epistemologias deveras eurocêntricas. Deve-se ler Lélia para que se desenvolva uma formação crítica que contemple uma perspectiva do Sul Global, seja esta formação universitária ou militante, mas acima de tudo cidadã.

Notas de autor

* Brasileiras. Mestrandas pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

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